Acompanhamento processual

Sistema informatizado não deve ser usado para controlar prazos

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18 de outubro de 2004, 11h51

O sistema informatizado do Poder Judiciário é um serviço auxiliar de acompanhamento processual. Por isso, não deve ser usado para o controle dos prazos pelos advogados. O entendimento da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Cabe recurso.

De acordo com os autos, a Liberty Paulista Companhia contestava a sentença que a condenou. No entanto, o recurso foi protocolado quando já estava vencido o prazo de 15 dias, contado a partir da data da juntada aos autos do Aviso de Recebimento (AR) da Carta de Citação.

A empresa alegou que foi induzida em erro pelo sistema informatizado de acompanhamento processual, assim como por funcionária do Cartório, por obter informação incorreta quanto ao dia da juntada da citação aos autos, segundo o TJ-RS.

O relator do recurso no TJ gaúcho, desembargador Artur Arnildo Ludwig, explicou que a parte demandada em ação judicial, no momento do recebimento da Carta de Citação, já toma conhecimento do início do prazo contestacional de 15 dias. Desta forma, discorda o argumento da indução em erro. “Na prática, o réu ainda será beneficiado com alguns dias de ganho, se considerarmos aquele período em que se aguarda a juntada do Aviso de Recebimento”.

Destacou que é função do advogado diligente o acompanhamento efetivo do processo e não está dispensada sua presença no local. O procedimento deve ser feito “principalmente quanto aos atos que independem de publicação”. Sublinhou, ainda, que a apelação foi interposta 21 dias após o AR ser juntado aos autos, “sendo, portanto, corretamente consideradas extemporâneas pelo magistrado de 1º Grau”.

Processo nº 70008133027

Leia o acórdão

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE VEÍCULO. NEGATIVA DE PAGAMENTO POR AGRAVAMENTO DO RISCO.

CONTESTAÇÃO INTEMPESTIVA. CONTAGEM DO PRAZO. REVELIA.

Nos termos do Código de Processo Civil em vigor, o prazo de quinze dias para oferecer contestação inicia-se a partir da juntada aos autos do aviso de recebimento. Trata-se, o sistema informatizado do Poder Judiciário, de serviço auxiliar de acompanhamento processual, não se prestando para o controle dos prazos pelos advogados, que devem, impreterivelmente, observar a legislação processual vigente. Intimada pessoalmente, a parte ré tem plena ciência do prazo para resposta, devendo o advogado verificar em cartório a data em que se inicia a contagem do referido prazo, que independe de publicação.

MÉRITO. AGRAVAMENTO DO RISCO PELA SEGURADA. NÃO CARACTERIZADO. RECONHECIDA A RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA EM INDENIZAR.

APELO PROVIDO, EM PARTE, APENAS PARA DEDUZIR-SE DA CONDENAÇÃO O VALOR CORRESPONDENTE À FRANQUIA DO SEGURO, BEM COMO READEQUAR A INCIDÊNCIA DOS JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.

Apelação Cível

Nº 70008133027

Sexta Câmara Cível

Comarca de Cachoeirinha

LIBERTY PAULISTA COMPANHIA DE SEGUROS

APELANTE

VANIA GRITTI

APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, dar provimento, em parte, ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, os eminentes Senhores DES. CARLOS ALBERTO ALVARO DE OLIVEIRA (PRESIDENTE E REVISOR) E DES. ANTÔNIO CORRÊA PALMEIRO DA FONTOURA.

Porto Alegre, 09 de junho de 2004.

DES. CARLOS ALBERTO ALVARO DE OLIVEIRA

PRESIDENTE, VOTO VENCIDO

DES. ANTÔNIO CORRÊA PALMEIRO DA FONTOURA

VOGAL

DES. ARTUR ARNILDO LUDWIG,

RELATOR.

RELATÓRIO

Des. Artur Arnildo Ludwig (RELATOR)

Trata-se de apelação interposta por LIBERTY PAULISTA SEGUROS contra sentença proferida nos autos da ação de cobrança de indenização de seguro ajuizada por VÂNIA GRITTI, em desfavor da apelante, junto à Comarca de Cachoeirinha.

Entendeu, o magistrado a quo, em decretar a revelia do réu, tendo em vista que a contestação foi protocolizada quando já vencido o prazo de 15 dias para resposta, contado a partir da data da juntada aos autos do Aviso de Recebimento (AR) da Carta de Citação. Assim, julgou a ação procedente, condenando a requerida no pagamento à autora, da quantia pleiteada na inicial, correspondente a R$ 10.891,00, mais as despesas de guincho, no montante de R$ 50,00, valores corrigidos pelo IGP-M, a partir da data do orçamento realizado (05.07.2002) e acrescidos de juros legais, contados da data do fato. Condenou, ainda, a ré, no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 15% sobre o valor da condenação.

Em sua inconformidade, alega, a apelante, que foi induzida em erro pelo sistema informatizado de informações processuais, bem como por funcionária do Cartório, por obter a informação incorreta de que a citação havia sido juntada aos autos na data de 10.10.2002. Aduz que não pode ser prejudicada por erro de terceiros, pedindo o afastamento da revelia. No mérito, sustenta a tese de culpa e agravamento do risco, por parte da segurada, uma vez que teria deixado o carro com o porta-malas e a porta do motorista abertos, com a chave de ignição colocada sobre o banco. Alega que tal circunstância, provocada pela própria segurada, tem o condão de eximir a seguradora do pagamento da indenização, com base no contrato e nos termos do art. 1.454, do Código Civil.


Alternativamente, pede seja deduzido, da condenação, o valor referente à franquia estipulada no contrato que, no caso, é de R$ 500,00. Ainda, pleiteia a incidência da correção monetária somente a partir do ajuizamento da demanda, bem como dos juros moratórios no índice de 6% ao ano, a partir da citação. A final, pede a redução da verba honorária para 10% do valor da condenação, tendo em vista a singeleza da demanda.

O apelo foi recebido no duplo efeito (fl. 97).

Em contra-razões, a autora pede o desprovimento do apelo e a manutenção da sentença recorrida.

Nesta instância, vieram os autos conclusos para julgamento.

Não é caso de intervenção do órgão do Ministério Público.

É o relatório.

VOTOS

Des. Artur Arnildo Ludwig (RELATOR)

Senhores Desembargadores.

Não há como ser afastada a revelia no presente feito, como pretende o recorrente.

Alega, o apelante, que foi induzido em erro por informação equívoca prestada por funcionária do Cartório, bem como pelo sistema informatizado de andamento processual, tendo em vista que ali teria sido indicado erroneamente, como dies a quo do prazo para resposta, data diversa daquela em que efetivamente foi juntado o Aviso de Recebimento do Mandado de Citação.

Quanto ao alegado, entendo necessárias algumas considerações iniciais.

O sistema informatizado implantado pelo Poder Judiciário sem dúvida foi criado com o intuito de proporcionar aos servidores, advogados e partes um controle mais rápido e eficaz da movimentação processual, sem burocracias.

Assim, os passos da tramitação de um processo passam a estar retratados pelo rol de movimentações disponíveis no sistema, permitido o seu acesso ao usuário tanto pelos terminais de atendimento, quanto pelo site do Tribunal de Justiça, disponibilizado na rede mundial de computadores – Internet.

No entanto, em que pese estas informações serem oficiais, pois alimentadas por prepostos do poder judiciário, tratam-se, na verdade, de relatórios de cunho administrativo, sem qualquer efeito de natureza processual, não se prestando, por isso, a dilatar prazos peremptórios.

A lei processual civil é clara ao fixar seus prazos, indicando a sua forma de contagem, assim como seu termo inicial.

Quando a citação do réu é feita por Carta, como no caso dos autos, o prazo de quinze dias para contestação inicia-se a partir da data da juntada do Aviso de Recebimento aos autos. Isto é determinado pelo art. 297 e art. 241, inciso I, do Código de Processo Civil.

Ora, a parte que é demandada em ação judicial, no momento em que recebe a Carta de Citação, para responder no prazo de quinze dias, já toma ciência do início desse prazo contestacional. Sendo que, na prática, o réu ainda será beneficiado com alguns dias de ganho nesse prazo, se considerarmos aquele período em que se aguarda a juntada do Aviso de Recebimento.

No entanto, é função do advogado diligente o acompanhamento efetivo do processo, não sendo dispensada a sua presença no Cartório, para verificação do andamento processual, principalmente quanto aos atos que independem de publicação.

No caso concreto, a citação foi efetivada em 27.09.2002, sendo o AR juntado aos autos somente em 02.10.2002 (fl. 30 verso), quando então começou a fluir o prazo para oferecimento da contestação, independentemente de qualquer movimentação no sistema informatizado.

Assim, o termo final para apresentação da resposta seria no dia 17.10.2002. As contra-razões foram protocolizadas somente em 23.10.2002, sendo, portanto, corretamente consideradas extemporâneas pelo magistrado de primeiro grau.

Concluo que de forma alguma houve a alegada indução em erro por parte do Cartório, nem esta poderia ocorrer, a partir do momento em que houve a citação pessoal do demandado.

Quando se faz uma determinada consulta no sistema virtual de andamento de processos, observa-se a presença de duas colunas: à esquerda encontram-se as datas e, imediatamente ao lado, na coluna da direita, as correspondentes movimentações.

As datas ali consignadas (esquerda) referem-se única e exclusivamente ao dia em que foi incluída a respectiva movimentação, pelo servidor, não podendo, por isso, ser consideradas para contagem dos prazos processuais, que estão claramente definidos no CPC.

O acúmulo de serviço verificado nos cartórios judiciais, o que é sabido, principalmente pelos profissionais que atuam na área do Direito, impede a desejável atualização diária das movimentações dos processos que ali tramitam. Em outras palavras, nem sempre o dia da alimentação do sistema informatizado corresponderá ao dia em que aquele ato efetivamente ocorreu, de modo que ainda há a necessidade do acompanhamento no balcão do Cartório.

E, ainda, considerando que o sistema informatizado ainda não está perfeitamente estruturado para retratar fielmente a posição em que se acha cada processo, com a definição inicial dos prazos etc, não há como dispensar a presença do advogado no cartório, para o acompanhamento processual, principalmente quando se discutem prazos que terão início independentemente de publicação.


Segundo o apelante, a última movimentação constante para o processo e que o teria induzido em erro, era datada de 10.10.2002 e consignava o seguinte: “Aguarda decurso de prazo”. Ora, não mencionou, o apelante, a existência de qualquer indicação quanto à data da juntada do AR aos autos, pelo que este jamais poderia ser ‘deduzido’ pela parte.

Admitir-se a dilação deste prazo, peremptório, por ter havido indução a erro pelo sistema de informática, significaria uma violação a dispositivo constante na legislação processual civil pátria, pois assim dispõem o art. 183, do CPC e seu parágrafo primeiro:

Art 183. Decorrido o prazo, extingue-se, independentemente de declaração judicial, o direito de praticar o ato, ficando salvo, porém, à parte provar que o não realizou por justa causa.

§ 1o Reputa-se justa causa o evento imprevisto, alheio à vontade da parte, e que a impediu de praticar o ato por si ou por mandatário.

Este posicionamento já foi adotado em outros julgados deste Tribunal:

“(…) os advogados da parte sabem, ao menos, a data da intimação pessoal para contestação, possuindo, na verdade, um pouco mais do que o prazo legal porque o mandado sempre demora um pouco a ser juntado aos autos; o certo é que, ao contrário do que alega a parte, o site fornece mera consulta e não dispensa que a parte se certifique, e peça certificação oficial ao secretário competente, do andamento processual do feito.(Transcrição parcial do voto do Relator no AGRAVO REGIMENTAL Nº 70004690822, SEXTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: ANTÔNIO CORRÊA PALMEIRO DA FONTOURA, JULGADO EM 30/10/2002)”

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACAO REVISIONAL. INTEMPESTIVIDADE DA CONTESTACAO. JUNTADO AOS AUTOS O MANDADO DE CITACAO, DESTA DATA FLUI O PRAZO PARA A CONTESTACAO, DESCABENDO PRORROGACAO SE INOCORRENTE QUALQUER EFETIVO OBSTACULO A AUTORIZAR A REABERTURA DO PRAZO. RELATORIOS DO SISTEMA INFORMATIZADO SAO LEVANTAMENTOS DE CUNHO ADMINISTRATIVO QUE, POR SI SO, NAO AUTORIZAM PRORROGACOES DE PRAZOS PEREMPTORIOS. AGRAVO IMPROVIDO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 70001389584, DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: ELAINE HARZHEIM MACEDO, JULGADO EM 31/10/2000).”

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. PERDA DO PRAZO PARA CONTESTAÇÃO. TERMO INICIAL DO PRAZO É A DATA DA JUNTADA AOS AUTOS DO AVISO DE RECEBIMENTO. DESIMPORTA A DESATUALIZAÇÃO DO SISTEMA INFORMATIZADO. DEVER DO ADVOGADO DE ACOMPANHAR O PROCESSO, EM CARTÓRIO, PRINCIPALMENTE QUANTO AOS ATOS QUE INDEPENDEM DE PUBLICAÇÃO. REVELIA MANTIDA. Agravo de instrumento improvido. (AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 70005801592, DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: ALEXANDRE MUSSOI MOREIRA, JULGADO EM 08/04/2003).”

Quanto à alegação de que a informação errada foi confirmada por funcionária da Vara, quando em contato telefônico, não pode ser considerada, visto que se tratou de mera alegação, sem qualquer prova. Ademais, como já foi dito, a obrigação do advogado que recebe procuração da parte para agir em seu nome e na defesa de seus interesses, é o acompanhamento de todos os atos processuais, diligenciando junto ao Cartório, quando tais atos independem de publicação, seja pessoalmente, seja através de estagiário de Direito que execute a tarefa.

Nesse sentido, trago parte do voto do eminente Colega Cacildo de Andrade Xavier, no julgamento do Agravo de Instrumento nº 70003468170, quando menciona sua decisão que indeferiu o pedido de efeito suspensivo:

“No caso concreto, a fundamentação é irrelevante. Ocorre que juntado o aviso de recebimento da Carta de Citação em 08 de junho, uma sexta-feira, o prazo para contestação terminou no dia 25 de junho, uma segunda-feira.

As razões de contestação, datadas de 28 de junho, deram entrada em cartório dia 29 de junho, portanto, intempestivamente.

As alegações de que o atraso se deveu a deficiências de informações obtidas por telefone, por óbvio que não prosperam. Não calha a alegação de que a ré, ora agravante, foi “induzida em erro pelo cartório”. (AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 70003468170, SEXTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: CACILDO DE ANDRADE XAVIER, JULGADO EM 27/02/2002)”

Destarte, constatando-se que não ocorreu nenhuma das hipóteses previstas no parágrafo primeiro, e tendo em vista ser perfeitamente possível o acompanhamento processual junto ao Cartório, não há como se acolher o pedido deduzido em sede de apelação, para que seja afastada a revelia.

No que tange à questão de fundo da demanda, tenho que o apelo também não merece prosperar.

A contratação do seguro é fato certo e incontroverso.

Da mesma forma, é evidente a vigência do contrato de seguro na data da ocorrência do sinistro.

Pretende, a apelante, a exclusão da sua obrigação de indenizar, alegando, como fundamento para tal, o agravamento do risco pela apelada, por facilitar o evento danoso.


O art. 1.454 do Código Civil de 1916, vigente à época da contratação e do sinistro, assim determinava:

Art. 1.454. Enquanto vigorar o contrato, o segurado abster-se-á de tudo quanto possa aumentar os riscos, ou seja contrário aos termos do estipulado,sob pena de perder o direito ao seguro.

Em face da redação conferida ao citado comando legal gerou-se uma discussão doutrinária e jurisprudencial a respeito da necessidade ou não de intencionalidade dessa conduta do segurado, para configurar-se o agravamento do risco.

A jurisprudência, então, inclinou-se pela necessidade de comprovação da intencionalidade do agir do segurado, no sentido de se agravar o risco, o que, finalmente, restou chancelado pelo atual art. 768, da novel codificação civil.

Assim define o citado dispositivo:

Art. 768. O segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato.

A conclusão a que se chega, portanto, é que de acordo com a orientação doutrinária e jurisprudencial adotada, e agora nos termos do novo comando legal, não basta mera negligência ou imprudência por parte do segurado, para excluir-se da seguradora o dever de indenizar. Mais que isso, é necessário que se prove que a conduta de agravamento do risco foi intencional, por parte do segurado.

No caso concreto, o apelante limita-se a referir que houve agravamento do risco por culpa da recorrida, pois ela teria deixado o bem segurado estacionado em frente ao seu prédio, com as portas abertas e a chave no banco do motorista.

Ora, ao que me parece, de modo algum houve conduta intencional da recorrida em agravar o risco.

Pela declaração acostada à fl. 49 dos autos, extrai-se claramente que a apelada estaria retirando seus pertences do carro, para tão somente deixá-los junto à escadaria do seu prédio, quando então retornaria, em seguida, ao automóvel. Nesse curto lapso de tempo, ocorreu o roubo e a colisão do veículo, o que originaram as avarias demonstradas.

O que transparece é que sequer houve previsão do ocorrido, por parte da segurada, que provavelmente julgava-se em segurança, atitude comum de quem se encontra em frente a sua residência, mesmo que na via pública.

De todo modo, a ré, ora apelante, não logrou trazer aos autos qualquer elemento concreto de prova que pudesse demonstrar a intencionalidade da conduta perpetrada pela autora, em agravar os riscos do bem segurado.

E assim reza o art. 1.456, do Código Civil/1916:

Art. 1.456. No aplicar a pena do art. 1.454, procederá o juiz com equidade, atentando nas circunstâncias reais, e não em probabilidades infundadas, quanto à agravação dos riscos.

Levando-se em conta que o apelante trabalhou aqui com meras probabilidades, uma vez que não comprovou suas alegações, tenho que permanece a obrigação da seguradora em indenizar a autora, segurada.

Quanto ao pedido para dedução da franquia, do valor da condenação, merece ser provido o apelo. Com efeito, não há como se condenar a demandada, sem realizar o desconto de R$ 500,00, referente ao valor estipulado para a franquia para o seguro. Necessária a concessão desse desconto para que restem preservados o equilíbrio contratual e a boa-fé, princípios que devem balizar qualquer avença.

No que tange aos juros moratórios, também procede o apelo, em parte.

A verba devida em razão da condenação deve ser acrescida de juros pela demora no pagamento, juros estes que serão devidos somente a partir da citação e não da data fato, como consignou a sentença, nos termos do art. 219, do Código de Processo Civil.

Contudo, esses juros devem ser incidentes no índice de 6% ao ano, desde a citação, até à data em que vigorou o Código Civil de 1916, sendo que, a partir da entrada em vigor do novo Código Civil de 2002, devem passar a ser de 12% ao ano, forte no art. 406, do referido diploma legal e art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional.

Quanto à correção monetária, impossível considerá-la somente a partir do ajuizamento da demanda, como pleiteia o apelante. O objetivo da atualização é justamente manter o poder aquisitivo da moeda, em face do desgaste inflacionário a que está submetida. Caso fosse reconhecido o pedido da recorrente, a autora restaria prejudicada, por isso, mantenho a correção monetária fixada na sentença.

Por derradeiro, desacolho o pedido para redução da verba honorária, pois verifico que foi bem fixada pelo magistrado, que atentou aos critérios legais dispostos no § 3º do art. 20, do Código de Processo Civil.

Ante o exposto, dou provimento em parte ao apelo, apenas para deduzir da condenação o valor da franquia do seguro, bem como adequar a incidência dos juros e da correção monetária.

É o voto.

DES. CARLOS ALBERTO ALVARO DE OLIVEIRA (PRESIDENTE E REVISOR)


Eminentes Colegas, peço licença para divergir do eminente Relator. Esta Câmara, talvez com outra composição, em acórdão por mim relatado, entendeu que os registros do Serviço de Computação no Tribunal geram uma expectativa no jurisdicionado. Ao meu ver, temos que fazer uma distinção. Uma coisa são as informações prestadas pelo Serviço de Informações Judiciárias, que são serviços privados, e outra coisa são as informações prestadas pelo Serviço de Computação do Tribunal de Justiça, serviços estes do próprio Tribunal, que são públicos. Então, estes geram uma expectativa que, se for defraudada, viola o princípio da confiança legítima nos atos da Administração, princípio este que hoje é pacífico na doutrina do Direito Administrativo.

Na espécie, conforme consta de f. 60, no controle de processos do Tribunal de Justiça, da Comarca de Cachoeirinha, verifica-se o seguinte: a distribuição foi realizada em 27 de agosto de 2002, e, logo em seguida, vem uma outra movimentação dizendo: “10-10-2002 – aguarda o decurso do prazo”. Então, não há dúvida de que, neste caso concreto, a parte foi prejudicada.

Com efeito, a falha apontada na apelação decorre do próprio Estado, por defeito nos registros eletrônicos do processo no próprio serviço judiciário.

Nessas circunstâncias, interfere em prol do jurisdicionado o princípio da proteção da confiança legítima. Princípio esse que, consoante a melhor doutrina, permite o reconhecimento da proteção da boa-fé no direito público, na medida em que o cidadão deve presumir que os órgãos públicos agem de maneira regular, circunstância que o leva legitimamente a confiar na aparência de direito, suscitada pelo Estado, conforme a teoria do direito privado da aparência.

Daí, a conclusão de U. Gueng (Zur Verbindlichkeit verwaltungsbehördlicher Auskünfe und Zusagen, ZBl, 71/1970, 449-465, 473-489, 497-512, St. Gallen, 1971, nº de margem 9) no sentido de que “o cidadão não deve ser obrigado a sofrer as conseqüências desfavoráveis do erro das autoridades”. Como bem ressalta J. Mainka (Vertrauenschutz im öffentilichen Recht, Bonn, Röhrscheid, 1963, 40, nota 194), “a boa-fé do cidadão deve ser protegida quando tenha ele sido induzido em erro pela pessoa de direito público”, erro que inclusive pode consistir em uma informação falsa (B. Weber-Dürler, Vertrauensschutz im öffentlichen Recht, Basel u. Frankfurt a.M, Helbing & Lichtenhahn, 1983, 18, nota 27).

Essa, aliás, a orientação mais recente da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, de que é exemplo o acórdão da 1a. Turma, no REsp 390.561, rel. o Min. Humberto Gomes de Barros, prolatado em 18.6.2002, DJ de 26.8.2002, p. 175, in RSTJ, 162/116 encimado desta ementa:

“PROCESSUAL – PRAZO – JUSTA CAUSA INFORMAÇÕES PRESTADAS VIA INTERNET – ERRO – JUSTA CAUSA – DEVOLUÇÃO DE PRAZO – CPC, ART. 182.

– Informações prestadas pela rede de computadores operada pelo Poder Judiciário são oficiais e merecem confiança. Bem por isso, eventual erro nelas cometido constitui “evento imprevisto, alheio à vontade da parte e que a impediu de praticar o ato.”. Reputa-se, assim, justa causa (CPC, Art. 183, § 1º), fazendo com que o juiz permita a prática do ato, no prazo que assinar. (Art. 183, § 2º).”

Em igual perspectiva, a 4a. Turma, rel. o Min. Barros Monteiro, REsp 49.456/DF, j. em 25.10.1994, DJ de 19.12.1994, p. 35.321, acórdão assim ementado:

“APELAÇÃO. TEMPESTIVIDADE. ADVOGADO RESIDENTE FORA DA SEDE DO PROCESSO. INFORMAÇOES ERRONEAS ORIUNDAS DA SECRETARIA SOBRE A EPOCA DE INTIMAÇÃO DA SENTENÇA, INCLUSIVE VIA SISTEMA DE COMPUTADOR. É SUSCETIVEL DE OCASIONAR A SUSPENSÃO DO PRAZO O EMBARAÇO PROCESSUAL PROVENIENTE DE INFORMAÇÃO EQUIVOCADA PRESTADA PELA SECRETARIA DO JUIZO. APLICAÇÃO DOS ARTS. 183 E § 1º E 507 DO CPC.

RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.”

Ressaltando a boa-fé, assim se pronunciou a 4a. Turma, em acórdão relatado pelo Min. Sálvio de Figueiredo (RESP 41.497/RJ, DJ de 24.10.1994, p. 28.762), com esta ementa:

“PROCESSO CIVIL. SEMANA SANTA. AVISO DA CORREGEDORIA-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO. PREVISÃO EXPRESSA DE SUSPENSÃO DOS PRAZOS PROCESSUAIS. RECONHECIMENTO DE TAL EFEITO NO ARESTO RECORRIDO. INVOCAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 184, § 1º, CPC. NORMA DE APLICAÇÃO RESTRITA AOS CASOS DE PRORROGAÇÃO. INDUZIMENTO A ERRO. ESCUSABILIDADE. LEGISLADOR ESTADUAL. RECURSO ACOLHIDO.

I – Impõe-se considerar o período da semana santa, no plano da legislação federal, em principio, como de “feriados contínuos ou consecutivos”, não havendo, pois, que se falar em suspensão dos prazos processuais, mas tão-somente – e isso nas hipóteses em que o inicio ou o término do prazo recaia em um dos dias de tal período – em prorrogação (art. 184, § 1º, CPC).

II – Buscando exegese construtiva, que melhor atenda à realidade forense, em harmonia com o sistema legal, conclui-se que, excluída a hipótese de “recesso”, os feriados, mesmo quando contínuos, consecutivos (‘verbi gratia’, os da semana santa), não tem o condão de suspender prazos. Apenas prorrogam o vencimento para o primeiro dia útil.

III – Se, diante de previsão expressa estabelecida em aviso da corregedoria-geral de justiça, a parte age na convicção de que suspensos os prazos durante o interregno da semana santa, resta evidenciada a sua boa-fé, cumprindo, caso atestada a incompetência de referido órgão judiciário para dispor acerca da matéria, reconhecer presente a justa causa a que alude o art. 183, CPC.

IV – Nada impede que o legislador local, deixando sua habitual timidez, evolua no sentido de dar vida ao comando constitucional sediado no inciso XI do art. 24 da Lei Maior, contribuindo eficazmente para o aprimoramento da tutela jurisdicional, atentando especialmente para as peculiaridades regionais deste País de dimensões continentais, adotando, para exemplificar, regras concernentes a ritos e prazos.”

Assim, com a vênia do eminente Relator, estou provendo o recurso, para cassar a sentença e determinar que seja realizada a instrução probatória, nos termos requeridos na contestação da demandada.

É o meu voto.

DES. ANTÔNIO CORRÊA PALMEIRO DA FONTOURA – Com a vênia do eminente Presidente-Revisor, estou acompanhando o Desembargador-Relator.

Julgador(a) de 1º Grau: HILBERT MAXIMILIANO AKIHITO OBARA

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