Profissão protegida

CDC é inadequado para resolver questões entre médico e paciente

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3 de novembro de 2004, 15h47

Passados mais de 16 anos de vigência da Constituição Brasileira, denominada de “Constituição cidadã”, o segmento saúde permanece arregimentando suas perdas e tudo em detrimento da própria pessoa humana. A Lei de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), por ela gerada, incumbiu-se de preencher fantástica e indesejável lacuna que existia nas relações de consumo, onde sempre o produtor representava o poder econômico, em detrimento do consumidor-hipossuficiente, sendo certo que essa assertiva é comprovada e aplaudida por todos nós.

Mas, no que diz respeito a relação médico-paciente, as questões se tornaram caóticas e exageradas. Olvidou-se que no campo dos fornecedores de serviços profissionais liberais ambas as partes envolvidas devem ser alvo de proteção e defesa das garantias fundamentais previstas na dignidade da pessoa humana, conforme estabelece o inciso III, ART.1º da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB).

Diante desse quadro, surge a oportunidade para a elaboração de um Código Nacional da Saúde, onde o vínculo entre médicos e pacientes seja respaldado pelo Novo Código Civil, principalmente nos casos de possíveis erros médicos, tudo à luz da eticidade. Há anos alertamos para essa necessidade, tendo em vista a inadequação de se aplicar o Código de Defesa do Consumidor (CDC) para tais relações. É preciso uma regulamentação, mas não sob os preceitos das relações de consumo.

Os rigores protecionistas e defensivos passaram a ser usados em desfavor da pessoa humana do esculápio. Dessa forma, inversões do ônus da prova, concessões de Gratuidade da Justiça e pedidos de valores exorbitantes para danos morais trouxeram uma década rica em demandas judiciais ajuizadas contra os médicos em todo o país. Existem estatísticas denunciando que em 80% das ações contra médicos, o médico vence, sendo cruel a realidade que em 100% dos casos ele é processado. É a repetição do modelo norte-americano, gerando a “indústria do dano”.

Na Europa, a responsabilidade objetiva (aquela que independe de culpa) é utilizada para o Produtor, mas com relação ao Fornecedor de serviços só é aplicada quando o dano representar 30% ou mais de perda da capacidade laborativa. No Brasil, o Código de Defesa do Consumidor trouxe a responsabilidade objetiva para todos os Produtores e Fornecedores de serviços, gerando uma demanda incomensurável de ações judiciais descomprometidas com a eticidade e a boa fé.

O Código Nacional de Saúde surge com a oportunidade de resgatar a imensa lacuna de leis civis ocorridas entre 1917 e 2002, propiciando a fuga dessa legislação defensiva e protecionista em seara consumerista para um ordenamento baseado na eticidade, em total respeito às respectivas dignidade das pessoas humanas que compõem a relação médico-paciente.

A sociedade brasileira precisa ficar atenta em não seguir o modelo norte-americano, que dizimou médicos obstetras em vários estados, em função do absurdo ocorrido entre jovens que não conseguiam ingressar nas Universidades e responsabilizavam esses médicos por supostos problemas no parto.

Nesta direção, no dia 18 de setembro, se reuniram no Rio, os principais especialistas da responsabilidade civil médica, que entregaram a Carta do Rio de Janeiro à Frente Parlamentar da Saúde. Junto com a Carta entregamos a cartilha Caixa de Pandora, reunindo os principais motivos que evidenciam a necessidade da criação do Código Nacional da Saúde.

Nossos médicos, cerca de 250 mil em todo o país, merecem respeito e precisam de paz para o digno exercício da profissão, respeitando o mais absoluto interesse da saúde do paciente.

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