Contribuição previdenciária

Leia voto de Peluso sobre retenção de 11% em valor de nota fiscal

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9 de novembro de 2004, 9h25

A empresa tomadora de serviços de limpeza, segurança ou empreitada de mão de obra deve reter 11% sobre o valor da fatura emitida pela empresa prestadora dos serviços, recolhendo-os ao INSS, para fins de contribuição previdenciária. Esta decisão, adotada por maioria de votos, na quarta-feira (3/11), pelo Supremo Tribunal Federal, contou com opinião favorável do ministro Cezar Peluso.

O processo foi relatado pelo ministro Carlos Velloso, que também votou pela constitucionalidade da retenção. A decisão foi provocada pela empresa P&M Instalações Ltda., que interpôs recurso contra o INSS, alegando que a retenção feria diversas normas constitucionais como a do empréstimo compulsório, do confisco e da antecipação do fato gerador da contribuição.

O alvo da discórdia foi o artigo 31 da Lei nº 8.212/91, que estabeleceu a responsabilidade solidária entre tomador e prestador dos serviços para fins de contribuição previdenciária — alterado pela Lei nº 9.711/98, que tornou obrigatória e efetiva a retenção, a partir de fevereiro de 1999 (veja a íntegra dos dispositivos abaixo).

O ministro Peluso interrompeu o julgamento, no início de agosto passado, para produzir, com a sua vista, argumentos que não haviam sido apresentados pelo relator. Segundo ele, a retenção pode ocorrer antes da ocorrência do fato gerador, configurando-se numa antecipação e podendo, inclusive, implicar tributação maior. Neste caso, o prestador do serviço será restituído.

Além disso, argumentou Peluso, não há confisco porque a contribuição social incidente sobre a folha de salários é de 20% enquanto a retenção é de 11% sobre o “valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços”, resguardando-se o direito de restituição de eventual excesso.

Leia a íntegra do voto do ministro Cezar Peluso

V O T O – V I S T A

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO:

1. O acórdão impugnado reformou sentença que, concedendo segurança, declarara, incidenter tantum, a constitucionalidade do art. 31 da Lei nº 8.212/91, com a redação dada pela Lei nº 9.711/98. Da ementa consta:

“Constitucional e tributário. Contribuição social. Retenção de 11% (onze por cento) sobre o valor bruto da nota fiscal ou da fatura de prestação de serviços. Artigo 31 da Lei nº 8.212/91, com redação da Lei nº 9.711/98. Legalidade e constitucionalidade.

As modificações introduzidas pela referida Lei 9.711/98 visam, apenas e tão somente, facilitar a arrecadação e a fiscalização do recolhimento das contribuições para a Previdência Social, prevenindo a sonegação, não havendo nisso nenhuma ilegalidade ou inconstitucionalidade.

2. Com efeito, não se cuida de uma nova fonte de custeio para a Seguridade Social (CF, art. 195, § 4º), nem, tampouco, de imposto criado na área da competência residual da União (CF. art. 154, I) ou instituição de empréstimo compulsório (CF, art. 148).

O que houve, não faz mal repetir, foi uma alteração na forma de recolhimento da contribuição previdenciária, sem nenhuma afronta à Constituição, atribuindo responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, o que é permitido não só pelo Código Tributário Nacional (art. 128), como, também, pela atual Carta Magna, que prevê, inclusive, o pagamento antecipado do imposto ou contribuição, com possibilidade de compensação e/ou restituição (C.F. art. 150, § 7º), exatamente como previsto na Lei nº 9.711/98, ora impugnada, pelo que não há que se falar ou sustentar em, repito, empréstimo compulsório, aumento de alíquota, confisco ou transgressão a qualquer princípio constitucional, muito menos o da capacidade contributiva.

3. Precedentes.

4. Apelação e remessa oficial providas.

5. Sentença reformada.”

O recurso extraordinário argúi a inconstitucionalidade da retenção, pelo tomador dos serviços, dos 11% sobre a nota fiscal emitida pelo intermediador de mão de obra, por ofensa aos arts. 148 (empréstimo compulsório), 150, § 7º (antecipação do fato gerador), 150, IV (princípio do não confisco), 194, V (equidade na participação do custeio), e 195, § 4º (nova fonte de custeio da seguridade social), todos da Constituição Federal.

Alega o recorrente que “não há qualquer vinculação entre o substituto tributário e o fato gerador da obrigação referente ao pagamento da contribuição social incidente sobre a folha de salários, isso porque o tomador do serviço não é contribuinte originário das contribuições devidas pelo cedente de mão-de-obra e não tem qualquer controle sobre a elaboração e o pagamento da folha de salários deste último, eventos esses que sequer podem ser considerados como posteriores ao pagamento do serviço” (fls. 151).

2. Acompanho o voto do eminente Ministro Relator, posto que com ressalvas quanto aos fundamentos.


2.1. Não se está, deveras, perante nova hipótese de incidência tributária, senão de transferência de responsabilidade pelo recolhimento do tributo, ou de substituição tributária, prevista no art. 128 do Código Tributário Nacional:

“Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste Capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.”

Trata-se de substituição tributária na relação jurídica da contribuição social incidente sobre a folha de salários e devida pela prestadora de serviço. Daí, não vejo insulto aos arts. 148, 194, V, e 195, § 4º, da Constituição Federal.

2.2. Quanto ao art. 150, § 7º, que cuida da antecipação da ocorrência do fato gerador, entendo que, nos termos em que foi instituída, com previsão de compensação ou de devolução do montante eventualmente retido a maior (art. 31, §§ 1º e 2º, da Lei 8.212/91), a retenção prevista no art. 31 da Lei 8.212/91, com a redação dada pela Lei nº 9.711/98, não lhe é incompatível:

“Cronologicamente a retenção pode ocorrer antes da incidência factual da regra matriz, ou seja, antes da ocorrência do fato gerador. Basta que a nota fiscal seja emitida até o último dia do mês de referência. Neste caso, a substituição configurará uma antecipação e por não guardar identidade com o valor devido em decorrência da ocorrência do fato gerador poderá implicar em uma tributação a maior, e em uma apropriação indevida do patrimônio do prestador do serviço.

(…)

Assim, teremos a incidência de duas normas jurídicas: (i) de substituição (logo que pago o valor relativo à cessão de mão de obra) e da (ii) regra matriz de incidência (contribuição social sobre a folha de salários), ligadas pelo liame lógico da substituição.

Como se trata de tributo sujeito a lançamento por homologação em que o cálculo do montante devido e o recolhimento são efetuados pelo próprio contribuinte (art. 150 do Código Tributário Nacional) o cálculo das relações jurídicas produzidas pela incidência das normas é efetuado por ele próprio, ou seja, por expressa autorização legal (art. 31, § 1º da Lei 8.212/91), o prestador do serviço compensará o valor retido com o valor devido a título de contribuição sobre a folha de pagamento.

Uma relação jurídica (débito de contribuição social sobre a folha de pagamento) é anulada por outra relação jurídica (crédito pela retenção sofrida quando do recebimento pela prestação dos serviços – 11%).

Caso a retenção seja superior ao valor devido, o que não é raro acontecer visto que a retenção ocorre sobre o faturamento e a folha de salários lhe é em regra menor, o prestador do serviço será restituído do valor retido a maior, nos exatos termos do artigo 31, § 2º da Lei 8.212/91, dando-se cumprimento à norma constitucional insculpida no artigo 150, § 7º, da Constituição Federal de 1988.

Deve ser salientado que a “autorização para compensação” é única e exclusiva às contribuições incidentes sobre a folha de pagamentos, o que nos autoriza afirmar que na verdade não se trata de compensação, mas sim de verificação da legitimidade da substituição, ou seja, se o valor retido corresponde ao valor devido e sucessivamente na previsão de devolução do valor retido em excesso”(Aldo de Paula Junior). A retenção das Contribuições Sociais, in Michel Cutait Neto. org.. Contribuições Sociais em Debate. São Paulo: JH Mizuno. 2003. p. 454).

2.3. Não há confisco, pois a contribuição social incidente sobre a folha de salários é de 20% (art. 22, I, da Lei nº 8.212/91), enquanto a retenção é de 11% sobre o “valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços” (art. 31 da Lei nº 8.212/91, com a redação dada pela Lei nº 9.711/98), resguardando-se o direito de restituição de eventual excesso (art. 31, § 2º).

2.4. Por fim, quanto à alegação de ausência de “vinculação entre o substituto tributário e o fato gerador da obrigação referente ao pagamento da contribuição social incidente sobre a folha de salários”, observo que tal questão transpõe os contornos do recurso, por envolver a aplicação do art. 128 do Código Tributário Nacional e nenhum dos dispositivos invocados pelo recorrente.

Concordo com o Ministro Marco Aurélio, no asserto de que a técnica de substituição tributária deve obedecer a limites, mas, no caso, atenho-me aos temas que constituem objeto do recurso extraordinário e, nessa moldura, acompanho o voto do Ministro Relator.

“§ 1º. O valor retido de que trata o caput, que deverá ser destacado na nota fiscal ou fatura de prestação de serviços, será compensado pelo respectivo estabelecimento da empresa cedente da mão-de-obra, quando do recolhimento das contribuições destinadas à Seguridade Social devidas sobre a folha de pagamento dos segurados a seu serviço” (Redação dada pela Lei nº 9.711/98).


“§ 2º. Na impossibilidade de haver compensação integral da forma do parágrafo anterior, o saldo remanescente será objeto de restituição” (Redação dada pela Lei nº 9.711/98).

Leia os dispositivos legais que definiram a substitução tributária nesse setor:

Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991

Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio e dá outras providências.

(…)

Art. 31. O contratante de quaisquer serviços executados mediante cessão de mão-de-obra, inclusive em regime de trabalho temporário, responde solidariamente com o executor pelas obrigações decorrentes desta lei, em relação aos serviços a ele prestados, exceto quanto ao disposto no art. 23.

§ 1° Fica ressalvado o direito regressivo do contratante contra o executor e admitida a retenção de importâncias a este devidas para a garantia do cumprimento das obrigações desta lei, na forma estabelecida em regulamento.

§ 2° Entende-se como cessão de mão-de-obra a colocação, à disposição do contratante, em suas dependências ou nas de terceiros, de segurados que realizem serviços contínuos cujas características impossibilitem a plena identificação dos fatos geradores das contribuições, tais como construção civil, limpeza e conservação, manutenção, vigilância e outros assemelhados especificados no regulamento, independentemente da natureza e da forma de contratação.

(…)

Lei nº 9.711, de 20 de novembro de 1998

Dispõe sobre a recuperação de haveres do Tesouro Nacional e do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, a utilização de Títulos da Dívida Pública, de responsabilidade do Tesouro Nacional, na quitação de débitos com o INSS, altera dispositivos das Leis nos 7.986, de 28 de dezembro de 1989, 8.036, de 11 de maio de 1990, 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.213, de 24 de julho de 1991, 8.742, de 7 de dezembro de 1993, e 9.639, de 25 de maio de 1998, e dá outras providências.

(…)

Art. 29. O art. 31 da Lei nº 8.212/91 produzirá efeitos a partir de 1o de fevereiro de 1999, ficando mantida, até aquela data, a responsabilidade solidária na forma da legislação anterior.

(…)

“Art. 31. A empresa contratante de serviços executados mediante cessão de mão-de-obra, inclusive em regime de trabalho temporário, deverá reter onze por cento do valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços e recolher a importância retida até o dia dois do mês subseqüente ao da emissão da respectiva nota fiscal ou fatura, em nome da empresa cedente da mão-de-obra, observado o disposto no § 5o do art. 33.

§ 1o O valor retido de que trata o caput, que deverá ser destacado na nota fiscal ou fatura de prestação de serviços, será compensado pelo respectivo estabelecimento da empresa cedente da mão-de-obra, quando do recolhimento das contribuições destinadas à Seguridade Social devidas sobre a folha de pagamento dos segurados a seu serviço.

§ 2o Na impossibilidade de haver compensação integral na forma do parágrafo anterior, o saldo remanescente será objeto de restituição.

§ 3o Para os fins desta Lei, entende-se como cessão de mão-de-obra a colocação à disposição do contratante, em suas dependências ou nas de terceiros, de segurados que realizem serviços contínuos, relacionados ou não com a atividade-fim da empresa, quaisquer que sejam a natureza e a forma de contratação.

§ 4o Enquadram-se na situação prevista no parágrafo anterior, além de outros estabelecidos em regulamento, os seguintes serviços:

I – limpeza, conservação e zeladoria;

II – vigilância e segurança;

III – empreitada de mão-de-obra;

IV – contratação de trabalho temporário na forma da Lei no 6.019, de 3 de janeiro de 1974.

§ 5o O cedente da mão-de-obra deverá elaborar folhas de pagamento distintas para cada contratante.” (NR)

(…)

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