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Conheça o relatório com alegações finais do MPF sobre a Anaconda

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25 de outubro de 2004, 13h21

O prazo para os acusados na Operação Anaconda apresentarem as alegações finais de defesa termina na quinta-feira (28/10). A revista Consultor Jurídico publica, com exclusividade, a íntegra do relatório com as alegações finais do Ministério Público Federal.

A parte mais novidadeira é o resumo das ações que ainda correm contra os 12 acusados. O libelo acusatório final é assinado por Ana Lúcia Amaral, Janice Agostinho Barreto Ascari e Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, procuradoras regionais da República.

Estão em curso, ainda, os seguintes procedimetos: perante o Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região há sete ações penais originárias com denúncia recebida; cinco ações penais originárias com denúncia oferecida, pendente de recebimento; uma Ação Civil Pública (improbidade administrativa); três procedimentos administrativos disciplinares; nove inquéritos judiciais, uma representação criminal e 89 Exceções de Suspeição e/ou Impedimento, todas rejeitadas.

Perante a Justiça Federal de primeiro grau, correm três ações penais com denúncia recebida, uma medida cautelar de indisponibilidade de bens e três inquéritos policiais.

No Superior Tribunal de Justiça, há uma ação penal originária com denúncia recebida; 34 Habeas Corpus — 20 denegados no mérito pela 5ª Turma e os demais com liminar indeferida aguardando julgamento do mérito –, duas desistências e uma Reclamação (liminar indeferida).

Perante o Supremo Tribunal Federal, constam: 13 Habeas Corpus; liminares indeferidas aguardando julgamento do mérito — dois rejeitados liminarmente pela Presidência da Corte por serem incabíveis; um Mandado de Segurança, inicial indeferida e uma Ação Originária julgada improcedente no mérito pelo Plenário.

Até o momento, quatro juízes federais e um subprocurador-geral da República foram afastados de suas funções.

Leia os principais trechos do relatório

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

PROCURADORIA REGIONAL DA REPÚBLICA — 3ª REGIÃO

EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA, RELATORA DO PROCESSO Nº 2003.03.00.065344-4

APN 128 — ÓRGÃO ESPECIAL

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelas Procuradorias Regionais da República signatárias, nos autos da ação penal movida contra JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, CASEM MAZLOUM, ALI MAZLOUM, JOSÉ AUGUSTO BELLINI, DIRCEU BERTINI, JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA, CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ, VAGNER ROCHA, NORMA REGINA EMÍLIO CUNHA, CARLOS ALBERTO DA COSTA SILVA, AFONSO PASSARELLI FILHO e SÉRGIO CHIAMARELLI JUNIOR, vem, nos termos do artigo 11 da lei nº 8.039/90, oferecer.

RAZÕES FINAIS

Em outubro de 2003 o Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra os acusados, imputando-lhes a prática de conduta delituosa elencada no artigo 288 (quadrilha ou bando) do Código Penal, em co-autoria.

A denúncia foi instruída em peças extraídas do Inquérito nº 533, autuado neste Colendo Tribunal sob nº 2003.03.00.048044-6 (fls. 1.127/1.303) e que deu origem às ações penais autuadas sob nºs 2003.03.00.065345-6, 2003.03.00.065346-8, 2003.03.00.065347-0, ação de improbidade administrativa nº 2003.61.00.036130-8, além de outras medidas.

Os acusados foram regularmente notificados para oferecer resposta (fl. 629 – JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS; fls. 631 – CASEM MAZLOUM; fl. 633 – ALI MAZLOUM; fl. 635 – JOSÉ AUGUSTO BELLINI; fl. 637 — DIRCEU BERTINI; fl. 639 — JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA; fl. 641 — CEZAR HERMAN RODRIGUEZ; fl. 643 — VAGNER ROCHA; fl. 645 — NORMA REGINA EMÍLIO; fl. 647 — CARLOS ALBERTO DA COSTA SILVA; fl. 349 — AFFONSO PASSARELLI FILHO; fl. 651 — SERGIO AUGUSTO CHIAMARELLI JUNIOR), na forma prevista no artigo 4º da Lei nº 8.038/90.

Apresentaram resposta, acompanhada de documentos: AFFONSO PASSARELLI FILHO — fls. 936/938; JOSE AUGUSTO BELLINI — fls. 940/988; SERGIO CHIAMARELLI JUNIOR — fls. 990/1046; VAGNER ROCHA — fls. 1048/1103; CASEM MAZLOUM — fls. 1106/1181; JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA — fls. 1186/1213; ALI MAZLOUM – fls. 1352/1243; JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS — fls. 1356/1678); DIRCEU BERTINI — fls. 1682/1818; CÉZAR HERMAN RODRIGUEZ — fls. 1820/1870; CARLOS ALBERTO COSTA SILVA — fls. 1872/1909.

O Ministério Público Federal manifestou-se sobre o teor das respostas, na forma do artigo 5º da Lei nº 8.038/90 (fls. 1913/1958). A defesa de JOÃO CARLOS houve por bem manifestar-se sobre a réplica do MPF, fls. 2277.

A fls. 2068 O Ministério Público Federal explanou, fundamentadamente, as razões pelas quais deixou de propor suspensão condicional do processo ou oferecer transação penal, previstos da Lei nº 9.099/95.

Solicitado dia para julgamento na forma do artigo 33, VII do Regimento Interno do TRF da 3ª Região (fl. 2254), os acusados e seus advogados foram regularmente intimados da sessão designada. A defesa de JOÃO CARLOS requereu que fosse ele requisitado para comparecimento à sessão, o que acertadamente indeferido, por falta de amparo legal (fls. 2533).

Em sessão extraordinária realizada em 19 de dezembro de 2003, o Órgão Especial deste Colendo TRF recebeu a denúncia, por unanimidade, nos termos do voto da Excelentíssima Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA (fls. 2317/2422, 5010/5012, 5013/5015) e, também por unanimidade, afastou de suas funções dos três juízes federais denunciados.

Designados os interrogatórios dos réus às fls. 2436, foram eles e seus advogados devidamente intimados (fls. 2499/2515).

ALI MAZLOUM foi ouvido em 12/01/2004, fls. 2751/2792, VAGNER ROCHA em 12/01/2004, fls. 2808/2844, NORMA REGINA em 13/01/2004, fls. 2869/2923, CÉSAR HERMAN em 14/01/2004, fls. 2943/3041, CARLOS ALBERTO DA COSTA SILVA em 14/01/2004, fls. 3045/3077. JOSE LUIZ BEZERRA DA SILVA em 15/01/2004, fls. 3091/3148, SERGIO CHIAMARELLI JUNIOR em 15/01/2004, fls. 3152/3190, BELLINI em às fls. 3205 e ss. JOÃO CARLOS, em 20/01/2004, fls. 3386/3512, CASEM MAZLOUM em 21/01/2004, fls. 3515/3587, AFFONSO PASSARELI às fls. 3591 e ss. DIRCEU BERTINI às fls. 3632 e ss.

No prazo legal, todos apresentaram suas defesas prévias, acompanhadas de rol de testemunhas: ALI MAZLOUM — fls. 3299/3300, NORMA REGINA — fls. 3303/3307, CARLOS ALBERTO DA COSTA SILVA — fls. 3378/3379, JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA — fls. 3699/3741, CESAR HERMAN RODRIGUEZ — fls. 3743/3749, VAGNER ROCHA — fls. 3751/3755, SERGIO CHIAMARELLI JUNIOR — fls. 3763/3766, JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS — fls. 3768/3772, AFFONSO PASSARELI FILHO — fls. 3776/3777, JOSE AUGUSTO BELLINI — fls. 3779/3872, DIRCEU BETIN — fls. 3784/3786, CASEM MAZLOUM — fls. 3793/3802.

Os requerimentos apresentados com as defesas prévias foram apreciadas no r. despacho de fls. 3966/3969.

DEFESA DE ALI MAZLOUM (fls. 3301)

DEFESA DE NORMA REGINA EMILIO (fls. 3307):

DEFESA DE CARLOS ALBERTO DA COSTA SILVA (fls. 3379/3380).

DEFESA DE JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA (fls. 3739):

DEFESA DE CÉSAR HERMAN RODRIGUES (fls. 3749):

DEFESA DE VAGNER ROCHA (fls. 3755);

DEFESA DE SÉRGIO CHIAMARELLI JÚNIOR (fls. 3766):

DEFESA DE JOÃO CARLOS DA ROCHA MATOS (fls. 3772):

DEFESA DE AFFONSO PASSARELLI FILHO (fls. 3777):

DEFESA DE JOSÉ AUGUSTO BELLINI (fls. 3871/3782):

DEFESA DE DIRCEU BETIN (fls. 3785/3786):

DEFESA DE CASEM MAZLOUM (fls. 3799/3800):

Como testemunhas do juízo foram ouvidas …

Foi instaurado incidente de insanidade a pedido da defesa de NORMA REGINA EMÍLIO CUNHA (fls. 13406/13407), e apresentados laudos que responderam aos quesitos da acusação e da defesa.

Os documentos colhidos nas buscas e apreensões efetuadas, desde logo, formam eloqüente conjunto probatório, consubstanciado nos diversos laudos, elaborados pela Diretoria de Inteligência da Polícia Federal e/ou a seu pedido, não deixando dúvidas sobre a consistência da denúncia oferecida, bem justificando a manutenção das prisões preventivas — porquanto presentes os pressupostos respectivos — medidas essas decretadas pelo egrégio Tribunal Regional Federal da Terceira Região em Sessão Extraordinária de 07.11.2003 do C. Órgão Especial.

Durante a instrução foram juntados laudos relativos ao material apreendido (relação em anexo), bem como outros documentos em resposta aos requerimentos das defesas, da acusação e do juízo.

A consistência dos elementos probatórios colhidos, não infirmados pelas defesas dos réus, inviabilizou a acolhida de todos os pleitos, manejados pelos réus por meio dos diversos Habeas Corpus junto aos Tribunais Superiores.


Após a elaboração do relatório e antes de adentrar na análise da relação entre os fatos ilícitos praticados pelos denunciados e sua subsunção ao tipo penal apontado na inicial e que se comprovou inteiramente com as provas colhidas durante a instrução criminal, o Ministério Público Federal irá contrariar algumas alegações realizadas pelas diversas defesas do curso do presente feito.

II — Sobre algumas questões levantadas no curso da instrução da presente ação penal, relativas às interceptações telefônicas

A defesa, por inúmeras vezes, questionou os procedimentos relativos às interceptações telefônicas que fazem parte do conjunto probatório da presente ação penal. Entretanto, como já restou demonstrado pelas firmes decisões da Exma. Desembargadora Federal Therezinha Cazerta, bem como pela decisão inicial sobre o tema (fls. 1475/1479 de 03/09/2003, do Inquérito Judicial nº 2003.03.00.048044-6, trasladada para a presente ação penal), além daquela que recebeu a denúncia às fls. 2319/2422 e ainda nas demais relativas aos Agravos Regimentais pela defesa de CESAR HERMAN RODRIGUEZ na ação penal nº 2003.03.00.056346-8 (fls. 1392/1405 em 10/05/2004 e fls. 1914/1935 em 12/08/2004) — todas acolhidas pelo Órgão Especial — os procedimentos em questão encontram-se totalmente acobertadas pela Lei nº 9.296/1996, que regulamentou o inciso XII, parte final, do artigo 5º da Constituição Federal.

A propósito do tema o Ministério Público Federal passa agora a se manifestar.

II.1 Das interceptações telefônicas

Como é sabido, o artigo 5º, inciso XII, parte final, da Constituição Federal garante o sigilo de dados e comunicações telefônicas, que somente poderá ser quebrado por ordem judicial e nas hipóteses e formas previstas em lei, para fins de investigação criminal ou instrução processual pena, tendo a matéria sido regulamentada pela Lei nº 9.296/1996.

Quanto ao procedimento da interceptação, Vicente Greco Filho, de forma sucinta, leciona que:

“O procedimento de interceptação é de natureza cautelar, sendo sua finalidade a produção de prova processual penal, e os requisitos para sua autorização constituem os seus pressupostos específicos, que se enquadra nos conceitos genéricos ‘fumus boni juris’ e ‘periculum in mora’.

A providência pode ser determinada para a investigação criminal (até antes, portanto, de formalmente instaurado o inquérito) e para a instrução criminal, depois de instaurada a ação penal.

A competência para definir a medida (juiz competente para a ação principal) é de natureza funcional, tratando-se, pois, e competência absoluta”.

Nenhuma ilicitude se vislumbra na interceptação telefônica, eis que foi deferida por autoridade judicial competente, atendendo a representação feita pela Polícia Federal, de maneira fundamentada, em observância às exigências legais.

Como já foi dito, as investigações que deram origem à presente ação penal iniciaram-se no estado de Alagoas, tendo o requerimento de interceptação telefônica para fins criminal sido feita pela Polícia Federal à Justiça Federal daquele estado.

O requerimento foi distribuído ao Juízo da 4ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Alagoas e acompanhado pela Ministério Público Federal desde o início, em conformidade com o disposto artigo 6º da Lei 9.296/1996.

Ressalve-se que os requerimentos iniciais da Polícia Federal, a decisão inicial do Juízo a 4ª Vara Federal de Alagoas, os requerimentos da prorrogação das interceptações realizadas pela Polícia Federal, as manifestações do Ministério Público Federal e as decisões daquele Juízo relativas às prorrogações encontram-se no Inquérito Judicial nº 2003.03.00.048044-6 e foram trasladadas para o presente feito.

Finalmente, quando se constatou, através do monitoramento das conversas realizadas por alguns dos investigados, que poderiam existir Juízes Federais da 3ª Região envolvidos em atos ilícitos, os autos foram remetidos ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região, para a continuidade das investigações, em razão do disposto no artigo 108, inciso I da Constituição Federal e no artigo 33, parágrafo único, da Lei Orgânica da Magistratura, Lei Complementar nº 35/1979.

Aqui cabe ressalvar trecho da decisão da Exma. Sra. Ralatora na decisão de fls. 1475/1479.

“Reconhecendo validade aos atos judiciais praticados pela autoridade que presidiu inicialmente o inquérito, ratificando-os integralmente, visto que a declinatória de competência se deu em razão de fatos supervenientes” (fls. 1478).

Note-se que nesta preliminar apreciação dos fatos relativos às interceptações, feita em 03/09/2003, a Exma. Sra. Relatora deferiu o monitoramento dos telefones do magistrado federal JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS e em decisão de 02/10/2003 o deferimento estendeu-se aos telefones do magistrado CASEM MAZLOUM (fls. 1755/1757 do Inquérito Judicial nº 2003.03.00.48044-6, trasladadas às fls. 19.819/19.821).

A correção dos procedimentos da interceptação telefônica realizados neste processo foi objeto da apreciação do Superior Tribunal de Justiça que, ao julgar o Habeas Corpus nº 34.008 impetrado pelo co-réu CASEM MAZLOUM, assim se pronunciou:

“HABEAS CORPUS. DENÚNCIA, CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ATIPICIDADE DAS CONDUTAS DO PACIENTE. NULIDADE NAS INTERCEPTAÇÕES E GRAVAÇÕES DE COMUNICAÇÕES TELEFÔNICAS QUE EMBASARAM A ACUSAÇÃO. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL DE ALAGOAS PARA INVESTIGAR MAGISTRADOS DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO. IMPROCEDÊNCIA”.

O Habeas Corpus não se presta a demonstrar a atipicidade dos fatos se reclama aprofundado exame de provas.

As interceptações e gravações telefônicas ocorreram por determinação judicial e perduraram pelo tempo necessário à elucidação dos fatos delituosos, revestidos de complexidade e envolvendo organização criminosa, com o que não se violou a Lei 9.296/1996 (art. 10).

Procedimento investigatório instaurado perante Juízo Federal. Deparando-se com indícios de envolvimento de Juízes Federais de São Paulo nas atividades ilícitas, o feito autuado no Juízo de 1º grau foi remetido ao TRF-3ª região, o competente. Nenhuma balda a proclamar.

Portanto, foram absolutamente regulares a autorização e os procedimentos para a realização das interceptações telefônicas, devidamente deferidas por autoridades competentes. Passaremos agora ao ponto da prorrogação dos prazos para as interceptações telefônicas.

II. 2- Da possibilidade de prorrogação da interceptação telefônica

O artigo 5º da Lei 9296/96 estabelece que a interceptação telefônica “não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova”.

Não procede a afirmação de que o artigo 5º da Lei 9696/96 autorizaria renovação de pedido de interceptação telefônica por mais de uma vez.

Com efeito, analisando aquele dispositivo legal, a melhor doutrina sustenta que é perfeitamente possível a renovação da interceptação em caso de necessidade.

Nesse sentido o magistério de Ada Pellegrini Grinover:

“A lei esclarece se, após a primeira prorrogação, outra será possível. O Projeto Miro Teixeira era expresso, prevendo tantas prorrogações quantas necessárias, desde que continuassem presentes os pressupostos de admissibilidade da ordem de interceptação. O bom senso deverá conduzir o juiz nesse sentido”.

No mesmo sentido, Antonio Scarance Fernandes:

“diz a lei que a diligência não poderá exceder o prazo de quinze dias,renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova. Pode-se, assim, permitir a renovação da interceptação, pelo mesmo prazo, por outras vezes, desde que, contudo, fique demonstrada sua indispensabilidade, ou, como dizia o Projeto Miro Teixeira, quando permanecem pressupostos que permitem a sua autorização”.


Luiz Flávio Gomes perfilha o mesmo entendimento:

“A interceptação telefônica é medida excepcional e tem por fundamento a sua necessidade para obtenção de uma prova O fundamental, assim, não é tanto a duração da medida, senão a demonstração inequívoca da sua indispensabilidade. Enquanto indispensável, enquanto necessária, pode ser autorizada. A lei não limitou o número de vezes, apenas exige a evidenciação da indispensabilidade. É o prudente arbítrio do Juiz que está em jogo. Mais tecnicamente falando: é a proporcionalidade. No instante em que se perceber que a interceptação já não tem sentido, desaparece a proporcionalidade. Logo, já não pode ser renovada. E se o for, é nula”.

Damásio E. de Jesus afirma que:

“O prazo para a realização da diligência é de 15 dias, muito exíguo, renovável por mais 15, demonstrando-se a necessidade. O prazo não se restringe a uma prorrogação. Pode ser renovado quantas vezes se fizer necessário”.

E, ainda, segundo entendimento de Vicente Greco Filho:

“A decisão do magistrado, a ser tomada no prazo máximo de 24 horas, deverá obrigatoriamente ser fundamentada sob pena de nulidade e deverá indicar a forma de execução, que não poderá exceder 15 dias, renovável por igual tempo, uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova. A lei não limita o número de prorrogações possíveis, devendo entender-se, então, que serão tantas quantas necessárias à investigação, mesmo porque 30 dias pode ser prazo muito exíguo”.

Élio Wanderley de Siqueira Neto, Juiz Federal em Pernambuco, em artigo publicado na Revista dos Tribunais, adverte que:

“A lei não indica por quantas vezes é possível a renovação do prazo. Ao se reportar, a ‘igual tempo’ parece admitir apenas uma renovação. Mas, na verdade, não se pode tolerar a restrição à renovação do prazo, por tantas vezes quantas necessárias à apuração dos fatos, caso, como antedito for evidenciada a indispensabilidade do emprego da escuta”.

O Promotor de Justiça Paulo Rangel pondera que:

“A expressão usado pelo legislador (renovável por igual tempo, uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova) não pode levar o intérprete a pensar que só há renovação uma única vez, mas sim, que a expressão uma vez que se refere a comprovada indispensabilidade do meio de prova, ou seja, desde que presentes o ‘periculum in mora’ e o ‘fumus boni iuris’. Portanto, tratando-se de medida cautelar, poderá ser adotada em tantas vezes quantas forem necessárias”.

No mesmo sentido, aliás, o Supremo Tribunal Federal já se posicionou pela possibilidade de renovações sucessivas de autorização judicial para interceptação telefônica, em caso de comprovada necessidade. Nesse sentido, recentíssimo julgamento ocorrido em 16/09/2004, Habeas Corpus nº 83515, Relator Ministro Nélson Jobim, cujo acórdão ainda pende de publicação.

Interceptação Telefônica. Prazo. Renovação. Crimes Punidos com Detenção.

O Tribunal, por maioria, indeferiu Habeas Corpus, impetrado contra acórdão do STJ, em que se pretendia o reconhecimento da ilegalidade e inconstitucionalidade de interceptações telefônicas que acabaram por embasar a propositura de ação penal contra os pacientes, acusados da prática de crimes contra a ordem tributária, a saúde pública, o sistema financeiro nacional, agiotagem, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Os impetrantes alegavam: a) excesso de prazo legal para interceptação telefônica, em virtude de ter havido mais de uma renovação do prazo de 15 dias: b) inexistência de comprovação da indispensabilidade da interceptação telefônica como meio de prova. c) ausência de notificação do Ministério Público como fiscal da lei para acompanhar as medidas investigatórias; d) ausência da transcrição integral das conversas gravadas nos relatórios destinados à renovação qüinqüenal da autorização para a interceptação; e) ilegalidade da interceptação em relação a crimes punidos com detenção. Os argumentos foram afastados por estas razões: a) o art. 5º da Lei 9.296/96 permitiu as renovações sucessivas de prazo quinzenal para a interceptação e as mesmas, no caso, teriam sido deferidas por serem imprescindíveis à elucidação dos fatos, tendo em conta a sua natureza e complexidade, bem como a quantidade de réus envolvidos; b) a interceptação somente teria sido autorizada após uma série de investigações da polícia e da CPI estadual, instalada para investigar o crime organizada no estado do Rio Grande do Sul, nas quais se teriam empregado diversos meios de prova que se demonstram insuficientes para apuração de determinados fatos constantes da denúncia, tendo-se lançado mão da interceptação por ser medida indispensável para esse fim; c) a análise de eventual alijamento do parquet no acompanhamento das interceptações efetuadas apenas seria possível por meio de exame minucioso dos autos de investigação, de qualquer forma, contrária ao que se poderia depreender dos documentos e acórdãos constantes do processo; d) a Lei 9.296/96 não exigiu que o pedido de renovação fosse precedido da transcrição completa das conversas já interceptadas, o que tomar inexeqüível a própria investigação, mas de mero relatório circunstanciado da polícia com a explicação do teor das conversas interceptadas e, no caso de pedido de renovação, da necessidade da continuidade das investigações com a utilização desse procedimento, o que teria sido cumprido na espécie; e) a interceptação teria sido realizada de forma legal e legítima para apuração de crimes puníveis com reclusão. Dessa forma, os elementos probatórios levantados a partir desse procedimento em relação a outros crimes conexos puníveis com detenção poderiam e deveriam ser levados em consideração para fundamentar denúncia quanto a estes, sob pena de se inviabilizar a interceptação telefônica para a investigação de crimes apenados com reclusão quando estes forem conexos com crimes punidos com detenção. Vencido o min. Marco Aurélio que concedia a ordem por considerar que o prazo legal razoável para conclusão das investigações por meio da interceptação seria de 15 dias, renovável, quando demonstrada a imprescindibilidade da medida, por mais 15 dias apenas. Entendeu, ainda, existir diferença entre o parágrafo 1º e o parágrafo 2º do art. 6º da referida lei, já que aquele exigiria a transcrição do conteúdo das conversas, e este estaria, e este estaria direcionando não a esse conteúdo. Mas à forma de como cumprida a diligência, não se podendo admitir que a degravação fosse substituída pelo auto circunstanciado, o que tornaria inútil a determinação do parágrafo 1º do artigo mencionado. (Lei 9.296/96. Art. 2º — não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses: … II — a prova puder ser feita por outros meios disponíveis; III — o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com a pena de detenção. … Art. 5º A decisão será fundamentada, sob pena de nulidade, indicando também a forma de execução da diligência, o que não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova. Art. 6º Deferido o pedido, a autoridade policial conduzirá os procedimentos da interceptação, dando ciência ao Ministério Público, que poderá acompanhar a sua realização. Parágrafo 1º No caso de a diligência possibilitar a gravação da comunicação interceptada, será determinada a sua transcrição. Parágrafo 2º Cumprida a diligência, a autoridade policial encaminhará o resultado da interceptação ao juiz, acompanhado de auto circunstanciado, que deverá conter o resumo das operações realizadas”.


Na espécie, a questão sobre a possibilidade de renovação sucessiva dos prazos de interceptação telefônica já foi analisada no âmbito deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região e também no Superior Tribunal de Justiça.

Neste Tribunal Regional Federal da 3ª Região, esta questão já foi examinada quando do recebimento da denúncia. Do voto, condutor do acórdão constou que:

“… As decisões de capacitação, quer autorizando, quer prorrogando-as conquanto sucintamente, foram todas fundamentadas: os prazos rigorosamente obedecidos; as renovações ocorreram enquanto houve necessidade Doutrina e jurisprudência, ao menos em parte, assim o permitem A propósito:

Quantas vezes pode ser renovada a autorização judicial? Paulo Napoleão Quezado e Clarisier Cavalcante, assim como Altamiro Lima Filho, entendem que a renovação só pode ocorrer uma vez. Em nenhuma hipótese seria possível a interceptação por mais de trinta dias. Damásio E. Jesus; Vicente Greco Filho e Antônio Scarance Fernandes adoram posicionamento diferente e afirma que não há limite: quantas vezes forem necessários. A razão está, no nosso modo de ver, com os últimos doutrinadores: A interceptação telefônica é medida excepcional e tem por fundamento a sua necessidade para a obtenção de uma prova. O fundamental assim, não é tanto a duração da medida, senão a demonstração inequívoca da sua indispensabilidade. Enquanto indispensável, enquanto necessária, pode ser autorizada. A lei não limitou o número de vezes, apenas exige a evidenciação da indispensabilidade. É o prudente arbítrio do juiz do que está em jogo. Mas tecnicamente falando: é a proporcionalidade. No instante em que se perceber a interceptação já não tem sentido, desaparece a proporcionalidade. Logo, já não pode ser renovada. E se for, é nula”

(Luiz Flávio Gomes e Raul Cervini, Interceptação Telefônica, RT, p. 219);

Mais:

‘Se a interceptação telefônica foi feita pela Autoridade Judiciária com equilíbrio e atenção às exigências do art. 5º da Lei 9296/96, não poderá ser declarada nula porque foi renovada várias vezes posteriormente em razão da necessidade do prosseguimento das investigações’ (TRF-4ª Região, Habeas Corpus 3220/RS, 7ª Turma, Rel. Juiz Wladimir de Freitas, julgado em 04/06/2002, votação unânime, DJ 19/06/2002).

A mesma questão foi novamente suscitada em Agravo Regimental interposto pela defesa de CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ nos autos da Ação Penal nº 2003.03.00.065344-4, sendo que o Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade de votos, negou provimento a ele. Confira-se excerto do acórdão.

“As provas colhidas durante todo o tempo de investigação são válidas. As decisões de interceptações telefônicas, autorizando ou prorrogando as medidas, embora de modo conciso, foram todas fundamentadas e os prazos obedecidos. As renovações, mostrando-se indispensáveis ao prosseguimento das investigações e obtenção de provas deram-se enquanto houve necessidade, respeitando-se as exigências do artigo 5º da Lei nº 9296/96”.

Esta questão foi levada ao Superior Tribunal de Justiça, através do Habeas Corpus nº 33.176/SP, impetrado pela defesa de JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, e no Habeas Corpus nº 34.008-SP, impetrado pela defesa de CASEM MAZLOUM, no qual foram alegadas nulidades nas interceptações de gravações de comunicações telefônicas que embasaram a acusação.

No julgamento do Habeas Corpus nº 33.176, sobre a alegação de que o artigo 5º da Lei 9096/96 não autorizava prorrogação de interceptação telefônica por mais de uma vez, o voto condutor do acórdão afirmou inicialmente a “inviabilidade de, em sede de Habeas Corpus, e frente a fatos tão complexos como os narrados na denúncia, e ao número de participes, se poder examinar o tempo de duração das interceptações telefônicas. Ponderou que “o que é facilmente verificável é saber se elas ocorrem devidamente motivadas, e assim o foram”. Por fim, concluiu que “o recolhimento da prova, na fase pré-processual, foi antecedido de autorização judicial, não se evidencia a alegada ilegalidade”.

Já no julgamento do Habeas Corpus nº 34.008/SP, cuja ementa já foi transcrita, no que se refere às renovações de autorização de interceptação telefônica na espécie, o acórdão proferido pela Superior Tribunal de Justiça fez remissão à decisão de recebimento da denúncia, proferida pelo Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, supra transcrita, para após denegar a ordem, ressaltando que “à atuação da polícia judiciária precedeu autorização judicial, e que, em conseqüência, a conduta descrita na inicial acusatória se revelava apta a deflagrar a ação penal”.

O Superior Tribunal de Justiça já havia se pronunciado expressamente pela possibilidade de renovação de interceptações telefônicas no julgamento RHC 13.274 (2002/01048666/RS). Confira-se excerto da ementa:

“CRIMINAL. RHC. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. A SAÚDE PÚBLICA, O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, AGIOTAGEM. LAVAGEM DE DINHEIRO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. NULIDADES. PRAZO DE DURAÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DA INSISPENSABILIDADE DA INTERCEPTAÇÃO. QUANDO DA AUTORIZAÇÃO DAS RENOVAÇÕES. AUTORIZAÇÃO DA INTERCEPTAÇÃO ANTES DA EFETIVAÇÃO DE QUALQUER OUTRO MEIO DE PROVA. CONFIABILIDADE QUESTIONÁVEL DAS DEGRAVAÇÕES. IMPROPRIEDADE DO HABEAS CORPUS. AUSÊNCIA DE TRANSCRIÇÕES DAS CONVERSAS INTERCEPTADAS NOS RELATÓRIOS DA POLÍCIA AO JUÍZO. CIENTIFICAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO SORE AS MEDIDAS INVESTIGATÓRIAS. GRAVAÇÕES ENTRE INVESTIGADO E ADVOGADO. DELITOS APENADOS COM DETENÇÃO. LICITUDE DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. RECURSO DESPROVIDO.

I- A interceptação telefônica deve perdurar pelo tempo necessário à completa investigação dos fatos delituosos.

II- O prazo de duração da interceptação deve ser avaliado pelo Juiz da causa, considerando os relatórios apresentados pela Polícia”.

Demonstrado, portanto, com base em entendimento doutrinário e jurisprudencial, inexistir qualquer irregularidade na renovação do prazo para interceptação telefônica em período dilatado de tempo, em caso de comprovada necessidade, justamente o que ocorre na espécie.

II. 3- Da desnecessidade da transcrição integral das comunicações telefônicas e da realização de prova pericial

Insistem os réus em apontar suposto cerceamento de defesa que teria ocorrido em razão do indeferimento de requerimento de transcrição integral das comunicações telefônicas e da realização de prova pericial, que seria obrigatória, nos termos da lei.

O artigo 6º da Lei 9296/96 estabelece:

Art. 6º Deferido o pedido, a autoridade policial conduzirá os procedimentos de interceptação, dando ciência ao Ministério Público, que poderá acompanhar a sua realização.

Parágrafo 1º No caso de a diligência possibilitar a gravação da comunicação interceptada, será determinada a sua transcrição.

Parágrafo 2º Cumprida a diligência, a autoridade policial encaminhará o resultado da interceptação ao juiz, acompanhado do auto circunstanciado, que deverá conter o resumo das operações realizadas.

Parágrafo 3º Recebidos esses elementos, o juiz determinará a providência do art. 8º.

Há que se observar, inicialmente, que a transcrição aludida no artigo 6º da lei 9296/96 não se resume à redução a termo escrito das gravações efetuadas.

As próprias gravações constituem “documentação (materialização) da fonte de prova, podendo ser identificadas como meio de prova”.


Luiz Flávio Gomes faz importante distinção entre comunicação telefônica; interceptação telefônica; ordem judicial de interceptação telefônica; operação técnica de interceptação telefônica; auto circunstanciado; gravação da interceptação telefônica, transcrição da gravação da interceptação, que é pertinente transcrever:

“a comunicação em si é ‘fonte de prova’, porque é dela que emerge a comprovação de um delito ou do envolvimento de uma pessoa com determinado delito; a interceptação telefônica, por ser turno,é medida cautelar processual, mas precisamente medida coativa real (não pessoal) consistente numa apreensão imprópria; a ordem judicial necessária exterioriza a autorização para a concretização da medida cautelar; a operação técnica (ato de interceptar, de captar a comunicação telefônica) é o meio executivo da medida cautelar de apreensão imprópria, o auto circunstanciado obrigatório revela a documentação da operação técnica; a gravação da interceptação é o resultado da operação técnica e, desse modo, documentação (materialização) da fonte de prova: a transcrição dessa gravação, como materialização do que foi captado, é o meio probatório (documental) que será levado em conta pelo Juiz na sentença final e que serve para afastar a presunção de inocência. Outro meio probatório possível, para atestar o conteúdo da capacitação, é o testemunhal. Urge pelo que acaba de ser exposto, bem distinguir os conceitos”.

Como visto, a gravação foi conceituada como “resultado da operação técnica e, desse modo, documentação (materialização) da fonte e prova”, a transcrição como “materialização do que foi captado”, e “meio probatório (documental)” para atestar o conteúdo da capacitação, tal qual a prova testemunhal.

Após proceder à distinção dos conceitos, Luiz Flávio Gomes identifica a finalidade da interceptação, nos seguintes termos:

A finalidade da interceptação telefônica, em suma, como já se afirmou, é, antes de tudo, a obtenção de uma ‘prova’, que se materializa num documento (auto circunstanciado, transcrição) ou num depoimento (prova testemunhal). É um desses meios probatórios que irá fixar os fatos no processo, de tal modo a legitimar a decisão judicial, seja frente às partes, seja frente à universalidade das pessoas.

Importa observar que nestes autos foi fornecida às partes a totalidade das gravações das conversas telefônicas referidas às partes a totalidade das gravações das conversas telefônicas referidas nos autos, cópias dos Relatórios Parciais e Final de Inteligência Policial, autos de busca e apreensão e respectivas análises pela autoridade policial; documentos digitalizados correspondentes ao material apreendido, e diligências encetadas pela polícia — áudios e resumos das conversações correspondentes, diagramas e relatórios policiais, acompanhadas de vídeos, levantamento de dados, informações processuais, relatórios de vigilâncias, depoimentos, enfim, todo o material entregue a Relatora em mídia. Foi ainda disponibilizado equipamento para acessar todo o material apreendido, em mídia DVD.

Destaque-se que no caso em tela as gravações foram fornecidas às partes, em sua integralidade, em CD e DVD. A defesa parece não querer usar métodos modernos de mídia para seu trabalho, talvez porque como a transcrição integral fosse demorar muito tempo, a intenção seria aproveitar isso em benefício próprio, como restou bem claro em matéria veiculada na Revista Consultor Jurídico, a propósito do eventual julgamento do Habeas Corpus de nº 31.227, impetrado por VAGNER ROCHA (cópia anexa).

Outro sim, procedeu-se à transcrição das gravações mais relevantes de forma tradicional.

Às partes foram disponibilizadas também todos os Autos Circunstanciados referentes às gravações. E ainda foram tomados, em juízo, os depoimentos dos policiais responsáveis pelas interceptações telefônicas.

Há, assim, abundante material probatório, que dispensa a transcrição integral das gravações para o papel.

Em face de todos os elementos probatórios produzidos, devidamente disponibilizados às partes, foi perfeitamente cumprida a finalidade da interceptação telefônica (fornecimento ao juízo de meios probatórios a fixar os fatos). Disto emerge a falta de utilidade da transcrição das gravações, reclamadas pela defesa.

A transcrição apenas se justificaria no caso de o juízo permanecer inseguro sobre a veracidade das provas, o que não ocorre na espécie, evidentemente, justamente pela robustez e idoneidade da prova produzida.

Aliás, a desnecessidade da transcrição integral das comunicações telefônicas já foi reconhecida pelo Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em pelo menos duas oportunidades: quando do recebimento da denúncia, e quando do julgamento de Agravo Regimental interposto pela defesa de César Herman nos autos desta Ação Penal (processo nº 2003.03.00.065344-4), datado de 15/04/2004.

O voto condutor do acórdão que recebeu a denúncia assinalou que:

“Incorre cerceamento de defesa. Além da integralidade das conversas telefônicas referidas nos autos, e tomadas como base à acusação, forneci para análise cópias dos Relatórios Parciais de Inteligência Policial de nº 18, 19, 20, 21, 22 e 23, encaminhado e esta Relatoria pela Diretoria de Inteligência do Departamento de Polícia Federal, bem como tudo o mais que me foi entregue em mídia, especificamente, os autos de busca e apreensão e respectivas análises pela autoridade policial, os áudios e resumos das conversações correspondentes, os diagramas e relatórios policiais, acompanhados de vídeos, levantamento de dados, informações processuais, relatórios de vigilâncias, depoimentos, etc, enfim, todas as diligências, policiais, encetadas, além dos documentos digitalizados correspondentes ao material apreendido, tendo, inclusive, conferido prazo — cinco dias — para que defesa e acusação apusessem sua manifestação. De mais a mais, a partir da notificação dos acusados para apresentação de defesa preliminar, os presentes autos e os feitos de registros nº 2003.03.00.048044-6 (inquérito principal), 2003.03.00.065343-2 (busca e apreensão) e 2003.03.00.048044-6 (denúncia), sempre estiveram acessíveis, que para consulta, quer para cópias, em nenhum momento esquecendo-se de atender aos pedidos dos padres. Todos os cuidados foram tomados; todas as prerrogativas foram observadas; tudo a garantir, nesta fase, a mais ampla defesa, o devido processo legal”.

Já no voto condutor do acórdão proferido no julgamento do referido Agravo Regimental, e Exma. Relatora, referindo o magistério de Ada Pellegrini, afirmou que:

“Irrompem in casu: questionamentos concernentes ao controle probatório, tanto em relação à fonte quanto ao meio de prova. Não me furto a explicar de forma detida, mesmo porque a questão merece solução definitiva: verdadeira pá de cal há que se posta em relação ao assunto. O resultado da interceptação telefônica, fonte de prova, deve ser fixado em juízo, vale dizer, os fatos provados pela conversa interceptada devem ser transportados de algum modo, ao processo”.

É a necessidade, conforma a lição de Ada Pellegrinni Grinover de encontrar-se uma forma idônea para atestar a existência da conversação interceptada ou suficiente para se obter a idéia precisa de sua existência: a necessidade, isto é, de selecionar um meio de prova adequado à natureza da interceptação telefônica.Prossegue a consagrada professora, em sua obra mais aclamada: O mesmo fato pode ser provado por vários meios: e realmente a conversa interceptada poderia provar-se, v.g., através do testemunho do interceptador. Quanto, porém, se trata de interceptações autorizadas pela autoridade judiciária, o resultado da operação técnica deve revestir-se de forma documental. Por isto é que o problema da interceptação telefônica assume particular importância. Normalmente a interceptação é acompanhada da gravação de diálogos interceptados, com a finalidade de se dispor de uma reprodução sonora que permita repetir a escuta. Tal gravação, de per si, já constituiu documento. Isto, todavia, não exime os ;órgãos públicos da obrigação de documentar todas as operações desenvolvidas. Já se observou que a gravação em fita magnética, embora contribuindo para reforçar o valor probante da operação, representa simplesmente o resultado material da interceptação. Mas só o termo que a documentar é que se reveste de autêntica relevância probatória. Assim, apesar da utilidade da gravação, em fita magnética, das comunicações telefônicas interceptadas, a exigência de garantir a genuidade da prova não excluiu a obrigação de se lavrar o auto da diligência. Consoante o prescrito no artigo 6º da Lei 9296/96, a interceptação realizada vem acompanhada da gravação da conversa telefônica, se tecnicamente viável, com a finalidade de se dispor de uma reprodução sonora, que permita a escuta. Essa gravação, desde que possível, já constitui documento, valendo como meio de prova. A transcrição determinada pela Lei não se restringe à redução a termo escrito, pretendida pelo agravante. O sentido da expressão, nos dá o dicionário Aurélio: transcrição é o ‘ato ou efeito de transcrever’. Transcrever significa ‘copiar, reproduzir, trasladar’. Ou seja, os sinais sonoros serão captados por meio digital e transferidos, em áudio, para HD e CDs. Essa transcrição digitalizada, em áudio, atende à prescrição legal e possibilita, ao juízo e às partes, conhecimento integral do objeto das conversas interceptadas, tornando dispicienda a produção da prova por outro meio. Também são meios de prova, é bem verdade, servindo por fixá-la em juízo, o auto circunstanciado. Previsto no parágrafo 2º, do artigo 6º, a atestar a veracidade da operação concretizada contendo o resumo das operações realizadas o mudus operandi o tempo demorado, os telefones interceptados, o resultado obtido, a existência de encontro fortuito, etc. a transcrição de toda a gravação da comunicação interceptada, descrita no parágrafo 1º. A prova testemunhal por meio da oitava de quem realizou a interceptação. Pode ocorrer de a diligência não possibilitar a interceptação, por dificuldades técnicas, ou ainda, não ser o caso, como por exemplo não hipótese do juiz determinar apenas o controle das chamadas telefônicas, ou seja, obter-se apenas quem se chama, em que hora chama, etc. Nesses casos, a transcrição também não poderá ser realizada. Quero dizer que é perfeitamente possível e rigorosamente dentro dos ditames legais a existência de situações em que os meios de prova, referentes às interceptações telefônicas, não se resumam à absoluta transcrição dos diálogos interceptados. Não, se há outros meios de se fixar em juízo os fatos resultantes das escutas, sem se desbordar, inclusive, da documentação escrita dos atos processuais, principio inerente ao nosso sistema. A integralidade das gravações, contendo a totalidade dos diálogos interceptados, com as respectivas reproduções sonoras, como dito acima, restou entregue a todos os acusados, pemitindo-se a escuta a todos os defensores, mediante acesso aos CDs disponibilizados não merecendo guarida a alegação de violação à auto-defesa, por cumprir ao advogado constituído o exercício da defesa técnica, com as medidas necessárias, o que, aliás, tem se demonstrado à exaustão. Disponibilizou-se inclusive, equipamento de informática para consulta do material em gabinete, pelos defensores. O agravante não formalizou semelhante pedido para atender à sua peculiar situação de custodiado preventivamente. Os autos circunstanciados, regularmente encaminhados, tanto ao juízo condutor do inquérito em Maceió, ‘ab ovo’, quanto a esta Relatoria. Posteriormente, são validos em sua plenitude, não se furtando à documentação das operações realizadas, com o resumo das atividades encetadas. As principais conversas, que efetivamente interessam à investigação, foram desgravadas. A seleção prévia e a edição parcial do material colhido atende à necessidade de racionalização da prova e de preservação da intimidade dos envolvidos, além disso, aos autos de inquérito ocorrem somente elemento úteis e relacionadas aos fatos, a autoridade policial competindo a indicação do material necessário. Os responsáveis pela lavratura dos autos das diligências foram ouvidos na qualidade de testemunhas, portanto, sob compromisso de dizer a verdade, e prestarem as informações pertinentes, respondendo às perguntas e reperguntas relativas às interceptações e gravações Desnecessária, pois, a redução a termo de todas as comunicações interceptadas, como insistentemente, tem requerido a defensoria de César Herman, inclusive porque tal medida implicaria em gasto de tempo demasiadamente grande, não se olvidando que há nove réus presos preventivamente, e sua efetivação consistir-se-ia em manifesto constrangimento ilegal. Há informação de que tal procedimento, abrangendo quase dois anos de gravações de vários terminais telefônicos, demandaria quase igual período de trabalhos dos peritos.


De mais a mais, não bastasse isso tudo, no combate às organizações criminosas há lei específica dispondo sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações perpetradas, permitindo-se procedimento de investigação e formação de provas em qualquer fase de persecução criminal, dentre os quais ‘o acesso dados, documentos e informações fiscais, bancárias, financeiras e eleitorais’, também a ‘capacitação e a interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, óticos ou acústicos’. Possibilita-se a delação premiada. Não se concede liberdade provisória, com ou sem fiança, aos agentes que tenham tido intensa e efetiva participação na organização criminosa. O réu não pode apelar em liberdade. O indício da pena se dá em regime fechado. Todo o rigor advém da magnitude do crime em questão, que coloca em risco a estrutura do Estado e suas instituições, ainda mais quando cometido justamente por pessoas que têm o dever legal de zelar pelo Direito. Razões bastantes à dispensa da transcrição requerida. Sob outro aspecto, lembro que as transcrição tem razão de ser quando inseguro o juiz sobre a veracidade da prova, sua idoneidade técnica ou a autenticidade da voz, pois, quanto ao valor probante que resulta da interceptação, a questão resolve-se no momento probatório da valoração pelo magistrado, não se confundindo com a admissibilidade da prova. Não é o caso, de forma alguma. No que se refere a eventual discussão acerca da autenticidade das reproduções dos áudios, caberá ao perito examinar, através do espectograma da voz, a veracidade das informações. Deveras. Se a pessoa a quem a conversa é atribuída não a reconhece com sua, é indispensável a perícia, com a comparação das vozes. O rigor se permite aplica-se, subsidiariamente, ao artigo 383 do Código de Processo Civil segundo qual “qualquer reprodução mecânica, como a fotografia cinematográfica, fonográfica ou de outra espécie, faz prova dos fatos ou das coisas representadas se aquele contra quem foi produzida lhe admitir a conformidade: estabelecendo o parágrafo único que impugnada a autenticidade da reprodução mecânica, o juiz ordenará a realização de exame pericial. In casu, não há insurgência acerca do fato, ressaltando-se desde logo que a transcrição das conversas gravadas, a teor do disposto no artigo 6º da Lei nº 9296/96, em nada se confunde com perícia técnica”.

Mais uma vez vale dizer que o Superior Tribunal de Justiça apreciou alegação de cerceamento de defesa por inexistência de transcrição integral das conversas telefônicas interceptadas, ao apreciar o Habeas Corpus nº 34.008/SP (2004/0026141-7), interposto pela defesa de CASEM MAZLOUM, sendo que o acórdão se remeteu ‘a decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região que recebeu a denúncia.

E a mesma posição foi adotado pelo Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira que, ao indeferir a liminar pleiteada em Habeas Corpus nº 37.227, impetrado pela defesa de Vagner Rocha, cujo trecho encontra-se transcrito acima.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região também já explicitou o entendimento da desnecessidade da transcrição integral das comunicações telefônicas interceptadas. Colacionam-se, a título exemplificativo, as seguintes ementas:

PENAL E PROCESSUAL. DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE. RÉU PRESO DURANTE A INSTRUÇÃO DO PROCESSO. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. ART. 4º 16 E 22 PARÁGRAFO ÚNICO DA LEI Nº 7.492/86. PRELIMINARES. COMPETÊNCIA CERCEAMENTO DE DEFESA LITSIPENDÊNCIA. GESTÃO FRAUDULENTA. EVASÃO DE DIVISAS OPERAR INSTITUIÇÃO FINANCEIRA SEM AUTORIZAÇÃO. AUTORIA. TIPICIDADE. FALSIDADES. ARITGO 199 DO CÓDIGO PENAL. CONSUNÇÃO. QUADRILHA. SEPARAÇÃO DO PROCESSO. ART. 80 DO CPP. CABIMENTO. DUAS DENÚNCIAS. BIS IN IDEM. DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIAS. CONCURSO MATERIAL. PENA DE MULTA. PRESCRIÇÃO. INCORRÊNCIA. REGIME INCIAL FECHADO.

1- Não tem direito de recorrer em liberdade o acusado que permaneceu preso no decorrer da instrução criminal. Precedentes. Revogação da custódia indeferida.

2- A resolução nº 20 da Presidência dessa Corte, de 20.05.2003, editada com amparo na Res. Nº 314 do CJF e na Lei 9.664/98, determinando a especialização da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba para processar e julgar os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional de ‘lavagem’ ou ocultação de bens, direitos e valores, nada tem de ilegal ou inconstitucional, sendo descabida a alegação de incompetência do juízo. Precedentes.

3- A questão da litispendência foi objeto de Habeas Corpus, bem como da respectiva exceção ajuizada no primeiro grau. O exame detido dos autos demonstra não haver perfeita identidade de partes, pedido e causa de pedir nas referidas ações penais e, ocorrendo variação de qualquer destes elementos entre os dois processos, não é possível reconhecer o suposto bis in idem.

4- A jurisprudência deste Regional tem se orientado no sentido de não ser indispensável a transcrição integral de todas as conversas telefônicas interceptadas, desde que ás partes seja franqueado o acesso ao conteúdo das gravações, o que ocorreu na hipótese sub judice. Cerceamento de defesa inexistente.

5- Atenta leitura do conjunto probatório não deixa margem a qualquer dúvida sobre a autoria relativa.

6- Segundo se depreende da prova dos autos. O Recorrente com o concurso de outras agentes e testas-de-ferro, criou normalmente uma pessoa jurídica no Paraguai e esta, por sua vez, na qualidade de empresa estrangeira, abriu contas CC-5 em bancos nacionais objetivando a remessa ilegal de numerário para fora do país, principalmente depositados por “laranjas”: ou seja, ocultando os verdadeiros titulares das quantias incidindo, portanto, no crime de evasão de divisas tipificado no art. 22, parágrafo único, da Lei 7.492/86.

7- Verificando que a constituição da pessoa jurídica (Casa de Câmbios) foi procedida mediante documentação inidônea, resta evidenciado tratar-se da conduta típica descrita no artigo 16 da aludida lei, que pune o ato de fazer operar a instituição financeira sem autorização ou mediante autorização obtida com declaração falsa.

8- A referida empresa é integrante do sistema financeiro apenas por ficção legal para efeito do disposto art. 16 da Lei 7.492/86, eis que criada de maneira irregular e, desta forma, sem autorização para operar no mercado nacional. Logo, os atos de gerência do negócio ilícito se mostram incompatíveis com o crime de gestão fraudulenta previsto no art. 4º da mesma norma, pois quem não pode praticar a conduta vedada pelo tipo em questão é o administrador, diretor ou gerente de instituição regular, formalmente constituída.

9- Ausência de provas nos autos quanto ao delito de gestão fraudulenta. Absolvição com apoio no art. 3896, inciso VI, do CPP.

10- O falsum, segundo o próprio agente ministerial, foi praticado “com o escopo de evadir divisas ao exterior”, restando assim absorvido pelos crimes contra o sistema financeiro.

11- Conforme a jurisprudência da Suprema Corte, “a tese de que é impossível condenar-se uma só pessoa em processo por delito de quadrilha, por ser crime de concurso necessário, não merece guarida, porquanto o que importa é a existência de elementos nos autos denunciadores da societas delinquentium”. Por outras palavras, a separação facultativa do processo contra os vários membros do bando, não impede que um deles seja condenado separadamente, se no feito desmembrado há prova da participação de todos, como ocorreu em espécie.

12- Contudo, tendo sido ajuizada precedente denúncia pelo crime de quadrilha, este deve ser processado e julgado na Vara Federal Criminal de Foz do Iguaçu, impondo-se afastar o decreto condenatório exclusivamente em relação ao art. 288 do CP.

13- Prevalecendo a avaliação negativa concernente à culpabilidade circunstâncias e conseqüências das práticas delituosas, cabível a fixação da pena acima do mínimo legal.

14- Pena de multa dosada de forma proporcional à privativa de liberdade. Mantido o quantum unitário do dia-multa em face das boas condições econômicas do Recorrente.


15- Não ocorreu a prescrição da pretensão punitiva, porquanto a prova dos autos demonstra que a instituição financeira operou até abril de 200, quando foi dissolvida, não havendo transcorrido quatro anos até o recebimento da denúncia (08.08.2003).

16- Condenação do réu como incurso nas sanções previstas aos infratores dos artigos 16 e 22, parágrafo único da Lei 7,492/86 c/c art. 71 do Código Penal aplicada a regra do concurso material (art. 69 do CP) 17. Tendo em conta a reprimenda fixada (sete anos de reclusão) bem como tratar-se de crime praticado no âmbito de organização criminosa (art. 10 da Lei 9034/95) além do disposto nos artigos 33, parágrafos 2º e 3º e 59 do Código Penal, o cumprimento da pena deverá se dar no regime inicialmente fechado.

HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. PRESSUPOSTOS DA PRISÃO PREVENTIVA. ART. 312 DO CPP. DEMONSTRAÇÃO. CARTA PRECATÓRIA; GRAVAÇÕES TELEFÔNICAS. TRANSCRIÇÃO. ORDEM DENEGADA.

1- A prisão preventiva, embora implique sacrifício à liberdade individual, é ditada por interesse social, impondo-se a sua decretação por decisão fundamentada sempre que for suficientemente demonstrada a presença de qualquer dos pressupostos inscritos no art. 312 do CPP.

2- O cumprimento do mandado de prisão decretado por juiz competente, fora de sua jurisdição, sem a formalidade da precatória, não invalida a prisão.

3- Não compromete a validade da prova o fato da transcrição das comunicações telefônicas ser apenas parcial e estar acompanhada de comentários elaborados pela autoridade policial, pois qualquer dúvida quanto à fidedignidade da transcrição ou à pertinência dos comentários pode ser imediatamente verificada pelo juízo ou por qualquer das partes mediante acessos aos discos (CDs) que contém a integralidade das conversas gravadas.

4- Justifica-se a restrição cautelar da liberdade individual nos casos em que as provas evidenciam que a liberdade do suspeito (ou condenado) pela prática do ato delituoso põe em risco a instrução criminal e a ordem pública. Ordem de Habeas Corpus denegada.

A desnecessidade da transcrição das gravações, no caso em tela, é determinada pela abundância e idoneidade dos meios probatórios produzidos, como, aliás, foi exaustivamente demonstrada pela própria Relatora de feitos, com apoio da doutrina e jurisprudência.

III — Da rigorosa observância ao princípio do Promotor Natual quando da distribuição do presente feito na Procuradoria Regional da República da 3ª Região

Algumas das defesas, especialmente aquelas de CESAR HERMAN RODRIGUEZ e de JOÃO CARLOS da ROCHA MATTOS, questionaram a distribuição do presente feito na Procuradoria Regional da República às procuradoras da República que nele atuam, a saber, Ana Lúcia Amaral, Janice Agostinho Barreto Ascari e Luiza Cristina Fonseca Frischeisen.

De início cabe ressaltar o Núcleo do Órgão Especial do Procuradoria Regional da República da 3ª Região foi criado pela portaria nº 17 de 10/05/2002, baixada pela Chefia da unidade, com atribuição para atuar nos feitos que tramitam perante o Órgão Especial do TRF-3ª Região. A referida portaria sofreu alterações através da portaria nº 35/2003.

Após ter sido enviado ao Subsecretario do Órgão Especial à Procuradoria Regional da República da 3ª Região, o presente feito foi distribuído aleatoriamente, em 13/0/2003, à Procuradora Regional da República Janice Agostinho Barreto Ascaro (integrante do Núcleo do Órgão Especial do PRR-3ª Região desde 19/05/2003) que, por tratar-se de processo extremamente complexo, envolvendo muitos investigados e que poderiam originar, como de fato originaram, diversas ações penais, houve por bem, segunda as regras pré-existentes, solicitar auxílio a duas outras colegas, a saber, as Procuradoras Regionais da República Ana Lúcia Amaral e Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, que já estavam atuando no Núcleo do Órgão Especial. Ressalve-se que o referido pedido de auxílio era regra pré-existente aos fatos, conforme previsto nas Portarias PRR — 3ª Regi”ai nº 17/2002 e 35/2003.

A defesa de CESAR HERMAN RODRIGUEZ questionou a referida distribuição através do HABEAS CORPUS nº 33.231, que tramitou no Superior Tribunal de Justiça, sob a relatoria do Ministro Arnaldo da Fonseca.

O referido Habeas Corpus foi denegado, por unanimidade, pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça em julgamento de 27/04/2004, cujo acórdão restou assim ementado:

HABEAS CORPUS. DENÚNCIA. PRISÃO PREVENTIVA. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO PROMOTOR NATURAL. IMPOSSIBILIDADE DE O MESMO MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PARTICULAR DA FASE INVESTIGATÓRIA E DEPOIS ELE PRÓPRIO OFERECER DENÚNCIA. VÍCIOS INEXISTENTES.

Designações de membros do Parquet com base em atos precedentemente expendidos. Observado critério objetivo. Inocorrência de infringência do princípio do Promotor Natural. Nos termos na Súmula 234 do STJ. A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.

Decreto de custódia cautelar devidamente fundamentado, revelando-se necessária. Prova da ocorrência do fato criminoso e indícios suficientes de autona. Denúncia que descreve pormenorizadamente a conduta delituosa do paciente em concurso com outros agentes, permitindo o exercício da defesa. Denúncia idônea.

Denegração da ordem.

Nesta oportunidade, o Ministério Público Federal junta aos autos o inteiro teor do acórdão proferido no Habeas Corpus nº 33.231.

Portanto, as regras de distribuição de feitos oriundos do Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região na Procuradoria Regional da República da 3ª Região são regidas por critérios objetivos e anteriores à distribuição dos feitos, razão pela qual não há que se falar em qualquer violação do princípio do promotor natural, como restou assentado e reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça.

IV — Dos Habeas Corpus impetrados pelas Defesas perante o Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal

O Ministério Público Federal aproveita a apresentação das alegações finais para informar que as defesas impetraram:

a) perante o Superior Tribunal de Justiça 34 Habeas Corpus e

b) perante o Supremo Tribunal Federal 13 Habeas Corpus

Somente o Habeas Corpus nº 83.883/9, impetrado no Supremo Tribunal Federal pela defesa do co-réu Carlos Alberto da Costa Silva, foi deferido somente para anular o julgamento do Habeas Corpus nº 32102 no Superior Tribunal de Justiça sob o argumento que quando do julgamento por aquele Corte teriam sido considerados fatos que não constavam dos autos. Nova decisão de mérito foi proferida pelo STJ, denegando-se a ordem.

Quadros com os números dos Habeas Corpus, seus impetrantes e resultados dos julgamentos e/ou liminares seguem nos anexos (doctos. nº 2 e 3).

V — Dos elementos necessários à caracterização do crime de quadrilha ou bando

O artigo 288 do Código Penal tipifica o crime de quadrilha ao descrever a seguinte conduta:

"associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes"

A doutrina e a jurisprudência têm firmado posição que para a existência do crime de quadrilha é necessário:

a) associação permanente para cometimento de crimes;

b) o crime de quadrilha é autônomo, não importando que crimes tenham sido cometidos pela quadrilha, mas sim que tenha existido a associação com tal finalidade e

c) não é necessário que todos os integrantes da quadrilha se conheçam, pois podem existir diversas esferas e níveis de associação e participação.

Neste sentido vale citar posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL PENAL — RECURSO EM HABEAS CORPUS — CRIMES DE QUADRILHA — ATUAÇÃO EM COMARCAS DIVERSAS — COMPETENCIA — PREISÃO EM FLAGRANTE — FIANÇA — O crime de quadrilha constitui infração permanente e autônoma, que independe dos delitos que vierem a ser cometidos pelo bando. Se a atuação criminosa da quadrilha se fez em território de duas ou mais jurisdições, a competência firmar-se-à pela prevenção (art. 71, CPP). — Presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva, não cabe a concessão de fiança (art. 324, IV, CPP). — Recurso improvido. (STJ, RHC — 3573-MT, Rel. Cid Flaquer Scarterzzini, Quinta Turma, DJ 27.06.1994, p. 16993


N presente hipótese, resta demonstrado que, através de um conjunto de provas obtido através das interceptações telefônicas, das buscas e apreensões, dos interrogatórios e depoimentos de testemunhas em Juízo e, ainda, dos diversos documentos juntados aos autos durante a instrução criminal, os denunciados constituem uma associação criminosa permanente, que tinha como finalidade a prática de diversos crimes, com diversos níveis de organização e participação de cada um de seus integrantes.

Atuavam em diversas partes do sistema de justiça criminal visando a prática de crimes, aproveitavam-se do exercício de suas funções, obtinham ilicitamente favores de cunho particular, em tudo concorrendo para a corrupção da Justiça Federal Criminal na subseção judiciária do Estado de São Paulo.

VI — DO CRIME DE QUADRILHA OU BANDO

Os fatos apurados nas investigações, que precederam a formalização da acusação, foram confirmados com os elementos trazidos a estes autos por força das buscas e apreensões realizadas, bem como no curso dos interrogatórios e oitivas das testemunhas, além de documentos trasladados de outros feitos envolvendo condutas de réus nesta ação penal.

Ainda no curso da instrução processual, ocorrências outras vieram a reforçar os elementos de convicção, tudo para bem demonstrar os liames entre os diversos integrantes do grupo criminoso e a sua forma de atuação.

VI. 1 — Da associação permanente para o cometimento de crimes

Na Justiça Federal Criminal, em São Paulo, a organização contava com a atuação:

a) do Juiz Federal JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, que atuava em processos sob sua jurisdição visando conceder vantagens a alguns integrantes da organização criminosa, obter vantagens ilícitas para si e seus familiares e outros integrantes do grupo;

b) do Juiz Federal CASEM MAZLOUM, que mantendo relações com parte dos demais integrantes da quadrilha obtinha para si ou para pessoas de seu círculo familiar ou de amizades vantagens ilícitas;

c) do Juiz Federal ALI MAZLOUM, que atuou para proteger alguns dos demais integrantes da organização criminosa, utilizando-se de sua função jurisdicional para proteger aqueles;

d) JOSÉ AUGUSTO BELLINI, que como Delegado da Policia Federal utilizava-se de sua função para obter vantagens ilícitas para si e para pessoas da família e amigos;

f) DIRCEU BERTIN, que utilizando-se de sua função de Delegado da Polícia Federal, acobertou e impediu a apuração de fatos ilícitos praticados por alguns integrantes da quadrilha;

g) JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA que, como ex-delegado da Polícia Federal, utilizava-se de suas relações com os demais integrantes da quadrilha e outros para obter informações e alterar o curso de investigações policiais visando obter vantagens para si e/ou para seus clientes;

h) CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ que, como agente da Polícia Federal, transitava entre toda sas diversas esferas da organização criminosa, fazendo, muitas vezes, o papel de ligação entre os diversos participantes daquela, visando obter vantagens ilícitas para si e seus familiares e realizando serviços ilícitos para os demais integrantes da quadrilha;

i) VAGNER ROCHA que mantinha relações com grande parte da organização criminosa, sendo seu escritório um dos pontos de apoio para as atividades da quadrilha, bem como intertermediava a obtenção de novos negócios ilícitos;

j) NORMA REGINA EMÍLIO CUNHA funcionava como uma das "tesoureiras" e gerenciadoras de parte do produto auferido com a prática de crimes cometidos por alguns integrantes da quadrilha;

l) CARLOS ALBERTO DA COSTA SILVA que atuava com advogado

e um dos gestores do produtos auferidos com a prática de crimes cometidos por alguns integrantes da quadrilha;

m) AFFONSO PASSARELLI FILHO que, como advogado, cedia seu nome ao escritório utilizado por alguns dos integrantes da quadrilha e que era responsável pela movimentação financeira das despesas diárias e pessoais dos integrantes da quadrilha;

n) SÉRGIO CHIAMARELLI JR. (processos nº 96.0102108-6) beneficiário direto de um dos crimes praticados por integrantes da quadrilha e ao mesmo tempo partícipe da organização criminosa.

Os indícios de participação de familiares, empregados ou funcionários subalternos aos mentores e executores, em seus escritórios particulares ou na hierarquia administrativa do órgão público, do qual faziam parte, foram confirmados no curso da instrução.

Em face disso — enfatize-se mais uma vez — que as condutas descritas na inicial acusatória não podem ser apreciadas isoladamente, mas enquanto um conjunto de ações perpetradas por um grupo que operava de forma orquestrada, em permanente aliança, mediante intenso esquema de troca de favores e intercâmbio de informações, visando ao enriquecimento e obtenção de vantagens ilícitas.

De fato, participavam de direcionamento de inquéritos, investigações e processos judiciais em favor de seus "clientes", atuavam na facilitação de contrabando, liberação de mercadorias, arquivamento de inquéritos, absolvição em ações penais, obtenção de informações privilegiadas, tráfico de influência, pagamento e obtenção de vantagem ilícita, interceptações telefônicas clandestinas e obtenção de dados protegidos por sigilo, sendo certo que as diversas ações ilícitas que protagonizaram só se tornaram possíveis graças a estar o grupo integrado por agentes públicos federai que atuavam no sistema de Justiça criminal e que intervinham em favor de terceiros para obter enriquecimento ilícito.

Na peça acusatória, o MPF identificou os papéis dos diversos integrantes da organização criminosa da seguinte forma:

a) mentores: JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, JOSÉ AUGUSTO BELLINI, CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ E JORGE LUIZ BEZERRA.

b) auxiliares: VAGNER ROCHA, NORMA REGINA EMÍLIO CUNHA, AFFONSO PASSARELLI, CARLOS ALBERTO DA COSTA SILVA, SÉRGIO CHIAMARELLI e DIRCEU BERTIN.

Os juizes federais CASEM MAZLOUM E ALI MAZLOUM, ao lado de JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, vieram a participar das atividades do grupo criminoso, basicamente, utilizando-se da sua atividade e/ou autoridade judicial.

Como ficou demonstrado nestes autos, embora nem todos tenham intervindo nos mesmos delitos, e ainda que todos não se conheçam diretamente, as suas ações acabam por conectar-se com a dos demais graças à atuação dos mentores como se passa a demonstrar.

VI. 2 — De uma das formas de atuação dos integrantes da Quadrilha e das relações delituosas dos integrantes JORGE BEZERRA DA SILVA, CÉSAR HERMAN, AFFONSO PASSARELLI e JÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS

Dentre as diversas ações delituosas perpetradas pelo grupo, e descritas na exordial, cumpre relatar mais detalhadamente, neste passo, o caso evolvendo as empresas AFFAIR SYSTEM (ACCESS) X ACTION, descoberto no curso das interceptações autorizadas no qual todos os denominados mentores atuaram, bem demonstrando o "modus operandi" da organização criminosa.

O Processo nº 2002.61.81.005719-9, distribuído à 4ª Vara Federal Criminal de São Paulo, relativo ao Inquérito Policial nº 12-0062/03 — DELEFIN/DRCOR/SR/DPF/SP (Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros da Polícia Federal), foi autuado em 10/11/2002, sendo que na autuação constou que ele seria relativo ao Processo nº 050.02.038117-4 — DIPO 3 — seção 3.2.3 (IP nº 50/02 — 2ª Delegacia de Fé Pública, Falsificação, Roubo e demais delitos sobre medicamentos — DIG/DEIC/SSP/SP) — Prot. COR/SR/DPF/SP nº 64.505-12.

O inquérito policial, vindo da esfera estadual, teve origem em petição subscrita pelos advogados JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA e Maria Regiana Marra Güimil, endereçada ao Delegado de Polícia Titular da Delegacia Especializada sobre Crimes contra a Fé Pública do Departamento Estadual de investigações Criminais — DEIC — São Paulo/SP, veiculando "notitia criminis" formulada pela AFFAIR SYSTEM Telecomunicações LTDA, na qual era requerida a instauração de inquérito Policial para apurar a prática dos delitos descritos nos artigos 171 c.c. 288 do Código Penal por parte de sócios e funcionários da empresa ACTION CORRETORA DE CÂMBIO E VALORES MOBILIÁRIOS, a saber; Bruno Farina. José Luís Camargo; Valdir dos Santos; Sérgio Severo de Castro Filho; Lucas Pace Junior e Ricardo Chermont.


Naquela petição, JORGE LUIZ relata que a AFFAIR System Telecomunicações manteve longa relação comercial com a corretora de câmbio ACTION, como cliente em operações financeiras, e também como prestadora de serviços técnicos. Dando continuidade a tais operações, em outubro 2002, teria feito uma operação financeira com a ACTION para "antecipação de lastro para futuro fechamento de câmbio". Tal operação envolveria a quantia R$ 952.501,51, que a Affair System teria entregue à ACTION através de 54 (cinqüenta e quatro) cheques ao portador. Contudo, os sócios e funcionários da ACTION não teriam prestado contas à Affair System sobre o destino dado aos valores que esta lhes confiou, caracterizando-se espécie de "desfalque", o que teria gerado séria crise financeira na empresa.

Em 16/09/2002, o Juiz de Direito do Departamento de Inquérito Policial de São Paulo — SP — DIPO 3 — Seção 3.2.3, Dr. Júlio Caio Farto Salles, determinou a redistruição dos autos do Inquérito a uma da Varas Criminais da Justiça Federal, que seria competente para conhecer dos fatos investigados nos termos do artigo 26 da lei 7492/86.

Assim, o Inquérito instaurado por portaria do Delegado de Policia Carlos Alverto Delaye Carvalho, que o presidiu até sua remessa à justiça federal, foi distribuído à 4ª Varra Criminal Federal em 24/09/2002 (distribuição automática). Posteriormente, em 03/12/2002, foram juntadas aos autos do Inquérito peças remetidas pelo DEIC, referentes a diligências efetuadas no período em que o inquérito havia sido remetido ao Judiciário, notadamente o "Relatório de Investigações", elaborado por investigadores de polícia da Polícia Civil do Estado de São Paulo, no qual foi destacado que as investigações apontaram "na direção de desbaratar forte esquema de lavagem de dinheiro, com flagrante ação do crime organizado, com prática de crimes contra o sistema financeiro".

Esse Inquérito continua em trâmite na Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros — DELEFIN. Apensado a ele por dependência veio o Processo nº 2003.61.81.005974-7, que foi autuado em 30/07/2003.

Ocorre que os autos nº 2003.61.81.005974-7 são um Inquérito Policial inicialmente instaurado na Delegacia de Policia do Aeroporto de Congonhas — DEATUR (policia estadual) por Portaria do Delegado de Polícia Civil Ruy Marchioni de Barros, para investigar eventual crime de moeda falsa noticiado por denúncia anônima.

Naquele Inquérito foi feita a preensão, no Aeroporto de Congonhas, no setor de guarda-volumes da empresa MALEX DO BRASIL, de um envelope com a inscrição "A/C Rua Augusta nº 2530, 18º A Conjun. 181,182…", contendo a quantia em dinheiro de doze mil e quinhentos dólares americanos, supostamente falsos.

O Delegado de Polícia Ruy Marchioni de Barros, em 21/07/2003, representou ao Juiz de Direito Corregedor do DIPO e da Polícia Judiciária/SP, requerendo a expedição de mandado de Busca e Apreensão no local indicado na inscrição do envelope apreendido, sendo que em 22/07/2003 foi-lhe comunicado, por via eletrônica, a seguinte determinação do juiz; "visto, etc., pelo que se dessume dos autos, o crime que se investiga é de moeda falsa, afeto, portanto, à competência da Justiça Federal a quem cabe o exame da presente medida. Comunique-se à autoridade policial, arquivando-se após".

Estranhamente, o Delegado Ruy Marchioni de Barros representou diretamente ao Juiz de Direito da 4ª Vara Criminal da Justiça Federal, encaminhando o original do Inquérito Policial em andamento e requerendo a expedição de Mandado de Busca e Apreensão para a Rua Augusta, 2530, cjs. 181 e 182, com base em informações prestadas por policias civis que realizaram diligências investigatórias no local mencionado no envelope, apurando com vizinhos que lá teria funciona a empresa "ACTIVE CAMBIO E TURISMO", que teria sido substituída pela empresa "TONY-A CAMBIO E TURISMO", e que lá já teria funcionado também a "ACTION TURISMO E CÂMBIO", empresa que seria objeto de investigação em processo com trâmite na 4ª Vara Criminal da Justiça Federal".

Em 30/07/2003, o Juiz JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, àquela época juiz da 4ª Vara Criminal Federal, ao receber a referida representação, determinou a distribuição do feito por dependência ao inquérito policial de nº 2002.61.81005719-9, e, na mesma data, determinou a expedição de Mandado de Busca e Apreensão, afirmado vislumbrar indícios de prática do crime de moeda falsa, bem como de ilícito contra o Sistema Financeiro Nacional.

Em 31/07/2003, foi realizada a busca e apreensão na Rua Augusta, 2530, 18º andar, cjs. 181/182, sendo também tomadas declarações de Elizeu Ferreira de Souza e Waldir Favoretto, pessoas relacionadas à empresa Ton-Ya Viagens e Turismo Ltda, que declararam não apresentarem qualquer relação com a empresa ACTION CÂMBIO E TURISMO LTDA.

Diante das informações prestadas por policiais civis responsáveis pela investigação sobre a existência, no Aeroporto de Congonhas, de loja com a inscrição "ACTION CÂMBIO E TURISMO LTDA" , foi efetuada busca e apreensão também naquela loja, colhendo-se depoimento de funcionários.

Em 21/08/2003, o Inquérito foi remetido à 4ª Vara Criminal Federal, tendo sido relatado pelo Delegado de Policia Assistente, Dr. Luiz Antonio Ribeiro Longo, que afirmou "não ter sido possível identificar o responsável pela detenção do material criminoso, não restando outros elementos que possibilitassem prosseguir na investigação", protestando pelo ulterior envio do laudo pericial, já requisitado.

O Juiz Federal JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, em 28/08/2003, abriu vista dos autos ao Ministério Público Federal, que requereu a vista conjunta com o Inquérito nº 2002.61.81.005719-9.

Em 22/09/2003, o Ministério Público Federal manifestando-se, após a abertura de vista de ambos os autos, afirmou a inexistência de conexão ou continência entre o Inquérito nº 2003.61.81.005974-7 e o Inquérito nº 2002.61.81.005719-9, e requereu fosse reconsiderada a decisão que havia determinado a distribuição por dependência e fosse regularizada a distribuição do Inquérito nº 2003.61.81.005974-7. Outrossim, afirmou que aquele Inquérito não estava devidamente instruído, requerendo fosse requisitado o envio de numerário e o envelope apreendido, para posterior remessa ao SECRIM, para análise de sua autencidade.

Em 24/09/2003, o Juiz Federal JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, afirmando fique realmente nada havia sido apurado com relação à conexão com o Processo nº 2002.61.81.005719-9, determinou a remessa dos autos do Processo nº 2003.61.81.005974-7 para que fosse "extraído do cadastro deste inquérito policial a dependência ao processo acima mencionado". Outrossim, determinou que se oficiasse á Delegacia de Polícia do Aeroporto de Congonhas requisitando o encaminhamento do numerário e envelope apreendidos.

Em 08/10/2003, o Delegado de Polícia Estadual Luiz Antonio Ribeiro Longo encaminhou ao juízo da 4º Vara Criminal Federal, acompanhado do envelope e das cédulas apreendidas, o Laudo Pericial elaborado pelo Instituto Criminalística "Perito Criminal Dr. Octávio Eduardo de Brito Alvarenga", que conclui pela falsidade das cédulas apreendidas.

Em 01/12/2003, os autos do Inquérito nº 2002.61.81.005719-9 foram remetidos ‘a Delegacia de Policia Federal.

A exposição acima confirma o alegado na exordial acusatória, no subitem intitulado "Fatos típicos envolvendo a participação de JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA — a) O Caso Access Sistem/Action no qual narrado que esse co-réu e CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ defenderiam os interesses de empresários representantes da Empresa Access System ou Affair System Telecomunicações Ltda., sendo mencionado que eles estariam utilizando de Inquérito instaurado no DEIC (que posteriormente virificou-se tratar do Processo nº 2002.61.81.005719-9, originário do DEIC, e distribuído à 4ª Vara Federal) "como instrumento de pressão para acuar os representantes da empresa ACTION, como forma de coação para o pagamento da dívida, e que, como não estavam conseguindo os objetivos mencionados, planejavam fazer uma denúncia contra a empresa ACTION junto à Polícia Federal, onde o Delegado de Polícia Federal aposentado Luiz Carlos Zubcov entraria para atuar no caso" (o que parece ter sido manejado no Inquérito nº 2003.61.81.005974-7).


A respeito desses fatos são as gravações efetuadas pela Polícia Federal, transcritas no Relatório Parcial da Operação Anaconda, sendo de se destacar o áudio nº 020903164815. C001, através do qual é possível se constatar a ligação de vários integrantes do grupo com Toninho da Barcelona, tanto é que CÉSAR HERMAN diz a JOÃO D’Ângelo, titular da Access System, que o mencionado doleiros iria colaborar no sentido de pressionar, como outros do mesmo ramos, os titulares da ACTION a saldarem sua dívida com a Access.

No Relatório Parcial da Operação Anaconda, foi elaborado pela Policia Feral um "Organograma da Organização Criminosa", no qual foi incluído um item fazendo expressa menção aos fatos relacionados ao Inquérito nº 2002.61.81.005719-9 e Inquérito nº 2003.61.81.005974-7 ("Diagrama Caso Access System"), bem como a transcrição de conversas telefônicas gravadas, sendo que na inicial acusatória é feita referência aos áudios do Relatório, assim elencados em notas de rodapé na denúncia.

Denúncia — crime de quadrilha

Proc. nº 2003.03.00.065344-4: doc.3

Fls. 44, Nota 74:

Áudio 020621114621.c010

Relatório Parcial

Operação Anaconda: doc. 4

Fls. 73

Denúncia — crime de quadrilha

Proc. nº 2003.03.00.065344-4: doc.3

Fls. 44, nota 75: Áudios

020625111058.c010 e 020625111525.c010)

Relatório Parcial

Operação Anaconda: doc. 4

Fls. 75

Denúncia — crime de quadrilha

Proc. nº 2003.03.00.065344-4: doc.3

Fls. 45, nota 76:

Áudio 020903164815.c001

Relatório Parcial

Operação Anaconda: doc. 4

Fls. 96

Denúncia — crime de quadrilha

Proc. nº 2003.03.00.065344-4: doc.3

Fls. 45, nota 77:

Áudio 020910151322.c001

Relatório Parcial

Operação Anaconda: doc. 4

Fls. 100

Denúncia — crime de quadrilha

Proc. nº 2003.03.00.065344-4: doc.3

Fls. 45, nota 78:

Áudio 020911100909.c001

Relatório Parcial

Operação Anaconda: doc. 4

Fls. 100

Denúncia — crime de quadrilha

Proc. nº 2003.03.00.065344-4: doc.3

Fls. 45, nota 79:

Áudio 02091920503.c001

Relatório Parcial

Operação Anaconda: doc. 4

Fls. 109

No Relatório Parcial da Operação Anaconda foram tecidas as seguintes considerações acerca do acaso em comento (fls. 110):

Durante a presente investigação foram gravados alguns diálogos sobre o assunto da conversa acima e que nos permite tirar algumas conclusões a respeito do caso, quais sejam: JORGE LUIZ e CÉSAR HERMAN estariam defendendo os interesses de JANDA e D’ANGELO, representantes da empresa ACCESS SISTEM ou AFFAIR SYSTEMTELECOMUNICAÇÕES LTDA, no que se refere à cobrança de uma dívida de USS 300.000,00 da empresa ACTION. Possivelmente a empresa ACTION ou seus representantes estariam envolvidos em um inquérito instaurado no DEIC de SÃO PAULO. JORGE e CÉSAR HERMAN estariam pressionando os representantes da empresa ACTION através do inquérito do DEIC. Para tanto contariam com a colaboração de PAULO e JOÃO, integrantes do referido órgão oficial. Como JORGE LUIZ e CESAR HERMAN não estão conseguindo os seus objetivos, planejam fazer uma denúncia contra a empresa ACTION junto à POLÍCIA FEDERAL. O delegado aposentado da Polícia Federal LUIZ ZUBICOV, novo integrante da quadrilha, atuaria no caso.

A relação entre os fatos atinentes ao Inquérito nº 2002.61.81.005719-9 e o Inquérito nº 2003.61.81.005974-7 dão supedâneo à imputação que é feita no presente feito, ficando evidenciada pelos seguintes dados:

1) O co-réu JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA, advogado que subscreveu a "notitia criminis" que deu origem ao Inquérito nº 2002.61.81.005719-9.

No Relatório Parcial de Inteligência Policial é registrado que a investigação (que posteriormente converteu-se na "Operação Anaconda") teve início "a partir de informação policial dando conta de que Jorge Luiz Bezerra da Silva, advogado, policial federal aposentado, estaria tentando se valer de sua influência e contatos no Departamento de Polícia Federal para atender a interesses de seus clientes".

No mesmo relatório, o nome de Jorge Luiz Bezerra da Silva é incluído entre aqueles que, "na posição de policiais federais ou usufruindo desse status para beneficiarem clientes contratarem interessados, intimidarem desafetos ou coagirem vítimas atuam vendendo facilidades a pessoa investigadas em inquérito policiais, oferecendo vantagem econômica a funcionários públicos, além de cobrarem valores para remunerar a própria intermediação dos serviços ilícitos".

2) O Inquérito nº 2002.61.81.005719-9 foi originariamente instaurado no "Departamento de Investigação sobre Crime organizado — DEIC, Divisão de Investigações Gerais — DIG, 2ª Delegacia de Polícia — Fé Pública e Falsificação, Roubo e demais delitos sobre Medicamentos", por portaria do Delgado de Policia Titular, Dr. Carlos Alberto Delaye Carvalho, que presidiu aquele Inquérito até sua remessa ‘a Justiça Federal. Atuaram nas investigações, na época em que o Inquérito tramitou no DEIC, os Investigadores de Polícia Batista João Lopes e Paulo Roberto dos Santos.

Ocorre que no "Relatório Parcial de Inteligência Policial — Operação Anaconda" é noticiado que parte das atividades da quadrilha consistiria em "infiltrar-se, através de seus membros ou de seus auxiliares eventuais, em companhias telefônicas, órgãos da Justiça, Ministério Público, Polícia e outras instituições públicas e privadas", para, entre outros objetivos, ter acesso a "dados de procedimentos criminais diversos, inquéritos e outros procedimentos administrativos". A seguir, o mesmo Relatório destaca "a participação efetiva, ainda que não intensa", de vários integrantes, dentre os quais são mencionados "João, Paulo Roberto dos Santos e Delair (DEIC SP)".

Consigne-se, ainda que o fato de o inquérito em referência — que trata de operações financeiras — ter sido instaurado no DEIC — 2ª Delegacia de Policia — Fé Pública e Falsificação, Roubo e Demais Delitos sobre Medicamentos foi objeto de questionamento por representantes da ACTON, que requereu a remessa dos autos á Justiça Federal.

3) O Inquérito nº 2003.61.81.005974-7 foi instaurado por Portaria do Delegado de Polícia Titular da Delegacia de Polícia do Aeroporto de Congonhas Ruy Marchioni de Barros.

Consigne-se que nas transcrições de gravações contidas no Relatório Parcial de Inteligência Policial da Operação Anaconda, consta, por diversas vezes, a menção ao "delegado do estado RUI, que seria amigo de Jorge Luiz Bezerra da Silva e César Herman" (fls. 74 e fls. 76).

4) Ricardo Scarponi Chermont figurou como um dos requeridos, na notitia criminis formulada pela AFFair System Telecomunicações LTDA, em petição subscrita por Jorge Luiz Bezerra da Silva, que deu origem ao Inquérito 2002.61.81.005719-9. Em tal petição, Ricardo Chermont é qualificado como funcionário da ACTION.

Ocorre que o mesmo Ricardo Chermond figura como um dos sócios da empresa Ton-Ya Viagens e Turismo Ltda., que tem sede no local indicado no envelope no qual foram encontradas cédulas falsas no Aeroporto de Congonhas, conforme informação contida em denúncia anônima, que deu origem ao Inquérito nº 2003.61.81.005974-7.

5) No "Relatório Parcial de Inteligência Policial" é também assinalado que "aparecem como beneficiários ou vitimas das atividades da organização criminosa", dentre vários outros, "José D’Angelo Costa e João Abujamra Junior (que apresentaria a alcunha de Janja) da Acess System ou Affair System Telecomunicações". Ambos seriam sócios da Affair System Telecomunicações Ltda.

Cumpre, neste passo, informar que o MPF, diante da necessidade de buscar a responsabilização penal pelos fatos ilícitos verificados no presente relato, já que eles, em tese poderiam ser subsumidos a diversas condutas típicas, vislumbrando-se, desde logo, a ocorrência de crimes contra a administração pública (artigo 313-A do Código Penal — inserção de dados falsos em sistema de informações, no que se refere à manipulação da distribuição do Inquérito nº 2003.61.81.005974-7; artigo 316 do Código Penal — concussão; artigo 317 do Código Penal — corrupção passiva; artigo 319 do Código Penal — prevaricação; artigo 333 do Código Penal — corrupção ativa; artigo 357 do Código Penal — exploração de prestígio); crimes contra o sistema financeiro (Lei 7492/86) e crimes de lavagem de dinheiro (Lei 9613/98) — condutas essas que foram contempladas nas denúncias já ofertadas pelo Parquet no caso da Operação ANACONDA — requereu a instauração de investigação.


O caso acima relatado bem comprova a integração de JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA à organização, contrariando o alegado por esse acusado (fls. 3091/3148), quando negou em seu interrogatório que usava o escritório de AFFONSO PASSARELLI, não tendo negado que usava cartão de visita com o endereço daquele escritório. Demonstrou conhecer como era organizado e as pessoas que lá trabalhavam: administração do escritório ficava aos cuidados da advogada Regina Guimil (prima de César Herman), sendo que ali trabalhavam o advogado Rodrigo Lobo, a secretária volante Lizandra (parente de César), e o motoboy Anderson.

Apesar de negar freqüentar por falta de estrutura, acabou por declarar que, quando questionado sobre o caso ACCESS/ACTION, pediu a CÉSAR HERMAN que o seu escritório fizesse a peça, sendo que Maria Regina Guimil teria feito todo trabalho de pesquisa nesta ação judicial, tendo, ainda, efetuado o depósito correspondente aos honorários na conta deste escritório. Ao ser indagado acerca do caso Santarém, disse que no escritório Passarelli eram feitos os acompanhamentos processuais, além dos casos que ele tinha em São Paulo, razão pela qual pediu ao Delegado de Santarém que enviasse via fax informação para o escritório Passarelli, aos cuidados do César Herman.

Cumpre registrar que entre os documentos apreendidos no escritório de PASSARELLI está o contrato da Affair System com o escritório Affonso Passarelli e Guimil e JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA (laudo n.º 2.479-03).

Ainda que não conhecesse os demais integrantes da quadrilha, cujo envolvimento pode estar mais ligado a outros executores ou a outros mentores, o fato é que restou cabalmente comprovado nos autos quea relação de JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA com o grupo não se deu de forma esporádica nem eventual. Veio para integrá-lo e de forma atuante.

VI. 3 — Da atuação de AFFONSO PASSARELLI e do uso de seu escritório como um dos centros da organização criminosa

A estrutura do escritório de AFFONSO PASSARELLI e GUIMIL dava o suporte para a atuação do grupo. O livro-caixa apreendido demonstra que lá tanto se arrecadava os pagamentos à atividade delituosa da quadrilha, como satisfazia as despesas particulares de vários de seus integrantes.

Para demonstrar, valer-se-á o MPF do termo de interrogatório de AFFONSO PASSARELLI FILHO, do qual são extraídos os trechos que seguem:

RELATORA: Quando o senhor conheceu o César Herman ele já estava afastado da Polícia Federal?

ACUSADO: e, ele estava afastado da Polícia Federal e eu dei uma mão para ele.

RELATORA: E ele já tinha esse escritório na Brigadeiro Faria Lima?

ACUSADO: Não, não. A gente trabalhava ai na Batatais. E dali nós começamos.

RELATORA: Isso em que ano?

ACUSADO: Em 88, 89, mais ou menos.

RELATORA: O senhor disse que dos réus conhecia só César Herman?

ACUSADO: Só o César.

RELATORA: Os outros…

ACUSADO: O doutor João, eu devo ter falado com ele umas três ou quatro vezes, aniversário do filho do César, uma vez na casa do César, e… O doutor, doutor Costa e Silva nunca tinha nem ouvido falar o nome dele, conheci lá também… é…. Chiamarelli eu conhecia de nome por que tinha aquela ação da SPLIT que começou com um inquérito que o César estava acompanhando que ele estava fora da federal, aí depois, no processo, quem fez foi a Regina, então eu recebo todas as publicações e ações, quando, todas as procurações têm o meu nome, então eu recebo todas. Então eu conhecia de nome, conheci ele pessoalmente lá também.

(omissis….)

ACUSADO: Não, doutor Bellini eu conhecia de nome porque era muito amigo do César e o César falava muito dele, falava bem dele. Então eu conhecia de nome.

RELATORA: Norma Regina?

ACUSADO: Norma Regina também no aniversário do filho do César, acho que uma ou duas vezes.

RELATORA: E o Jorge Bezerra?

ACUSADO: O Jorge Bezerra, inclusive no dia que o doutor Emanuel tomou o depoimento, ele me perguntou "Jorge Bezerra", ele tem até cartão seu do seu escritório, tal. Eu falei: Não lembro Jorge Bezerra, não lembrava nem o nome dele, mais eu conheci o Jorge Bezerra, depois do depoimento que eu lembrei que eu costumo ir jantar com os meus amigos (…) O Jorge foi em dois ou três jantares.

RELATORA: Quem é Reizinho?

ACUSADO: Reizinho é o sobrinho do César, é um menino e cabecinha, sabe, mineiro que não sai de casa,… Educado pela mãe, muito rígido, sabe, então ele pe meio paradinho, sabe.

RELATORA: Ele trabalha no escritório?

ACUSADO: Não, ele veio acho que passar uns dias em São Paulo.

RELATORA: Onde ele mora?

ACUSADO: Em Minas.

RELATORA: E o Jorge Bezerra também trabalhou no escritório?

ACUSADO: Então, o Jorge Bezerra, foi encontrado um cartão do escritório, isso era um ponto de referência, que ele é, acho que de Maceió, se não me engano, ele atua no Brasil todo. E lá o ponto de referência. Tendo algum cliente, provavelmente, isso não fui eu que acertei, o César deve ter acertado com ele, isso, é mais ou menos comum na área, né, ia atender lá no escritório e pagaria uma taxa pelo uso da sala, de computadores e tudo o mais.

RELATORA: César continuava participando do escritório mesmo depois de ter retornado à…?

ACUSADO: Olha, ativamente o César é extremamente competente, juridicamente ele realmente conhece muito, mas ele não estava atuando, fazendo petições, trabalhando como ele trabalhava quando era, quando estava fora da federal, ele fora da federal ele chegava a passar a noite fazendo petições, ele realmente trabalhava muito. Agora ele estava tratando os negócios dele, ele tinha o trabalho na federal, tinha na justiça, não sei mais aonde que ele estava indo, porque eu não sou de perguntar e não gosto que fale muita coisa para mim, sabe. Ele… E ele estando lá no escritório, eu não posso dizer para a senhora que alguma dúvida da Regina ele não fosse tirar com ele. Isso é mais ou menos normal, ta lá, ta junto, vai perguntar, mas não ele, sentar, fazer, não. Isso ela fazia as petições quando o boy, o Anderson vinha na minha casa no mínimo 3 vezes por semana, para eu dar uma relida, ver texto, ver português, assinava e mandava de volta, eles davam entrada. Flagrante, isso de jeito nenhum, flagrante ela fazia. Então… Minha posição era essa lá, sabe?

(omissis…)

RELATORA: Quantas salas tem o escritório?

ACUSADO: Salas. Nos tínhamos o andar todo. Ai como estava muito caro, era mais de 8 mil reais o condomínio é muito caro saiu, saíram alguns né mesmo o… Oscar também não ficou muito tempo, ai em 2000 saiu nos entregamos e ficamos só com a metade. Ai diminuiu bem. Esta na faixa de dois mil e pouco.

RELATORA: E aí é que ficou com 7 salas?

ACUSADO: é, mais ou menos. Porque eu não subo lá, Dra..

(omissis…)

RELATORA: Há quanto tempo o senhor não freqüenta o escritório?

ACUSADO: Olha… Há uns quatro anos.

(omissis…)

RELATORA: Quem administra de fato o escritório?

ACUSADO: A Regina, a Regina, a parte jurídica ela administra, na parte de revisões eu faço, assino, e na parte financeira eu tenho total confiança no César, é como se fosse um irmão mesmo e ele, ele é bom de negócio, ele é bom comprador. (omissis…) Eu confio nele totalmente.

RELATORA: Ele que faz os negócios do escritório?

ACUSADO: Faz mas está tudo na contabilidade. Eu tenho até aqui, trouxe que a Regina que acompanha, a contabilidade está no escritório Meira Fernandes, também pode ser levantado e ele pode explicar como ta né?

(omissis)

RELATORA: Há quanto tempo estão no imóvel?

ACUSADO: Ah… 2003, 3, 4, acho que há 5 anos, mais ou menos.

RELATORA: E o César está diariamente no escritório?

ACUSADO: Não, não todo dia.

RELATORA: Mas freqüentemente?

ACUSADO: Mais no final da tarde às vezes quando eu preciso falar com ele ou mais no celular. E quando não converso com ele à noite, quando eu vou jantar.

RELATORA: Ele ocupa uma sala?

ACUSADO: Ele ocupa uma sala e até mais, né… é como se fosse o dono também. Ele foi dono, né é difícil deixar de ter aquela… Aquela postura, né?

RELATORA: E quando ele saiu do escritório que negócio vocês fizeram?


ACUSADO: Quando ele saiu?

RELATORA: Sim. Quando ele deixou de advogar…

ACUSADO: Eles passou o escritório para mim, ai eu abri a firma como consultoria. Affonso Passarelli e Guimil Advogados.

(omissis…)

RELATORA: O senhor não pagou nada para ele.

ACUSADO: Se eu paguei?

RELATORA: Para ficar com o escritório?

ACUSADO: Não, não paguei nada, ele devia muito para mim porque quando ele saiu da federal ele não tinha nada, eu o ajudei muito. O que fez foi me retribuir. Eu entendi é normal.

RELATORA: E não houve nenhum acerto financeiro?

ACUSADO: Não, nenhum.

RELATORA: E o senhor continuou tocando os casos em que ele atuava?

ACUSADO: Continuamos. Ainda tem uns quatro ou cinco.

RELATORA: Havia honorários dele por pagar?

ACUSADO: Tem, tem para pagar sim. (…(omissis)

RELATORA: Quando César saiu do escritório foi feito um levantamento das causas em que ele tinha honorários a receber?

ACUSADO: Não, não. Não porque ele sabia qual eram todas as que estavam entrando. Isso ai estava controlando, a Regina controlava, eu recebia.

RELATORA: Ele recebeu esses valores?

ACUSADO: Não, não recebeu nada ainda, não concluiu nenhuma.

RELATORA: Não houve pagamento?

ACUSADO: Não, nenhum.

RELATORA: O senhor começou a trabalhar com ele em que ano?

ACUSADO: 87, 88, mais ou menos quando a empresa onde eu trabalhava (…). Começou a decair.

(omissis….)

RELATORA: O senhor sabe qual é a renda mensal do escritório?

(omissis…)

ACUSADO: Renda mensal do escritório, nós temos… Deve dar… Não sei bem, hein, vou falar mais ou menos pelos contratos que eu lembro, alguns, né… é… Deve dar uns 80, 100 mil por mês, acredito.

RELATORA: Sempre foi assim ou já foi melhor ou pior?

ACUSADO: Não… De uns três anos para cá vem melhorando.

(omissis…)

RELATORA: E por que tinha coisas do João?

ACUSADO: Porque ele espalha, por causa da mulher dele que terminaram lá, ele não tinha onde por. E eu sabia que lá tinha. Se a senhora quer saber, eu acho que o doutor João, eu acho que não foi nenhuma vez no escritório. Não sei se foi perguntando isso para ele, mas eu acho que ele não foi nenhuma vez lá.

RELATORA: Mas ele tinha relacionamento com César?

ACUSADO: Muito amigo.

RELATORA: César cuidava dos negócios dele?

ACUSADO: Do João? Não. Teve uma dívida que falaram que era realmente compra de um carro, o César pagou.

RELATORA: César comprou um carro de João?

ACUSADO: João comprou um carro do César, aquele Smart, aquele pequenininho e não sei se pagou, se não pagou, se ficou devendo, se depois devolveu. Eles fazem muito rolo desse tipo. Eu não, eu não sou de perguntar. Quando chegam para mil e falam alguma coisa eu ouço, mais eu não gosto de saber muita coisa.

(omissis…)

RELATORA: O senhor sabe que relacionamento César tinha com o réu Jorge Bezerra?

ACUSADO: Eram amigos, parece que muitos amigos.

RELATORA: César que ofereceu o escritório para uso de Jorge?

ACUSADO: Provavelmente, provavelmente.

RELATORA: César participou dos casos em que atuou Jorge Bezerra?

ACUSADO: Eu acho que não porque não deve ter nenhum caso, ele estava começando lá, né. Não tem muito tempo.

(omissis…)

RELATORA: Foram apreendidos vários cheque em nome de César Herman. A que titulo esses cheque eram emitidos?

ACUSADO: Aí eu tenho que saber quais são os cheques. Porque realmente para lembrar é difícil. Eu não retirava nada, quando eu precisava de dinheiro se tinha algum negócio bom, ele me emprestava, passava, acho que uma ou duas vezes, tipo, 20 ou 50 mil não foi mais que isso. Depois eu devolvia. (17)

RELATORA: O César emprestava?

ACUSADO: O escritório me passava.

RELATORA: Dinheiro o escritório?

ACUSADO: é.

RELATORA: Depois o senhor devolvia.

ACUSADO: Ou dele, não sei, emprestava não sei de onde era.

RELATORA: Mas o senhor recebia valores mensalmente?

ACUSADO: Não. Nunca, eu não tiro nada (…).

RELATORA: E as suas despesas?

ACUSADO: Mínima, sozinho. Não vou a lugar nenhum, não gasto… Não saio, não vou a lugar nenhum, não bebo, não vou em bar, não faço nada.

RELATORA: E por que constava na contabilidade pagamentos a Bellini?

ACUSADO: Por que? Ah, só o César e, o César não, a Regina pode responder.

RELATORA: O senhor não sabe que negócio tinha com Bellini?

ACUSADO: De jeito nenhum, nem imagino porque pagamentos a Bellini, que serviços ele possa ter prestado ao escritório para fazer um pagamento.

RELATORA: E César? Fazia algum serviço para que o escritório devesse pagar?

ACUSADO: Diretamente não.

RELATORA: Mas ele retirava dinheiro no escritório?

ACUSADO: Se eram pagas ele tem que depois devolver no acerto de contas.

RELATORA: E isso sempre foi feito assim?

ACUSADO: Sempre. Depois que eu fiquei doente passou tudo para a mão dele.

RELATORA: Ele nunca acertou essas contas?

ACUSADO: Não, nunca fiz questão.

(omissis…)

RELATORA: E para pagamento do apartamento de Moema, 20 mil e apartamento de Moema, 90 mil? Bellini, 15 mil?

ACUSADO: Não, Bellini eu não sei, mais apartamento pode ter sido colocado como investimento e ia me dar um retorno maior. Com certeza, se foi para isso ia me dar um retorno maior.

RELATORA: O senhor adquiriu um apartamento em Moema?

ACUSADO: Não, não adquiri.

RELATORA: César adquiriu?

ACUSADO: Eu acho que é dele. Ele faz tanto rolo que é difícil… Eu posso me enganar… Compra, passa, troca, vende, pega de volta em outro rolo. Ele é assim e ganha dinheiro. Eu não consigo fazer isso mais ele faz com muita habilidade.

(omissis)

RELATORA: O senhor soube de um imóvel em construção que César comprou juntamente com Cícero Viana?

ACUSADO: Não sei se ele comprou, se ele entrou de sócio, se ele é participante, eu não queria que ele fizesse. Pessoalmente conversamos a respeito e eu era contra pelo fato de ser o Cícero Viana, que eu não confiava nele. Mas ele fez, mas não sei como fez, o que fez, se ganhou, perdeu, provavelmente perdeu. Mas não sei o negócio que foi feito, só ele pode dizer. Isso ele não conta para ninguém, só ele mesmo.

RELATORA: Mas foi com o dinheiro do escritório ou com o dinheiro dele?

ACUSADO: Uma parte do escritório, parece que uma parte ele tirou do escritório, mas como ele acreditava no negócio, ele é um investidor, ele cuida, ele é responsável. Se der prejuízo ele repõe.

RELATORA: O senhor autorizou?

ACUSADO: Não precisava autorizar, não existe autorização. Existe… Estamos conversando, você acredita? Eu não acredito. Você acredita? Então faz! Sabe, mas não… Não é: Não, não vai fazer, vamos brigar. Não, não é isso. Eu confio ou não confio.

RELATORA: Quando do escritório entrou nesse negócio?

ACUSADO: Ah… Acho que duzentos e poucos mil.

RELATORA: O senhor que fez o cheque?

ACUSADO: O cheque já estava assinado, se ele tirou… Foi só a Regina completar. Eu mando o cheque assinado.

RELATORA: Mas a Regina o consultou a respeito desse negócio?

ACUSADO: Não. Não, que a participação dela é muito pequena, ela se atém mais a parte jurídica mesmo.

RELATORA: Então pelo que eu entendi o César Herman tinha livre acesso e disponibilidade sobre o dinheiro do escritório?

ACUSADO: Financeira tinha, tinha. Com responsabilidade, né. Responsabilidade dele.

RELATORA: Sim, mas ele podia investir como bem entendesse?

ACUSADO: Podia.

Dos temos do interrogatório do co-réu AFFONSO PASSARELLI FILHO fica patente que sua participação no grupo se deu ao assumir a titularidade de escritório de advocacia — que há anos não exercia, dedicando-se, a bem da verdade, à revenda de veículos — conforme informado por D. F. B. (fls. 8.685), ex-companheira de CÉSAR HERMAN, tanta que sequer freqüentava o escritório, limitando-se a assinar cheques em branco para a movimentação das contas bancárias em nome do escritório, que recebia valores decorrentes da atividade criminosa, bem como de onde saiam os pagamentos de tantos quantos colaborassem na execução de tarefas afetas à mesma organização.

Cedeu seu nome para o escritório por meio do qual CÉSAR HERMAN movimentava-se com desenvoltura, dissimulando o real centro de atividade do referido escritório, qual seja intercâmbio de informações envolvendo investigações em cursos e/ou ações penais, central de recebimentos e pagamentos no interesse de vários integrantes da quadrilha.


Embora AFFONSO PASSARELLI tenha pretendido ocultar como se dava a sua participação e a de CÉSAR HERMAN, não logrou tal intento. Com explicações totalmente inverossímeis e muitas delas bisonhas, tais como a supostamente rentável advocacia mantida por ambos ao tempo que CÉSAR HERMAN estava afastado da Polícia Federal — por força de decisão administrativa estranhamento revogada depois -, a versão não se sustenta. Declarou ele, por exemplo, que o escritório, presentemente, ia muito bem, muito embora, daquele período, só tenha umas poucas ações, que não rendiam honorários. De tais declarações é possível se concluir que a pretensa expressiva advocacia de ambos, àquela época, não seria capaz de justificar a movimentação de valores necessários às aquisições de bens por CÉSAR HERMAN — não em nome próprio, mas em nome de terceiros, familiares e ex-companheiras — tanto que, segundo o declarado no curso do interrogatório, as ações que remanesceram daquela época nada rendem ao escritório. Os "honorários" eram decorrentes da atividade criminosa, e nutriam os pagamentos de tantos quantos colaboram na execução de tarefas afetas à mesma organização.

Assim é que dentre os documentos apreendidos, escritório AFFONSO PASSARELLI E GUIMIL, há correspondências datadas de 12/09/02 e 03/06/03, pelas quais são informados, à administração do condomínio à Av. Faria Lima, os nomes das pessoas que têm acesso às salas do escritório, inclusive nos fins de semana e feriados: JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA, CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ, ANTONIO AUGUSTO CÉSAR e LUIZ CARLOS ZUBCOV.

A importância do escritório do AFFONSO PASSARELLI e GUIMIL no esquema criminoso da quadrilha extrai-se do grande volume de documentos ali encontrados, relativos não só aos inquéritos policiais nos quais seus integrantes intervinham criminosamente, como exemplificado acima, como também aos processos judiciais, em larga escala afetos à 4ª Vara Criminal Federal, de titularidade do Juiz Federal JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS.

Dos documentos apreendidos, no curso das diligências de buscas e apreensões, ainda merecem registros os relativos ao interesse pessoal dos integrantes da quadrilha, atendidos pela estrutura do escritório em nome de AFFONDO PASSARELLI, a seguir apontados:

– documentos, em nome de ANGELA MARIA VILELA CHAGAS — ex-companheira de CÉSAR HERMAN, relativos ao veículo BMW, placa CHF 4444, datado de 1997;

– recurso administrativo contra multa incidente sobre o veículo acima apontado, desta feita já em nome D. F. B., outra ex-companheira de CÉSAR HERMAN;

– pagamento de conta da Eletropaulo, relativo ao ap. 1002, Al. Campinas 540, em nome de JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS;

– pagamento de condomínio em nome de JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, relativo ao Ed. World Square Flat, através do cheque n. 000594, emitido pelo escritório PASSARELLI;

– documentos relativos à compra, em nome do escritório PASSARELLI, de veículo Suzuki Vitara, placa CHR 5185, pago com cheque de CÉSAR HERMAN, no valor de R$ 22.000,00 (vinte e dois mil reais);

– pagamento de IPVA do veículo Ford/Memec, placa CKH 9959, em nome de JOSÉ AUGUSTO BELLINI;

– documentos relativos à venda de imóvel ocupado pela escola em nome de ANGELA MARIA VILELA CHAGAS, ex-companheira de CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ, sendo que o pagamento foi feito a este co-réu, em 01/12/00, no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais);

– procuração de LISANDRA GISELE VILELA CHAGAS, irmã de Ângela e a atual companheira de CÉSAR HERMAN, para Anderson de Oliveira, motoboy do escritório PASSRELLI, para realizar a transferência de propriedade do veículo placa CMM 3663, anteriormente em nome de MARIA LÚCIA PEREIRA, empregada de ANTONIO AUGUSTO CÉSAR, subprocurador-geral da República que também mantinha sala no conjunto do Escritório PASSARELLI, denunciado perante o STJ (Inq. 306/2004);

– licenciamento do veículo de placa CZK 7791, em nome da empresa de SÉRGIO CHIAMARELLI JR., CGC 040.589.940/0001-58;

– autorização de NORMA REGINA EMÍLIO CUNHA para que seu filho CAIO pudesse viajar com o pai, JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, datado de 1995;

– No Laudo nº 2.476-03, ainda relativo aos documentos apreendidos no escritório de AFFONSO PASSARELLI, estão descritos os cheques referentes à retirada de JOSÉ AUGUSTO BELLINI; no mesmo laudo há a descrição de documento no qual SANDOAR PAES DE FIGUEIREDO é indicado como testemunha de NORMA REGINA, na ação de reconhecimento de sociedade conjugal movida contra JÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS;

– Do Laudo nº 2.507-03, relativo a documentos também encontrados no escritório PASSRELLI, destaquem-se as declarações de ajuste anual do IRPF em nome de ANGELA MARIA VILELA CHAGAS, referentes ao exercícios de 2001, 2002 e 2003, nas quais há empréstimos para CÉSAR HERMAN, sendo que no exercício de 2003, este co-réu informou empréstimo de R$ 48.000,00 (quarenta mil reais) a JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, enquanto também apontava empréstimo recebido de AFFONSO PASSRARELLI para o mesmo ano base 2002, embora CÉSAR HERMAN declarasse ter em casa R$ 130.000,00 (cento e trinta mil reais);

– Em nome de Lisandra foi encontrada a declaração de ajuste anual, com base tributável de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), tendo, por outro lado, em casa R$ 20.000,00 (vinte mil reais);

– Em nome de D. F. B., embora sem atividade remunerada, as declarações de IRPF comprovam que mantinha U$ 20.000,00 (vinte mil dólares americanos) em casa, nos exercícios de 2001 e 2002;

– Correspondência de JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, datada de 1996, referente à transferência de linha celular 041 975-2837, para Ponta Grossa/PR, vinculada à linha fixa nº 042 224-0673, instalada à R. Padre João Lux, 747, em nome de ABRAÃO BARBOSA EMÍLIO, pai de NORMA REGINA;

– Do Laudo nº 2.476-03 constam documentos, também encontrados no Escritório AFFONSO PASSARELLI, relativos a assuntos pessoais de outros integrantes da quadrilha, tal como CASEM MAZLOUM, um vez que foram encontrados os requerimentos de passaportes de suas filhas KAREN, MARINA e NADIR, datados de 18/3/03.

– Pelo Laudo nº 2.478-03, verifica-se que JORGE LUIZ BEZERRA utilizou-se de minuta de recurso administrativo por CÉSAR HERMAN contra multa de trânsito.

– Do Laudo nº 2.478-03 consta a descrição de documentos relativa ao veiculo em nome de VAGNER ROCHA, Ford Explorer 1997, placa CKH 1001, datado de 02/7/02.

– Do laudo acima indicado, consta também, a descrição de documentos relativos ao processo nº 94.0025958-1, de interesse do co-réu CASEM MAZLOUM e de outros de interesse do mesmo co-réu;

– No Laudo n. 2.507-03 está descrito registro encontrado em agenda de recados, no escritório de AFFONSO PASSARELLI, dando conta do IPL 2 –2125/97 (processo nº. 97.0104268-9 — 5ª Vara Criminal Federal, conduzido pelo Delegado ELDO SARAIVA GARCIA, o QÜEM-QËUM, no qual consta como indiciado Alexandre Dalmy Jr., sendo que a intimação se deu via telefone do "Dr. Herman". O mesmo Delegado Garcia, o QÜEM-QÜEM, presidia o inquérito envolvendo as atividades da Universidade São Judas Tadeu (processo nº 2001.61.81.006258-0, distribuído à 3ª Vara Criminal Federal), cliente do escritório de AFFONSO PASSARELLI, como admitido em interrogatório, sendo de notar que seu nome faz parte da contabilidade os pagamentos mensais em torno de R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil reais);

– Outro documento, descrito no laudo indicado no item anterior, refere-se a anotações na agenda de recados, havendo um dirigido a JORGE LUIZ BEZERRA, datado de 06/01/03, dando conta que o Delegado da Polícia Federal Paulo Gomes ligar para avisar que marcara oitivas e precisava falar com ZUBCOV, outro Delegado da Polícia Federal aposentado, além de outros referentes aos denominados Caso Affair System e Caso Sardinhas Gomes da Costa.

A par da estrutura do escritório AFFONSO PASSARELLI e GÜIMIL, o grupo utilizava, freqüentemente, como local de "reuniões", o Restaurante ANGÉLICA GRILL, localizado na Av. ANGÉLICA nº 430 — Consolação, SÃO PAULO-SP, o que foi confirmado pelos réus, conforme termos dos interrogatórios.

Consoante as provas colhidas, os agentes públicos e os terceiros aqui acusados, formavam verdadeira rede articulada de laços, caracterizada pela associação permanente e estável, com grande mobilidade, influência e periculosidade, voltada à prática de atos criminosos e ímprobos, a cuja ação deletéria e perniciosa ficou exposta à sociedade.


VI.4 — Das relações delituosas mantidas dentre os integrantes da Quadrilha JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, CASEM MAZLOUM, JOSÉ AUGUSTO BELLINI, CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ, SÉRGIO CHIAMARELLI JR. e DIRCEU BEDRTIN

Nessa rede de agentes públicos, destacam-se o magistrado JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, o Agente da Polícia Federal CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ e o Delegado da Polícia Federal JOSÉ AUGUSTO BELLINI, dentre os mentores dos atos ilícitos.

Conforme a prova coligida, JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, Juiz titular da 4ª Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de São Paulo, atuava de sorte a garantir os resultados da ação dos demais integrantes da quadrilha, ao se valer do exercício da atividade jurisdicional para a realização de ilícitos por ela praticados.

Ainda, restou apurado que JOSÉ AUGUSTO BELLINI, que exercia a Chefia da Delegacia de Ordem Política e Social da Superintendência Regional em São Paulo, do Departamento e da Polícia Federal, então lotado na DELEMAF, bem como DIRCEU BERTIN, Delegado de Polícia Federal que exercia a função de Corregedor Regional de Polícia da Superintendência Regional da Polícia Federal de São Paulo, além de JORGE LUIZ BEZERRA DA SILVA, Delegado de Polícia Federal aposentado, autuavam oferecendo seus “serviços” a pessoas investigadas em inquéritos policias, cobrando e recebendo, para tanto, valores para remunerar a própria intermediação dos serviços ilícitos, bem como quantias destinadas ao pagamento de propinas (compreendendo valores ou favores) a servidores públicos, integrantes ou não da rede criminosa, em troca de proteção para as atividades ilícitas, ou ainda acobertando ou facilitando essas atividades.

Por seu turno, conforme restou demonstrado, CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ, Agente de Polícia Federal, é peça chave no esquema de ilícitos. Era destacado executor das atividades determinadas pelo demais integrantes do grupo, principalmente os magistrados JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS e CASEM MAZLOUM, atuando, também, no planejamento de diversos crimes e atos lesivos à probidade administrativa, pagando e recebendo vantagens indevidas, obtendo peças processuais, atuando no direcionando de investigações, inquéritos e processos judiciais criminais.

Como já destacado anteriormente, a falta de veracidade na declaração do co-réu AFFONSO PASSAREELI FILHO ficou mais patente, também, por força dos termos do depoimento de D., ex-companheira de CÉSAR HERMAN — que com ele conviveu naqueles anos nos quais esteve afastado da Polícia Federal — , ao declarar que César não auferia bons ganhos com a advocacia que fazia com Passrelli àquela época. Disse mais, que o patrimônio de CÉSAR HERMAN teria começado a se formar quando fazia a importação de veículos de luxo para a revenda.

Essa atividade de CÉSAR HERMAN remete à atuação do mentor JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, da qual se passa a tratar.

A intensa atuação da quadrilha estabeleceu tal grau de proximidade entre seus integrantes, que companheiras e ex-companheiras têm pleno conhecimento da ação de boa parte dos integrantes, participando em maior ou menor grau de ações da quadrilha.

Expressivo dessa circunstância é o que contém o MANDADO DE SEGURANÇA Nº 96.0105592-4, no qual é impetrante ÂNGELA MARIA VILELA CHAGAS (à época, companheira de CÉSAR HERMAN), sob o patrocínio de AFFONSO PASSARELLI FILHO, dirigido contra ato do INSPETOR DA RECEITA FEDERAL EM SÃO PAULO, para o fim de garantir a posse de seu automóvel marca BMW, placa CHF 4444, do ano de 1997. Vinha ela sendo ameaçada por auditores da Receita Federal que, fundamentados em ocorrência de fraude ao fisco quando da internalização do veículo, pretendiam a apreensão do bem. Foi requerida liminar inaudita altera pars.

O mandado de segurança foi encaminhado, em 01/12/96, ao juiz de plantão, que era o Juiz Federal JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, que, no mesmo dia, proferiu decisão para conceder medida liminar.

Em 02/12/96, uma vez levado a protocolo e conseqüente autuação, a distribuição automática encaminho à 1ª Vara Criminal. Neste mesmo dia o Juiz Federal Substituto desta Vara, MM. Juiz Dr. Paulo Sérgio Domingues, determinou o cumprimento do despacho.

Quando instado a se manifestar, o Ministério Público Federal, pelo Procurador da República Dr. Ângelo Roberto Ilha da Silva, opinou pela remessa ao juízo Cível, já que não havia elementos que apontassem para a prática delituosa — inaplicação do artigo 61 da Lei nº 5.010/1966. Acolhendo a manifestação ministerial, o Juiz Federal da 1ª Vara Criminal, Dr. Roberto Santoro Facchini, declinou de sua competência e determinou a remessa dos autos ao juízo Cível, em 10/10/97. Redistribuído à 21ª Vara Federal Cóvel, o MS foi sentenciado em 03/12/99 mantendo a decisão liminar, e procedendo à remessa oficial, pendente ainda de reexame pela 6ª Turma desta Corte.

Posteriormente, passou a figurar como patrono da impetrante JOSÉ GUILHERME CAVALHEIRO, ex-agente de Polícia Federal, demitido por decisão administrativa, mencionado durante as interceptações, nome constante do livro-caixa e muito ligado a CÉSAR HERMAM e a JOÃO CARLOS.

Um outro fato que demonstra as ligações entre JOÃO CARLOS e CÉSAR HERMAN é o fato de ter magistrado, aqui acusado, atuado como testemunha da então companheira do Agente da Polícia Federal, ANGELA MARIA VILELA CHAGAS, conforme teor de documentos encontrados no escritório de advocacia de AFFONSO PASSARELLI (laudo nº 2.479-03) em questão envolvendo o roubo do veículo Fiorino, de placa ADH-8392, adquirido por CÉSAR HERMAN, mas em nome de sua ex-companheira, que gerou a instauração de investigação no âmbito da Justiça Estadual (Inq. 770/95, processo nº 30675/95-9).

A propósito dessa forte ligação entre JOÃO CARLOS e CÉSAR HERMAN, que se manteve mesmo tendo o magistrado reassumido suas funções jurisdicionais, é de ser destacado, dentre o material apreendido — MB 04/03 (Escritório AFFONSO PASSARELLI e GUIMIL) itens 6.24 e MB 06/03 (casa de NORMA REGINA, itens 326, 327, 610 e 613 — os documentos relativos à minuta de hábeas corpus no interesse de J.C.M., encaminhado a CÉSAR HERMAN, além de cópias de peças de várias ações cíveis e criminais promovidas envolvendo os negócios de M. em duas empresas — Iderol e DVN Embalagens — encontradas na casa de NORMA. Tais documentos dão sentido à conversa captada no áudio 034230850018.C001, que registra conversa entre JOÃO CARLOS e CÉSAR HERMAN se referem a M. como mau pagador, razão pela qual não teria cobrado R$ 10.000,00 (dez mil reais) por um hábeas corpus. O conhecimento das pendências judiciais em face de M. comprova que JOÃO CARLOS e CÉSAR HERMAN atuaram como seus advogados, ainda que não tenham subscrito qualquer das petições, o que é compreensível pelos impedimentos legais em relação a ambos.

Esse episódio não é isolado. A respeito dessa prática, liberação de veículos durante plantões das varas criminais, foi indagado o MM. Juiz Federal Dr. HÉLIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA, ao ser ouvido como testemunha do juízo (termo às fls. 8.623/8.679).

Indagado sobre a reputação do acusado, JOÃO CARLOS DA ROCA MATTOS, declarou que seus colegas faziam relatos sobre plantões em finais de ano em que o doutor João Carlos teria liberado mercadorias ou veículos também sem a prévia oitiva do Ministério Público”.(fls. 8.624)

A propósito, quando do cumprimento do mandado de busca e apreensão na residência do Juiz Federal JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, dentre os documentos apreendidos merece destaque, pela pertinência aos fatos objeto do presente feito, o requerimento feito ao Corregedor Geral desta 3ª Região, na Representação n. 12/91, instaurada por força de provocação feita por Procurador da República, Dr. LUIZ FERNANDO AUGUSTO, então oficiante perante a 3ª Vara Criminal Federal, diante da atuação do réu, em substituição naquela por força do período de férias do Juiz Federal titular da mesma, durante o mês de janeiro de 1991.

Na representação então formulada, o órgão do MPF representante apontou, dentre as diversas irregularidades, a indevida liberação de veículos estrangeiros apreendido — processo nºs 8277532, de interesse de DALTON LUIZ MARCHIONI e 91.0100056-0, de interesse de ROJAS GRULON, sempre sem prévia oitiva do MPF. Em 1998, JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS requereu ao então Corregedor-Geral, Exmo. Des. Fed. MÁRCIO MORAES o arquivamento do procedimento, conforme cópia do documento apreendido, o que foi acolhido ao fundamento que decisões judiciais são atacáveis tão somente via recurso próprio, em 1999.


Diante de todos estes elementos — feitos identificado, documentos correspondentes e termos de depoimentos — patente está que não eram meros boatos e/ ou má interpretação a respeito das decisões do réu, JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, e, sim, a percepção de sua atuação delituosa,q eu encontrou no co-réu CÉSAR HERMAN o parceiro necessário para a sua continuidade.

Todavia, as mudanças legais acabaram por esvaziar o filão então explorado, demandando a busca de outras formas delituosas, que foram encontradas com a adesão de outros integrantes. Assim é que para a manipulação de inquéritos criminais, ou da ação penal, outros vieram a aderir.

VI.5 — Das relações delituosas entre JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ, AFFONSO PASSARELLI FILHO e SÉRGIO CHIAMARELLI JR.: O CASO SPLIT

O caso SPLIT, distribuído à 4ª Vara Criminal Federal, então da titularidade do co-réu JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS — no qual o co-réu SÉRGIO CHIAAMARELLI Jr. é acusado — é paradigmático para demonstração do uso do sistema de Justiça Criminal pelos integrantes da quadrilha para o cometimento de crimes.

Até antes de retornar aos quadros da Polícia Federal, CÉSAR HERMAM atuou como advogado de CHIAMARELLI. Na condição de agente da PF, não podendo advogar, lançou mão do disfarce por meio da sociedade de advogados, então constituída por PASSARELLI e Maria Regina Guimil, prima de CÉSAR.

Nesse feito de nº 96.0102108-6, JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, quando da instrução da ação penal, com o nítido propósito de manter sob seu controle todo e qualquer processo que envolvesse SÉRGIO CHIAMARELLI JÚNIOR, suscitou Conflito de Competência Positivo em face do Juízo da 3ª VarA Criminal, pelo qual tramitava a ação penal nº 2000.61.81.3633-3. O Conflito (nº 2000.03.00.053985-3) foi julgado pela 1ª Seção deste Colendo TRF-3ª Região, que decidiu pela competência, na hipótese, da 3ª Vara Criminal Federal.

Em corriqueiro o recurso à argüição de prevenção de feitos, nos quais o grupo criminoso tinha interesse na atuação jurisdicional do mentor, Juiz Federal JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS. Artificiosos fundamentos eram invocados para buscar caracterizar a prevenção de sorte a atrair outros feitos, de interesse da quadrilha e/ou de seus “clientes” — investigados e/ou acusados — e, quando perdia o controle da situação, o magistrado federal usava e abusava de todo e qualquer expediente para garantir o controle sobre certos processos.

Da sentença do chamado Caso SPLIT, cujos réus ENRICO PICCIOTTO, FRANCISCO CARLOS GERALDO CALANDRI GUIMARÃES, LÚCIO DIAS, IBRAHIM BORGES FILHO e SÉRGIO CHIAMARELI JÚNIOR haviam sido absolvidos por JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, houve recurso pelo Ministério Público Federal, julgado e inteiramente provido pela Egrégia 5ª Turma desta Corte, em substancioso acórdão de lavra do Relator, Exmo. Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE, conforme ementa que segue:

PROC.: 2003.03.99.025896-7 ACR 15735

ORIG. : 9601021086/SP

APTE. : Justiça Pública

APDO.: ENRICO PICCIOTTO

APDO.: FRANCISO CARLOS GERALDO CALANDRI GUIMARÃES

ADV.: SONIA COCHRANE RAO

ADV.: DORA MARZO DE A CAVALCANTI CORDANI

APDO.: SÉRGIO CHIAMARELLI JÚNIOR

ADV: JORGE LUÍS CARVALHO SIMÕES (Int. Pessoal)

APDO: LÚCIO DIAS

ADV.: HUMBERTO SANTANA

APDO.: IBRAIM BORGES FILHO

ADV. : OMAR FENELON SANTOS TAHAN

RELATOR: DES. FED. ANDRÉ NAVARRETE / QUINTA TURMA

EMENTA

PENAL. ART. 1º INCS I E II DA LEI Nº 8 137/90. E ARTS. 4º CAPUT E 7º INCS II E III, DA LEI Nº 7 492/86. PRELIMINAR DE INTEMPESTIVIDADE REJEITADA RECURSO INTERPOSTO DENTRO DO QÜINQÜIDIO LEGAL

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, DECIDE a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, à unanimidade, rejeitar a preliminar de intempestividade do apelo ministerial e julgar procedente a ação penal para condenar:

1) Enrico Picciotto a 04 (quatro) anos de reclusão e 288 (duzentos e oitenta e oito) dias-multa no valor de 01 (um) salário mínimo por infração ao artigo 1º incisos, I e II, da Lei nº 8.137/90; a 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 70 (setenta) dias-multa no valor de um salário mínimo por infração ao artigo 7º, incisos II e III, da Lei nº 7.492/86; e a 07 (sete) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 225 (duzentos e vinte e cinco) dias-multa no valor de um salário mínimo por infração ao artigo 4º da Lei nº 7.492/86, c.c. os artigos 29, 71 e 69 do Código Penal. Regime inicial fechado;

2) Francisco Carlos Geraldo Calandrini Guimarães a 04 (quatro) anos de reclusão e 288 (duzentos e oitenta e oito) dias-multa no valor de 01 (um) salário mínimo por infração ao artigo 1º, incisos I e II, da Lei nº 8.137/90; a 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 70 (setenta) dias-multa no valor de um salário mínimo por infração ao artigo 7º, incisos II e III, da Lei nº 7.492/86; e a 07 (sete) anos e 06 (seis) meses de reclusão e a 225 (duzentos e vinte e cinco) dias-multa no valor de um salário mínimo por infração ao artigo 4º da Lei nº 7.492/86, c.c. os artigos 29, 71 e 69 do Código Penal. Regime inicial fechado;

3) Sérgio Chiamarelli Júnior a 04 (quatro) anos de reclusão e 288 (duzentos e oitenta e oito) dias-multa no valor de 1/3 (um terço) do salário mínimo por infração ao artigo 1º, incisos I e II, da Lei nº 8.137/90; a 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e a 70 (setenta) dias-multa no valor de 1/3 (um terço) do salário mínimo por infração ao artigo 7º, incisos II e III, da Lei nº 7.492/86: e a 07 (sete) anos e 06 (seis) meses de reclusão e a 225 (duzentos e vinte e cinco) dias-multa no valor de 1/3 (um terço) do salário mínimo por infração ao artigo 4º da Lei nº 7.492/86. c.c. os artigos 29, 71 e 69 do Código Penal. Regime inicial fechado.

4) Ibraim Borges Filho a 04 (quatro) anos de reclusão e 288 (duzentos e oitenta e oito) dias-multa no valor de 1/3 (um terço) do salário mínimo por infração ao artigo 1º. Incisos I e II da Lei nº 8.137/90. c.c. o artigo 29 do Código Penal. Regime inicial semi-aberto.

5) Lúcio Dias a 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 180 (cento e oitenta) dias-multa no valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo por infração ao artigo 1º, incisos I e II, da Lei nº 8.137/90, c.c. o artigo 29 do Código Penal. Regime inicial aberto, substituída a pena segregativa por duas restritivas de direito, nos termos do voto do relator.

VI.6 — Da reintegração de CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ ao Departamento da Polícia Federal

A organização criminosa adquiriu maior abrangência com a volta de CÉSAR HERMAN RODRIGUEZ — mentor e executor — para os quadros da Polícia Federal, onde se valia de suas relações com os integrantes da corporação, tendo acesso a inquéritos policiais, e aos instrumentos de investigação, tais como as senhas conferidas a Delegados de Polícia (54) e a outros agentes policiais.

Após o período de afastamento, CÉSAR HERMAN continuou exercendo a advocacia por interpostas pessoas, recebendo honorários advocatícios, valendo-se de AFFONSO PASSARELLI FILHO e de sua prima Maria Regina Güimil. Junta-se a estas razões finais a cópia integral do processo administrativo que o reintegrou aos quadros da Polícia Federal, por ordem do então Ministro de Estado da Justiça, JOSÉ CARLOS DIAS. JOÃO CARLOS ROCHA MATTOS em muito contribuiu para o retorno de CÉSAR HERMAN, prestando depoimento como testemunha arrolada por este.

VI.7 — Do uso, pela quadrilha, de senhas concedidas por autoridades judiciais a fim de satisfazer interesse particular de CASEM MAZLOUM e da indevida requisição de inquérito policial para acobertar o uso de placas frias por membros da organização criminosa

Os integrantes da quadrilha se utilizavam, freqüentemente, de senhas concedidas judicialmente para o fim de serem obtidas informações junto às operadoras de telefonia, mediante autorização judicial. No presente processo, este fato é confirmado pela resposta da empresa VIVO, em atenção ao ofício 129/2004, juntando aos autos informações acerca das consultas realizadas pela agente de polícia federal Sílvia Regina Jasmin Ueda Romano e dos dados cadastrais das linhas telefônicas celular 11-9855-1566, 11-9984-6079 e 11-9606-3261 (fls 9279/8283), utilizados por Valdean Cardoso, pessoa que deveria ter conversações interceptadas por CÉSAR HERMAN a pedido do co-réu CASEM MAZLOUM, que se aproxima do grupo criminosos para dele auferir vantagens pessoais, e, para “retribuir” vem se valer de sua função jurisdicional para dar cobertura à ação delituosa dos demais.

Destaque-se que no Laudo nº 2.478-03, consta análise de cópia do pedido feito, em Agosto/03, pelo DPF Marcelo Sabadin Baltazar, então Chefe da Delegacia de Repressão a Crimes Previdenciários (DELEPREV) da SR/DPF/SP, dirigido ao Juiz Federal JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, para que a servidora Sílvia Regina Jasmim Ueda Romano fosse credenciada junto às operadoras telefônicas, prestadoras de serviços de telefonia fixo ou móvel, para obter qualificação completa de todos os usuários, conhecimento da ERB (Estação Rádio-Base) onde o usuário está, entre outras informações.

Obviamente, a concessão de senhas para acesso aos dados cadastrais e informações telefônicas é procedimento previsto em lei e útil à atividade policial, quando corretamente utilizadas. A senha tem prazo de validade determinado, usuário identificado e deve ser utilizada, única e exclusivamente, para levantar dados sobre pessoas investigadas, no âmbito da investigação criminal, sempre com a participação e acompanhamento do Ministério Público. No caso em tela, porém, os integrantes do grupo valiam-se dessa autorização judicial para obter informações e outros dados de interesse da quadrilha, vale dizer, interesses escusos e ilícitos.

Comprovado ficou nestes autos que CÉSAR HERMAN RODRIGUES obtinha informações cadastrais acobertadas pelo sigilo usando senhas que eram concedidas para a polícia no curso de investigações criminais, portanto, violando as normas da Lei nº 9.296/1996 e incidindo nas penas previstas no artigo 10, pois que obtinha dados com objetivos não autorizados pelo diploma legal citado e ainda que forjava explicações para acobertar suas atividades ilícitas.

Amigo há vários anos de JOÃO CARLOS, foi irregularmente cedido ao Foro Federal Criminal desta Seção Judiciária, a pedido do também co-réu Juiz CASEM MAZLOUM, titular da 1ª Vara Federal Criminal, que o requisitou na qualidade de Coordenador do Fórum Criminal.

A irregular convocação de CÉZAR HERMAN se insere nas manobras idealizadas pelos co-réus JOÃO CARLOS e CASEM MAZLOUM para justificar a infundada e criminosa forma de obtenção de placas de uso reservado da Polícia Federal.

Assim é que o Juiz Federal CASEM MAZLOUM , requisitou, em 28.06.2002, na qualidade de Juiz Federal Coordenador do Fórum Criminal Federal, a instauração de Inquérito Policial à Polícia Federal em São Paulo, sob o pretexto da ocorrência de supostos delitos previstos nos artigos 344 e 288 do Código Penal (fls. 86/87), alegando, através do Ofício nº 124/02 Gab, que "pode haver alguma organização criminosa, possivelmente ligada ao tráfico internacional, interessada em intimidar, ou, de outra forma, colocar em risco a segurança dos magistrados deste fórum criminal, não havendo outra explicação para o fato de uma pessoa do sexo feminino ter levantado as placas dos veículos dos Juízes, senão para a obtenção de seus endereços, a serviço de interesses escusos de possível organização criminosa."

A requisição assim formulada resultou na instauração do Inquérito Policial nº2-1538/02, curiosamente distribuído à Delegada VERA CRISTINA VIEIRA DE MORAES, sobrinha do co-réu Juiz Federal JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, e que exercera a advocacia com CÉSAR HERMAN antes de este retornar à Polícia Federal. Cumpre lembrar que JOÃO CARLOS era investigado, à época, pelo mesmo delito-adulteração de sinal exterior de veículo. No âmbito judicial, aquele inquérito policial foi distribuído à 7ª Vara Criminal Federal, sob nº 2002.61.81.004859-9, então titularizada pelo Juiz Federal ALI MAZLOUM.

Em 12.07.2002, a Delegada VERA CRISTINA fez expedir o Ofício 22.410/02 (fls. 90) dirigido a CASEM MAZLOUM, ao término do qual solicitou-lhe que informasse sobre a "existência de ameaça à integridade física ou moral de qualquer magistrado federal, e que as cópias das respectivas representações por ameaça, eventualmente existentes, sejam encaminhadas a esta Polícia Federal".

Em 20.08.2002, CASEM MAZLOUM faz circular entre os Juízes Federais criminais o Ofício Circular nº 06/2002, através do qual solicitou "providências.cabíveis no sentido de informar a esta Coordenadoria, a respeito de ameaça à integridade física ou moral de qualquer magistrado federal, afim (sic) de colocar com o competente inquérito policial em curso, naquele departamento de Policial Federal".

Sintomaticamente, os dois únicos magistrados federais que responderam a este ofício, alegando estar sofrendo ameaças através de ligações telefônicas não identificadas, foram JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS e ADRIANA PILEGGI DE SOVERAL, ambos então também investigados pela

[Notícia alterada em 26 de julho de 2012, às 14h29, para supressão de dados pessoais.]

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