Os trabalhadores considerados “escravos” na fazenda do deputado federal Inocêncio de Oliveira tinham “um orgulho ingênuo de estarem trabalhando para uma pessoa tão importante e poderosa”. Segundo eles, o deputado costumava ir nos barracos “atravessando o rio a cavalo, enquanto os trabalhadores atravessavam a nado”.
Essa e outras afirmações dos trabalhadores constam da denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal, em outubro de 2003. O deputado foi condenado, no ano passado, a pagar uma indenização de R$ 530 mil por submeter 53 trabalhadores rurais a condições similares à escravidão em sua fazenda.
Ele foi condenado também, em outro processo, a se abster de explorar mão-de-obra escrava e de aliciar menores de 16 anos para trabalhar em suas fazendas. Ainda cabe recurso.
Leia a denúncia apresentada pelo MPF:
PGR N.º 1.00.000.009077/ -2002-60
INTERESSADO: DEPUTADO FEDERAL INOCÊNCIO DE OLIVEIRA
ASSUNTO: OF/Nº 1287/02/PGT – DENÚNCIA INQ/2054
EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL,
O Ministério Público Federal ajuíza DENÚNCIA contra:
1. Inocêncio Gomes de Oliveira, brasileiro, casado, médico, Deputado Federal, podendo ser encontrado na Câmara dos Deputados - Praça dos Três Poderes - Gabinete 26, Anexo II.
2. Sebastião César Marques de Andrade, qualificado as fls. 57, dos autos do PA 9077/02, que integram esta denúncia, pelos seguintes fatos delituosos: 1.00.000.009077/2002-60
I. Dos Fatos
1.O Grupo Móvel de Fiscalização da Região 04, do Ministério do Trabalho e Emprego constatou, no período compreendido entre os dias 19 a 27 de março de 2002 que na Fazenda Caraíbas, situada no Município do Dom Pedro Maranhão, delitos contra a liberdade e contra a organização do trabalho foram consumados pelos acusados.
2. Em anterior pronunciamento nosso, transcrevemos depoimentos dos trabalhadores e dos chamados "gatos", ou intermediadores, no aliciamento dos trabalhadores para a roça da juquira, na Fazenda Caraíbas verbis:
"8. Com efeito, depôs Vicente de Pinho Borges e disse, verbis:
"Que ao chegarem à Fazenda Caraíbas, foram levados para
alojamentos precários, sem piso e sem qualquer iluminação, bem como sem instalações sanitárias; Que os 15 (quinze) trabalhadores
ficaram alojados no local ora descrito; Que, ao iniciarem suas atividades, cuja tarefa consistia em roço de juquira, passaram a trabalhar sob as ordens do gato VICENTE, o qual informou aos trabalhadores e ao declarante que o adiantamento que havia sido fornecido aos mesmos seria descontados posteriormente bem como as botas e ferramentas de trabalho (foice) que lhes foram entregues pelo referido gato VICENTE, naquela ocasião,
Que a água fornecida aos trabalhadores era retirada de um cacimba infestado de insetos e "copa-rosa"; Que a alimentação fornecida era de péssima qualidade e era composta apenas de feijão e arroz (no almoço e no jantar), e que o café da manhã consistia apenas em café puro e farinha de puba; Que a alimentação também seria descontada, conforme lhes informou o gato VICENTE, que anotava em caderno todos os gastos com os trabalhadores, inclusive as despesas realizadas com o transportes dos referidos trabalhadores para a citação Fazenda Caraíbas". (vide: fls. 71)
9. Prosseguiu Vicente, verbis:
"Que no dia 08.03.02 Sexta-feira, o gato VICENTE, a pedido dos trabalhadores, fez o acerto de contas e informou ao final, que dos 15
(quinze trabalhadores apenas 05 (cinco) tinham saldo a receber, no valor de R$ 20,00, sendo que o declarante nada recebeu, pois, segundo o gato 1.00.000.009077/2002-603 VICENTE, suas dúvidas correspondiam aos valores dos dias trabalhados;
Que , para retornar ao seu município foi necessário que os 05 (cinco) trabalhadores que tiveram saldo pagassem as passagens dos demais e inclusive a sua; Que, para sair da fazenda, percorreram cerca de 09 (nove) quilômetros, digo 15 (quinze) quilômetros a pé, até chegarem à cidade de Espírito Santo-MA, de onde retornaram à União-PI.
Que no local de trabalho (Fazenda Caraíbas) ainda ficaram vários trabalhadores, sob as ordens de outros gatos." (vide fls. 72/73) 10. Edilson Diniz Ferreira também esclareceu que, verbis:
"Num barraco de 6x4m ficam alojados cerca de 30 trabalhadores, não haviam instalações sanitárias; não era fornecida água potável (a água
para consumo era retirada do açude). Os barracos não têm paredes e são de terra batida. Muitas vezes foram encontrados animais peçonhentos, como cobras e aranhas dentro do barracão. O declarante informa que desde dezembro/2001 o acesso ao alojamento está alagado, sendo os trabalhadores obrigados a nadarem em locais onde a água alcança a altura do peito de um homem adulto para se locomoverem do alojamento até a sede da Fazenda, e de lá de volta para o alojamento." vide: fls. 75--)
Comentários de leitores
2 comentários
Maria Lima (Advogado Autônomo)
Caro Antonio Fernandes Neto, "Inocêncio". Malditêncio, isso sim. Nunca suficientemente amaldiçoado. Menores inocentes são confinados na FEBEM, não sabemos como "vivem"; não queremos saber; há, entre eles, assassinos impiedosos, ninguém ignora; mas, são poucos; a grande maioria é deserdada da sorte, não existe, na paisagem jurídico-social brasiliera; abominamos os menores infratores (QUE custo futuro, meu Deus!). Mas, chegamos em casa, após o trabalho, e vemos o Jornal Nacional: quantos delinqüentes impiedosos, terno, gravata, curso superior, levando a fome, a miséria, às casas de Família (seus eleitores)! Riem na nossa cara. Riem na cara de milhões de brasileiros. Pra eles, ninguém pede a pena de morte. O fato de EXISTIR gente dessa laia é um acinte cósmico a um povo honesto e honrado como o nosso. Maria Lima
Antonio Fernandes Neto (Advogado Associado a Escritório - Empresarial)
Sobre esses fatos e essa pessoa,já me manifestei por diversas vezes. A sua desfaçatez é tamanha que continua aparecendo na mídia como lider de governo, bancada, E PRESIDINDO A CAMARA FEDERAL!!! Pode? Neste País, de hoje, parece que tudo pode, sem punibilidade. Cassação? Nem pensar. Por que será???
Comentários encerrados em 04/04/2004.
A seção de comentários de cada texto é encerrada 7 dias após a data da sua publicação.