Pontos divergentes

Procurador e delegado opinam sobre poder investigatório do MP

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6 de outubro de 2004, 12h35

A quem interessa limitar o poder investigatório do Ministério Público? “Aos que fraudam o erário, àqueles que dilapidam o patrimônio público, àqueles que cometem crimes graves e aos que assaltam os cofres do estado”, dispara o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Rodrigo Pinho, em entrevista à revista Consultor Jurídico. O presidente da Associação dos Delegados do Estado de São Paulo, Jair Cesário, rebate: “Esse é o discurso que o MP tem para poder enganar a opinião pública”. Segundo ele, o MP não pode usar “nenhum pretexto” para descumprir a Constituição. “O poder investigatório criminal do MP não está previsto constitucionalmente”, reafirma.

É nesse clima que o Supremo Tribunal Federal deve votar a constitucionalidade do poder investigatório do MP ainda este ano. Em 1º de setembro, também no STF, três ministros entenderam que o Ministério Público não pode presidir inquéritos policiais, mas tem o poder constitucional de fazer investigações criminais. Os ministros Joaquim Barbosa, Carlos Ayres Britto e Eros Grau decidiram que não é exclusividade da polícia a condução das investigações.

O julgamento foi adiado porque o ministro Cezar Peluso pediu vista do processo. Com a interrupção, o placar está 3 X 2 para o MP. Os dois ministros que votaram contra o poder investigatório criminal foram Marco Aurélio e Nelson Jobim.

A questão é discutida no Inquérito 1.968, que envolve denúncia apresentada contra o deputado Remi Trinta, acusado de fraudar o Sistema Único de Saúde, com base em investigações feitas pelo Ministério Público Federal. Em sua defesa, o deputado alegou atipicidade da conduta, inépcia da denúncia e falta de justa causa para a ação penal, já que o MPF não teria competência para proceder a investigação de natureza criminal.

Ao MP caberia apenas requisitar diligências e a instauração de inquérito policial. O relator da questão, ministro Marco Aurélio, considerando que os elementos que serviram de base à denúncia foram obtidos exclusivamente com dados de investigação criminal feita pelo MP, votou no sentido de rejeitá-la.

Ele entendeu que o Ministério Público, embora titular da ação penal, não tem competência para investigar, diretamente, na esfera criminal, mas apenas para requisitá-las à autoridade policial. Na ocasião, o ministro Joaquim Barbosa pediu vista dos autos.

A retomada das votações nesta quarta voltou os olhos do MP para Brasília. Com Rodrigo Pinho não foi diferente. “Caso o poder seja limitado, teremos um retrocesso”, diz.

Leia a entrevista:

Explique, por favor, o que se passa.

Nesta quarta-feira temos a retomada do julgamento do Habeas Corpus do deputado federal Remi Trinta, do Maranhão, que é acusado de desvio do dinheiro do SUS, um dinheiro que deveria ter sido empregado para a população mais carente e foi desviado em proveito do próprio deputado. O Ministério Público Federal ingressou com uma ação contra esta pessoa pelo crime de estelionato continuado mais falsificação de documento. A defesa desse deputado não quer a negação dos fatos, mas contestar a legitimidade do Ministério Público em realizar investigações. É um grave precedente pois caso limitado o poder do Ministério Público de realizar investigações, num país de tamanha impunidade como o Brasil, aumentará ainda mais esta certeza da falta da efetiva aplicação da lei penal em relação às pessoas que se consideram acima da lei.

O que acontece imediatamente caso o poder seja limitado?

Será um prejuízo futuro, primeiro, porque o MP deixará de poder realizar investigações diretamente ou complementar as provas. Isso vai prejudicar a apuração de responsabilidade de pessoas, pois os promotores de justiça e procuradores da República atuam de forma independente. Existe também prejuízo para o passado. Condenações obtidas com provas produzidas por promotores de Justiça poderão ser objeto de anulação, como no caso do juiz Lalau, como no caso do Bar Bodega, como no caso da Máfia dos Fiscais.

Assertivas aumentaram contra o MP após o assassinato do ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel?

Após as investigações feitas e que redirecionaram as apurações feitas no caso Celso Daniel, sem sombra de dúvida alguns setores a mais se levantaram contra o poder de investigação do MP, mas não podemos generalizar isso em relação a nenhum partido político.

O que temos observado na nossa prática é que após a Constituição de 88 a instituição MP ganhou novo patamar, passamos a atuar como braço jurídico da sociedade e começamos a levar ao banco dos réus pessoas que até então não respondiam pelos atos praticados. E certos partidos quando chegam ao poder, alguns segmentos deles mostram certa incompatibilidade com a postura firme e atuante do MP.

A quem interessa a limitação dos poderes do MP?

Aos que fraudam o erário, àqueles que dilapidam o patrimônio público, àqueles que cometem crimes graves, aos que assaltam os cofres do estado.

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