De olho no crime

População carcerária do país aumentou 47%, aponta pesquisa.

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5 de novembro de 2004, 9h38

Preocupado com o impacto da Lei dos Crimes Hediondos sobre a população carcerária, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, encomendou ao Instituto Latino Americano para a Prevenção do Delito e o Tratamento do Delinqüente (Ilanud) um panorama criminal do Brasil. Nos últimos oito anos, a população carcerária do Brasil aumentou 47%, e a de São Paulo 56%.

De acordo com os dados, São Paulo dispõe de 41% dos internos do país. Mesmo com a lei dos crimes hediondos, os crimes de narcotráfico continuam crescendo no país.

Estes são alguns dados preliminares da pesquisa, divulgada com exclusividade pela revista Consultor Jurídico. O dossiê está assinado pela advogada Karina Sposato e pelo cientista político Guaracy Mingardi, do Ilanud — orgão das Nações Unidas que estuda a criminalidade na América Latina, a partir de São Paulo.

Veja o que diz Karina Sposato

O que revela a pesquisa?

O que as estatísticas demonstram é que num período de oito anos é possível verificar um aumento, um incremento da população carcerária nacional da ordem de 47%, enquanto que São Paulo apresenta um crescimento superior, chegando a mais de 50% nesses mesmos oito anos.

Então a questão que se coloca é verificar em que medida esse aumento da população carcerária não se deve à lei de crimes hediondos, porque você tem de um lado uma maior entrada de condenados no sistema, o que pode ser a causa do aumento, mas também sobretudo a permanência prolongada, por mais tempo, de condenados por crimes hediondos. Culmina a entrada com as não saída dos condenados, o que geraria um inchaço do sistema carcerário, especialmente de São Paulo mas também nacional.

E o Brasil ?

O Brasil ocupa a octagésima oitava posição mundial no ranking de encarcerados. Não é de todo ruim, mas esta posição nos faz refletir sobre um risco que o Brasil possa correr, de vir nos próximos anos a possuir uma taxa de encarceramento ainda mais significativa. É preciso, ao invés de apostar e priorizar as políticas de encarceramento, no sentido contrário trabalhar e implementar as penas alternativas. Isso é uma tendência mundial e muitos países já vêm desenvolvendo isso. Devemos apostar as medidas comunitárias mas que não deixam de priorizar os infratores da lei.

São Paulo detém 41% da população prisional do país. Por quê?

Uma primeira percepção é que nos estados mais industrializados e portanto também com maior concentração populacional, essa taxa seria também maior. É importante dizer que há uma influência da criminalidade urbana, que aumenta o número de pessoas no sistema prisional, mas a pesquisa mostrou (e isso é uma questão curiosa) que Rio de Janeiro por exemplo não está entre os estados de maior concentração penitenciária.

São estados, ao contrário, como o Acre, Roraima, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo, aqueles que detêm a maior concentração de população penitenciária. De um lado, pela criminalidade urbana, e por outro que podem ser nesses estados de fronteira que os delitos de tráfico são também cometidos e também com maior facilidade apreendidos pela polícia.

A pesquisa indica o que, nesse período, o narcotráfico não parou de crescer…

Ainda vamos trabalhar com um pouco mais de cautela, mas há uma percepção que em crimes que não envolvam a questão patrimonial talvez a lei possa ter tido uma influência na sua diminuição, como seria o caso de estupro, até mesmo do latrocínio. Um sujeito, ao cometer um roubo, pode tomar mais cuidado e não vitimar alguém, não causar morte. Entretanto outros crimes, como tráfico de drogas, que nesse caso ganha destaque, não apresentam nenhuma alteração na sua incidência e também no seu correspondente na população carcerária. Isso leva a crer que é preciso ter tratamentos diferenciados, de acordo com o tipo de delito. Não é possível abarcar sob o mesmo rótulo de “hediondos” delitos tão diferenciados.

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