De papel passado

Amante perde direito trabalhista se viúva tiver certidão de casamento

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15 de outubro de 2004, 14h16

As verbas trabalhistas devidas a empregado morto devem ser pagas pela empresa à viúva que apresentar certidão de casamento e não à companheira estável. O empregador também não está obrigado a ajuizar ação de consignação em pagamento, por dúvida sobre a herdeira do trabalhador.

Com esse entendimento os juízes da 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região acataram Recurso Ordinário movido pela empresa Plásticos Metalma S/A contra sentença da 65ª Vara do Trabalho de São Paulo, que reconheceu à companheira estável o direito a metade das verbas rescisórias do Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho.

O juiz Fernando Antonio Sampaio da Silva, relator do recurso, esclareceu que a Constituição Federal autoriza que se institua o companheiro como beneficiário, desde que tenha sido desfeito, de fato ou de direito, o casamento.

“Mas a situação ‘sub judice’ é exatamente oposta. O casamento civil ocorreu após — e muito após — a união estável, cuja extinção presume-se, deste o ato solene e formal do matrimônio. Vale dizer que o casamento civil fez cessar — de pleno direito — a situação da companheira da reclamante, para efeito do contrato de trabalho, ainda que o então empregado nada tenha comunicado ao empregador. Vale dizer que, na vigência do casamento é vedada a instituição da companheira como beneficiária”, acrescentou o juiz relator.

De acordo com o TRT paulista, a Metalma quitou o saldo das verbas trabalhistas de ex-empregado morto com a viúva, que apresentou certidão de casamento do Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais de Ubatuba.

A companheira estável do ex-empregado, que conviveu com ele durante mais de 10 anos, acionou a Justiça do Trabalho alegando ter direito a parte das verbas rescisórias. Em sua defesa, informou ser considerada beneficiária do INSS, que garantiu a ela o direito à pensão por morte, “desdobrada entre esposa e companheira”, bem como do convênio de assistência médica contratado pela própria Metalma. A sentença da Vara reconheceu à reclamante o direito a metade das verbas rescisórias.

A Metalma recorreu ao TRT-SP alegando que quitou o débito trabalhista com a viúva amparada na certidão de casamento apresentada, e que a declaração do INSS a respeito do benefício concedido não constitui prova absoluta de que a reclamante era companheira do ex-empregado.

Para o juiz Sampaio da Silva, a empresa pagou corretamente a totalidade dos créditos trabalhistas devidos ao empregado morto para a viúva legítima, que lhe apresentou a certidão do casamento ocorrido quatro anos antes do óbito.

O magistrado decidiu ainda que a empresa não está obrigada a promover ação judicial para divisão dos créditos entre as duas mulheres ou, eventualmente, filhos.

“Caberia à reclamante acionar, no juízo estadual competente, a segunda esposa do ‘de cujus’ (ele era viúvo de casamento civil anterior), pretendendo o reconhecimento de eventual direito à totalidade ou meação dos haveres trabalhistas, sobre os quais não há controvérsia. Assim, não há falar em incompetência da Justiça do Trabalho, nem muito menos de remessa dos autos ao juízo estadual competente”, concluiu o relator.

RO 02570199906502002

Leia o voto do relator

RECURSO ORDINÁRIO DA 65ª VT DE SÃO PAULO

RECORRENTE : PLÁSTICOS METALMA S/A

RECORRIDO : MARIA DA PENHA CABRAL

EMENTA. EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO PELO FALECIMENTO DO EMPREGADO. OBRIGAÇÃO DO EMPREGADOR EM VERIFICAR A LEGITIMIDADE DO SUCESSOR. Extinto o contrato de trabalho pelo falecimento do ex-empregado, correto o pagamento da totalidade das verbas rescisórias à viúva que se apresenta munida da certidão de casamento, que faz presumir, cessada de pleno direito, relação anterior estável, com outra companheira. Eventual direito desta última a meação destes haveres deve ser objeto de ação dirigida contra a viúva, no juízo estadual competente, pretendendo a totalidade ou meação. Não há controvérsia sobre direitos trabalhistas pagos à viúva. O empregador, no caso, não está obrigado a ajuizar ação de consignação em pagamento, por dúvida acerca do sucessor. Recurso ordinário provido, para julgar improcedente a ação.

Recurso ordinário da reclamada, pelas razões de fls.145/152, contra a r. sentença de fls.137/141, que julgou parcialmente procedente a ação. Argúi nulidade da r. sentença, por omisão no relatório, de fatos essenciais do processo, como o protesto por prova testemunhal, indeferimento da audiência de instrução, ofícios ao INSS, etc. Nulo o processo, por cerceamento de defesa, ante a ausência do depoimento pessoal do reclamante e das testemunhas, como também pelo encerramento da instrução processual, sem as respostas do INSS às perguntas formuladas pela reclamada. Alega que a dependência da reclamante foi contestada e não foi esclarecida pelo INSS. Afirma que a certidão de casamento, apresentada pela viúva, importa na ciência sobre a pessoa do “de cujus”, da ex-companheira e da viúva. A declaração do INSS a respeito do benefício concedido à reclamante não constitui prova absoluta de que a reclamante era companheira do “de cujus”, o que não justifica a condenação.

Contra-razões (fls.161/164).

Parecer ministerial pelo prosseguimento (fl.165).

É o relatório.

VOTO:

1- DO CONHECIMENTO

Preparo às fls.153/157. Tempestivo. Regular. Conheço.

2- DAS NULIDADES

2.1- DAS OMISSÕES DO RELATÓRIO

O relatório da r. sentença deve expor o resumo da lide (pedido e resposta), bem como o registro das principais ocorrências ao longo do processo, na forma do disposto no inciso I, do artigo 458, do CPC. Sem razão, portanto, a recorrente, ao pretender que o relatório faça referência a cerceamento de defesa, ou seja, a protestos da reclamada por prova testemunhal, pelo depoimento da reclamante, contra o encerramento da instrução e pela expedição de ofício ao INSS.

O relatório de fls. 137/138 atende ao objetivo legal.

Não se deve declarar nulidade em prejuízo de quem alega, seja processual ou econômico, o que evidentemente não ocorre. Com efeito, eventual omissão no relatório da sentença, acerca de “principais ocorrências havidas no andamento do processo” não impede a apreciação de qualquer fato ou ato ali omitido, e seu acolhimento, se caso.

Sob duplo fundamento, portanto, rejeito a nulidade por omissões do relatório.

2.2- DO CERCEAMENTO DE DEFESA.

Sem razão a recorrente, visto que deve ser indeferida a produção de provas inúteis deve ser indeferida, em atenção aos princípios da economia e celeridade processuais.

Com efeito, tratando-se a lide sobre eventual direito à totalidade dos chamados direitos trabalhistas do ex-empregado da reclamada, na qualidade de ex-companheira deste, os autos contém todos os documentos necessários ao julgamento do mérito. As questões formuladas pelo julgador foram devidamente respondidas pelo Órgão Previdenciário, que reconheceu a reclamante como dependente do ex-empregado falecido, tornando-se inócuas novas perguntas, bem como produção de prova oral a demonstrar a ausência da vida em comum.

3- DA CONDIÇÃO DE BENEFICIÁRIA

A r. sentença reconheceu à reclamante a metade das verbas rescisórias constantes no TRCT de fl.83, à exceção do auxílio funeral (que nem foi objeto) com fundamento nas informações do INSS, que garantiu à reclamante o direito ao benefício previdenciário decorrente de pensão por morte, “desdobrado entre esposa e companheira” (fls.117 e 119).

Incontroverso que a reclamante tenha convivido com o ex- empregado, durante mais de 10 anos, situação que a caracteriza como sua companheira, até perante a própria reclamada, diante da qual considerada a beneficiária do convênio de assistência médica, como evidenciam a declaração de fl. 16 (documento 15 da inicial) e a ficha de registro de fl. 81 (documento 04 da contestação).

Entretanto, apesar da união estáve, veio o ex-empregado a convolar núpcias com a Sra. Aparecida Juvenal, conforme a certidão de casamento do Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais de Ubatuba, Estado de São Paulo, a qual passou a chamar-se Aparecida Juvenal Pinchetti, adotando assim o sobrenome do marido.

Inquestionável que o matrimônio civil gera efeito “erga ominis” e faz presumir, de pleno direito, a antiga união estável, com a ora reclamante.

A Constituição Federal autoriza que se institua o companheiro como beneficiário, desde que tenha sido desfeito, de fato ou de direito, o casamento. Mas a situação “sub judice” é exatamente oposta. O casamento civil ocorreu após – e muito após – a união estável, cuja extinção presume-se, deste o ato solene e formal do matrimônio. Vale dizer que o casamento civil fez cessar – de pleno direito – a situação da companheira da reclamante, para efeito do contrato de trabalho, ainda que o então empregado nada tenha comunicado ao empregador. Vale dizer que, na vigência do casamento é vedada a instituição da companheira como beneficiária.

O empregador pagou, portanto, corretamente, a totalidade dos haveres do empregado falecido, à viúva legítima, que lhe apresentou a certidão do casamento ocorrido quatro anos antes do óbito. Vale dizer que o empregador não está obrigado a ajuizar ação de consignação de pagamento, em decorrência de dúvida sobre a pessoa do sucessor do ex-empregado, visto que – repita-se – a certidão de casamento faz presumir situação fática anterior em relação à ex-companheira.

Tampouco pode ser considerado obrigado o empregador a promover ação judicial (de consignação ou não) pretendendo divisão de haveres entre duas mulheres ou, eventualmente, filhos. Não houve, portanto, pagamento a pessoa errada, ou mal pagamento justificando novo pagamento ao credor correto.

Caberia à reclamante acionar, no juízo estadual competente, a segunda esposa do “de cujus” (ele era viúvo de casamento civil anterior), pretendendo o reconhecimento de eventual direito à totalidade ou meação dos haveres trabalhistas, sobre os quais não há controvérsia. Assim, não há falar em incompetência da Justiça do Trabalho, nem muito menos de remessa dos autos ao juízo estadual competente.

Provejo, portanto, o recurso, para julgar a presente ação improcedente.

3- DA REVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA

Revertida a sucumbência, fica a reclamante condenada ao pagamento das custas calculadas sobre o valor atribuído à causa. Não há nos autos declaração de pobreza.

Ante o exposto, CONHEÇO do recurso, a que DOU PROVIMENTO para julgar IMPROCEDENTE a ação. Custas em reversão, pela reclamante, sobre o valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais), atribuído à causa, no importe de R$ 140,00 (cento e quarenta reais).

FERNANDO ANTONIO SAMPAIO DA SILVA

JUIZ RELATOR

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