Falta de memória

A OAB e o Brasil se esqueceram de Sobral Pinto

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6 de novembro de 2004, 19h58

Na sexta-feira passada, 5 de novembro, procurei em todos os jornais e na Internet, especialmente nos “sites” jurídicos, uma referência ainda que singela, àquele que foi um dos maiores Advogados de todos os tempos: HERÁCLITO FONTOURA SOBRAL PINTO, nascido em Barbacena, MG, em 5/11/1893 e falecido aos 98 anos de idade, no Rio de Janeiro, em 30 de novembro de 1991.

Encontrei apenas na Internet uma notícia sobre outro brasileiro ilustre, Rui Barbosa, que nasceu no mesmo dia, mas em 1849 e que faleceu em primeiro de março de 1923.

Nem mesmo o site oficial do Conselho Federal da OAB, — do qual SOBRAL PINTO participou ativamente –, registrou seu aniversário.

À noite, não acreditando que pudessem ter se esquecido do Advogado, telefonei para Barbacena, sua terra natal. Imaginei que um filho como aquele não pudesse ser esquecido…

Como não conheço ninguém em Barbacena, telefonei para um Hotel e perguntei se ele estava hospedado lá. Dei o nome completo e ainda disse que se tratava de um advogado. A atenciosa atendente deu-se ao trabalho de procurar na lista de hóspedes! Sobral não estava lá. Perguntei se ela já tinha ouvido falar no Dr. Sobral e a resposta foi negativa.

Tentei ligar para um jornal local, mas ninguém atendeu. Na Internet encontrei o noticiário de um jornal de Barbacena, de 5 de novembro. Por certo diriam algo sobre o aniversariante, seu ilustre conterrâneo.

Havia de tudo no jornal: notícia sobre furto de flores, “socialites” locais, um time de futebol, um baile, mas nada sobre Sobral. Até um promotor de justiça da cidade, que escreve uma coluna de assuntos jurídicos, falava apenas da pena de morte.

Que Rui tenha sido um gênio, não se discute. Mas embora tenha sido advogado, sempre se dedicou mais à política, à diplomacia, às letras.

ADVOGADO mesmo, com todas as letras maiúsculas, foi SOBRAL PINTO!

Vi-o uma única vez, na década de 80, no Fórum do Rio. De terno preto, conversava animadamente com dois jovens. Não me atrevi a interrompê-los e aproximar-me e lamento até hoje ter desperdiçado a oportunidade de me apresentar e, quem sabe, ter apertado a mão daquele Mestre!

De SOBRAL PINTO, o país e principalmente os advogados receberam inúmeras lições. Cito apenas três, que foram as que mais me impressionaram: para defender Harry Berger –- um comunista a quem nenhum outro defensor teve a coragem de aceitar como cliente, SOBRAL PINTO invocou a lei de proteção aos animais, no ponto em que o diploma veda a crueldade contra os bichos. Berger fora tão violentamente torturado nos cárceres da ditadura de Vargas que chegara à loucura. O advogado, cabe lembrar, jamais teve qualquer proximidade com a ideologia de seu cliente.

Outra lição: detido pelos militares em 64, e ouvindo de um deles que aquilo era uma “democracia à brasileira”, respondeu que “Existe peru à brasileira, mas não existe Democracia à brasileira. A democracia é universal”.

E, finalmente, a mais marcante: não aceitou o convite de Juscelino para ser ministro do Supremo Tribunal Federal, embora advogasse com dificuldades financeiras. Não queria receber o cargo como prêmio pelo apoio que dera à posse de Juscelino, ameaçada antes pelos golpistas, sempre de plantão.

Já que se fala tanto em valorizar a Advocacia, como recentemente foi dito pela OAB, estou aqui sugerindo que, nas Faculdades de Direito e no Exame de Ordem torne-se obrigatório o estudo da biografia de SOBRAL PINTO.

Quem se esquece desse ADVOGADO ou quem não conhece sua biografia, não merece ser advogado, pois não sabe nada da nossa Profissão!

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