Tentativa fracassada

Supremo nega foro privilegiado para Paulo Maluf

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26 de novembro de 2004, 17h53

A última esperança de impedir a 2ª Vara Criminal Federal de São Paulo de julgar o pedido de prisão preventiva do ex-prefeito Paulo Maluf foi por água abaixo. O ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, negou liminar à reclamação que contestava a legitimidade de o ex-prefeito ser julgado pela primeira instância.

É a segunda vez que o STF bate a porta para Maluf. Esta semana, a Corte decidiu arquivar a reclamação do ex-prefeito, que pedia para ser julgado pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região.

Gilmar Mendes não divisou, no caso, vínculo entre as práticas atribuídas a Maluf e a atividade de prefeito. Ou seja, sem desqualificar o direito a foro privilegiado de autoridades públicas, o ministro afirmou que, para usufruir do benefício legal, é preciso indicar o nexo entre o delito imputado e o papel do agente público. “A inicial e as petições que lhe seguiram não demonstram de modo inequívoco a correlação entre os atos imputados ao reclamante e o exercício do cargo de Prefeito”, disse o ministro.

O Ministério Público Federal denunciou Maluf por sonegação fiscal, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. O MPF pediu a prisão do ex-prefeito em uma denúncia com nove volumes. O caso está sendo analisado pela juíza da 2ª Vara Criminal Federal de São Paulo, Silvia Maria Rocha.

Leia a decisão do ministro Gilmar Mendes

MED. CAUT. EM RECLAMAÇÃO 2.984-1

SÃO PAULO

RELATOR: MIN. GILMAR MENDES

RECLAMANTE(S): PAULO SALIM MALUF

ADVOGADO(A/S): JOSÉ ROBERTO LEAL DE CARVALHO E OUTRO(A/S)

RECLAMADO(A/S): JUIZ FEDERAL DA 2ª VARA CRIMINAL DA SEÇÃO

JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO (PROCESSOS Nº 2001.61.81.005327-0,

2001.61.81.006491-6, 2002.61.81.006280-8, 2002.61.81.006073-3 E

2004.61.81.007555-1)

INTERESSADO(A/S): MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

DECISÃO: Cuida-se de reclamação ajuizada por Paulo Salim Maluf tendo em vista a tramitação de cinco feitos criminais perante o Juízo da 2ª Vara Criminal Federal da Seção Judiciária de São Paulo.

Na inicial, busca o reclamante estabelecer conexão entre os fatos que são objeto dos referidos feitos criminais e o exercício, pelo reclamante, do cargo de Prefeito da cidade de São Paulo, no período compreendido entre 1º de janeiro de 1993 e 31 de dezembro de 1996. Em conseqüência, busca o reclamante amparo na regra do art. 84, § 1º, do Código de Processo Penal, com a redação estabelecida pela Lei nº 10.628, de 2002.

Invoca o indeferimento da liminar na ADI 2797, em que se impugna a referida Lei nº 10.628, de 2002. E mais, invoca precedentes desta Corte em sede de Reclamação (na linha firmada na mencionada ação direta) no sentido de se garantir a aplicação daquela Lei, em face de sua presunção de constitucionalidade.

Ao apontar o perigo da demora, o reclamante enfatiza especialmente a designação de audiência de interrogatório do acusado, a ser realizada no próximo dia 6 de dezembro, nos autos da ação penal nº 2004.61.81.007555-1 (fl. 214).

Postula, na inicial, a concessão de liminar para o fim de sobrestar os autos dos feitos de números 2001.61.81.005327-0, 2001.61.81.006491-6, 2002.61.81.006280-8, 2002.61.81.006073-3, e 2004.61.81.007555-1, que atualmente tramitam perante a 2a. Vara Criminal Federal da Seção Judiciária de São Paulo.

No mérito, requer a remessa dos referidos feitos ao TRF da 3a. Região. Requer, ainda, a declaração de nulidade dos atos praticados em primeira instância, especialmente a decisão de recebimento da denúncia no processo nº 2004.61.81.007555-1. No dia 24 de novembro de 2004, proferi despacho requisitando informações.

No dia 25 de novembro de 2004, após noticiar que teria sido decretada a prisão preventiva do reclamante, o reclamante veio aos autos para reiterar o pedido de liminar.

Na data de hoje (26 de novembro), o reclamante vem aos autos para pedir a desconsideração da petição do dia anterior. Em seqüência, também na data de hoje, o reclamante apresenta nova petição, noticiando, a partir de matéria jornalística, o possível pedido de prisão preventiva do reclamante. Consta da petição:

“Paulo Salim Maluf […] vem, mui respeitosamente, através de seus advogados e procuradores requerer a juntada de fotocópia do jornal ‘O Estado de São Paulo’ – sexta-feira 26/11/04, pág. A12; Caderno Nacional – que tem como título os seguintes dizeres:

‘MINISTÉRIO PÚBLICO DEVE PEDIR A PRISÃO DE MALUF’ Denunciado ontem por formação de quadrilha e lavagem de dinheiro, ex-Prefeito diz: ‘Não vou fugir’. Comprova-se, assim, o noticiado nas petições protocoladas ontem pelos subscritores da presente.

Requer, outrossim, ante a peculiaridade do caso e, real perigo de ser decretada, POR JUÍZO ABSOLUTAMENTE INCOMPETENTE, a prisão preventiva do reclamante, que seja apreciada em caráter de urgência o pedido de concessão de liminar que ao final deve ser concedida consoante fartamente demonstrado em sede de inicial.”

Ressalvado melhor exame quando do julgamento do mérito, não vislumbro o sinal de bom direito para a reclamação. A inicial e as petições que lhe seguiram não demonstram de modo inequívoco a correlação entre os atos imputados ao reclamante e o exercício do cargo de Prefeito. Tal correlação não se verifica, em especial, nos autos do processo nº 2004.61.81.007555-1, feito que é destacado para o fim da caracterização do periculum in mora. Há precedente desta Corte sobre o tema, cuja ementa possui o seguinte teor:

“EMENTA: Supremo Tribunal Federal: competência penal originária por prerrogativa de função após a cessação da investidura: L. 10628/02. 1. O art. 84, § 1º. C.Pr.Pen, introduzido pela L. 10628/02 não restabeleceu integralmente a cancelada Súm. 394: segundo o novo dispositivo a competência especial por prerrogativa de função só se estende após cessada a investidura determinante se a imputação for ‘relativa a atos administrativos do agente’. 2. Por isso, independentemente do juízo sobre a constitucionalidade ou não da lei nova – objeto da ADIn 2797 -, não compete ao STF a supervisão judicial de inquérito em que indiciado ex-Deputado Federal por suspeita de participação de desvio de subsídios da União a entidade privada de assistência social, cuja direção integrava.” (g.n./ Inq. 718 QO, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 16.5.2003).

Já apreciei o tema em outra oportunidade (Inq. 753, DJ 12.5.2004).

Embora considere que a expressão “atos administrativos” deva ser entendida em sentido amplo, da leitura da inicial não consigo vislumbrar a correlação entre as condutas supostamente criminosas que seriam objeto daqueles procedimentos criminais com o exercício do cargo de Prefeito.

Indefiro a liminar.

Recebidas as informações, remetam-se os autos à Procuradoria-Geral da República.

Publique-se.

Brasília, 26 de novembro de 2004.

Ministro Gilmar Mendes

Relator

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