Público e privado

Sucesso das PPPs depende de solução de dívidas judiciais passadas

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10 de novembro de 2004, 19h22

A premissa básica das Parcerias Público Privadas (PPPs) é a necessidade impostergável de novas obras e serviços de interesse público. O esgotamento ou incapacidade de investimento, endividamento e gestão do governo exigiriam a participação da iniciativa privada neste esforço, que já teve muito sucesso em países como o Reino Unido.

Qualquer estruturação jurídica para PPPs presume o respeito aos contratos e, como é regra em qualquer discussão civilizada, o cumprimento estrito de ordens judiciais, o império da lei.

Não tem sido este o padrão do comportamento do poder público no Brasil, onde concessões contratadas após licitações públicas são “rescindidas”, reajustes tarifários (telefonia, pedágio, p. ex.) são discutidos longamente para efeitos muitas vezes políticos e por aí vai.

A superação destas questões na legislação em discussão, no esforço de sedução para atração de novos investimentos, prevê garantias “especiais”, fundos “dedicados”, “reservas”, comprometimento de receitas futuras e outras idéias criativas e com muito mérito, enfim blindagem jurídica nova para o potencial futuro credor.

Lamentável ou estrategicamente, todas iniciativas esquecem fatos profundamente significativos:

Existe um universo de milhares e milhares de credores judiciais consolidados, titulares de ordens judiciais de pagamento (os assim chamados “precatórios”), oriundos de ações alimentares ou não, que constituem um estoque de inadimplência de muitos bilhões de reais.

Tais credores, que já passaram pela via crucis judicial, ou seja, muitos anos de luta, não recebem seus créditos, atrasados há muitos anos e evidentemente não podem ter seus direitos preteridos em favor de novos possíveis eventuais futuros credores.

O Poder Legislativo estaria criando credores de várias castas, e os atuais se tornariam seguramente os párias da Justiça e do país.

Desde a velha Roma, isto se chama fraude a credores.

No esforço de desenvolvimento legislativo e na análise de risco das PPPs, os congressistas e a iniciativa privada precisam levar em conta que quase a totalidade dos órgãos públicos tem hoje dívidas trabalhistas multimilionárias (precatórios alimentares), além de rescisões contratuais que demoram a ser pagas e, periodicamente, sujeitas a moratórias unilaterais.

É fato que o país está em moratória com relação a suas dívidas judiciais (Emenda à Constituição n.o 30).

O que se registra é que qualquer nova alternativa para cooperação mais estreita com a iniciativa privada, como PPPs o que é louvável, deverá necessariamente incluir como preliminar a solução das dívidas passadas judiciais, sem o que o Poder Público não terá autoridade moral ou credíticia para novos negócios.

Não se espera o pagamento imediato de todas as dívidas judiciais, mas o seu equacionamento definitivo, principalmente no caso dos alimentares.

Soluções existem, são muito conhecidas e uma das ferramentas poderia ser a securitização dos precatórios para pagamento de impostos, projetos de privatização ou mesmo PPPs.

Se o BNDES, Banco Mundial, BID, Fundos de Pensão, Banco do Brasil, etc, vierem a participar de PPPs (ou, aliás, de qualquer investimento ou crédito) o mínimo que se pode esperar é que exijam do Poder Público a apresentação de certidão de quitação de dívidas judiciais ou acordo chancelado pela Justiça e acompanhado pela OAB.

Inadmissível será a constituição de credores de primeira e última classe, em clara violação de direitos humanos, desrespeito ao Poder Judiciário e à própria Democracia.

Em poucas palavras: Sr. Empresário, o Sr. não teme ser o futuro detentor de precatórios no futuro? Vai mesmo fazer parceria com um alguém que deve bilhões, especialmente a seus empregados, descumpre ordens judiciais e sequer coloca esses números em seus balanços e demonstrativos financeiros?

Transparência e seriedade nas contas públicas são fundamentais para a cidadania e novos negócios com o Poder Público.

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