Lavanderia Brasil

Acusados de desviar dinheiro do Banestado são condenados

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25 de março de 2004, 22h17

Os doleiros Odilon Cândido Bacellar Neto e Altemir Antonio Casteli foram condenados nesta quinta-feira (25/3) a regime de prisão semi-aberta. A sentença foi dada pela juíza substituta da 2ª Vara Criminal de Curitiba, Bianca Georgia Cruz Arenhart. Ambos poderão recorrer da decisão em liberdade. Eles estavam detidos desde meados de 2003, quando foram presos por fraude com o uso de contas CC-5 mantidas na agência do Banestado de Foz do Iguaçu.

Ex-operador de câmbio dos bancos Bemge e Rural, Bacellar Neto foi acusado de permitir a movimentação ilegal de mais de R$ 4 mi em sua conta e Casteli, ex-gerente da casa de câmbio Elcatur, de deixar passar mais de R$ 400 mil.

Eles também são acusados de recrutar laranjas para abrir contas em bancos oficiais e privados. Segundo o Ministério Público, os doleiros eram responsáveis por preencher documentos – como declaração de rendimentos e residência — com dados falsos para desviar dinheiro do Banestado ao exterior. Eram eles também que movimentavam as contas que abriram em nome de laranjas nos bancos Plus, paraguaio, Rural, brasileiro, IFE Rural, uruguaio e no norte-americano Citibank.

Apesar de Castelli negar ter participado da ação, o MP alegou que, por ser caixa do Banco Bamerindus na época, ele detinha conhecimento das normas que regiam o sistema financeiro. Sabia assim das conseqüências de entregar cheques em branco a Carlos Ramirez e da ilegalidade da vultuosa movimentação em sua conta, não tomando qualquer providência a esse respeito. Segundo o MP, a ampla prova documental contra Bacellar Neto não deixa dúvidas de sua participação na operação.

Bacellar Neto foi condenado a regime semi-aberto de 6 anos e 9 meses e multa de R$ 3,6 mil. Ao mesmo valor foi condenado Castelli, que, segundo a decisão, deverá cumprir pena de 5 anos e 6 meses, também em regime semi-aberto.

Leia a sentença na íntegra

Autos nº:2003.70.00.039528-9

Classe: 7000 – Ação Penal

Autor: Ministério Público Federal

Acusados:Altemir Antonio Casteli (réu preso), brasileiro, casado, filho de artêmio casteli e elinir casteli, natural de cascavel/pr, nascido aos 12/07/1969, portador da ci rgnº 4.255.165-1 ii/ssp/pr, cpf nº 628.120.179-53, residente e domiciliado na rua maringá, 1719, ap. 35-a, jardim gramado, cascavel/pr, e atualmente preso;

Odilon Cândido Bacellar Neto (réu preso), brasileiro, casado, filho de teodorico januario bacellar e selma tanus bacellar, natural de ipanema/mg, nascido aos 28/02/1957, portador da ci rgnº m-900.223 ii/ssp/mg, cpf nº 227.129.096-15, residente e domiciliado na av.amazonas, 1730, 1º andar, bairro preto, belo horizonte/mg, e atualmente preso.

SENTENÇA

1. RELATÓRIO:

Trata-se de ação penal promovida pelo Ministério Público Federal, originariamente, em face de 11 (onze) pessoas – todas devidamente elencadas e qualificadas – pela suposta prática dos crimes assim descritos (fls. 02/48):

– Os Agentes do BANCO PLUS S/A, oito primeiros denunciados, quais sejam:

1) BELARMINO FERNÁNDEZ LORENCES; 2) AURÉLIO GONZALEZ VILLAREJO; 3) EDUARDO DANIEL FRIDMAN SBOROVSKI; 4) JOSÉ ALAMO RAMIREZ; 5)JOSÉ OMELLA CONCHELLO; 6) REGINALDO RIBEIRO DE AZEVEDO; 7) OSCAR ALBERTO FRANCO ALCARAZ E 8) JUAN CARLOS DOMINGO PRONO TOÑÁNEZ: por 311(trezentos e onze) vezes o delito do art. 22, parágrafo único, da Lei nº 7492/86, na modalidade “promoção de saída de moeda ou divisa para o exterior”, combinado com o art. 25 da mesma Lei, e artigos 29, 62 I e 69 do Código Penal, em virtude de igual número de depósitos realizados por 28 “laranjas” na conta CC-5 do Banco Plus S/A.;

por 28 (vinte e oito) vezes o crime do artigo 299 do Código Penal c/c os artigos 29 e 69 do mesmo estatuto, em virtude da abertura de contas correntes, para uso pelo Banco Plus S/A., em nome de 28 (vinte e oito) interpostas pessoas (“laranjas”), omitindo-se a verdade sobre fatos juridicamente relevantes, isto é, sobre a própria titularidade das contas e dos recursos que por elas transitaram; e 1 (uma) vez o crime de quadrilha (art. 288 do Código Penal);

– Os Aliciadores de “Laranjas”, quais sejam:

– o denunciado ALTEMIR ANTÔNIO CASTELI, como incurso, na medida de sua culpabilidade:

21 (vinte e uma) vezes no crime do art. 22, parágrafo único, na modalidade “promoção de saída de moeda ou divisa para o exterior”, da Lei 7.492/86, em concurso material e de pessoas, pelos dez depósitos de CLAUDEMIRO MARIANO, pelos quatro de OZANILDO TEODORO DE SOUZA e pelos sete que ele próprio realizou em seu nome na conta CC-5 do Banco Plus S/A.;

3 (três) vezes no crime de falsidade ideológica de documentos particulares (art. 299 do CP), em concurso material e de pessoas, em virtude da abertura de “contas de aluguel” em seu nome e em nome de CLAUDEMIRO MARIANO e OZANILDO TEODORO DE SOUZA; e


1 (uma) vez, no delito de formação de quadrilha, tipificado no art. 288 do CP;

– o denunciado ODILON CÂNDIDO BACELLAR NETTO, como incurso, na medida de sua culpabilidade:

1(uma) vez, no crime do art. 22, parágrafo único, na modalidade “promoção de saída de moeda ou divisa para o exterior”, da Lei 7.492/86, em concurso de pessoas, pelo depósito realizado na conta CC-5 do Banco Plus S/A. por meio da conta de ROGER SEBASTIÃO PINTO CONCEIÇÃO; 1(uma) vez, no delito de falsidade ideológica em documento particular (art. 299 do CP), em concurso de pessoas, em razão da abertura da conta de aluguel em nome de ROGER SEBASTIÃO PINTO CONCEIÇÃO; e 1(uma) vez, no delito de formação de quadrilha, tipificado no artigo 288 do CP, em concurso material com os demais.

– o denunciado LUIZ BENITEZ, como incurso, na medida de sua culpabilidade:

24(vinte e quatro) vezes, no crime do art. 22, parágrafo único, na modalidade “promoção de saída de moeda ou divisa para o exterior”, da Lei 7.492/86, em concurso de pessoas, pelos depósitos, em igual número, realizados na conta CC-5 do Banco Plus S/A. por meio da conta de SELOIR PEDROZO SILVEIRA; 1(uma) vez, no delito de falsidade ideológica em documento particular (art. 299 do CP), em concurso de pessoas, em razão da abertura da conta de aluguel em nome de SELOIR PEDROZO SILVEIRA; e 1(uma) vez, no delito de formação de quadrilha, tipificado no artigo 288 do CP, em concurso material com os demais.

Àquele tempo, descreveu a peça acusatória, em suma, remessas fraudulentas de numerários, via contas “CC-5”. Em reporte histórico, citou-se a autorização concedida, em 1996, pelo Banco Central do Brasil, para que cinco instituições financeiras (BEMGE, BANCO DO BRASIL, BANESTADO, ARAUCÁRIA e REAL) – as quais mantinham agências na cidade fronteiriça de Foz do Iguaçu/ Pr –, para receberem depósitos em espécie (grifos no original) em contas ‘CC-5’ (Carta Circular nº 5, de 1969), acima do patamar de R$ 10.000,00 (art. 8º da CC 2677 – que exigia a identificação da proveniência e destino de tais montantes). A determinação autárquica, segundo se alegou, teria o pretexto de facilitar o repatriamento de recursos gastos por brasileiros (“compristas”) no comércio de Cidade de Leste (Paraguai). Todavia, através de tais, “doleiros” teriam vislumbrado a possibilidade de dissimular recursos financeiros de origem ilícita e promover a evasão de divisas, em detrimento de reservas cambiais nacionais. Destarte, também segundo a Acusação, quadrilhas e organizações criminosas promoveram a abertura de contas de “laranjas”, mediante a cooperação, em co-autoria, de inúmeros gestores bancários, sendo que essas novas contas (mais de 300 teriam sido utilizadas para intermediar depósitos em contas CC-5) possibilitaram a transferência de recursos por meio de cheques e ‘docs’.

Ainda, consoante a exordial, o dinheiro depositado nessas contas de “laranjas” era repassado diretamente para contas de Casas de Câmbio ou Bancos paraguaios, a exemplo do BANCO PLUS S/A – INVERSIÓN Y FOMENTO (ora envolvido) para fins de remessa ao exterior mediante crédito em contas fora do País. Ou seja, basicamente, e para burlar a fiscalização do Banco Central, diz-se que o titular dos valores não depositava diretamente na conta CC-5, assim agindo, apenas, através de interposta pessoa, um “laranja”, que abria conta falsa em uma instituição financeira. Citou-se o e exemplo envolvido no IPL nº 558/98 (em nome de suposto ‘laranja’ CLAUDEMIRO MARIANO, titular da conta 33.774-4, na Ag. Banestado em Foz, para a conta CC-5 de nº 33.081 do BANCO PLUS S/A. na mesma agência, tendo como destino final a conta nº 77600954, do CITIBANK em Nova Iorque, nos EUA).

Segundo a inicial, também, ditas remessas teriam ocorrido em 9, 10, 11 e 15, 16, 17, 18 e 23 de dezembro de 1997, sempre para a mesma agência do CITIBANK e somaram r$ 14.382.321,00 (quatorze milhões, trezentos e oitenta e dois mil, trezentos e vinte e um reais), em valores históricos, conforme Laudo Pericial nº 1861-01 INC. Pelo menos vinte e oito “laranjas” teriam sido utilizados pelo BANCO PLUS para evadir divisas do Brasil, sempre através do mecanismo acima descrito.

Diante disso, minuciou o MPF cada qual das condutas dos supostos “aliciadores” e “laranjas” ora denunciados, todos integrando uma dada organização criminosa, quadrilha ou bando para fins de evasão de divisas nacionais por meio de contas CC-5. Ainda, desenvolveu todo o modus operandi do BANCO PLUS, com fulcro na documentação anexa (sobremaneira: IPL 558/98 no Dossiê que instruiu a presente; documentos extraídos do IPL 561/98; Anexo 1 do Laudo Pericial nº 1689/03 – INC; documentos extraídos do IPL 360/98; Laudo 1392/03 – INC; arquivos “Laranjas do Plus.anb.” e “Laranjas CC5 Plus.xls.” etc.) em prol do argumento de que todos os acusados que integravam a diretoria e as gerências do BANCO PLUS, na época dos fatos (entre 1997 e 1998), tinham conhecimento de que os recursos que alimentavam a conta CC-5 nº 33.081-2 (aberta na Agência 025, Centro, do Banestado de Foz do Iguaçu, em 14/01/97 – cf. docs. do IPL 558/98), eram de “origem espúria, clandestina ou ilegítima e provinham de contas comuns de ‘laranjas’ brasileiros. No entanto, concordaram com as remessas e as determinaram” (fls. 20/21) – sendo que 94,8% dos valores recebidos em conta, ou mais de 146 milhões de reais, teriam sido depositados por 28 ‘laranjas’ (fl. 22), relacionados no anexo 1 do Laudo Pericial nº 1639/03; ademais, que as transferências de valores da tal conta CC-5 para as contas CC-5 do IFE BANCO RURAL (URUGUAY) teriam sido ordenadas ou determinadas pelos denunciados, e somam a ordem de R$ 157.621.046,30 (cento e cinqüenta e sete milhões, seiscentos e vinte e um mil, quarenta e seis reais e trinta centavos) – cf. anexo 3, fl. 9, do Laudo 1689/03-INC, no vol.01 do “Dossiê Banco Plus” que instruiu a denúncia.


Destarte, que os oito primeiros denunciados teriam concertado com terceiros a realização de 311 (trezentos e onze) depósitos de ‘laranjas’ na conta CC-5 do Banco e mais 7 (sete) de origem suspeita, sendo que apenas um pequeno percentual de 0,32%, correspondente a R$ 468.648,00 (quatrocentos e sessenta e oito mil, seiscentos e quarenta e oito reais) teria sido originados de transferências entre domiciliados no exterior. Assim, conclui o MPF que praticamente todo aquele dinheiro restante saiu ilegalmente do país.

Finalmente, que os delitos de evasão de divisas e de falsidade ideológica foram praticados por inúmeros agentes, associados em quadrilha ou bando, incidindo, portanto, o artigo 288 do Código Penal e os aspectos processuais da Lei 9.034/95. Ainda, que os depósitos de recursos nas contas CC-5 do BANCO PLUS, que caracterizaria a “constituição de disponibilidades no exterior”, deram-se em desobediência às normas regulamentares, porquanto a dissimulação da origem dos recursos com a movimentação por meio de contas de ‘laranjas’, o que maculou todos os atos seguintes da operação financeira de modo a integrar o tipo penal do art. 22 da Lei 7.492/86.

Também, descreveu-se a suposta “divisão de tarefas” entre os denunciados, em unidade de desígnios, contando com a cooperação de inúmeros outros agentes; pormenorizando as condutas de cada qual ao fim de fazer denotar a “profissionalização do crime, vale dizer, a habitualidade delitiva (HC 71940/SP)” (fl. 28).

A denúncia, após distribuição por dependência (fl. 02), foi recebida em 08 de agosto de 2003 (fls.49/54).

O feito foi desmembrado em relação aos acusados estrangeiros não residentes no país (cf. fl. 53, item 7, e certidões das fls.72 e 145), formando-se os autos de nº 2003.70.00.043257-2. O mesmo se procedeu em relação a REGINALDO RIBEIRO AZEVEDO, nacional brasileiro não encontrado e supostamente residente em Assunção/PY (consoante se extrai das fls. 79 e 95 dos autos), autuando-se a AP nº 2003.70.00.049665-3 (fl. 300-item 3 e 330), também por dependência.

O processo pois, passou a tramitar unicamente em desfavor dos acusados (ora presos) ALTEMIR ANTONIO CASTELI e ODILON CÂNDIDO BACELLAR NETO.

De efeito, em autos inicialmente sigilosos (após, conhecidos – cf. fl. 116) e a pedido do Ministério Público Federal (fls. 73/85), restaram fundamentadamente decretadas as suas prisões preventivas (fls. 86/94), as quais foram cumpridas de acordo com rigores da lei (a tanto: fls. 113/115, 126/128 e 129//131).

Ainda, e depois de regularmente citados (fls. 149, 172 e 173), os imputados foram interrogados (ALTEMIR – às fls. 176/177 e 194/203; ODILON – às fls. 178/179, 218/219 e 241/250), e, por ilustres defensores constituídos, apresentaram suas correlatas defesas prévias (fls. 260/261 e 294/296, respectivamente).

Seguiu-se a instrução processual regular.

Pela Acusação, depois de reduzido o rol testemunhal a fim de que fosse empreendida celeridade ao presente (eis que se tratam de presos) – cf. fls. 188/189, item 7 e promoção da fl. 190 –, restaram ouvidas 6 (seis) pessoas, sendo uma na condição de informante.

Assim: Hilton Kasai (fl. 356), Claudemiro Mariano (fls. 612 e 684), Marli Nelci Fantin (fls. 607/609 e 672/674), Roger Sebastião Pinto Conceição (fl. 371), José Roberto Salgado (fls. 392, 405/406) e Eurico M. Montenegro (fls. 478 e 543). No que tange aos testigos Rolf Staud e Ozanildo T. de Souza, após várias tentativas improfícuas de serem localizados (fls. 392, 614, 462v, 528v e 613), o Ministério Público Federal solicitou a substituição do primeiro e indicou novo endereço do segundo, o que, entretanto, foi indeferido com fulcro na decisão das fls. 633/634.

Pela Defesa do acusado ALTEMIR foram ouvidas, por precatória: Adair João Sbardella (fl. 596), Marli Nunes (fl. 597) e Salete Schuck (fl. 598), sendo que a Parte desistiu do depoimento de Elise da Cruz, o que foi deferido (fl. 601).

Pela Defesa do acusado ODILON foram ouvidas, em maioria por deprecatas: José Felisberto Sobrinho (fls. 778/779), Walter José Ramos (fls. 384 e 571), Levi de Freitas Soares (fl. 579), Eder Martins Machado (fls. 385 e 572/573), Rogério Luiz Angelotti (fls. 474 e 478/481), Benedito Barbosa Neto (fl. 473 e 482/486), Luiz Acosta (fl. 559) e Pedro Bueno (fl. 587).

Na fase do art.499, a Acusação requereu as diligências da fl.640; pela Defesa de ALTEMIR foram solicitadas as dilações probatórias relacionadas nas fls. 658/659; finalmente pela Defesa de ODILON foram requeridas as providências das fls. 698/701. Os pleitos foram devidamente analisados pelo despacho das fls. 702/705, intimadas as Partes.

Em alegações finais, o Ministério Público Federal, invocou, em suma (fls.706/716): a ratificação do conteúdo da denúncia e sua plausibilidade, eis que o feito se teria pautado nos princípios do contraditório e da ampla defesa, bem como por estarem comprovadas tanto materialidade quanto autoria dos delitos praticados; que, tocante à prova material, esta restaria evidente no vasto dossiê anexo aos autos, contendo cópias dos IPLs a estes atrelados, e, sobretudo o Laudo nº 1689/03-INC, dando conta de que ALTEMIR ANTONIO CASTELI permitiu, em seu nome, a movimentação da quantia de R$ 452.600,00, enquanto ODILON CÂNDIDO foi o responsável pela movimentação de R$ 4.854.935,00; quanto à falsidade ideológica, que a documentação do feito faz concluir que os denunciados, em conjunto com os co-réus, inseriram elementos inverídicos em diversos documentos, tais como declarações de rendimentos, de residência, e de trabalho, abrindo contas em nome de ‘laranjas’ em banco oficiais e privados, em detrimento também do Banco Central do Brasil, dissimulando ainda a origem dos respectivos recursos, sempre no escopo de evadir divisas ao exterior. Sobre a autoria, o MPF invocou que esta também restaria provada, tendo sido os acusados os responsáveis pelo aliciamento e movimentação das contas de ‘laranjas’; que, inobstante ALTEMIR tenha negado a imputação, em sendo caixa do Banco Bamerindus na época dos fatos, detinha pelo conhecimento das normas que regiam o sistema financeiro; assim, sabia das conseqüências de entregar cheques em branco a Carlos Ramirez (segundo sua própria versão); também, que tinha ciência da vultuosa movimentação em sua conta, não tomando qualquer providência a esse respeito. Tangente a ODILON, diz que a ampla prova documental e testemunhal carreada aos autos não deixa dúvida de seu envolvimento nos fatos; que, durante as investigações policiais nos IPLs nºs 163/98, 561/98, 558/98, 685/98, 571/98, 139/98, 063/98, 561/97 ficou claro que os acusados ODILON e ALTEMIR foram os responsáveis pelo recrutamento e aliciamento de ‘laranjas’, utilizados para o Banco Plus; que a testemunha Hilton Kasai, analista do Banco Central, apontou as irregularidades encontradas na conta de ALTEMIR; do mesmo modo, que o depoimento de Roger Sebastião deixa clara a participação de ODILON. Finalmente, discrimina a tipicidade dos fatos, pleiteando a condenação dos réus em pena-base, ao menos, acima do termo médio; no que tange à pena de multa, sua fixação no máximo patamar, dadas as privilegiadas situações financeiras dos envolvidos.


A Defesa do acusado ALTEMIR apresentou sustentos finais aduzindo, por síntese (fls. 783/814): – em matéria preliminar a ocorrência de nulidades argüíveis ao tempo do inciso II do art. 571, quais sejam: a) litispendência, “como já grafado em exceção oposta em apartado e como fazem provas os documentos lá anexados” (in verbis fl. 785, infra), eis que verificadas as mesmas condutas atribuídas ao acusado, a mesma forma de execução, o mesmo lapso temporal bem como os supostos beneficiários da conduta nos autos de Ação Penal nº 98.10.14402-4, em trâmite na Circunscrição de Foz do Iguaçu; b) existência de norma penal em branco no tipo previsto pelo art. 22, parágrafo único, da Lei 7.492/86 (cf., sobretudo, argumentos das fls. 788 e ss.), sendo que, “todavia, a acusação não se valeu de nenhuma norma regulamentadora válida, mesmo porque, não há, em nosso ordenamento jurídico norma de tal natureza (o que aqui não se discute pela ausência de menção a qualquer norma)” (in verbis, fl. 790); destarte requereu “seja reconhecida a impossibilidade jurídica do art. 22 da Lei 7.492/86, para que seja implementado nos moldes pleiteados pelo Ministério Público Federal” (grifos no original, in verbis, idem); c) atipicidade, eis que é de clareza solar que o acusado não agiu da forma delitiva “pelas razões já apresentadas, as quais são corroboradas pela completa ausência de DOLO” (grifos no original, fl. 792); que o Ministério Público Federal, ao denunciar o réu, desatendeu ao princípio do devido processo legal, rasgando o princípio da tipicidade, quando imputou ao acusado o modelo incriminador albergado no parágrafo único do art. 22 da Lei 7.492/86; que ausente, ab inititio e no caso em tela, a demonstração do dolo de “promover a saída de divisa/moeda do território nacional”, e, ainda inadmitida a conduta culposa; que toda a prova carreada aos autos demonstra que o acusado foge daqueles padrões noticiados pela imprensa local, ou seja, ‘doleiro’ ou ‘aliciador’, sendo que foi apenas usado por terceiros – ou seja, era apenas mais um ‘laranja’; que o acusado não sabia que suas contas estavam sendo utilizadas para a promoção de evasão de divisas, nada restando provado em contrário no feito, por parte do órgão acusador; d) inexistência de condições para um pronunciamento judicial de mérito, por infringência a vários preceitos constitucionais, dentre eles, o cerceamento defensivo consistente no indeferimento de requisição de documentos essenciais à tese do réu, em especial aqueles que buscavam demonstrar que ‘o acusado não faltara ao seu trabalho na época dos fatos que lhe são imputados (aliciamento), que os seus delatores (sic) estiveram juntos na cidade de Foz do Iguaçu para a abertura de suas contas correntes, visando provar que buscaram atingir o acusado para se verem livres de conseqüências de seus próprios atos, obviamente que por articulação do algoz do denunciado, o Sr. Renato” (in verbis, fls. 798/799); que também fere o princípio do contraditório admitir-se à acusação buscar uma condenação com fulcro em “depoimentos de pseudo aliciados obtidos sem o crivo do contraditório, atentando-se, neste particular, que tais depoimentos se deram com os detratores na condição de indiciados e presos, no mesmo dia, oportunidade em que, mancomunados com RENATO, buscaram incriminar o ora Réu” (in verbis, fl. 799); – no mérito: invocou a inexistência dos delitos atribuídos ao acusado, razão pela qual a imputação há de ser tida, de plano, como improcedente; que, tanto a denúncia quanto as alegações finais não descreveram os elementos integrantes do delito pretendido, quais sejam os elementos objetivos, normativos e subjetivos do tipo penal – em especial (nota 19) ‘o fim de promover a evasão de divisas do País’; que restou indemonstrada a culpabilidade do ora denunciado; no que toca à autoria: que “é lamentável que se tente justificar a autoria delitiva cometendo exercício exegético equivocadíssimo, pois, o membro ministerial procede a elucubrações mentais fora da realidade factual, pois, interpreta os fatos de forma imaginária e tendenciosa” (in verbis, fl. 803); que a prova extrajudicial (oriundas do inquérito policial) não foram corroboradas por outros elementos de convicção colhidos em juízo; que os delatores buscavam isentar-se de suas próprias culpas, não estando – àquele tempo – compromissados a dizer a verdade, eis que interrogados; assim, que Claudemiro informa ter sido recrutado por uma mulher de nome Marly, afirmando trata-se de esposa de ALTEMIR; que, pois, a menção ao nome do réu apenas surge quando se fala da suposta mulher, que não era sua esposa (fato, portanto, desmentido ou não provado); que Claudemiro mente ao dizer que não foi pessoalmente à Agência do Banestado em Foz do Iguaçu, quando, em verdade, ele, Ozanildo e Renato estiveram pessoalmente naquela cidade a fim de proceder a abertura das contas-correntes, tendo comparecido, inclusive, no Tabelionato Pinheiro, na mesma data, para providenciar o Cartão de Assinaturas para posterior reconhecimento de suas firmas; que, em juízo, Claudemiro não confirmou aquela versão da fase inquisitorial; que, ao contrário, afirmou categoricamente não conhecer ALTEMIR ANTONIO CASTELI; que, já Ozanildo, afirma que foi pessoalmente à Agência na companhia de ALTEMIR, quando este, na realidade, estava trabalhando na agência do Banco Bamerindus da cidade de Cascavel (“fato que este Juízo impediu fosse provado ante o indeferimento para que aquela instituição informasse acerca das faltas do denunciado” – fl. 805); que, convém enfatizar, o agente ministerial lança mão de tais ‘imprestáveis interrogatórios’ para alicerçar seu entendimento; que, ao contrário, a testemunha de acusação Hilton Kasai (fls. 356/362) demonstra a mera condição de ‘laranja’ do réu; que a testemunha Salete Schuck (fl. 598) revela a intenção de Renato no sentido de, segundo suas palavras “ferrar o ALTEMIR”; que o aliciador, no caso, é Renato Cesar Mariano, fato este destacado pela sua evasão logo após o seu indiciamento bem como sua condição de revel nos autos de Ação Penal nº 98.1014402-4, em Foz do Iguaçu; que, enfim, o réu não promoveu qualquer aliciamento, mas tão-só “vendeu seus talões de cheque, sem que tivesse noção de que tais documentos seriam utilizados da forma como o foram” (in verbis, fl. 807), e assim agiu “por extrema dificuldade financeira” (cf. fl. 808); que o acusado nem mesmo passaporte possui sendo que nada o levaria a aliciar outros ‘laranjas’ se ele próprio já havia sido usado como um; que, dentre as testemunhas de Acusação (exceto a esposa do acusado), ninguém o conhece; no que tange à materialidade: que a mesma também não teria sido provada diante da atipicidade dos fatos; que não se comprovou que os valores remetidos através das contas correntes do acusado são provenientes de algum ilícito; que o acusado foi enfático, desde a esfera policial, em afirmar que não praticou os atos descritos; que, por fim, inexistentes provas bastantes, urge um decreto absolutório em favor do réu. Outrossim, e via alternativa, deduziu a Defesa em jogo argumentos em prol do reconhecimento de continuidade delitiva, da inexistência de falsidade documental e de formação de quadrilha (fls. 812/814). Anexados, ainda, os documentos da fls. 815/845.


A Defesa do acusado ODILON, por sua vez, apresentou alegações finais pelas razões de fato e de Direito assim resumidas (fls. 846/894): – em matéria preliminar: a) ofensa ao princípio do Juiz Natural no plano da fonte e incompetência do juízo processante, eis que (1) os Tribunais não podem criar, mas apenas propor ao Poder Legislativo a instituição de novas varas ou juízos; (2) os órgãos do Poder Judiciário da União devem ter a sua “organização e competência” estabelecidas na Constituição e na Lei (LOMAN, art. 15), salvo quanto à organização interna corporis dos Tribunais e (3) o “desdobramento de juízos e a criação de novas varas” também depende da prévia edição de lei; também, que seria inadmissível imaginar que a competência material de um órgão jurisdicional de 1ª instância possa ser fixada através de mero ato administrativo, sem amparo em lei específica que crie esse determinado órgão; que, portanto, o acusado está sendo processado – e teve sua prisão preventiva decretada – por autoridade judiciária criada ao arrepio da garantia constitucional do juiz natural e em desacordo com o que determina o art. 74 do Código de Processo Penal; que, com isso, os autos devem ser remetidos para a 1ª Vara Federal de Foz do Iguaçu, verdadeiro Juiz Natural da causa, e concebidos todos os atos decisórios (e, principalmente, o decreto da prisão) como radicalmente nulos; b) ofensa ao princípio do Juiz Natural no plano do tempo, dado que foi atribuída a esta 2ª Vara Federal Criminal uma competência em sentido amplo – e para todo o território do Estado do Paraná – inclusive em relação aos fatos delituosos ocorridos anteriormente à edição das Resoluções nº 314 do Conselho da Justiça Federal e nº 20 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região; c) ofensa ao princípio do Juiz Natural no plano da competência, considerando que, no momento em que a denúncia foi oferecida perante esta Vara, o Juízo Federal de Foz do Iguaçu já se encontrava prevento, eis que já havia proferido atos decisórios na fase das investigações; d) cerceamento de defesa frente ao indeferimento de diligências na oportunidade do art. 499, CPP e a impossibilidade de produção de prova pelo acusado que objetivava evidenciar “a viabilidade da tese outrora aventada” (fl. 871), qual seja, a ocorrência de litispendência no caso; – e, no mérito: (1) quanto à evasão de divisas: a) a ocorrência de litispendência, tangente ao tipo penal do art. 22 da lei 7.492/86; b) a insubsistência da acusação, eis que, em tempo algum, conseguiu-se demonstrar indene de dúvidas que o acusado ODILON efetivamente tivesse tido participação decisiva na consumação da evasão de divisas; que não se têm provas nos autos de que o depósito em tela (R$ 117.810,00, através da conta corrente aberta em nome de Roger Sebastião Pinto Conceição) tenha sido efetivado de maneira irregular, pois, como se verifica da própria denúncia, parte dos depósitos efetuados na conta CC-5 do Banco Plus não foi transferida para o exterior (IFE Rural); que não haveria qualquer prova que ligasse o acusado ao suposto ingresso de valores, oriundo de referida conta-corrente (a qual, frisou-se, sequer se tem notícia de sua existência – fl. 877), na CC-5 do Banco Plus, pois os envolvidos em tal remessa podem ser facilmente identificados; que os depósitos efetuados na conta ‘CC-5 tipo 2’ (sic contas origens) não podem caracterizar constituição de disponibilidade no exterior, uma vez que a conta possui características de conta comum e só permite a movimentação financeira em moeda nacional; que a declaração de Roger Sebastião no sentido de que teria trabalhado para o acusado seria falsa, pois jamais provada nos autos; que o Sr. Roger – segundo a versão de ODILON – é ex-funcionário da Caixa Econômica federal, onde trabalhou por aproximadamente 17 (dezessete) anos em cargos que tinha contato direto com clientes e abertura de contas correntes; que tal pessoa, pois, possuía pleno domínio da atividade bancária o que permitia a ele efetivar de esponte própria qualquer operação; que o acusado ODILON afirmou que, desde junho de 1997, não havia tido mais qualquer contato ou relacionamento com o Sr. Roger, sendo que este sempre agiu por iniciativa própria e para servir e obter vantagens para outras pessoas relacionadas com o mercado comandado pela área de câmbio do conglomerado Banco Rural; que, aliás, tal Conglomerado é que seria o grande centralizador das operações, não tendo sequer sido mencionado pela acusação; que a função do denunciado ODILON “sempre foi a de operador de mesa, ou seja, limitava-se a acompanhar as definições das taxas que se praticam no momento e as repassam aos clientes” (fl. 878, in verbis), sendo que não possuía autonomia para efetuar fechamentos nem conhecimentos contábeis ou sobre normas de liquidação (o que cabia à área de câmbio da instituição financeira); que dita área de câmbio do Banco Rural, segundo disse ODILON, sempre teve suas atividades concentradas pela pessoa do Sr. José Roberto Salgado, o qual analisava as empresas e pessoas físicas a serem utilizadas para a efetivação das operações, tratando pessoalmente com as interpostas pessoas e também com os detentores dos recursos; que “a conta CC-5 do Banco Plus aberta no Banestado de Foz do Iguaçu teve o objetivo de servir ao conglomerado Rural S/A para fazer remessas disfarçando a utilização de interpostas pessoas e empresas” (in verbis, fl. 879); que o que mais causaria estranheza seria o fato de que tanto José Roberto Salgado (chefe imediato e superior hierárquico do acusado no Banco Rural) quanto Roger Sebastião Pinto Conceição (pessoa com amplos conhecimentos da atividade bancária) terem sido apenas mencionados como testemunhas de acusação, jamais tendo sido investigados; que, ademais, a efetiva participação de ODILON nos fatos descritos na denúncia nunca foi esclarecida a contendo, não havendo qualquer prova que o incrimine ou que demonstre sua responsabilidade; (2) quanto à formação de quadrilha ou bando: a) que o tipo penal em jogo exige a participação de, ao menos, quatro pessoas o que, de antemão, já manifesta a inviabilidade da acusação; que, “dos (11) onze denunciados, apenas ODILON e mais um indivíduo encontram-se no pólo passivo da demanda criminal, o que demonstra, de plano, a incoerência de uma eventual condenação” (in verbis, fl. 881-fim); b) que, por fim, não restou provado qualquer vínculo do acusado com quaisquer dos co-réus mencionados na inicial, assim também a existência de dita associação para fins criminosos, com a presença de ODILON; (3) quanto ao crime de falsidade ideológica: a) que tal já foi objeto de apreciação pelo Juízo da 4ª Vara Federal Criminal de Belo Horizonte; b) que tal conduta é absorvida pelo crime disposto no art. 22, parágrafo único, da Lei 7.492/86, eis que “crime-meio” e elementar objetiva do tipo penal em epígrafe. Propugnou-se, finalmente, pelo acolhimento das teses perpetradas.


Os autos foram registrados para a prolação de sentença pelo MM. Juízo Federal desta Vara, em 06/fevereiro/2004 (fl. 895), e recebidos por este Juízo Substituto logo após o retorno de suas férias regulares (02/fevereiro a 03/março).

Vale, ainda, relatar que, no ínterim do presente procedimento foram opostas as seguintes medidas:

1. desde 25/agosto/2003, pleito reiterado de revogação de prisão preventiva pela Defesa de ALTEMIR ANTÔNIO CASTELI (fl. 137 da presente) – autos nº 2003.70.00.044265-6, distribuídos por dependência à presente e ora apensados – despachados às fls. 02, 20/28, 32, 33 e 42/44 daqueles;

2. desde 03/setembro/2003, pleitos reiterados de revogação de prisão preventiva pela Defesa de ODILON CÂNDIDO BACELLAR NETO (fl. 184) – autos nº 2003.70.00.046516-4, distribuídos por dependência à presente e ora apensados – despachados às fls. 02, 71, 73, 95/105, 108, 149/155, 157, 164/167, 172, 193/194, 206, 207 e 209 daqueles;

3. em 03/setembro/2003, exceção de litispendência pela Defesa de ODILON (fl. 184) – autos nº 2003.70.00.046515-2, distribuídos por dependência à presente e ora arquivados -, cuja sentença transitada em julgado encontra-se trasladada à presente nas fls. 223/228;

4. em 04/setembro/2003, exceção de litispendência pela Defesa de ALTEMIR (fl. 184) – autos nº 2003.70.00.047521-2, distribuídos por dependência à presente e ora arquivados -, cuja sentença, transitada em julgado, encontra-se trasladada à presente nas fls.229/232;

Ainda, também, e perante nosso E. Tribunal Regional da 4ª Região:

1. autos de HC nº (no TRF): 2003.04.01.040759-6, em favor do paciente ALTEMIR ANTONIO CASTELI: cuja liminar restou indeferida (cf. fls.274/288), assim também denegada a ordem por unanimidade (cf. fl. 407), nos termos do acórdão acostado às fls. 463/470 da presente;

2. autos de HC nº (no TRF): 2003.04.01.045498-7, em favor do paciente ODILON CÂNDIDO BACELLAR NETO: cuja liminar restou indeferida (cf. fls. 489/510), assim também denegada a ordem por unanimidade (cf. fl. 618), nos termos do acórdão acostado às fls. 489/490 desta;

3. autos de HC nº (no TRF): 2003.04.01.056305-3, em favor do paciente ODILON CÂNDIDO BACELLAR NETO: cuja liminar restou indeferida (cf. fls. 643/655), concedendo-se parcialmente a ordem para fins de deferir a remoção do réu à cela especial (cf. consulta de movimentação processual e cumprimento por este juízo), nos termos do acórdão ainda não disponível.

2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1.Cuida-se de ação penal promovida pelo Ministério Público Federal em face, dentre outros, do denunciado ALTEMIR ANTÔNIO CASTELI, como incurso, na medida de sua culpabilidade: 21 (vinte e uma) vezes no crime do art. 22, parágrafo único, na modalidade “promoção de saída de moeda ou divisa para o exterior”, da Lei 7.492/86, em concurso material e de pessoas, pelos dez depósitos de Claudemiro Mariano, pelos quatro de Ozanildo Teodoro de Souza e pelos sete que ele próprio realizou em seu nome na conta CC-5 do Banco Plus S/A.; 3 (três) vezes no crime de falsidade ideológica de documentos particulares (art. 299 do CP), em concurso material e de pessoas, em virtude da abertura de “contas de aluguel” em seu nome e em nome de Claudemiro Mariano e Ozanildo Teodoro de Souza; e 1 (uma) vez, no delito de formação de quadrilha, tipificado no art. 288 do CP. Assim, também, contra o denunciado ODILON CÂNDIDO BACELLAR NETTO, como incurso, na medida de sua culpabilidade: 1(uma) vez, no crime do art. 22, parágrafo único, na modalidade “promoção de saída de moeda ou divisa para o exterior”, da Lei 7.492/86, em concurso de pessoas, pelo depósito realizado na conta CC-5 do Banco Plus S/A. por meio da conta de Roger Sebastião Pinto Conceição; 1(uma) vez, no delito de falsidade ideológica em documento particular (art. 299 do CP), em concurso de pessoas, em razão da abertura da conta de aluguel em nome de Roger Sebastião Pinto Conceição; e 1(uma) vez, no delito de formação de quadrilha, tipificado no artigo 288 do CP, em concurso material com os demais.

2.2.Das Preliminares – conhecíveis de ofício ou aventadas pelas partes.

2.2.a. Das condições genéricas da ação.

Cumpre verificar, inicialmente, a existência das condições genéricas da ação (legitimidade ad causam, possibilidade jurídica do pedido/tipicidade aparente, interesse de agir/punibilidade concreta/ausência de causas extintivas de punibilidade, e justa causa art. 43 c/c art. 18 do CPP). Neste patamar, tem-se que todas se verificam como presentes, pelo que, ratifica-se o decisório das fls. 49/54.

2.2.b. Das condições específicas para a ação penal.

Quanto às condições específicas para a ação penal (mais conhecidas como condições de procedibilidade), percebe-se, in casu, que são inexigíveis.


2.2.c. Dos pressupostos processuais.

Ainda, mister analisar os pressupostos processuais (acusação regular, citação válida, capacidade específica subjetiva e objetiva do juiz, capacidade das partes, originalidade da causa, ampla defesa e intervenção ministerial), não restando verificada, a tanto, qualquer irregularidade.

Todavia, face às preliminares aventadas pelas d. Defesas técnicas dos réus, cumpre avaliá-las pormenorizadamente, o que se procede adiante.

2.2.d. Das preliminares aduzidas pelas Partes.

Dessarte, em matéria preliminar, argumentou a Defesa de ALTEMIR a ocorrência de nulidades argüíveis ao tempo do inciso II do art. 571, quais sejam: a) litispendência, “como já grafado em exceção oposta em apartado e como fazem provas os documentos lá anexados” (in verbis fl. 785, infra), eis que verificadas as mesmas condutas atribuídas ao acusado, a mesma forma de execução, o mesmo lapso temporal bem como os supostos beneficiários da conduta nos autos de Ação Penal nº 98.10.14402-4, em trâmite na Circunscrição de Foz do Iguaçu; b) existência de norma penal em branco no tipo previsto pelo art. 22, parágrafo único, da Lei 7.492/86 (cf., sobretudo, argumentos das fls. 788 e ss.), sendo que, “todavia, a acusação não se valeu de nenhuma norma regulamentadora válida, mesmo porque, não há, em nosso ordenamento jurídico norma de tal natureza (o que aqui não se discute pela ausência de menção a qualquer norma)” (in verbis, fl. 790); destarte requereu “seja reconhecida a impossibilidade jurídica do art. 22 da Lei 7.492/86, para que seja implementado nos moldes pleiteados pelo Ministério Público Federal” (grifos no original, in verbis, idem); c) atipicidade, eis que é de clareza solar que o acusado não agiu da forma delitiva “pelas razões já apresentadas, as quais são corroboradas pela completa ausência de DOLO” (grifos no original, fl. 792); que o Ministério Público Federal, ao denunciar o réu, desatendeu ao princípio do devido processo legal, rasgando o princípio da tipicidade, quando imputou ao acusado o modelo incriminador albergado no parágrafo único do art. 22 da Lei 7.492/86; que ausente, ab inititio e no caso em tela, a demonstração do dolo de “promover a saída de divisa/moeda do território nacional”, e, ainda inadmitida a conduta culposa; que toda a prova carreada aos autos demonstra que o acusado foge daqueles padrões noticiados pela imprensa local, ou seja, ‘doleiro’ ou ‘aliciador’, sendo que foi apenas usado por terceiros – ou seja, era apenas mais um ‘laranja’; que o acusado não sabia que suas contas estavam sendo utilizadas para a promoção de evasão de divisas, nada restando provado em contrário no feito, por parte do órgão acusador; d) inexistência de condições para um pronunciamento judicial de mérito, por infringência a vários preceitos constitucionais, dentre eles, o cerceamento defensivo consistente no indeferimento de requisição de documentos essenciais à tese do réu, em especial aqueles que buscavam demonstrar que ‘o acusado não faltara ao seu trabalho na época dos fatos que lhe são imputados (aliciamento), que os seus delatores (sic) estiveram juntos na cidade de Foz do Iguaçu para a abertura de suas contas correntes, visando provar que buscaram atingir o acusado para se verem livres de conseqüências de seus próprios atos, obviamente que por articulação do algoz do denunciado, o Sr. Renato” (in verbis, fls. 798/799); que também fere o princípio do contraditório admitir-se à acusação buscar uma condenação com fulcro em “depoimentos de pseudo aliciados obtidos sem o crivo do contraditório, atentando-se, neste particular, que tais depoimentos se deram com os detratores na condição de indiciados e presos, no mesmo dia, oportunidade em que, mancomunados com RENATO, buscaram incriminar o ora Réu” (in verbis, fl. 799).

De primeiro, mister ter em mente que a parte abarca todos os pontos, pois, preambularmente aventados, enquanto nulidades argüíveis ao tempo do inciso II do art. 571. Todavia, desde logo (acresça-se), tal não se pode admitir dado que, cediço, a grande maioria da matéria relevada ou constitui tema já precluso (e, pois, nulidade relativa), ou confunde-se com o mérito.

Dessarte, tocante à ocorrência de litispendência, a própria e d. Defesa admite que já se trata de argumento enfrentado “em exceção oposta em apartado e como fazem provas os documentos lá anexados” (in verbis fl. 785, infra). Aliás, some-se agora: matéria esta já sujeita à sentença transitada em julgado e, pois, absolutamente preclusa – assim, e cf. relato supra, confira-se a cópia da decisão e de seu trânsito final (para ambas as Partes), às fls. 229/232 da presente.

Quanto à existência de norma penal em branco no tipo previsto pelo art. 22, parágrafo único, da Lei 7.492/86, tomo a matéria como de mérito, a ser analisada – pois – oportunamente, quando da análise da tipicidade penal. Assim também o faço quanto aos argumentos de: ausência de dolo na conduta do réu, atipicidade dos fatos, inadmitindo, portanto, a tese de “impossibilidade jurídica da acusação” em face de tais aduções, porquanto manifestamente insubsumíveis na previsão legal de prejudicialidade (art. 43 do CPP).


Sobre a inexistência de condições para um pronunciamento de mérito por infringência a vários preceitos constitucionais, dentre eles, o cerceamento defensivo consistente no indeferimento de requisição de documentos essenciais à tese do réu, denoto que, igualmente, a própria Parte assume que tais provas buscavam apenas demonstrar que: ‘o acusado não faltara ao seu trabalho na época dos fatos que lhe são imputados (aliciamento), que os seus delatores (sic) estiveram juntos na cidade de Foz do Iguaçu para a abertura de suas contas correntes, visando provar que buscaram atingir o acusado para se verem livres de conseqüências de seus próprios atos, obviamente que por articulação do algoz do denunciado, o Sr. Renato” (in verbis, fls. 798/799). Assim, ela própria ratifica o fundamento adotado pela decisão das fls. 702/705 (em especial item 1.2) – a qual, aliás, tornou a matéria preclusa e decidida definitivamente, ao menos nesta instância. Por derradeiro, note-se que não se comprova qualquer prejuízo (art. 563, CPP); ao contrário, vê-se que a questão se apresenta hoje como plenamente superada, tomando em consideração que, na forma do art. 231 CPP, a mesma e própria Defesa findou por juntar tais documentos (como, aliás, lhe incumbia – art. 156 CPP), e antes da prolação da presente: assim, confira-se petitório adiante, datado de 04/mar/2004, protocolo número 000009072.

Ainda, e também quanto à ofensa do princípio do contraditório – argumento tal e como formulado – tenho-no como matéria de mérito, a sofrer análise logo a seguir.

No que concerne às aduções da Defesa técnica do acusado ODILON, tenho, primeiramente, que inocorre in casu dita ofensa ao princípio constitucional do Juiz Natural (seja no plano da fonte, seja no plano temporal, seja no plano da própria competência). Assim, ratifico (mais uma vez) como presente dito pressuposto processual jurisdicional objetivo, a viabilizar o julgamento de mérito desta causa.

De início, cumpre alertar para a irregularidade da argüição não produzida, seja pela via de exceção (e, pois, ao tempo da defesa prévia ao arrepio do disposto pelos arts. 95, II c/c 108 do Código de Processo Penal.– visto que se impugnam fatos ocorridos ab initio, ou seja, investigação procedimental já encerrada e denúncia promovida em Subseção diversa), seja pela via do conflito (art. 113 c/c 116, também do CPP); do mesmo modo não restou promovida e processada em separado (em desatenção, pois, também, ao art. 111 CPP). Deste modo, nem mesmo mereceria conhecimento.

Todavia, em homenagem à ampla defesa, vale refutar os argumentos, repetindo as bem lançadas promoções do MM. Juízo Federal Titular desta Vara (em processo, aliás, já submetido à revisão de nosso E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região, cf. adiante); assim:

“A Resolução n.º 20 do TRF da 4.ª Região, determinou a especialização da 2.ª Vara Criminal Federal em Curitiba para processar e julgar crimes de lavagem de dinheiro e crimes contra o sistema financeiro nacional em todo o território paranaense.

Embora a legalidade da providência possa ser questionada, há argumentos suficientes para ampará-la.

Não cabe aos tribunais, por certo, a competência para criar novas estruturas judiciárias, com criação de varas ou cargos.

Entretanto, nunca se reclamou reserva legal para decisão quanto à especialização material de varas judiciárias, estando esta competência compreendida no poder de auto-organização do serviço judiciário (artigo 99 da CF/88).

Se o poder de especialização está compreendido no artigo 96, II , “d”, da CF/88, e, portanto, é dependente de lei, como alega o MPF, não se vislumbra porque a especialização administrativa seria legal a nível de circunscrição judiciária e não a nível de seção, sendo então forçoso concluir pela ilegalidade e nulidade de todos os atos judiciários praticados no âmbito dessa circunscrição de Curitiba nas diversas varas especializadas (criminais, execução fiscal, SFH etc.)

Doutro lado, a resolução ora atacada foi precedida pela Resolução n.º 314, de 12/05/2003, do Conselho da Justiça Federal, que determinou tal especialização, sendo de se observar que a Constituição, em seu artigo 105, parágrafo único, confere ao CJF expressamente poderes de supervisão administrativa sobre a Justiça Federal.

Ainda sobre o tema, releva destacar que a CF/88, ao tratar da Justiça Federal, divide-a, em primeiro grau, em seções judiciárias e não em circunscrições (artigo 110), havendo portanto espaço para especialização a nível de seção judiciária.

Assim sendo, rejeito a arguição do MPF, mantendo o processo perante este Juízo.”

Ainda, e sobre a incompetência jurisdicional no plano temporal e no da própria operacionalização das Varas especializadas, cumpre-me apenas aludir ao precedente específico a respeito, de ordem da 3ª Seção de nosso Colendo Superior Tribunal de Justiça, reconhecendo (por unanimidade e via decisão devidamente transitada em julgado aos 12/11/2003),a constitucionalidade da criação deste Juízo processante:


“CONFLITO DE COMPETÊNCIA. JUÍZOS FEDERAIS CRIMINAIS. PENAL. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA E SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. CONEXÃO. RESOLUÇÃO 20/2003 DO TRF DA 4ª REGIÃO. ESPECIALIZAÇÃO DE VARAS CRIMINAIS.

Considerando os termos da Resolução 20/2003 do TRF da 4ª Região, que especializou a Vara Federal Criminal de Curitiba/PR, para “…processar e julgar os crimes contra o sistema financeiro nacional e de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores…”, este deve ser o juízo competente na hipótese, eis que o referido ato do Conselho da Justiça Federal destina-se, à vista da sua atribuição, a zelar pela eficácia célere da prestação jurisdicional no âmbito da jurisdição federal ordinária. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo Federal da 2ª Vara Criminal do Estado do Paraná, o suscitado.”

(Origem: STJ – SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Classe: CC – CONFLITO DE COMPETENCIA – 39367, Processo: 200301262239 UF: SP Órgão Julgador: TERCEIRA SEÇÃO, Data da decisão: 08/10/2003 Documento: STJ000511676 DJ DATA:28/10/2003 PÁGINA:189 JOSÉ ARNALDO DA FONSECA)

Do voto do E. Ministro Relator, extrai-se, em especial:

(…) Impugnada a Resolução 314/03, que autorizou a especialização de Varas Federais Criminais, para os crimes de lavagem de dinheiro, por violação ao princípio constitucional do juiz natural por dois ilustres membros do Parquet Federal, o Exmo. Sr. Procurador-Geral da República, Dr. Cláudio Fonteles, ao estancar a irresignação, fê-lo, no ponto que importa, nestes termos:

“4. Na verdade, o texto a ser impugnado é a Resolução nº 314, de 12 de maio de 2003, do Conselho de Justiça Federal, da qual emanou a Resolução do Colegiado Regional, porque se lê, verbis:

“Artigo 1º: Os Tribunais Regionais Federais, na área de sua Jurisdição, especializarão varas federais criminais com competência exclusiva ou concorrente…” (Resolução nº 314/2003)

5. Tem-se, por primeiro, afrontado o artigo 96, II, d, que legitima os colegiados recursais, superiores e ordinários, a simplesmente “propor ao Poder Legislativo” a alteração da organização e da divisão judiciárias.

6. Cabe a indagação: mantida a organização, na estrutura das varas federais de 1º grau, determinar a especialização , para competência exclusiva ou concorrente, significa alterar a organização judiciária?

7. O próprio enunciado da indagação, na minha concepção, fundamenta a resposta negativa.

8. É que não se está a criar novas varas judiciais mas, dentro do quadro existente, especializa-se o que já existe para cuidar, exclusivamente, de determinadas matérias tópicas, ou, concorrentemente, ampliar o âmbito de conhecimento dos feitos criminais que lhe estão afetos.

9. Na verdade, o ato de especializar pode, perfeitamente, inserir-se na atribuição constitucional de supervisão administrativa, cometida ao Conselho de Justiça Federal, como Órgão do Superior Tribunal de Justiça, a zelar pela eficácia célere da prestação jurisdicional no âmbito da jurisdição federal ordinária (1º e 2º graus), como está claro no Parágrafo único, do artigo 105, da Constituição Federal.

10. Assim compreende-se, também, os atos administrativos dos Corregedores das Cortes Recursais Ordinárias, por exemplo, a Juízes Substitutos determinar a lavratura de decisões definitivas, em número certo, a dar-se vazão a feitos inúmeros, e represados, nos Cartórios Judiciais titularizados, e que não vencem o acúmulo de feitos, tal acontecido em dias recentes na Justiça do Distrito Federal.

11. Estabelecida essa fundamentação, não há ofensa ao princípio do Juiz Natural e, outrossim, ao princípio do Promotor Natural.

12. Lugar não há a que se cogite dos artigos 48, IX e X; 68, § 1º e 110 todos do texto constitucional, por inadequação ao debatido.

13. O aceno com o tema alusivo à prevenção – fl. 04 – não pode ter guarida por sediar-se no âmbito infra-constitucional.

14. Não acolho a pretensão subscrita pelos ems. Colegas, louvando-os pelo zelo assim traduzido.”

Por conseguinte, adotando essas judiciosas considerações, conheço do presente conflito para declarar a competência do juízo criminal suscitado.” (grifos no original).

No exato e mesmo sentido, restam os vários julgados de nosso E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região (incluso, através de sua 4ª Seção):

“CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PENAL. PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. INDÍCIOS. VARA FEDERAL ESPECIALIZADA. RESOLUÇÃO Nº 20/03 DO TRF DA 4ª REGIÃO.

1. Os inquéritos policiais em que se investigam infrações penais previstas nas Leis nºs 7.492/86 e 9.613/98, devem ser remetidos às Varas Federais Criminais especializadas, nos termos do artigo 6º da Resolução nº 20 desta Corte.


2. Na hipótese dos autos, havendo indícios da prática de crimes contra o sistema financeiro nacional, no âmbito da Seção Judiciária do Paraná, a competência para processar e julgar o feito é do Juízo da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba.”

(Origem: TRIBUNAL – QUARTA REGIÃO, Classe: CC – CONFLITO DE COMPETENCIA – 2055, Processo: 200304010373057 UF: PR Órgão Julgador: QUARTA SEÇÃO, Data da decisão: 16/10/2003 Documento: TRF400090880 DJU DATA:29/10/2003 PÁGINA: 187 DJU DATA:29/10/2003)

“HABEAS CORPUS. ‘LAVAGEM DE DINHEIRO’. REMESSA FRAUDULENTA DE NUMERÁRIO AO EXTERIOR. CONTAS CC5. DESCARACTERIZAÇÃO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA E LITISPENDÊNCIA. PRINCÍPIOS DO JUIZ E PROMOTOR NATURAL. OBSERVÂNCIA. PODER GERAL EM MATÉRIA DE PROVA NÃO ACARRETADOR DE IMPEDIMENTO. LEI Nº 9.664/98. RESOLUÇÃO Nº 314 DO CJF E 20 DO TRF 4ª REGIÃO. LEGALIDADE FIRMADA PELA QUARTA SEÇÃO DESTA CORTE.PRESSUPOSTOS DA PRISÃO PREVENTIVA. IMPOSSIBILIDADE DE REAPRECIAÇÃO DE OBJETO IDÊNTICO A ANTERIOR JÁ JULGADO NESTE TRIBUNAL. REITERAÇÃO DE PEDIDO. ORDEM DENEGADA.

1.(…)

4. Não há falar em ofensa aos princípios do Juiz e Promotor Natural (art. 5º, XXXVII e LIII, da CF/88) eis que não se criou juizado algum de exceção, sendo possível a designação, pelo Procurador-Geral da República, de grupo (‘força-tarefa’) integrado por membros do MPF para atuação em casos especiais. (…)

6. A Lei nº 9.664/98 preceitua, em seu art. 3º, que “caberá ao Tribunal Regional Federal da 4a Região, mediante ato próprio, especializar Varas em qualquer matéria, estabelecer a respectiva localização, competência e jurisdição, bem como transferir sua sede de um município para o outro, de acordo com a conveniência do Tribunal e a necessidade de agilização da prestação jurisdicional”.

7. Tendo em conta esse diploma legal, bem como o disposto na Resolução nº 314 do CJF, a Presidência desta Corte editou a Resolução nº 20/03 providenciando, entre outras medidas, a especialização de Varas Federais Criminais para processar e julgar crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e de ‘lavagem’ ou ocultação de bens, direitos e valores (Leis nºs 7.492/86 e 9.613/98).

8. Ao Poder Judiciário não é vedado decidir sobre a especialização (e conseqüente modificação da competência) de seus órgãos, porquanto tal prerrogativa é ínsita à garantia de auto-organização inscrita no artigo 99 da Magna Carta.

9. Segundo precedentes desta Corte, corroborados por manifestação do Ministério Público nesta Instância, não há inconstitucionalidade no referido ato normativo.

10. A questão relativa aos fundamentos da prisão cautelar do Paciente já foi apreciada em writ anterior, sendo inadequada a reiteração de habeas corpus sob os mesmos motivos.

11. Ordem denegada.”

(Origem: TRIBUNAL – QUARTA REGIÃO, Classe: HC – HABEAS CORPUS – 4522, Processo: 200304010372788 UF: PR Órgão Julgador: OITAVA TURMA, Data da decisão: 08/10/2003, Documento: TRF400090729 DJU DATA:15/10/2003 PÁGINA: 991 DJU DATA:15/10/2003).

“PROCESSO PENAL. COMPETÊNCIA. ESPECIALIZAÇÃO DE VARA FEDERAL. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO E LAVAGEM DE DINHEIRO. RESOLUÇÃO Nº 20 DESTA CORTE. CONSTITUCIONALIDADE. IRRESIGNAÇÃO IMPROCEDENTE.

1. A Lei nº 9.664/98 preceitua, em seu art. 3º, que “caberá ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, mediante ato próprio, especializar Varas em qualquer matéria, estabelecer a respectiva localização, competência e jurisdição, bem como transferir sua sede de um município para o outro, de acordo com a conveniência do Tribunal e a necessidade de agilização da prestação jurisdicional”.

2. Tendo em conta esse diploma legal, bem como o disposto na Resolução nº 314 do CJF, a Presidência desta Corte editou a Resolução nº 20/03 providenciando, entre outras medidas, a especialização de Varas Federais Criminais para processar e julgar crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e de ‘lavagem’ ou ocultação de bens, direitos e valores (Leis nºs 7.492/86 e 9.613/98).

3. Ao Poder Judiciário não é vedado decidir sobre a especialização (e conseqüente modificação da competência) de seus órgãos, porquanto tal prerrogativa é ínsita à garantia de auto-organização inscrita no artigo 99 da Magna Carta.

4. Segundo precedentes desta Corte, corroborados por manifestação do Ministério Público nesta Instância, não há inconstitucionalidade no referido ato normativo.

5. Firmada a competência da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba para o exame do feito.”

(Origem: TRIBUNAL – QUARTA REGIÃO, Classe: RSE – RECURSO EM SENTIDO ESTRITO

Processo: 200370010100304 UF: PR Órgão Julgador: OITAVA TURMA, Data da decisão: 08/10/2003 Documento: TRF400090728 DJU DATA:15/10/2003 PÁGINA: 989 DJU DATA:15/10/2003)

“COMPETÊNCIA. VARAS FEDERAIS ESPECIALIZADAS EM LAVAGEM DE DINHEIRO E CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. RESOLUÇÃO 20/2003 DA PRESIDÊNCIA DO TRF DA 4ª REGIÃO.


– A Resolução 20/2003, de 26 de maio de 2003, expedida pela Presidência deste Regional, não é ilegal, nem fere a Constituição Federal, porque os Tribunais possuem atribuição constitucional e autorização legal para especializar varas, de acordo com os arts. 11 e 12 da Lei 5.010/66, c/c o art. 11, parágrafo único, da Lei nº 7727/89. Recurso em sentido estrito desprovido.”

(Origem: TRIBUNAL – QUARTA REGIÃO, Classe: RSE – RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – 4406, Processo: 200372050034268 UF: SC Órgão Julgador: OITAVA TURMA, Data da decisão: 13/08/2003 Documento: TRF400089628 DJU DATA:03/09/2003 PÁGINA: 651)

“PENAL. PROCEDIMENTO CRIMINAL. COMPETÊNCIA. SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. “LAVAGEM” DE DINHEIRO. RESOLUÇÃO Nº 314/CJF. RESOLUÇÃO Nº 20/TRF-4ª REGIÃO.

1. Tratando-se de procedimento criminal, a competência é determinada pela exegese das Resoluções nº 314 do Conselho da Justiça Federal e nº 20 desta Corte, com a especialização da 2ª Vara Criminal de Curitiba/PR para processar crimes contra o sistema financeiro nacional e de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores.

2. Negado provimento ao recurso em sentido estrito.”

(Origem: TRIBUNAL – QUARTA REGIÃO, Classe: RSE – RECURSO EM SENTIDO ESTRITO, Processo: 200372050033574 UF: SC Órgão Julgador: OITAVA TURMA, Data da decisão: 08/10/2003 Documento: TRF400093043 DJU DATA:14/01/2004 PÁGINA: 480 DJU DATA:14/01/2004)

Diante de tais, desnecessárias maiores digressões.

Finalmente, e no que diz respeito ao alegado cerceamento de defesa frente ao indeferimento de diligências na oportunidade do art. 499, CPP e a impossibilidade de produção de prova pelo acusado que objetivava evidenciar “a viabilidade da tese outrora aventada” (fl. 871), qual seja, a ocorrência de litispendência no caso, tenho que, de igual forma, não merece guarida. É que a própria Parte ratifica que os documentos, que buscava acostar aos autos, nada mais pretendiam do que evidenciar a ocorrência de litispendência no caso, o que, por sua conta, já esta devidamente analisado e decidido nos autos incidentais (exceção interposta em apartado, aliás, cf. os ditames da lei) e cuja sentença já resta transitada em julgado. Assim, trata-se de questão definitivamente preclusa; a tanto, confiram-se as transladadas cópias das fls. 223/228 e certidão de trânsito.

Refutadas as preliminares, estão conformes os autos para avaliação do meritum causae.

2.3. DO MÉRITO:

2.3.1. Da materialidade

2.3.1.1. A materialidade dos fatos criminosos descritos na exordial é captada, antes de mais nada, da farta documentação que instruiu a denúncia, notadamente daquela inclusa nos autos do Apenso “Dossiê Banco Plus” (dotado de 02 volumes). Com efeito, desde a inicial, já se reportavam aos tais elementos de prova, de forma escalonada e regularmente individualizada, o que acabou ratificado pelas alegações finais da Acusação e a devida instrução criminal. Assim vejamos.

Conforme já relatado, a peça acusatória anunciou, em síntese, remessas fraudulentas de numerários, via contas “CC-5”. Segundo se alega, o dinheiro depositado nessas contas de “laranjas” era repassado diretamente para contas de casas de câmbio ou bancos paraguaios, a exemplo do BANCO PLUS S/A – INVERSIÓN Y FOMENTO (ora envolvido), para fins de remessa ao exterior mediante crédito em contas-correntes fora do País.

De efeito, fartas foram as provas dos cometimentos dos crimes referidos desde o início da ação penal – a qual, reitere-se, já veio embasada em ampla documentação, toda ela dotada de presunção pública de legitimidade e veracidade não refutada por prova em contrário (de falsidade, pois). Nesse modo, citem-se, sobremaneira: os documentos extraídos do IPL 558/98 (anexos no Apenso II, Dossiê Banco Plus); documentos extraídos do IPL 561/98 e do IPL 360/98 (idem); o Anexo 1 do Laudo Pericial nº 1689/03-INC (no disquete acostado aos autos, assim também no Apenso I, Dossiê); o Laudo 1392/03-INC (idem); os arquivos “Laranjas do Plus.anb.” e “Laranjas CC5 Plus.xls.” – também em anexo etc.

Destarte mister reconhecer que, desde aquele tempo, as tais comprovações atestavam que, na época dos fatos (entre 1997 e 1998), os recursos que alimentavam a conta CC-5 nº 33.081-2 do BANCO PLUS, aberta na Agência 025, Centro, do Banestado de Foz do Iguaçu, em 14/01/97 (cf. docs. do IPL 558/98, em anexo, e, também, aqueles oriundos do próprio Banestado e ora integrantes do Apenso III), eram de origem clandestina ou ilegítima, eis que provinham de contas comuns de ‘laranjas’ brasileiros, sem que fosse possível, aos órgãos públicos portanto, verificar os efetivos proprietários do dinheiro.

Como exemplo, cite-se aquele envolvido no IPL nº 558/98, em nome de CLAUDEMIRO MARIANO (titular da conta 33.774-4, na Ag. Banestado em Foz), abarcando significativas transferências internacionais entre a conta CC-5 de nº 33.081-2 (do BANCO PLUS S/A., na mesma agência) e, a destinatária final, conta nº 77600954 do CITIBANK em Nova Iorque (EUA). De efeito, consoante as provas documentais não refutadas (Laudo 1861/01-INC e seus anexos, em cópias autenticadas às fls. 111/119 e 155/175 do Apenso I), dentre 09 e 16 de dezembro de 1997 – ou seja, em apenas 8 dias – a conta-corrente de CLAUDEMIRO foi alimentada por depósitos (todos em cheque, destaque-se, e de origens diversas – cf. o mesmo Laudo, às fls. 111/117 do Apenso I) que somaram o total de créditos, em valores históricos, de R$ 15.580.557,67. Deste montante, foram remetidos à CC5 do BANCO PLUS (e destinados sempre para a mesma agência do CITIBANK/ EUA, como já visto), em 9, 10, 11 e 15, 16, 17, 18 e 23 de dezembro de 1997, um total de R$ 14.382.321,00 (quatorze milhões, trezentos e oitenta e dois mil, trezentos e vinte e um reais) em valores históricos – o que corresponderia, em 14/11/2001, a nada menos do que R$ 32.534.667,14 (cf. fl. 119 do Apenso I). Vale ressaltar, ainda, que todo o restante de dita conta-corrente foi creditado (no mesmo lapso temporal) em favor de, também, envolvidos com operações irregulares de câmbio, tais como: BANCO DEL PARANÁ S/A., REAL CÂMBIOS, JOSÉ CARLOS MELO (do Banco INTEGRACIÓN) etc. – cf. demonstra o Anexo III ao Laudo nº 1861, à fl. 118 do Apenso I.


Se tal não bastasse, cumpre registrar que as imputações ministeriais relativas a tal exemplo findam também ratificadas pelas peças trasladadas do IPL correlato, e que ora se anexam (devidamente autenticadas), no Apenso II (Dossiê, Volume 02) da presente.

Compulsando-no, é possível vislumbrar que, conquanto tenha movimentado a vultuosa quantia reportada de R$ 32.905.097,00, em transferências internacionais em reais registradas no SISBACEN (cf. fls. 441446/DPF do IPL, no Ap.II), dentre apenas os dias 09 e 23 do mês de dezembro de 1997, CLAUDEMIRO MARIANO declarava, à época, trabalhar como comerciante autônomo em Foz do Iguaçu, recebendo, mensalmente, a importância de R$ 2.800,00 (dois mil e oitocentos reais) – cf. fls. 11 e 15/DPF do IPL, no Ap. Demais disso, e conforme indicado pela Receita Federal à fl. 325/DPF do mesmo IP: “O contribuinte de nome ‘Claudemiro Mariano’, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas com número 474.299.339-04 (…) não entregou declarações de IRPF nos últimos seis anos.(…) Nos sistemas auxiliares de dados internos (bancos de dados de compra e venda de bens imóveis, veículos, SIGA etc.) também nada consta em nome do contribuinte”. Em igual modo, e consoante o Boletim de sua vida pregressa (fl. 852/DPF do IPL), vê-se que CLAUDEMIRO detém apenas o 1º grau completo de instrução, tendo trabalhado como Porteiro em Cascavel/Pr há 10 anos, e restando desempregado até junho de 2000, quando se mantinha através da aposentadoria de sua mãe.

De efeito, outro não poderia ser o remate do Laudo de Exame Financeiro nº 1861-INC, elaborado, em específico, a respeito (no mesmo IPL, e às fls. 155/175 do Apenso I, da presente):

“(…) Considerando-se os dados indicados acima, foi constatado que o total líquido de créditos registrados na conta-corrente questionada, no período de 09/12 a 23/12/1997, representou, aproximadamente, 5.644 (cinco mil, seiscentos e quarenta e quatro) vezes o rendimento indicado como auferido pelo investigado. (…)

Já o montante de recursos transferidos da conta corrente investigada para as contas de não-residentes indicadas no quadro 004 adiante representou, aproximadamente, 6000 (seis mil) vezes a renda indicada como auferida pelo investigado (sic)…

Assim, considerando todo o anteriormente exposto, conclui-se que a movimentação financeira ocorrida na conta corrente questionada, titulada por CLAUDEMIRO MARIANO, bem como os valores transferidos para o exterior em nome da citada pessoa, no período de 09 a 23/12/1997, são incompatíveis com a renda mensal informada nos documentos de folhas 0052 e 0056 do apenso 01 ao IPL Nº 558/98/DPF.A/FI/PR” (grifos no original).

Tal combinação de dados pode ser feita, registre-se, em todos os demais casos que se encontram documentados no “Dossiê” em apenso (e, pois, correlatos IPLs).

Em sendo assim, desde a denúncia já era possível observar que, dentre 21 de janeiro de 1997 a 2 de março de 1998, ao menos 28 (vinte e oito) “laranjas” foram utilizados pelo BANCO PLUS para evadir divisas do Brasil, sempre através do mecanismo acima descrito, e pormenorizado pelos Laudos em epígrafe (v.g.:Laudo nº 1689/03-INC e seu correlato Anexo 1; arquivos “Laranjas do Plus.anb” e “Laranjas CC5 Plus.xls.”). Destarte, provados (mesmo porquanto incontestes) os 311 (trezentos e onze) depósitos de ‘laranjas’ na conta CC-5 do Banco e mais 7 (sete) de origem suspeita, sendo que apenas um pequeno percentual de 0,32%, correspondente a R$ 468.648,00 (quatrocentos e sessenta e oito mil, seiscentos e quarenta e oito reais), teria sido originado de transferências entre domiciliados no exterior (assim, confira-se o Anexo 4 do Laudo 1639/03). De fato, não há como negar que as remessas ocorreram, assim também que 94,8% dos valores recebidos na apontada conta CC-5 (ou seja, mais de 146 milhões de reais) foram depositados por 28 pessoas, de manifesta incompatibilidade financeira (‘laranjas’) – tudo o que, registre-se mais uma vez, está indicado no Laudo Pericial nº 1689/03 (fls. 03/ 22 do Apenso I e disquete acostado na contracapa do feito).

Ademais, a prova é plena no senso de que as transferências de valores da tal conta CC-5 para as CC-5 do IFE BANCO RURAL (URUGUAY) somaram a ordem de R$ 157.621.046,30 (cento e cinqüenta e sete milhões, seiscentos e vinte e um mil, quarenta e seis reais e trinta centavos)– cf., também, o anexo 3 do Laudo 1689/03-INC (Apenso I, fl. 15 e disquete, fl. 9).

Ou seja, praticamente todo aquele valor creditado na CC-5 em tela – quer dizer, R$ 14.382.321,00 (quatorze milhões, trezentos e oitenta e dois mil, trezentos e vinte e um reais) –, saiu ilegalmente do país.

Aqui, e desde logo, vale frisar que, em sendo o IFE BANCO RURAL (URUGUAY) S/A. uma instituição financeira estrangeira, com sede em Montevidéu (Uruguai), e o próprio BANCO PLUS S/A. pessoa jurídica estrangeira (não-residente), não haveria como duvidar que houve a efetiva saída do numerário do país. Acresça-se, a tanto, que a “CC5” titulada pelo BANCO PLUS junto ao Banestado de Foz do Iguaçu (nº 330812) “não estava autorizada a receber recursos em espécie (natureza 63102), recebendo somente recursos de natureza 55000, os quais estão demonstrados no fluxograma do anexo 4” (cf. item 4 do Laudo nº 1689/03, à fl. 06 do Apenso I, Dossiê). Destarte, tendo-se a espécie 55000 como registro de “transferências de brasileiros destinadas a constituições de disponibilidades de recursos em depósitos bancários no exterior” (cf. Laudo 1689/03 – nota 3 da fl. 06 do Apenso I, e Laudo nº 1392/03 – fl. 25 do Apenso I), mais evidente ainda é a reportada evasão. Todavia, e se todo o tal não bastasse, cumpre alertar a que as contas de depósito em moeda nacional de pessoas domiciliadas no exterior (assim denominadas “contas CC5” – forte da Carta Circular nº 5/69) estavam, ao tempo dos fatos, regulamentadas pela Circular n.º 2.677, de 10/04/96, do BACEN. Nesse modo, a mera realização de depósito em conta CC5 caracterizava saída de recursos, vez que o valor respectivo tornava-se imediatamente disponível para a pessoa domiciliada no exterior. Outra, aliás, não era a expressa dicção do artigo 7.º, II, de referida Circular:


“Artigo 7º – Para fins e efeitos desta Circular caracterizam:

(…)

II – saídas de recursos do País os créditos efetuados pelo banco depositário em contas tituladas por domiciliados no exterior, exceto quando os recursos provierem de venda de moeda estrangeira ou diretamente de outra conta da espécie.”

No caso em apreço, veja-se que, conforme já aludido (e apontado no anexo 4 do Laudo 1639/03), a conta CC5 mantida pelo BANCO PLUS junto ao Banestado de Foz do Iguaçu recebeu 99,68% (noventa e nove vírgula sessenta e oito por cento) de créditos a título de “disponibilidades no exterior” (Tipo 2 – código 550000). Contemporaneamente, foram debitados e destinados para contas de domiciliados no exterior (no caso, as do IFE RURAL em Belo Horizonte – nº 132216 – e em Foz do Iguaçu – nº2480000013, cf. Anexo 3 do mesmo), nada menos do que um total de 99,42% (noventa e nove vírgula quarenta e dois por cento) de todos os valores lançados a débito em dita CC5.

De efeito, o fluxo dos recursos em tela até a sua remessa ao exterior finda como bem retratado – e, acrescente-se, inconteste por prova plana em contrário – nos Laudos n.º 1689/03 (fl. 16, Apenso I) e nº 1.392/03 (fls. 68/69, também do Apenso I).

É importante destacar, por fim, que as contas ‘CC5’ sempre se revelaram como importante instrumento de política econômica, não constituindo, por si sós, qualquer atividade ilícita. Não obstante, o que ocorreu na hipótese destes autos é que: os depósitos na conta do ‘não-residente’ PLUS eram perpetrados com o intuito de burlar o sistema de controle do BACEN; assim, não foram realizados diretamente pelo titular do numerário, mas através de contas-correntes comuns, entituladas por terceiros, sem capacidade econômica para as respectivas transações (os, então, denominados “laranjas”); dessa forma, não chegavam aos registros do BACEN os verdadeiros proprietários dos valores remetidos ao exterior, impossibilitando, pois, as atitudes cabíveis acaso detectadas quaisquer irregularidades.

De efeito, e como já dito, o Anexo 3 do Laudo nº 1689/03 (fl. 15, Apenso I) dá conta de que 94,8% dos recursos depositados na conta CC5 do BANCO PLUS seriam provenientes de contas titularizadas por “laranjas”. O percentual, registre-se, foi alçado mediante cruzamento técnico (elaborado, pois, pelos Peritos Criminais em tela) entre o nome dos depositantes e a relação dos correntistas suspeitos apresentada pelo BACEN ao MPF (cf. Anexo 5 do mesmo Laudo, fls. 17/22 do Apenso I); esta, por sua conta, foi alçada quando, em atividade regular de monitoramento e fiscalização das operações de câmbio nacionais, o Banco Central denotou manifestas disparidades entre os valores movimentados em algumas contas-correntes e as rendas declaradas dos correlatos ‘remetentes’.

Registre-se novamente que, diante de tal, quando menos (cf. esclarecem as fls. 21 e 22 dos autos) R$ 138.239.047,55 (cento e trinta e oito milhões, duzentos e trinta e nove mil, quarenta e sete reais, e cinqüenta e cinco centavos) foram remetidos ao exterior, através da conta ‘CC5’ do BANCO PLUS, mediante fraude e em desfavor do sistema de controle do Banco Central do Brasil (BACEN).

Ainda, confiram-se:

Os depósitos efetuados na conta CC5 em jogo vêm discriminados (por nome do depositante) no Anexo 1, do Laudo Pericial nº 1639/03 (fls. 07/12 do Apenso I), assim também no disquete anexo. Tanto na fl. 23, quanto na fl. 24 da inicial (e no disquete) constam tabelas indicando os IPLs correlatos (e autuados, individualmente, em relação a cada qual dos depositantes – cf. nota 6 da fl. 06 da denúncia), onde estão reunidos os documentos originais que demonstram as remessas de valores pelos correntistas (“laranjas”) e suas respectivas incapacidades econômicas a tanto. Neste ponto, vale consignar que – cf. a Certidão das fls. 616/617, desta ação penal – os autos inquisitoriais em jogo não se encontram todos em via original nesta Vara, mesmo porquanto fundamentam outras ações penais. Todavia, nos 02 Volumes que integram o Dossiê que acompanhou a presente denúncia (Apensos I e II), constam as fotocópias (devidamente autenticadas) das principais peças dos mesmos, não cabendo, pois, reste alegado qualquer prejuízo ou insuficiência de dados. Ademais, veja-se que vários deles foram, inclusive, resumidos nos Documentos de Análise que iniciam as suas cópias; como exemplo, v.g.: fls.195/201 do Apenso I (relativo ao IPL nº 573/98); fls. 231/238 do Apenso I (relativo ao IPL nº 063/98); Apenso II (sobremaneira item “Inquéritos Diversos”, ao final, referente aos IPLs 432/97, 527/97, 531/97, 589/97, 602/97, 139/98, 143/98, 196/98, 201/98, 384/98, 559/98, 561/98, 573/98).

Finalmente, note-se que no Anexo 5 do Laudo 1689/03 (fls. 17/22 do Apenso I) consta tabela específica em relação aos suspeitos (ora, depositantes tidos como “laranjas”), indicando-se: o Nome da Pessoa, seu CPF/CNPJ, o PT investigativo do BACEN, e o número do Ofício representativo (BACEN) – documentos estes que se encontram, como já dito, anexos nos Apensos I e II, no setor individual de cada IPL xerocado.


Outrossim, e ao compulsar tais peças, pode-se notar que todos os informes foram concluídos depois da análise da situação específica de cada qual dos depositantes junto à Receita Federal e, também, mediante representações do BACEN (como visto) que ensejaram decisões judiciais de quebras de sigilo bancário e fiscal, cujas cópias também se encontram encartadas nos Apensos. Ademais, pode ser visto que as contas em nome desses “laranjas” recebiam depósitos de diversas pessoas (oriundas de várias partes do país), como demonstra o anexo exemplificativo nº 02, do Laudo n.º 1.689/03, relativamente à conta da remetente SUELI MATIAS STENGHELE (fls. 13/14 do Apenso I). A persecução penal dos verdadeiros proprietários dos numerários remetidos restará procedida em apartado, sendo inviável – cediço – reuni-la por inteiro em uma única ação penal (eis que se contam aos milhares).

Os Laudos periciais e documentos acima referidos constituem, enfim, prova suficiente da materialidade das remessas de divisas ao exterior através da conta CC5 do BANCO PLUS, bem como prova (material) das fraudes empregadas para burlar ao sistema de controle de tais remessas pelo BACEN.

Ainda, vale ressaltar, a denúncia revela indícios de que parte dos recursos carreados ao IFE RBANCO RURAL (URUGUAY) S/A, através da CC-5 do BANCO PLUS, foi transferido para as contas Campari, Lespan e Tucano, na agência do Banestado, em Nova York (fl. 26), embora não tenha sido colhida a prova de movimentação financeira das mencionadas contas.

No específico em relação às imputações envolvendo os ora acusados, quais sejam, ALTEMIR ANTÔNIO CASTELI e ODILON CÂNDIDO BACELLAR NETTO, cumpre-me ainda registrar que:

2.3.1.2. Dos Delitos imputados a ALTEMIR ANTÔNIO:

De fato, ALTEMIR vem incurso, na medida de sua culpabilidade: a)- por 21 (vinte e uma) vezes no crime do art. 22, parágrafo único, na modalidade “promoção de saída de moeda ou divisa para o exterior”, da Lei 7.492/86, em concurso material e de pessoas, pelos 10 (dez) depósitos de CLAUDEMIRO MARIANO, pelos 4 (quatro) de OZANILDO TEODORO DE SOUZA e pelos 7 (sete) que ele próprio realizou em seu nome na conta CC-5 do Banco Plus S/A.; b) – por 3 (três) vezes no crime de falsidade ideológica de documentos particulares (art. 299 do CP), em concurso material e de pessoas, em virtude da abertura de “contas de aluguel” em seu nome e em nome de CLAUDEMIRO MARIANO e OZANILDO TEODORO DE SOUZA; e, c) por 1 (uma) vez, no delito de formação de quadrilha, tipificado no art. 288 do CP.

Neste ponto, mister reconhecer que as provas coligidas no feito confirmam a materialidade dos delitos a ele imputados – como já visto – aliás, até mesmo de forma agrava (cf. adiante).

Quanto aos depósitos a título de disponibilidades no exterior (e, pois, evasão de divisas – cf. supra), veja-se que:

os documentos que integram o IPL nº 685/98 (cópias nas fls. 294/318 do Apenso I à presente), e também o Anexo I do Laudo 1689 (na fl. 07 do mesmo Apenso) demonstram que ALTEMIR efetuou, em seu nome (CPF nº 628.120.179-53) e através de suas duas contas-correntes (nº 51810, junto ao Banco do Brasil 001, Agência 3508 e nº 50668, junto ao Banestado 004, Agência 0380), em verdade 8 (oito) – e não sete – depósitos na conta CC-5 do BANCO PLUS/S.A. de Foz do Iguaçu, assim discriminados e registrados no SISBACEN (fl. 305 do Ap. I):

Número Data Valor do Lançamento Natureza da Operação Titular da CC5 creditada

01. 1997003835 29/07/97 59.600,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

02. 1997003836 29/07/97 105.000,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

03. 1997003837 29/07/97 40.000,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

04. 1997003859 30/07/97 100.000,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

05. 1997003895 31/07/97 70.000,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

06. 1997003916 01/08/97 60.000,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

07. 1997003917 01/08/97 40.000,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

08. 1997003951 04/08/97 18.000,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

o valor total das transferências soma (não os R$ 452.600,00 indicados pela denúncia, às fls. 6 e 8), mas, em verdade R$ 492.600,00, que findaram creditados na CC-5 do IFE BANCO RURAL (URUGUAY) – cf. o Anexo 5, fl. 2, à fl. 69 do Apenso I c/c a Informação Técnica nº 217/03, na fl. 94, também do Apenso I. Todavia, e pro reu, registre-se desde logo que serão sopesados apenas aquelas 7 (sete) operações.

Ainda, através do aliciamento praticado com CLAUDEMIRO MARIANO, possibilitou fosse creditado, na mesma conta CC-5 do BANCO PLUS, a quantia de R$ 14.382.321,00 (quatorze milhões, trezentos e oitenta e dois mil, trezentos e vinte e um reais) – cf., sobretudo, as fls. 111/117 do Apenso I e fls. 104/107/DPF, 441/448/DPF do IPL 558/98, no Apenso II (além de suas demais peças). Deste modo (fl. 08/DPF, Ap. II):


Número Data Valor do Lançamento Natureza da Operação Titular da CC5 creditada

01. 1997006235 09/12/97 603.000,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

02. 1997006276 10/12/97 1.490.000,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

03. 1997006277 10/12/97 416.000,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

04. 1997006305 11/12/97 125.000,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

05. 1997006306 11/12/97 1.896.650,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

06. 1997006361 15/12/97 1.947.602,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

07. 1997006395 16/12/97 3.434.247,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

08. 1997006418 17/12/97 2.172.907,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

09. 1997006445 18/12/97 2.222.260,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A

10. 1997006522 23/12/97 74.655,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A

Também, teria sido o responsável pela abertura da conta e condução de novo ‘laranja’ (OZANILDO), através do qual aquela idêntica CC5 pôde ser irrigada com R$ 2.230.593, 41 (dois milhões, duzentos e trinta mil, quinhentos e noventa e três reais e quarenta e um centavos), entre 11 e 23 de dezembro de 1997 – consoante as fls. 177/180 do Apenso I referente a peças do IPL nº 571/98; assim (fl. 180):

Número Data Valor do Lançamento Natureza da Operação Titular da CC5 creditada

01. 1997006307 11/12/97 60.000,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

02. 1997006446 18/12/97 945.890,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

03. 1997006467 19/12/97 1.165.822,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

04. 1997006523 23/12/97 58.881,41 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

Demais disso, veja-se que de fato, concorreu de forma relevante (o que será mais bem analisado adiante, quando da autoria) para as evasões de divisas através de sua conta bem como as dos dois ‘laranjas’ aliciados, integrando, com previsibilidade, portanto, a suposta quadrilha ou organização criminosa.

Diante disso, plenamente refutáveis as aduções de sua Defesa técnica a respeito (em especial, fls. 803/813).

Assim, não há que se falar em ausência de prova material pela atipicidade dos fatos (como cediço) nem mesmo seria necessário, na hipótese dos autos, que os valores remetidos através das contas-correntes do acusado fossem provenientes de ilícito (como pede sua douta Defesa) – dado que não se trata de ‘lavagem’, mas delito autônomo e contra o Sistema Financeiro Nacional (Lei 7.492/86).

Ainda, e sobre a alegada inexistência do crime de falsidade (item VI das alegações defensivas, fl. 815), ressalte-se que a denúncia bem esclarece que a “omissão da verdade sobre fatos juridicamente relevantes” se deu – não quanto aos informes prestados para o cadastramento bancário – mas tendo em vista que os depósitos (valores), que passavam pelas contas dos ‘laranjas’ (dentre eles, o próprio ALTEMIR – cf. fl. 09), não lhes pertenciam, o que – como já dito – logrou burlar aos controles do BACEN.

Finalmente, e no que concerne à materialidade da formação de quadrilha, veja-se que todo o dito acima somado às bem lançadas análises ministeriais das fls. 620/621 (e, pois, sobretudo, a documentação acostada judicialmente no Apenso IV, ref. a “Informações do Banco Central do Brasil”), bastaria para demonstrar – contrariamente ao que vem invocado – a estreita relação dos envolvidos, todos no intento (ou a serviço) das práticas delitivas. Entretanto, eis que matéria atinente à tipicidade, analiso-a, de forma mais adequada, logo a seguir.

2.3.1.3.. Dos Delitos imputados a ODILON:

De igual modo, o segundo acusado é tido como incurso, na medida de sua culpabilidade: – por 1(uma) vez, no crime do art. 22, parágrafo único, na modalidade “promoção de saída de moeda ou divisa para o exterior”, da Lei 7.492/86, em concurso de pessoas, pelo depósito realizado na conta CC-5 do Banco Plus S/A., por meio da conta de ROGER SEBASTIÃO PINTO CONCEIÇÃO; – 1(uma) vez, no delito de falsidade ideológica em documento particular (art. 299 do CP), em concurso de pessoas, em razão da abertura da conta de aluguel em nome de ROGER SEBASTIÃO PINTO CONCEIÇÃO; e 1(uma) vez, no delito de formação de quadrilha, tipificado no artigo 288 do CP, em concurso material com os demais.

Quanto ao depósito realizado a título de disponibilidade no exterior (e, pois, evasão – cf. supra), veja-se que: os documentos que integram o IPL nº 360/98 (cópias nas fls. 264/292 do Apenso I à presente), e também o Anexo I, fl. 4 do Laudo 1689/03 (na fl. 10 do Ap. I) demonstram que, do aliciamento praticado com ROGER S. P. CONCEIÇÃO, o acusado possibilitou fosse creditado, na conta CC-5 do BANCO PLUS, a quantia de R$ 117.810,00 (cento e dezessete mil, oitocentos e dez reais) – além daqueles R$ 4.854.935,00, já objeto de ação e condenação penal em Belo Horizonte/ MG (cf. nota 13, da denúncia). Assim, e conforme o registro das Transferências Internacionais no SISBACEN (fl. 25/DPF do IPL 360/98, à fl. 265 do Ap. I):


Número Data Valor do Lançamento Natureza da Operação Titular da CC5 creditada

01. 1997005350 16/10/97 117.810,00 55000-95-0-96-90 BANCO PLUS S/A.

A soma, como já visto, findou creditada na CC-5 do IFE BANCO RURAL (URUGUAY) – cf. o Anexo 5, fl. 2, à fl. 69 do Apenso I c/c a Informação Técnica nº 217/03, na fl. 94, também do Apenso I – e, de lá, partiu a outras contas no exterior.

A tanto, vale registrar que o próprio ODILON confirmou, por ocasião de seus três depoimentos colhidos na esfera policial (e, registre-se, sempre na presença de seus defensores), a existência dos crimes. Assim, e como ex-operador de câmbio do BANCO DO ESTADO DE MINAS GERAIS – BEMGE e do BANCO RURAL em Belo Horizonte, o denunciado detalhou, inclusive, todo o modus operandi das práticas, para as quais contribuiu – some-se – auferindo comissões de corretagem de até 0,1%. Dessarte:

interrogatório, autos de IPL nº 360/98, em 03/12/98, na presença dos seus advogados Drs. José Guimarães Ferreira de Melo, OAB/MG-5359 e Gilson Macário de Oliveira, OAB/MG-29180(fls. 274/280 do Apenso I, grifamos):

“(…) QUE o interrogado, por seus conhecimentos profissionais e de matemática, da qual é um estudioso, tem intermediado operações de câmbio entre pessoas jurídicas ou físicas interessadas, recebendo comissões pela corretagem, o que se denomina ‘BROOKER’; QUE antes de exercer a atual atividade, trabalhou quatorze anos no BEMGE, cinco deles como operador de câmbio, depois transferindo-se para o Banco Rural onde trabalhou um ano e dois meses como gerente de câmbio, e desde 1996 trabalha por conta própria,(…) QUE as operações intermediadas pelo interrogado geralmente denominam-se de ‘disponibilidade’, que consiste na operação em que um vendedor, normalmente uma instituição financeira (…) se mostra disponível para a venda de moeda estrangeira, entrando então em ação o interrogado arranjando um comprador, como é o caso de ROGER SEBASTIÃO CONCEIÇÃO, dono de uma torrefação de café no interior, que adquire os dólares e os remete a uma conta no exterior, muitas das vezes usada apenas como conta de passagem já que existe um terceiro interessado na compra daqueles dólares, a quem é repassada aquela compra de moeda estrangeira; QUE muitas das vezes a operação se torna cheia de intermediários porque a instituição financeira tem um limite para negociar com uma determinada pessoa e não lhe interessa vender diretamente para uma pessoa, mesmo sabendo que poderia ganhar mais uma transação direta, daí surgindo a figura dos intermediários; que o interrogado geralmente atua com uma previsão de ganhos em comissão entre 0,03 à 0,1% sobre o montante da operação; (…) QUE o acusado recebe em média de três a quatro mil reais mensais com operações de intermediação de câmbio e declara normalmente o imposto de renda como “ganhos financeiros”(…) QUE o interrogado não tem idéia do quanto movimenta neste tipo de atividade, numa média diária de duzentos a duzentos e cinqüenta mil dólares; (…) QUE o interrogado já usou ‘contas-correntes de aluguel’ em nome de RODRIGO OTÁVIO VIGLIONI, GERALDO MARCELO BACELLAR, irmão do interrogado, OBED RIBEIRO JÚNIOR, primo do interrogado, e URIAS DE ASSIS; QUE as operações nas contas de aluguel funcionavam da seguinte forma: um comprador hipoteticamente denominado JOSÉ manifestava o interesse em comprar cinqüenta mil dólares (valor hipotético), o interrogado intermediava junto a um vendedor interessado, hipoteticamente denominado ANTONIO, mas esse vendedor não podia depositar cheques de valor superior a nove mil reais em sua conta, por motivos de fiscalização do Banco Central e então recebia o pagamento da venda em tantos cheques quantos forem necessários para que o valor não ultrapassasse aquele limite, sendo então os cheques depositados nas contas ‘de aluguel’(…) QUE é comum um banco vendedor de numerário arranjar um ‘suposto comprador’, com valores altos, simplesmente para servir de ponte para um comprador final que se encontra impossibilitado de fazê-lo legalmente, ou seja, a toda uma montagem fictícia de operações idealizadas pelos próprios bancos, burlando a fiscalização do Banco Central, já que é registrada no nome de um ‘laranja’ (…) QUE os documentos de fls. 259/263 do termo de apreensão de documentos de operações financeiras, assinadas em branco em formulário de declaração de transferências internacionais em reais do BANESTADO, contém as assinaturas de ROGER SEBASTIÃO PINTO CONCEIÇÃO; QUE a operação de transferência a cabo conste em lançamentos de débito e crédito sem utilização de papel moeda entre instituições financeiras em conta de empresas, similar ao DOC existente no mercado financeiro nacional (…) QUE essas operações de câmbio e remessas de numerários ao exterior, tinham(sic) por trás empresas poderosas e de grande conceito na época, como a IBF e a SPRINT, ambas sediadas em São Paulo/SP, sendo que dentre os documentos apreendidos em sua residência há um DOC de emissão da IBF em favor de ROGER SEBASTIÃO, através do BANCO DO BRASIL em Itabirinha de Mantena”.


– re-interrogatório, autos de IPL nº 360/98 em 22/12/98, na presença de seu advogado Dr. José Guimarães Ferreira de Melo, OAB/MG-5359 (fls. 281/286 do Apenso I, grifamos):

“QUE o interrogado ratifica quase o inteiro teor do seu interrogatório de fls. 75/81 destes autos, querendo retificar o teor das informações contidas às fls. 77 quando fala ‘QUE o interrogado percebe em média de três a quatro mil reais mensais com operações de intermediações de câmbio e declara normalmente o imposto de renda como ganhos financeiros’ e também mais adiante quando declara ‘que tais procedimentos eram de conhecimento do BEMGE e RURAL’, pois na verdade recebia em média de oito a dez mil reais mensais e somente trabalhava com os bancos RURAL e BR MERCANTIL, uma subsidiária do BANCO RURAL, não tendo efetuado operações de câmbio com o BEMGE (…) QUE, indagado sobre o motivo em que as empresas que ‘alugavam’ as contas bancárias para operações de câmbio, respondeu o interrogado que as fichas cadastrais destas empresas eram submetidas aos bancos operadores que, após aprovação, promoviam a remessa do dinheiro ao exterior, conforme se vê, por exemplo, às fls. 29 destes autos e, depois, o dinheiro era transferido para banco estrangeiros, geralmente com sede nos EUA, sobretudo o BANESTADO em Nova York; QUE a responsabilidade de remessa para o exterior em nome de ‘laranjas’ era inteira dos bancos que assim agiam para burlar a fiscalização com conseqüente sonegação de impostos por parte dos verdadeiros destinatários do dinheiro no exterior, cujos nomes nunca aparecem nessas operações (…) QUE o interrogado neste ato quer esclarecer como é o ESQUEMA DA OPERAÇÃO: Os bancos vendedores RURAL S/A e BR MERCANTIL S/A – através da compradora IFE BANCO RURAL (URUGUAI) – repassam(sic) o valor para empresa ‘laranja’ recebendo cheque da mesma, e após esta operação os dólares são repassados para os verdadeiros compradores no exterior (…) QUE referidas operações eram feitas por diversos corretores, além do interrogado, usando clientes possivelmente ‘laranjas’ de bancos em todo o Brasil e em grande volume, principalmente em São Paulo/SP, Ponta Porã/MS, Cascavel e Londrina/PR; QUE, indagado a respeito do ‘bolotário’ elaborado pelo Banco Central a respeito das movimentações de contas, tanto de pessoa física quanto jurídica de ROGER SEBASTIÃO PINTO CONCEIÇÃO respondeu o interrogado: Não existem contas no exterior em nome de ROGER, desconhecendo em nome de quem os valores remetidos chegavam ao destino pois a operação funcionava da seguinte forma: o banco vende para ROGER sendo este mero intermediário para um verdadeiro destinatário, o qual informa ao banco vendedor o número da conta recebedora dos dólares no exterior, sendo que o banco envia o dinheiro diretamente a esta conta informada pelo verdadeiro destinatário, cujo nome não aparece na operação realizada no Brasil, sendo o banco pagador o IFE BANCO RURAL URUGUAI S/A”

E, principalmente, o minucioso e objeto de confissão das fraudes:

– interrogatório complementar, nos autos de IPL nº 360/98 em 28/12/98, na presença de seu advogado Dr. José Guimarães Ferreira de Melo, OAB/MG-5359 (fls. 288/292 do Apenso I, grifamos):

“QUE, sob a orientação expressa do diretor internacional, JOSÉ ROBERTO SALGADO, o BANCO RURAL descumpria norma do BANCO CENTRAL que proibia a venda de moeda estrangeira por uma instituição financeira a outra do mesmo conglomerado, ocorrendo constantemente a venda de dólares do BANCO RURAL para o IFE do BANCO RURAL URUGUAY S/A, com simulação de venda; QUE a simulação consistia na seguinte operação: o BANCO RURAL vendia na cotação oficial, que é a mais baixa, uma certa quantia de dólar para o IFE RURAL. Mas como era impedido por norma do BANCO CENTRAL, já que o banco não podia vender para empresa coligada, simulava que a venda era para um outro banco, como CORFAN, DEL PARANÁ, INTEGRACIÓN, etc, cujas contas eram usadas como passagem do dinheiro para a conta do IFE BANCO RURAL. O IFE BANCO RURAL, após receber os dólares, depois de passarem pela conta de passagem, geralmente de bancos no exterior, vendia os dólares no mercado paralelo para empresas do estrangeiro, bem como para doleiros brasileiros, e, portanto, tinha um lucro, porque o dólar no mercado paralelo era mais caro que no mercado oficial. Como o dinheiro precisava retornar à conta do BANCO RURAL, eram usadas novamente contas de passagem (CC5 mantidas junto ao BANCO RURAL) desses bancos estrangeiros citados como exemplo, para os depósitos nos valores apurados na venda paralela, ou seja, já com o lucro. O BANCO RURAL então debitava nas contas desses bancos e creditava em seu próprio favor. Com isto, o BANCO RURAL obtinha um lucro, já que não incidia tributos porque o lucro ficava no IFE BANCO RURAL, mesmo que de forma mascarada, enquanto os bancos usados como conta de passagem ganhavam uma comissão incidida sobre o valor do lucro obtido na venda no câmbio paralelo. Exemplificando: o BANCO RURAL vendia no mercado oficial US$1.000.000,00, para o BANCO INTEGRACIÓN. Esse BANCO INTEGRACIÓN repassava no mesmo valor para o IFE BANCO RURAL, enquanto este vendia aquela importância para doleiros, não todo o dinheiro, mas o suficiente para receber US$1.000.000,00, sobrando ainda uma quantia em dólares que era o seu lucro geralmente em torno de 1% que era mantido no exterior, depositava todo o dinheiro obtido na conta de passagem em nome de outro banco estrangeiro (conta CC5 junto ao BANCO RURAL) que mais tarde seria debitado pelo BANCO RURAL na conta CC5 e creditado em sua própria conta. (…) QUE o BANCO RURAL mantinha uma conta, denominada C2, possivelmente de titularidade do TRADE LIKING BANK, também subsidiária do BANCO RURAL, mantida com dinheiro obtido de forma irregular e que não podia aparecer nas contas do BANCO RURAL, bem como produto de simulação de vendas de dólares. Tal conta C2 funciona como um caixa 2 de uma empresa comercial(…)


QUE o BANCO RURAL não obteve autorização do BANCO CENTRAL para operar com instituições financeiras estrangeiras; QUE JOSÉ ROBERTO era quem idealizava a sistemática de operação com câmbio, e, elaborou o sistema de remessa de dinheiro ao exterior no qual uma empresa ‘laranja’ou pessoa física ‘laranja’ emitia o cheque nominal ao IFE BANCO RURAL,e, no verso, emitia duas declarações, conformes especificado no croqui fls. 173 item 3. Cabe esclarecer que o dinheiro ao exterior nunca era depositado na conta mencionada no verso dos cheques emitidos pelos ‘laranjas’, já que os ‘laranjas’ assinavam uma carta endereçada ao BANCO IFE RURAL, cancelando aquela conta e solicitando o crédito em outra conta, tudo isso providenciado pelo próprio pessoal do BANCO RURAL. (….)

QUE o interrogado foi despedido do BANCO RURAL, com a orientação de JOSÉ ROBERTO para que se tornasse um cliente do BANCO RURAL em operações de câmbio, arranjando as pessoas jurídicas e físicas ‘laranjas’, cuja orientação foi passada ao interrogado pelo RONALDO CORREA, funcionário do BANCO RURAL, o qual cumpria ordens da diretoria (…)

QUE quando aparecia um bom negócio para fazer com uma empresa com remessa de dólares para o exterior, o BANCO RURAL, através de seus funcionários RONALDO CORREA ou CLÁUDIO EUSTÁQUIO, este último operador de câmbio, sempre cumprindo ordens de JOSÉ ROBERTO, efetuavam contato com o interrogado sugerindo que intercedesse junto a uma determinada empresa para que fosse usada como empresa ‘laranja’ e aparecesse como a responsável pelo depósito na conta do IFE BANCO RURAL, entrando em ação então o interrogado, que dividia uma gratificação paga pelo BANCO RURAL com o dono da ‘empresa ou pessoa laranja (…)

QUE o interrogado manteve contatos pessoais apenas com NILSON RIBEIRO, ROGER SEBASTIÃO PINTO CONCEIÇÃO e AURÉLIO CESAR DONÁDIA FERREIRA, que eram os principais ‘laranjas’, os quais intermediaram o surgimento de outros ‘laranjas’, inclusive dividindo comissão com o interrogado (…) ”

Aqui, mister reconhecer que, em juízo, o acusado mudou (parcialmente) sua versão dos fatos no que tange a autoria e culpabilidade delitivas, sem deixar de reconhecer, no entanto, a prova material dos episódios. Assim, confiram-se trechos de seu interrogatório (fls. 241/250):

“Juíza: Hum, hum. Consta em um interrogatório seu aqui, no 1º apenso, nas fls. 175, na Polícia Federal lá de Minas Gerais, que o senhor teria conhecimentos específicos profissionais de matemática – seria uma pessoa estudiosa nesse sentido – e que teria intermediado operações de câmbio entre pessoas jurídicas ou físicas interessadas, recebendo comissões pela corretagem, o que se denomina ‘broker’.

Interrogado: O que… ocorre o seguinte: quando eu saí do Rural, eu continuei prestando serviços p’ro Rural de… até o dia que eu fui preso. Até na véspera que eu fui preso. Inclusive foi mediante um… uma mala que eu peguei lá que parece que por isso que … o causador de tudo.

Juíza: Durante quanto tempo? Porque o senhor saiu do banco em 96.

Interrogado: 96. Então foi… 2º semestre de nov… final de 96 e 97 todinho, até novembro de 98.

Juíza: E o senhor trabalhava como? Como terceiro…?

Interrogado: Eu tinha uma… eu tinha uma eletrônica, e na eletrônica usava o telefone p’ra… intermediar… intermediar dete… intermediar determinadas operações. É o seguinte: se eu soubesse onde tinha operações de futuro, que gerava até um… até zero um por cento de comissão – o seguinte: tem dois bancos, um quer comprar opera… comprar dólar futuro e outro vender, eu localizava o corretor e falava ‘o banco tal vende’ – eu participava dessa comissão.

Juíza: Daí ganhava uma comissão?

Interrogado: É. Abaixo da comissão do corretor, que eu não tinha corretora. Eu tava abrindo uma empresa de câmbio… de turismo e câmbio. Estava abrindo.

Juíza: Hum, hum, junto com o seu irmão?

Interrogado: Exatamente. E um outro sócio.

Juíza: Essa… com Geraldo Marcelo Bacellar?

Interrogado: Exato.

Juíza: Uma empresa chamada BH turismo e Câmbio, é isso?

Interrogado: Exato, exatamente.

Juíza: Ela tá em operação, foi aberta, como é que é?

Interrogado: Não. Ela não foi, ela não foi autorizada a operar em câmbio.

Juíza: Hum, hum, OK. E daí, como é que funcionavam essas operações?

Interrogado: E… Agora, as operaç… essas operações de, de… entre dois bancos – raramente; se conseguia, conseguia pouquíssimas… E a flutuante é zero ponto zero três, que era a comissão do corretor. Então se eu conseguisse, falava: ‘o Banco Rural tem p’ra vender’, aí a pessoa: ‘não, tem quem compra’, aí eu ganhava uma parte da comissão. E essas operações do royalty, também. Ganhava zero três ponto zero três, que era dividido…


(…)

Interrogado: E essa operação é da seguinte forma: ooo… utilizava a conta de u’a pessoa, o… passava o cheque p’ro banco no, na, na véspera, o banco colocava o dinheiro do cliente na conta, e compensava o cheque na noite. Quer dizer, o risco…

Juíza: Cheque sempre abaixo de nove mil, é isso?

Interrogado: Não, cheque acima de… cheques de valores altos.

Juíza: Hum, hum, tá. O senhor falou, explicou essas operações, né, na fase policial, e falou o seguinte: que essas operações intermediadas pelo senhor denominavam-se disponibilidade e consistiam na operação em que um vendedor, normalmente uma instituição financeira, como o Banco Rural, BANESTADO, BEMGE, se mostra disponível para venda de moeda estrangeira, entrando, então, em ação, o senhor, arranjando um comprador, como seria o caso do Roger Sebastião Conceição, que seria dono de uma torrefação de café no interior. E essa pessoa adquire os dólares e os remete a uma conta no exterior, muitas vezes usada apenas como conta de passagem, já que existe um terceiro interessado na compra daqueles dólares, a quem é repassada aquela compra de moeda estrangeira. É isso?

Interrogado: Não, especificamente é o seguinte, mas p’ra eu… – o banco tem a disponibilidade do dinheiro… de alguém, você info… você informa a conta, o banco coloca o dinheiro e faz a rem… e registra a operação e faz a remessa onde o banco realmente… onde realmente tá definido… onde… aliás, ele manda realmente p’ro dono do dinheiro, aquele que o banco depositou na conta do… da pessoa considerado ‘laranja’.

Interrogado: … na rea… a verdadeira… o verdadeiro tá no outro depoimento meu – é o seguinte: o banco tem o dinheiro do cliente, mas o cliente não pode usar o nome dele, por efeito de fisco, provavelmente,…

Juíza: Hum.

Interrogado: … a gente utiliza a conta de um provável… o chamado laranja, o banco coloca o dinheiro, após receber o cheque, e deposita o cheque normalmente… provavelmente na própria CC5 do banco, do… de coligada ou de parceiros, e o dinheiro é remetido, só o banco sabe p’ra onde.

Juíza: Hum, hum.

Interrogado: E provavelmente é…

Juíza: E o senhor não sabia também p’ra onde era remetido esse, esse valor?

Interrogado: Não, o dinheiro normalmente iria p’ra IFE Banco Rural uruguaio.”

Finalmente, vale ressaltar que convergem, de pleno, aos termos da imputação: as declarações testemunhais (sobretudo: Hilton Kasai, fls. 356, 358/359; Roger Sebastião Pinto Conceição, fls. 371/372; e Eurico Monteiro Montenegro, fls. 543/544), o conteúdo do que vem assumido pelo próprio acusado em seus interrogatórios (incluso o judicial), além da farta documentação já mencionada.

Diante do exposto, descabidas as alegações técnicas de sua Defesa (mesmo porquanto destoantes das próprias palavras do réu), sobremaneira no senso de que: “(1) quanto à evasão de divisas: a) há litispendência, tangente ao tipo penal do art. 22 da lei 7.492/86; b) há insubsistência da acusação, eis que, em tempo algum, conseguiu-se demonstrar indene de dúvidas que o acusado ODILON efetivamente tivesse tido participação decisiva na consumação da evasão de divisas; que não se têm provas nos autos de que o depósito em tela (R$ 117.810,00, através da conta corrente aberta em nome de Roger Sebastião Pinto Conceição) tenha sido efetivado de maneira irregular, pois, como se verifica da própria denúncia, parte dos depósitos efetuados na conta CC-5 do Banco Plus não foi transferida para o exterior (IFE Rural); que não haveria qualquer prova que ligasse o acusado ao suposto ingresso de valores, oriundo de referida conta-corrente, na CC-5 do Banco Plus, pois os envolvidos em tal remessa podem ser facilmente identificados; que os depósitos efetuados na conta ‘CC-5 tipo 2’ (sic contas origens) não podem caracterizar constituição de disponibilidade no exterior, uma vez que a conta possui características de conta comum e só permite a movimentação financeira em moeda nacional; que a declaração de Roger Sebastião no sentido de que teria trabalhado para o acusado seria falsa, pois jamais provada nos autos; que o Sr. Roger – segundo a versão de ODILON – é ex-funcionário da Caixa Econômica federal, onde trabalhou por aproximadamente 17 (dezessete) anos em cargos que tinha contato direto com clientes e abertura de contas correntes; que tal pessoa, pois, possuía pleno domínio da atividade bancária o que permitia a ele efetivar de esponte própria qualquer operação“.

Assim, quando menos, tem-se que a Defesa não se desincumbiu à contraprova material de todos os fatos (art.156 CPP).

Tangente aos demais sustentos, vale ressaltar que, uma vez abarcando temas como tipicidade e culpabilidade penal, restarão analisados oportunamente.

2.3.2. Da autoria

No caso em apreço, e a partir dos próprios argumentos que elucidaram a materialidade fática (item 2.3.1.), resta claro que deva a autoria ser imputada aos acusados – ainda que na modalidade meramente participativa.


A documentação dos autos (mencionada supra), em si, já bastaria a comprovar a relação direta dos denunciados na causalidade fática dos resultados.

Ademais, de todo o aventado acima (principalmente, das minuciosas declarações de ODILON) é simples denotar que, para movimentar as vultuosas quantias a que estavam impedidos (ou controlados), os reais proprietários do dinheiro não poderiam dispensar as figuras tanto dos laranjas, quanto de seus aliciadores. Assim, repitam-se os trechos já supra transcritos:

“(…) QUE as operações nas contas de aluguel funcionavam da seguinte forma: um comprador hipoteticamente denominado JOSÉ manifestava o interesse em comprar cinqüenta mil dólares (valor hipotético), o interrogado intermediava junto a um vendedor interessado, hipoteticamente denominado ANTONIO, mas esse vendedor não podia depositar cheques de valor superior a nove mil reais em sua conta, por motivos de fiscalização do Banco Central e então recebia o pagamento da venda em tantos cheques quantos forem necessários para que o valor não ultrapassasse aquele limite, sendo então os cheques depositados nas contas ‘de aluguel’(…) QUE é comum um banco vendedor de numerário arranjar um ‘suposto comprador’, com valores altos, simplesmente para servir de ponte para um comprador final que se encontra impossibilitado de fazê-lo legalmente, ou seja, a toda uma montagem fictícia de operações idealizadas pelos próprios bancos, burlando a fiscalização do Banco Central, já que é registrada no nome de um ‘laranja’ (…)”

“(…)QUE JOSÉ ROBERTO era quem idealizava a sistemática de operação com câmbio, e, elaborou o sistema de remessa de dinheiro ao exterior no qual uma empresa ‘laranja’ou pessoa física ‘laranja’ emitia o cheque nominal ao IFE BANCO RURAL,e, no verso, emitia duas declarações, conformes especificado no croqui fls. 173 item 3. Cabe esclarecer que o dinheiro ao exterior nunca era depositado na conta mencionada no verso dos cheques emitidos pelos ‘laranjas’, já que os ‘laranjas’ assinavam uma carta endereçada ao BANCO IFE RURAL, cancelando aquela conta e solicitando o crédito em outra conta, tudo isso providenciado pelo próprio pessoal do BANCO RURAL. (….)

QUE o interrogado foi despedido do BANCO RURAL, com a orientação de JOSÉ ROBERTO para que se tornasse um cliente do BANCO RURAL em operações de câmbio, arranjando as pessoas jurídicas e físicas ‘laranjas’, cuja orientação foi passada ao interrogado pelo RONALDO CORREA, funcionário do BANCO RURAL, o qual cumpria ordens da diretoria (…)

QUE quando aparecia um bom negócio para fazer com uma empresa com remessa de dólares para o exterior, o BANCO RURAL, através de seus funcionários RONALDO CORREA ou CLÁUDIO EUSTÁQUIO, este último operador de câmbio, sempre cumprindo ordens de JOSÉ ROBERTO, efetuavam contato com o interrogado sugerindo que intercedesse junto a uma determinada empresa para que fosse usada como empresa ‘laranja’ e aparecesse como a responsável pelo depósito na conta do IFE BANCO RURAL, entrando em ação então o interrogado, que dividia uma gratificação paga pelo BANCO RURAL com o dono da ‘empresa ou pessoa laranja (…)

QUE o interrogado manteve contatos pessoais apenas com NILSON RIBEIRO, ROGER SEBASTIÃO PINTO CONCEIÇÃO e AURÉLIO CESAR DONÁDIA FERREIRA, que eram os principais ‘laranjas’, os quais intermediaram o surgimento de outros ‘laranjas’, inclusive dividindo comissão com o interrogado (…)

De fato, o acervo probatório está integrado por elementos que, reunidos, desnudam a preordenada e mútua cooperação de ambos os acusados – ALTEMIR e ODILON, na noção e execução da empreitada criminosa – a princípio, em conjunto com os demais.

As circunstâncias fáticas e probatórias – já acima suficientemente analisadas – deixam evidente na conduta de ambos a presença da ação intencional, seja ao vislumbre do dolo direto ou indireto. Refoge aos postulados da razoabilidade crer que dois agentes, ajustadamente vinculados aos mentores e idealistas do crime – consoante seus próprios depoimentos – não dirigissem suas ações (ou ao menos assumissem o risco) para a finalidade ilícita empreendida.

Ressalte-se, na esteira do decidido pelo STF em situação similar envolvendo crime financeiro que “não se trata de pura e simples presunção, mas de compreender os fatos consoante a realidade das coisas” (HC n.º 77.444-1, Rel. Min. Néri da Silveira, 2.ª Turma, un., DJ de 23/04/99, p. 2.)

Ademais, ratifique-se que consoante a interpretação já sufragada por nossos Tribunais superiores, o ônus da ausência de participação efetiva nos fatos incumbe à Defesa, visto que a questão se subsume a prova processual (art.156 CPP); neste sentido, v.g.: STJ RHC5643; STF HC 74813/RJ.

Deste modo, mister fazer valer a regra específica acerca da autoria nos crimes em apreço, constante do amplo artigo 25 da Lei 7.492/86, assim interpretado pela consolidada jurisprudência de nosso país:


“PROCESSUAL PENAL E PENAL. “HABEAS CORPUS”. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. ARTIGOS 6º E 22, DA LEI Nº 7.492/86. DENÚNCIA. INÉPCIA. INOCORRÊNCIA. AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. I – Operações de câmbio não autorizadas pelo órgão competente e que teriam por base falsas guias de importação. II – Outorga, pelo diretor-presidente da empresa, sediada em belo horizonte/mg, do exercício da gerência administrativa e financeira da filial, situada na cidade do Rio de Janeiro. III – Em se tratando de crime contra o Sistema Financeiro não é necessária a presença do agente em todas as fases da operação, vez que é possível o cometimento do delito por meio de prepostos devidamente autorizados a agir em nome da empresa ou do titular desta. IV – Impossível aferir em sede de “habeas corpus” o envolvimento ou não, dos responsáveis legais da empresa nas operações de câmbio em que tenha ela intervindo. V- Ademais, só se admite o trancamento da ação penal em hipóteses excepcionais, o que não é o caso. (…)”

(TRF 2ª R., HC nº 9802384798/RJ, Rel. Des. Fed. Cruz Netto, 2ª T., m., DJ 09.09.99, grifamos)

Ainda, não se há de esquecer que tais delitos não deixam de submeter-se à norma geral acerca da configuração da autoria no Brasil, ou seja, admite-se o concurso de agentes na exata e clássica teoria monista c/c domínio do fato, segundo as quais, “quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade” (art.29 CP). Nesse diapasão explicita DAMÁSIO DE JESUS:

“Dá-se a co-autoria quando várias pessoas realizam as características do tipo. Ex:A e B ofendem a integridade física de C. Ambos praticam o núcleo do tipo do crime de lesão corporal (art.129, caput), que é o verbo ‘ofender’. As condutas cometidas em co-autoria caracterizam-se pela circunstância de que os cooperadores, conscientemente, conjugam seus esforços no sentido da produção do mesmo efeito, de modo que o evento se apresenta como o produto das várias atividades. Co-autoria é divisão de trabalho como nexo subjetivo que unifica o comportamento de todos. Não existe um fato principal a que acedem condutas acessórias; cada um contribui com a sua atividade na integração da figura típica, executando a conduta nela descrita objetivamente. (…)

Para que haja co-autoria é necessário que todos realizem os atos executivos do crime? É preciso que todos tenham o mesmo comportamento?

Não, pois pode haver divisão de trabalho. Ex: …no roubo (art.157 caput), uma das pessoas pode ameaçar a vítima com arma de fogo, enquanto a outra a despoja de seus valores” (Direito Penal, volume I, Saraiva, p.356-357).

Neste patamar, todavia, importante analisar os argumentos defensivos.

De efeito, invoca a parte técnica de ALTEMIR ANTONIO CASTELLI, em síntese escalonada:

a) que fere o princípio do contraditório admitir-se à acusação buscar uma condenação com fulcro em “depoimentos de pseudo aliciados obtidos sem o crivo do contraditório, atentando-se, neste particular, que tais depoimentos se deram com os detratores na condição de indiciados e presos, no mesmo dia, oportunidade em que, mancomunados com RENATO, buscaram incriminar o ora Réu” (in verbis, fl. 799); que “é lamentável que se tente justificar a autoria delitiva cometendo exercício exegético equivocadíssimo, pois, o membro ministerial procede a elucubrações mentais fora da realidade factual, pois, interpreta os fatos de forma imaginária e tendenciosa” (in verbis, fl. 803); que a prova extrajudicial (oriundas do inquérito policial) não foram corroboradas por outros elementos de convicção colhidos em juízo; que os delatores buscavam isentar-se de suas próprias culpas, não estando – àquele tempo – compromissados a dizer a verdade, eis que interrogados;

Trata-se de argumento não apenas improfícuo, mas inverossímil.

Com efeito, não se desconhece o princípio fundamental do processo penal de que a prova colhida no inquérito, fora do crivo do contraditório, não é bastante para fundamentar um juízo condenatório (FRANCO CORDERO, Procedura Penale, Giuffrè, quarta edizione, 1998); entretanto, também não se há de desconsiderar que a carga informativa formada por qualquer elemento comprobatório da justa causa para a ação penal (art.39 CPP), deve ser trazida a juízo para confronto com as efetivas provas carreadas aos autos, sob pena de frustração à efetiva busca da verdade material.

Destarte, consoante o amplamente fundamentado acima, a tese da Acusação se sustenta, sobretudo, pela documentação que vem carreada aos autos, assim também pelos incontestes Laudos Financeiros que integram o “Dossiê Banco Plus”.

Além disso, veja-se, como exemplo, que CLAUDEMIRO MARIANO foi ouvido em juízo como testemunha devidamente compromissada (e não interrogado); ademais, – e conquanto o acidente automobilístico sofrido e problemas de amnésia – pôde ratificar, sob o crivo do contraditório e na presença do d. defensor do réu, que: “(…) o depoente não se recorda se tem conta corrente no Banestado de Foz do Iguaçu; que o depoente recorda-se que certo dia estava dentro de um carro quando uma mulher lhe deu um papel para assinar para abrir uma conta-corrente(…)”.


b) que Claudemiro informa ter sido recrutado por uma mulher de nome Marly, afirmando trata-se de esposa de ALTEMIR; que, pois, a menção ao nome do réu apenas surge quando se fala da suposta mulher, que não era sua esposa (fato, portanto, desmentido ou não provado); que Claudemiro mente ao dizer que não foi pessoalmente à Agência do Banestado em Foz do Iguaçu, quando, em verdade, ele, Ozanildo e Renato estiveram pessoalmente naquela cidade a fim de proceder à abertura das contas-correntes, tendo comparecido, inclusive, no Tabelionato Pinheiro, na mesma data, para providenciar o Cartão de Assinaturas para posterior reconhecimento de suas firmas; que, em juízo, Claudemiro não confirmou aquela versão da fase inquisitorial; que, ao contrário, afirmou categoricamente não conhecer ALTEMIR ANTONIO CASTELI;

A respeito de tais aduções vale, de primeiro, registrar que CLAUDEMIRO foi ouvido judicialmente enquanto testemunha devidamente compromissada (como já dito), eis que, aliás, refutada a contradita da Defesa técnica de ALTEMIR, infundada nas causas taxativas dos arts. 214 c/c 206 e 208 do CPP.

Neste ponto, é verdade que não confirmou in totum o depoimento proferido na fase inquisitorial; todavia, tal se justifica não apenas pelo relatado acidente automobilístico e problemas de amnésia, mas também pelo delongado transcurso do tempo entre a data dos fatos (dezembro/1997), a data do depoimento policial (23/06/2000, fls. 849/851 do IPL 558/98) e a do depoimento judicial (17/novembro/2003). Ademais, veja-se que se trata de pessoa simples, com 1º grau incompleto e porteiro na cidade de Cascavel (cf. fl. 854 do IPL, no Apenso II) e que, cf. as informações da Receita Federal à fl. 325 do IPL em tela (no mesmo Apenso), não registra renda suficiente nos últimos 6 anos a ponto de tê-la como declarada, adquirir imóveis, veículos etc – o que, aliás, se coaduna com suas informações na fase da PF (cf. fl. 851 do IPL).

Por segundo, confira-se que – inobstante o aduzido – ficou evidente que a Senhora Marli, de fato, “vivia” com ALTEMIR (como se sua esposa fosse). Assim, a prova documental constante da fl. 298 do Apenso I (ficha cadastral para abertura de conta-corrente) e as próprias palavras do réu, perante a PF: “QUE vive com MARLI NELCI FANTIN, que tem uma loja na Av. Brasil, Shopping Leste, Loja 28, em Cascavel/Pr” (fl. 869, IPL 558/98, Apenso II); igualmente, e neste Juízo: “Interrogado:- Eu só conheço aqui Marli Nelci Fantin, que é minha esposa” (fl. 194, linha 42). Ademais, convergentes as afirmativas de que era dona de uma loja no Mini Shopping do Terminal Leste em Cascavel, onde teria conhecido RENATO CESAR MARIANO, filho de CLAUDEMIRO, e também aliciado como ‘laranja’ em ditas operações (a tanto, vide: depoimento de CLAUDEMIRO – fl. 850 do mesmo IPL; de ALTEMIR – fl. 869 do IPL e fl. 201, linhas 27/31 destes autos; e o da própria Sra. MARLI – fl. 888 do IPL e fl. 607 destes autos).

c) que, já Ozanildo, afirma que foi pessoalmente à Agência na companhia de ALTEMIR, quando este, na realidade, estava trabalhando na agência do Banco Bamerindus da cidade de Cascavel (“fato que este Juízo impediu fosse provado ante o indeferimento para que aquela instituição informasse acerca das faltas do denunciado” – fl. 805); que, convém enfatizar, o agente ministerial lança mão de tais ‘imprestáveis interrogatórios’ para alicerçar seu entendimento; que, ao contrário, a testemunha de acusação Hilton Kasai (fls. 356/362) demonstra a mera condição de ‘laranja’ do réu;

No que tange a tais argumentos, veja-se que não está em questão o fato de ALTEMIR, enquanto suposto aliciador do ‘laranja’ OZANILDO, tê-lo verdadeiramente acompanhado (ou não) à Agência do Banco Banestado, em Foz do Iguaçu, para providenciar a abertura da conta-corrente em seu nome. O que se analisa, isto sim, é se OZANILDO era mesmo uma pessoa simples, sem condições financeira e fiscal suficientes para embasar as ditas operações, tendo sido arregimentado por ALTEMIR, assim como ocorrera com os outros dois (supostos) ‘laranjas’ CLAUDEMIRO e RENATO.

A tanto, é verdade que a tentativa frustrada em localizar OZANILDO impediu que restasse plenamente confirmado o seu depoimento em sede policial (IPL 571/98, no Apenso II). Todavia, tomando em conta o que já foi dito acima, vale considerar que há outros dados importantes nestes autos capazes de confirmar a versão do MPF.

Com efeito, a descrição física do acusado, elaborada por OZANILDO, pôde ser conferida judicialmente (fl. 202, linhas 26/31). Ademais, o próprio réu assegurou – neste processo – que, ao tempo dos fatos, encontrava-se em uma situação financeira de desespero, a ponto de assinar vários talões de cheques em branco e entregá-los ao paraguaio que acabara de conhecer em uma Casa de Câmbios (fls, 197/199, de seu interrogatório judicial). Isto, pois, vem de encontro com a contemporânea necessidade que teve de arrebatar novas contas (e, pois, ‘laranjas’), a serviço do dito paraguaio (e, portanto, do Banco Plus), dado que receberia comissões para tanto além de desviar o controle do Banco Central (a respeito, vide o depoimento da mesma Testemunha ora mencionada pela Defesa, Hilton Kasai, à fl. 358, linhas 28/35). Ainda, note-se que, àquele tempo, o acusado trabalhava realmente em Cascavel como vendedor de automóveis (v. fl. 227 do IPL 685/98, aqui na fl. 309 do Apenso I), o que veio registrado pelo aliciado OZANILDO (v. fl. 412 do IPL 571/98, aqui fl. 178 do mesmo Apenso).


Finalmente, veja-se que a prova de que o acusado não teria acompanhado OZANILDO, na abertura da conta-corrente em tela, acabou sendo anexada pela Defesa técnica que, depois da fase do art. 500 CPP, trouxe declaração unilateral do HSBC Bank Brasil S/A, não havendo de se falar em cerceamento, pois. Entretanto, vale lembrar que dito documento, além de dotado de valor probante relativo (art. 368 do CPC), não possui o condão de por si só afastar a condição do réu de ‘aliciador’, eis que de tal figura não se exige acompanhe o ‘laranja’ arregimentado em todos os seus passos, mas, sim, que providencie sua colaboração. Ainda, e se tal não bastasse, veja-se que o mesmo documento juntado pela Parte, ao assegurar que “o Sr ALTEMIR ANTONIO CASTELI, portador da Carteira de Trabalho nº 83.265 série 16, é funcionário desta empresa desde 17/10/1986, exercendo atualmente o cargo de CAIXA I, na unidade AG. NOVA CASCAVEL – CASCAVEL/ PR”, destoa do que veio alegado pelo próprio réu – ou seja: que atualmente trabalha como vendedor (fl. 176 dos autos), tendo saído do banco em maio de 98 (interrogatório, fl. 202, linha 41) –, além de contrariar aquela declaração (também sobrevinda por sua Defesa) na fl. 10 dos autos nº 2003.70.00.044265-6, em apenso.

Em tempo, vale registrar que a denúncia deixou claro que ALTEMIR também atuou como ‘laranja’, emprestando seu próprio nome e contas para as operações (fl. 07/09), sendo que o depoimento (mencionado) da testemunha Hilton, apenas serve para confirmar a tal imputação.

d) que a testemunha Salete Schuck (fl. 598) revela a intenção de Renato no sentido de, segundo suas palavras “ferrar o ALTEMIR”; que o aliciador, no caso, é Renato Cesar Mariano, fato este destacado pela sua evasão logo após o seu indiciamento bem como sua condição de revel nos autos de Ação Penal nº 98.1014402-4, em Foz do Iguaçu;

No que tange a tais argumentos, vale apenas considerar que a condição de revel de Renato, nos autos de ação penal indicados, não configura elemento suficiente de sua culpabilidade. Ademais, cumpre registrar (como tanto o faz a própria Parte) que esta constitui questão a ser resolvida e debatida no processo que tramita perante o Juízo de Foz do Iguaçu, envolvendo os depósitos realizados através de dita pessoa/conta-corrente, e não aqueles objeto da presente denúncia.

Todavia, e a fim de evitar posterior alegação de non liqued, registre-se que a testemunha arrolada pela mesma Defesa, Sra. Marly Wiedermann Nunes, foi clara ao assegurar em Juízo que:

“o Altemir algumas vezes levou a depoente e outras pessoas até o Paraguai para fazer compras de mercadorias para as lojas. (…) Que o Renato foi junto com Altemir e outras pessoas até o Paraguai para o mesmo objetivo já mencionado de comprar mercadorias. (…) Que viu algumas vezes estrangeiros paraguaios na banca da esposa do Altemir, assim como na banca do Renato. Que estes estrangeiros tinham uma casa de câmbio no Paraguai, que era visitado pela depoente, assim como pelo Altemir e pelo Renato, quando necessário a troca de dinheiro no Paraguai. (…) a casa de câmbio chamava-se Rio Paraná.”

Tais aduções, aliás, vieram confirmadas também pelo réu em seu interrogatório judicial (fl. 196, linhas 33/36), sendo de se ressaltar que as palavras da testemunha Sale Schuck (fl. 598) não foram confirmadas nem mesmo por Altemir, nem pelos demais testigos (v. fls. 596/597).

Deste modo, refutada a tese defensiva.

Idêntica sorte merece a astuta argumentação da Defesa técnica de ODILON CÃNDIDO BACELAR NETO. Assim:

a) que o acusado ODILON afirmou que, desde junho de 1997, não havia tido mais qualquer contato ou relacionamento com o Sr. Roger, sendo que este sempre agiu por iniciativa própria e para servir e obter vantagens para outras pessoas relacionadas com o mercado comandado pela área de câmbio do conglomerado Banco Rural;

b) que, aliás, tal Conglomerado é que seria o grande centralizador das operações, não tendo sequer sido mencionado pela acusação; que a função do denunciado ODILON “sempre foi a de operador de mesa, ou seja, limitava-se a acompanhar as definições das taxas que se praticam no momento e as repassam aos clientes” (fl. 878, in verbis), sendo que não possuía autonomia para efetuar fechamentos nem conhecimentos contábeis ou sobre normas de liquidação (o que cabia à área de câmbio da instituição financeira);

c) que dita área de câmbio do Banco Rural, segundo disse ODILON, sempre teve suas atividades concentradas pela pessoa do Sr. José Roberto Salgado, o qual analisava as empresas e pessoas físicas a serem utilizadas para a efetivação das operações, tratando pessoalmente com as interpostas pessoas e também com os detentores dos recursos; que “a conta CC-5 do Banco Plus aberta no Banestado de Foz do Iguaçu teve o objetivo de servir ao conglomerado Rural S/A para fazer remessas disfarçando a utilização de interpostas pessoas e empresas” (in verbis, fl. 879); que o que mais causaria estranheza seria o fato de que tanto José Roberto Salgado (chefe imediato e superior hierárquico do acusado no Banco Rural) quanto Roger Sebastião Pinto Conceição (pessoa com amplos conhecimentos da atividade bancária) terem sido apenas mencionados como testemunhas de acusação, jamais tendo sido investigados;


d) que, ademais, a efetiva participação de ODILON nos fatos descritos na denúncia nunca foi esclarecida a contendo, não havendo qualquer prova que o incrimine ou que demonstre sua responsabilidade;

De efeito, tratam-se todas de aduções amplamente refutadas, incluso pelas palavras do próprio acusado Odilon.

Assim, e como acima já enunciado, vale reler aos seus repetidos e minuciosos interrogatórios (fls. 274/292 do Apenso I) para vislumbrar que a sua participação delitiva resta confessa. Neste patamar, cediço, a confissão policial há de ser sopesada com as demais provas dos autos, como se elemento de prova fosse. Isto, todavia, mostra-se dispensável in casu, a partir do momento em que, quando interrogado neste Juízo, o mesmo disse nada ter a alegar contra as testemunhas da Acusação (dentre eles, pois, Roger e José Roberto) e findou por ratificar o conteúdo daqueles seus outros depoimentos. A tanto, confiram-se: fl. 241 (linhas 13/19, linhas 28/29, linha 44), fl. 242 (linhas 1/2, linhas 8/29, linhas 39/43), fl. 243 (linha 11, linha 13), fl. 244 (linhas 24/26, linhas 29/42), fl. 245 (linhas 27/30), fl. 248 (linhas 15/23, linhas 24/33), fl. 249 (linhas 1/ 10, linhas 22/40).

Ainda, veja-se que ODILON também confirmou os termos da denúncia quando assumiu que, nas operações, auferia comissões de corretagem de até 0,1%; que movimentou outras contas em nome do dito “laranja” ROGER em Belo Horizonte (justo onde reside) e Itabirinha de Mantena/ MG; que detinha (e detém) conhecimentos bancários especializados, eis que ex-operador de câmbio do BANCO DO ESTADO DE MINAS GERAIS – BEMGE e do BANCO RURAL; além disso que possuía, de fato, relações com o doleiro ALBERTO YOUSSEF (de Londrina/ Pr) e que foi procurador de uma empresa titular da conta “JUPITER”, no BDA CREDITANS TALK BANK, nas Ilhas Caimã.

Finalmente, e se houve participação ativa dos integrantes do “Conglomerado Banco Rural”, certo que tal haveria de ser objeto de prova nos autos, o que inocorreu; aliás, e ao contrário, isso foi absolutamente refutado pela testemunha José Roberto Salgado (fls. 405/406) e, ainda, por Hilton Kasai (fl. 359, linhas 21/27). Ademais, veja-se que o acusado deixa indene de dúvidas que bem conhecia das operações, auferindo, inclusive, vantagem econômica com elas; de igual forma, que assentiu nas práticas delitivas (ainda que via dolo eventual), colaborando para que fossem perpretradas, ao arrepio do controle e da fiscalização do Banco Central e do Fisco Nacional (assim, vejam-se: fls. 274/275, 279, 282/285, 288/290 – todos do Apenso I; também: fl. 241, linhas 28/29; fl. 242, linhas 16/18, linhas 22/29 destes autos), sendo que até mesmo passou a trabalhar como ‘tercerizado’ para receber e retransmitir alguns ‘fax’ das ilícitas operações do Rural, documentos estes que não poderiam ser recebidos, pois, por aquela instituição (assim: fl. 242, linhas 22/26; fl. 250, linhas 16/18).

Se todo o dito não bastasse, veja-se que as testemunhas ouvidas – inclusive aquelas arroladas pela Defesa – confirmaram (total ou parcialmente) as imputações atribuídas a Odilon; assim:

– testemunha de acusação Hilton Kasai (fls. 357/358):

“Depoente:- Em relação ao senhor Odilon, eu recuperei um registro de um processo administrativo instaurado contra o senhor Odilon, já decidido em última instância, tendo sido acusado à época pela não comprovação da aquisição de duzentos e sessenta mil, oitocentos e quarenta e oito dólares junto a um estabelecimento autorizado a operar em câmbio. Ele foi apenado com uma multa de cem mil reais, já confirmada pelo Conselho de Recursos Sistema Financeiro Nacional. E, isto é o que consta no Banco Central em termos de procedimento. Fora isso, chegou ao conhecimento do Banco Central, por meio de, é, cópias de depoimentos fornecidos pelo Ministério Público mesmo, acho que Estadual, onde o senhor Odilon, em um dos depoimentos, é, cita, menciona a utilização de, de contas de laranjas pra, é, é, efetuação de transferências via CC-5.”

– testemunha de acusação Roger Sebastião (fls. 371/372) – não contraditada nem pelo acusado nem por sua Defesa (registre-se, mais uma vez), sendo que, inclusive, declarou ser amigo de ODILON:

“…por volta do final de dezembro do ano de 1996, o acusado Odilon ligou para o depoente de Belo Horizonte, solicitando-lhe uma folha de cheque assinada em branco, frente e verso, dizendo-lhe que ia fazer depósito em sua conta, entrando e saindo o dinheiro no mesmo dia;…também foi a Foz do Iguaçu olhar um imóvel para o acusado Odilon, onde acabou abrindo uma conta no Banco do Brasil, assinando um ou dois talões em branco e entregando para o acusado; também foi procurador de três empresas, sendo uma em Itabirinha, outra de Mantena e outra de Rondônia, abrindo conta em nome dessas empresas no Banco BEMGE em Belo Horizonte, assinando os cheques em branco e repassando para o acusado; …parou de trabalhar para o acusado Odilon quando foi notificado pela Receita Federal, a qual lhe aplicou uma multa de R$ 210.000,00;”


– testemunha da própria Defesa de ODILON, Sr. Éder Martins Machado (fls. 385/386):

“..que o depoente trabalhou no Banco BEMGE e no Banco Rural, sendo que conheceu o acusado Odilon depois, porque com ele mantinha relacionamento por força de trabalhar na área de mesa; que o depoente tinha conhecimento da existência do Banco IFE Rural, logo quando foi admitido para trabalhar no Banco Rural e que havia, realmente, remessa de dinheiro para o estrangeiro, ‘o Banco Uruguai foi aberto para isso’; …que o depoente trabalhou no Banco Rural de 08/95 a 04/96, trabalhando, atualmente, em banco privado; que o depoente não conhece a pessoa de Roger Sebastião Pinto Conceição; que Odilon trabalhava na mesa de câmbio do Banco Rural; …que a diretoria do Rural depositava confiança em Odilon”.

– testemunha de Defesa de ODILON, Sr. Pedro Bueno de Souza (fl. 587):

“..que conhece somente o co-acusado, Odilon Cândido Bacelar Neto, desde o ano de 1991; que trabalhou com o co-acusado Odilon Cândido Bacelar Neto no extinto e privatizado Banco do Estado de Minas Gerais – BEMGE, no período aproximado de 1991 a 1994; que naquela ocasião, o co-acusado Odilon Cândido Bacelar trabalhava em ‘mesas de operações de câmbio’; que o co-acusado Odilon Cândido Bacelar Neto detinha um conhecimento razoável de operações de câmbio; que depois que o co-acusado Odilon Cândido Bacelar Neto ‘saiu’ do Banco BEMGE, foi trabalhar no Banco Rural em Belo Horizonte, também com mesa de operações de câmbio…”

No ademais, veja-se que as outras testemunhas de ODILON, além de (algumas) também serem denunciadas nesta Vara por participação em evasão de divisas via contas CC-5s, praticamente nada tiveram a dizer a seu respeito; assim: Rogério Angelotti (fls. 478/481), Benedito Barbosa Neto (fls. 482/486), Luiz Acosta (fl. 559/560) e José Felisberto Sobrinho (fl. 779).

Acerca da dúvida, que sustenta o réu, deve lhe favorecer, muito embora, como visto, não se a vislumbre no presente caso, urge consolidar que consoante bem ressalta a doutrina processual: “A essência da verdade é inatingível. Já o dissera VOLTAIRE, ao afirmar que ‘les vérités historiques ne sont que des probalités’. Assim também percebeu MIGUEL REALE, ao estudar o problema, deduzindo, então,, o conceito de quase-verdade, em substituição ao da verdade, que seria imprestável e inatingível. Deveras, a reconstrução de um fato ocorrido no passado sempre vem influenciada por aspectos subjetivos das pessoas que assistiram ao mesmo, ou ainda do juiz, que há de valorar a evidência concreta. (…) A figura mítica do juiz como alguém capaz de descobrir a verdade sobre as coisas e, por isso mesmo, apto a fazer justiça deve ser desmascarada. Esta fundamentação retórica de toda a doutrina processual não pode mais ter o papel de destaque que ocupa hoje. O juiz não é – mais do que qualquer outro – capaz de reconstruir fatos ocorridos no passado; o máximo que se lhe pode exigir é que a valoração que já de fazer das provas carreadas aos autos sobre o fato a ser investigado não divirja da opinião comum média que se faria das mesmas provas.(…) Tem-se assim, ser impossível atingir-se a verdade sobre certo evento histórico. Pode-se ter uma elevada probabilidade sobre como o mesmo se passou, mas nunca a certeza da obtenção da verdade.” (MARINONI, Luiz Guilherme.ARENHART, Sergio Cruz. Comentários ao Código de Processo Civil, Volume 5, Tomo I, São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2000, p.39-45).

Neste ponto, a única justiça que se tem sobre a valoração da referida probabilidade dos fatos em apreço está na garantia constitucional do livre convencimento: e é por isso, dado que inatacáveis as razões expostas acima, entendo deva ser reconhecida a autoria delitiva no presente caso.

2.3.3. Da tipicidade

A imputação, somada aos elementos de prova já indicados, dá conta de que, com efeito, realizaram-se como típicas as condutas dos acusados (devidamente comprovadas), e, pois, plenamente subsumidas aos arts.1º, II e art.22, parágrafo único, da Lei 7492/86, em concurso material e de pessoas (art. 69 e 29 do CP), com os artigos 299 e 288, ambos do mesmo Codex.

Com efeito, equiparados a instituição financeira (na forma do art.1º II da Lei 7492/86), ALTEMIR ANTONIO CASTELLI e ODILON CÂNDIDO BACELAR NETO, participaram ativamente (aquele 21 vezes, e este 1 vez), através das precitadas operações financeiras, no crime do art. 22, parágrafo único da Lei 7.492/86, na modalidade “promoção de saída de moeda ou divisa para o exterior”, em concurso material e de pessoas; no crime de falsidade ideológica de documentos particulares (art. 299 do CP), em concurso material e de pessoas, em virtude da abertura de “contas de aluguel” (ALTEMIR em seu nome e em nome de Claudemiro Mariano e Ozanildo Teodoro de Souza; e, ODILON, em nome de Roger Sebastião); também, finalmente, no delito de formação de quadrilha, tipificado no art. 288, do CP.


A tanto, basta um mero reler do amplamente fundamentado acima.

De fato, e apesar da possibilidade da remessa lícita de numerário ao exterior através de depósitos em contas CC5, a utilização de meio fraudulento para burlar o sistema de controle do BACEN contaminou, por inteiro, a licitude das operações. Assim, não se trata de mera atribuição de identidade falsa para a realização de operação de câmbio (artigo 21 da Lei n.º 7.492), mas sim da estruturação de um esquema de fraude – aqui, minuciosamente explicitado pelo réu ODILON (v. acima) – para burlar os sistemas de controle a respeito da remessa de divisas ao exterior, ao arrepio, portanto, das regras definidas na Circular n.º 2.677, de 10/04/96.

Resta configurado, portanto, o crime da última parte do parágrafo único do artigo 22 da Lei n.º 7.492/86, pois há registros nos autos (incluso documentais e periciais – Laudo 1689/03, no Apenso I) da movimentação financeira e remessa ao exterior daqueles valores, depositados fraudulentamente na conta CC5 do Banco paraguaio em tela, seguindo 89,3% dos recursos à conta do IFE BANCO RURAL (Uruguay) mantida em Foz e os outros 10,7% ao mesmo IFE RURAL (URUGUAY) – que, registre-se, trata-se de subsidiária do Banco Rural – mediante depósitos na conta mantida em Belo Horizonte. A fl. 5 do anexo 2 do Laudo nº 1392/03 (fl. 37 do Apenso I) demonstra, por ademais, como todos os reportados créditos foram destinados ao exterior.

Finalmente, ressalte-se que múltiplas foram as fraudes (depósitos fraudulentos, porquanto encobridores da verdadeira titularidade do dinheiro) que ensejaram à dimensão da lesão ao Sistema Financeiro Nacional, no específico, consistente na remessa fraudulenta ao exterior de mais de R$ 146 milhões.

No que se refere ao crime do artigo 288 do CP, a própria magnitude e reiteração dos fatos sugere a necessidade de uma complexa organização das fraudes, com a comunhão de esforços de várias pessoas, inclusive com a cooptação de ‘laranjas’ e até agentes de instituições bancárias. Doutro lado, há prova de que nem ALTEMIR, nem ODILON teriam agido sozinhos; ao contrário, ambos, por ocasião de seus interrogatórios judiciais (fls. 194/203 e 241/250, respectivamente) ressaltam a participação de terceiros (o paraguaio RAMIREZ, no caso de Altemir e o “Conglomerado do Banco Rural”, para Odilon). Por fim, inconteste (e, aliás, documental e pericialmente provado) que vários outros laranjas foram cooptados, sendo que, inclusive, dentre elas encontram-se pessoas sempre ligadas aos respectivos e ora acusados ‘aliciadores’. Assim: ALTEMIR teria aliciado Renato Cesar Mariano que trabalhava junto com sua esposa e com quem seguia ao Paraguai para fazer câmbio e compras; também teria aliciado o pai deste (Claudemiro Mariano) e Ozanildo T.de Souza, conhecido de Altemir da revenda de automóveis que mantinha em Cascavel; finalmente, veja-se que nos autos há dados da relação de ALTEMIR com bancários (eis que trabalhou por cerca de 11 anos enquanto tal), no específico tendo parentesco com o Gerente do Banco do Brasil da época, Sr. Fernando Gaiardo (assim, veja-se o depoimento de Angelo Stirma, no IPL 685/98, às fls. 310/313 do Apenso I). Quanto a ODILON, veja-se que confessa ter sido a pessoa que teria apresentado o ‘laranja’ Roger ao Banco Rural, assim também o tendo utilizado para constituição de ‘conta de aluguel’ em troca das comissões que auferia como funcionário ‘tercerizado’ e a serviço da mesa de câmbios do Banco Rural. Ainda, e no que toca a esta última instituição financeira, observe-se que a documentação sobrevinda do Banco Central e acostada no então formado Apenso IV, evidencia a estreita relação entre os dirigentes do Rural e do Mercantil (bancos estes onde estavams CC5 do IFE Rural, e nas quais desaguaram os valores). Havia, portanto, uma associação estável para a prática de delitos financeiros, havendo de ser considerada, outrossim, a autonomia do crime do artigo 288, CP, em relação a todos os demais.

Diante de tais aduções, mister estudar as alegações defensivas.

No que toca ao denunciado ALTEMIR, veja-se que sua Defesa técnica invoca a existência de norma penal em branco, sendo que, “todavia, a acusação não se valeu de nenhuma norma regulamentadora válida, mesmo porque, não há, em nosso ordenamento jurídico norma de tal natureza (o que aqui não se discute pela ausência de menção a qualquer norma)”; destarte requereu “seja reconhecida a impossibilidade jurídica do art. 22 da Lei 7.492/86, para que seja implementado nos moldes pleiteados pelo Ministério Público Federal”. Trata-se, todavia, de documento rechaçado não apenas por todo o sustentado supra, mas sobremaneira pela própria releitura da inicial que, expressamente e ab initio, consignou:

“O depósito de recursos nas contas CC-5 do BANCO PLUS, que caracteriza a “constituição de disponibilidades no exterior”, deu-se em desobediência às normas regulamentares, porquanto a dissimulação da origem dos recursos, com a movimentação por meio de conta de “laranjas”, macula todos os atos seguintes da operação financeira, de modo que restaram devidamente integrados os tipos do artigo 22, caput, e do parágrafo único da Lei n. 7.492/86.


Tem-se aí duas normas penais em branco, complementadas pela Carta Circular n.º 2.677/96 do BACEN.” (fl. 26 da denúncia, grifamos).

Ainda, alega-se: a atipicidade, eis que seria de clareza solar que o acusado não agiu da forma delitiva “pelas razões já apresentadas, as quais são corroboradas pela completa ausência de dolo”; que o Ministério Público Federal, ao denunciar o réu, desatendeu ao princípio do devido processo legal, rasgando o princípio da tipicidade, quando imputou ao acusado o modelo incriminador albergado no parágrafo único do art. 22 da Lei 7.492/86; que ausente a demonstração do dolo de “promover a saída de divisa/moeda do território nacional”, e, ainda inadmitida a conduta culposa. Tratam-se, no entanto, de argumentos que já restaram devidamente refutados, seja quando da análise da materialidade, seja quando da autoria e tipicidade. Vale, porém, citar o precedente específico a respeito, de nosso E. TRF 4ª Região:

“PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. LEI Nº 7.492/86, ART. 22, PARÁGRAFO ÚNICO. OPERAÇÃO DE CÂMBIO NÃO AUTORIZADA. EVASÃO DE DIVISAS. TIPICIDADE. AUTORIA. TEORIA OBJETIVA-SUBJETIVA (EXECUTOR E MENTOR INTELECTUAL). TENTATIVA. OCORRÊNCIA. DOSIMETRIA. PENA DE MULTA. RETIFICAÇÃO. NECESSIDADE. QUANTIA APREENDIDA. PERDIMENTO. FIANÇA. RESTITUIÇÃO.

(…) 2. De acordo com a teoria objetiva-subjetiva da culpabilidade, tanto o autor executor do crime, que efetivamente pratica a conduta do verbo nuclear, quanto aquele que detém o domínio do fato, seu mentor intelectual, respondem pela prática criminosa. (…)”

(TRF 4ª R., AC nº 7849/PR, Rel. Des. Fed. Vladimir Freitas, 7ª T., un., DJU 19.06.02, p. 1216)

No que se refere ao acusado ODILON, invoca sua Parte técnica, em síntese: quanto à formação de quadrilha ou bando: a) que o tipo penal em jogo exige a participação de, ao menos, quatro pessoas o que, de antemão, já manifesta a inviabilidade da acusação; que, “dos (11) onze denunciados, apenas ODILON e mais um indivíduo encontram-se no pólo passivo da demanda criminal, o que demonstra, de plano, a incoerência de uma eventual condenação” (in verbis, fl. 881-fim); b) que, por fim, não restou provado qualquer vínculo do acusado com quaisquer dos co-réus mencionados na inicial, assim também a existência de dita associação para fins criminosos, com a presença de ODILON. Tem-se, entretanto, que tal já restou amplamente refutado acima, sendo de se ressaltar que o próprio réu estreita suas relações com os envolvidos na fraude ao admitir que passou a trabalhar como tercerizado do Rural justo para viabilizar as transações com o exterior (inadmitida formalmente), sobremaneira, com o IFE Rural (Uruguay).

Ainda, observa-se que a mesma Defesa alega: quanto ao crime de falsidade ideológica: a) que tal já foi objeto de apreciação pelo Juízo da 4ª Vara Federal Criminal de Belo Horizonte; b) que tal conduta é absorvida pelo crime disposto no art. 22, parágrafo único, da Lei 7.492/86, eis que “crime-meio” e elementar objetiva do tipo penal em epígrafe. Os argumentos, todavia, não merecem prosperar. É que há autonomia na falsidade operada em relação à conta-corrente de Roger, justo porquanto se trata de cadastro distinto, perante instituição financeira, época, cidades e também através de meios diversos daqueles usados em relação ao processo criminal (e as transações financeiras abarcadas) no Juízo de BH. Tal inclusive, registre-se, já ficou claro desde a decisão nos autos de exceção de litispendência destes. Quanto à absorção, veja-se que a jurisprudência pátria tem-na admitido unicamente para o delito de gestão fraudulenta (art. 4º da Lei 7.492/86), mesmo porque a fraude não constitui – ao contrário do invocado, data venia – elementar objetiva do tipo penal insculpido no art. 22, parágrafo único da mesma Lei. De efeito, tanto as inveracidades puderam servir a outros fins que não somente à evasão de divisas (ex. impedimento de ação fiscal pela Receita) – não esgotando seu potencial lesivo em tal, pois – quanto a evasão pode se dar de outras formas que não exclusivamente através de tal modus operandi. Assim, aliás, a já manifesta jurisprudência a respeito:

“HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. INVIABILIDADE. PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE DESCLASSIFICAÇÃO JURÍDICA DO PEDIDO. EXCLUSÃO NA DENÚNCIA DO ART. 22 DA LEI 7.492/86. IMPOSSIBILIDADE. No que tange à alegação de que os fatos capitulados na denúncia não constituem os delitos de falsidade ideológica financeira, nem prática de operação cambial não autorizada, não pode ser apreciada na via do habeas corpus, por demandar exame aprofundado de provas, providência incompatível com a via eleita. Narrando a denúncia fatos revestidos, em tese, de ilicitude penal, com observância do disposto no art. 41, do CPP, incabível é a concessão de habeas corpus para trancamento da ação penal sob alegação de falta de justa causa. A prestação de informação falsa em contrato de câmbio autorizado (art. 21, par. único da Lei n. 7.492/86) não é absorvida, na hipótese, por uma operação de câmbio posterior, não autorizada, promovendo evasão de divisas (art. 22 da mesma Lei). É de todo descabida a tese defendida pelo impetrante (absorção do crime-fim pelo crime-meio). Impossibilidade da desclassificação jurídica do fato ( exclusão do art. 22 da Lei 7.492/86 da peça incoativa).” (grifamos).


Diante disso, absolutamente típicas as condutas descritas e comprovadas.

2.3.3.2. Da culpabilidade

Para a configuração da culpabilidade, como cediço, necessária a presença de três pressupostos: imputabilidade, potencial conhecimento da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa.

Os acusados eram maiores na data dos fatos, portanto, plenamente imputáveis e detinham o potencial conhecimento dos ilícitos.

De efeito, ODILON, além de sua imensa experiência bancária, bem demonstrou, em seus interrogatórios, conhecer dos fatos que praticava (operações de câmbio, formas de fechamento, depósitos simulados etc.), além do grande esquema de fraude que os sustentavam, em detrimento do Sistema Financeiro Nacional e controle do Banco Central.

Quanto a ALTEMIR, vê-se que, muito além daquela pessoa ‘leiga’ (a qual tanto intentou construir sua Defesa técnica), demonstrou ser bastante elucidado e instruído (assim, detém o 2º grau completo cf. fl. 176 dos autos); ademais, inconteste que detém amplo conhecimento das práticas bancárias, tanto que (como dito) trabalhou por 11 anos como caixa do Banco Bamerindus, e, inclusive, mantinha relações de parentesco com outros bancários daquela cidade. Destarte, consultando novamente o depoimento de Angelo Stirma, no IPL 685/98 (fls. 310/313 do Ap. I) é possível denotar que o Senhor Altemir era parente de Fernando Gaiardo, então Gerente do Banco do Brasil; além disso, que o mesmo aproveitou-se de sua condição de bancário justo para auferir a confiança e iludir a terceiros – dentre eles, o próprio gerente de sua conta; ademais, que ardilosamente solicitou a reativação de sua conta-corrente naquela instituição para quitar dívidas que detinha pelo uso de cartões de crédito, sendo que findou por, em verdade, utilizá-la para as confessas operações em seu nome; assim:

“…QUE reconhece que foi o responsável pela reativação da conta corrente nº 5181-0, em 16.06.97, em nome do Senhor ALTEMIR ANTONIO CASTELI, que reconhece ser sua a assinatura exposta nas fls. 30 dos autos; QUE, o único objetivo da reativação da conta corrente acima citada foi para ser efetuado o débito mensal das parcelas de renegociação de dívida oriunda de cartão de créditos; QUE não sabe dizer porque o senhor ALTEMIR ANTONIO CASTELI teria movimentado a exorbitante quantia de R4 3.066.030,00…a parir de 01.07.97 até a data de 13.08.97; QUE o interrogado achava que o senhor ALTEMIR ANTONIO CASTELI, por trabalhar em uma instituição financeira privada como caixa, em que há rigorosidade de conduta e etc., o interrogado não tinha como suspeitar do mesmo; (…)

QUE, da última vez que o interrogado procurou o Senhor ALTEMIR ANTONIO CASTEL, este foi até o Banco para ser negociada a dívida, houve a reativação da conta corrente supramencionada;” (fl. 311 do Ap. I, grifamos)

Finalmente, veja-se que já se pôde enunciar acima que o mesmo trabalhava, nas horas vagas, abastecendo uma loja de som com mercadorias que adquiria no Paraguai (assim: interrogatório judicial, fl. 195); dessarte, não titubeou em confirmar que, inclusive, teria conhecido o reportado paraguaio Ramirez na Casa de Câmbio Rio Paraná, onde normalmente adquiria os dólares para as compras naquele território (fl. 196, linhas 33/36).

Diante de tais condições, pouco crível a tese de sua Defesa no senso de que: o acusado não sabia que suas contas estavam sendo utilizadas para a promoção de evasão de divisas, nada restando provado em contrário no feito, por parte do órgão acusador; que, enfim, o réu não promoveu qualquer aliciamento, mas tão-só “vendeu seus talões de cheque, sem que tivesse noção de que tais documentos seriam utilizados da forma como o foram” (in verbis, fl. 807), e assim agiu “por extrema dificuldade financeira” (cf. fl. 808); que o acusado nem mesmo passaporte possui sendo que nada o levaria a aliciar outros ‘laranjas’ se ele próprio já havia sido usado como um.

De efeito veja-se que, em Juízo, além de mudar sua versão policial, não soube explicar como, enquanto bancário de tantos anos, desconhecia as efetivas conseqüências (e o risco assumido, pois, em manifesto dolo eventual) ao entregar 6 talonários de cheque, assinados em branco, a um paraguaio que acabara de conhecer na Casa de Câmbios e reviu junto a um Bar, próximo à Ponte da Amizade, enquanto ‘bebia uma cerveja’; além disso, observe-se que esclareceu (judicialmente) que, apesar de ter conferido a imensa movimentação bancária em sua conta através de extratos, não desconfiou de absolutamente nada, sendo que, ao contrário, e depois de contatar o dito ‘Ramirez’, acatou com a continuidade das movimentações em troca da suposta ‘comissão’ de 200 dólares. A tanto, pois, confiram-se suas palavras (fls. 196/200, grifamos):

Interrogado:- Aí, num sábado fui comprar mercadoria, na volta, a gente sempre ia em várias pessoas, né, pra ajudar no custos da, do transporte, fiquei em Foz do Iguaçu, na Vila Portes, esperando o pessoal e nisso o Carlos Ramirez passou, me reconheceu e nós começamos, ele começou a conversar comigo e a situação não tava boa, aí comecei a conversar com ele e aí ele me pediu pra que, que eu pudesse abrir uma conta no banco, né, pra ele. Aí eu perguntei: “Mas por quê?”, aí ele falou: “Ah, eu não tenho documentação, né, brasileira, não tenho CPF, comprovante de endereço”. E aí, como a minha situação não era muito boa, aí eu tinha uma conta que tava inativa no Banco do Brasil, fui, reativei ela e passei um talão de cheque pra ele e nisso aí ele me deu na faixa de 200 dólares por esse talão.


Juíza:- E daí, o senhor assinou esse talão inteiro?

Interrogado:- Assinei, entreguei em bran…

Juíza:- E da onde que era esse talão de cheques?

Interrogado:- Era do Banco do Brasil.

Juíza:- Do Banco do Brasil?

Interrogado:- Cascavel.

(…).

Juíza:- Ahã. E daí?

Interrogado:- Aí entreguei pra ele assinado as 20 folhas, né, me deu mais uns papéis lá pra assinar, não sei o que quê que era aqueles papéis que não, entreguei.

Juíza:- Tá. O senhor disse que conheceu uma pessoa chamada Ramirez, né?

Interrogado:- É, Carlos Ramirez.

Juíza:- Carlos Ramirez. Aonde que foi especificamente?

Interrogado:-É, eu conheci ele lá na casa de câmbio, né, que eu fui, comprava os dólares. Aí depois, lá em Foz do Iguaçu, perto da Vila Portes, lá em um bar, nós conversamos e ele me, me pediu o talão, né.

Juíza:- Mas o quê que tem a ver esse Carlos, ele era espanhol, ele era paraguaio?

Interrogado:- Ele era paraguaio, eu acho.

Juíza:- Paraguaio?

Interrogado:- É.

Juíza:- E do quê que ele trabalhava?

Interrogado:- Ele é atendente lá na casa de câmbio.

Juíza:- Atendente numa casa de câmbio?

Interrogado:- Isso.

Juíza:- Não era um dos donos da casa de câmbio?

Interrogado:- Não.

Juíza:- Como que era o nome mesmo da casa de câmbio?

Interrogado:- Era Rio Paraná.

Juíza:- Rio Paraná?

Interrogado:-É.

Juíza:- Ahã. Ele tinha algum irmão que tinha banco, algum parente?

Interrogado:- Não, não sei.

Juíza:- Não, tá, ahã. E esse senhor Ramirez ele providenciou, como é que o senhor conseguiu abrir essa conta corrente, como é que foi?

Interrogado:- Não, a conta corrente eu tinha já no banco.

Juíza:- E o quê que o seu Ramirez ia fazer com seu talão de cheques?

Interrogado:- Aí ele não me falou.

Juíza:- E o senhor não desconfiou?

Interrogado:- Não, eu não sabia nada das transação, né, eu falei pra ele: “Cuide pra não estourar a conta”, né.

Juíza:- Mas a conta era sua e o senhor não tinha dinheiro ali na conta?

Interrogado:- Não, ela tava paralisada.

Juíza:- Não tinha dinheiro?

Interrogado:- Não tinha dinheiro.

Juíza:- Ele só pediu que o senhor assinasse um talão de cheques?

Interrogado:- Isso.

Juíza:- O senhor não ficou preocupado de assinar um talão de cheques assim todinho em branco com uma pessoa que o senhor mal conhecia?

Interrogado:- É que na época, né, eu tava em situação financeira ruim, né.

Juíza:- E o senhor achou que ele ia usar aquilo para um fim lícito?

Interrogado:-Ah, eu não…

Juíza:- Não tinha importância pro senhor se era algo lícito ou ilícito?

Interrogado:- Ah, eu, na época, nem imaginei, né.

Juíza:- Não, mas o senhor, não tinha importância se era uma coisa lícita ou ilícita o que ele ia fazer? O senhor não desconfiou que seria uma coisa ilícita?

Interrogado:- Não.

Juíza:- Uma pessoa te dar um talão de cheques inteiro pra assinar em branco da sua conta, que tá o seu CPF e, de repente, o senhor pode se prejudicar com isso?

Interrogado:- É, ele falou que confiava em mim, que ele não, né, então.

Juíza:- Não, mas, que ele confiava no senhor tudo bem, mas o senhor confiava nele a esse ponto de dar um talão de cheques seu em branco totalmente?

Interrogado:- Foi mais um desespero, né.

Juíza:- Ahã. Mas o senhor achou que ele ia usar para uma coisa lícita ou ilícita?

Interrogado:- Achei que era alguma coisa lícita, né.

Juíza:- Não desconfiou?

Interrogado:- Não.

Juíza:- Confiava nele como se fosse seu irmão então?

Interrogado:- Não.

Juíza:- Conhecia ele só de vista?

Interrogado:- É, conhecia ele de vista.

Juíza:- E mesmo assim deu um talão de cheques em branco da sua conta todinho assinado?

Interrogado:- Sim.

Juíza:- E daí o que aconteceu? A conta estourou, como é que foi?

Interrogado:- Não, aí ele fez uma movimentação, aí depois me pediu mais talão, eu falei que não ia mais dar.

Juíza:- Só do Banco do Brasil?

Interrogado:- E um do Banestado.

Juíza:- Da Caixa Econômica não?

Interrogado:- Não.

Juíza:- E daí, o que aconteceu? O senhor acompanhou daí a movimentação de sua conta, que era sua conta, não acompanhou?

Interrogado:- É, é, tirei uns, um extrato, daí…

Juíza:- E daí, não viu que tinha uma movimentação grande?

Interrogado:- Eu vi valor alto, daí eu fui falar com ele, né, falei que não iria mais dar os talão de cheque, né.

Juíza:- O senhor viu uma movimentação alta na sua conta corrente?

Interrogado:- É.

Juíza:- Por esses cheques?


Interrogado:- Sim.

Juíza:- Durante quanto tempo?

Interrogado:- Ah, não me lembro.

Juíza:- Mais de um mês, dois meses, três meses?

Interrogado:- Menos, eu acho que foi.

Juíza:- Menos?

Interrogado:- Menos.

Juíza:- Ahã. Daí o senhor já foi tirar satisfação com ele?

Interrogado:- Sim.

Juíza:- E ele lhe disse o quê?

Interrogado:- Ele não me falou nada.

Juíza:- Não falou nada?

Interrogado:- Não.

Juíza:- E o senhor não achou estranho que aquele dinheiro entrava e saía, entrava e saía?

Interrogado:- Não.

Juíza:- Não? Achou que era totalmente certo?

Interrogado:- É, sim.

Juíza:- E o senhor recebeu alguma comissão durante isso daí?

Interrogado:- Ah, ele me deu 200 dólares pelo talão de cheque, né.

Juíza:- Só 200 dólares?

Interrogado:- Sim.

Finalmente, mister registrar que a suposta dificuldade financeira daquele tempo, tal e como alegada pela Parte, não veio documentada (conquanto a prova fosse facilmente alcançada). Ademais, não se enquadra nas hipóteses de excludentes legais, mesmo porquanto o acusado possuía 2 (dois) empregos naquela época, auferindo renda também através do trabalho de sua esposa Marli, com quem teria – aliás – “em maio de 97” (fl. 195, linhas 41/42), aberto uma loja em um Shopping da cidade.

A reprovabilidade das condutas de ambos os réus finda, pois, como de cogência legal.

3. DISPOSITIVO:

Diante de todo o exposto, julgo procedente o pedido condenatório inserido na denúncia para condenar:

a) ALTEMIR ANTÔNIO CASTELI pela prática do crime do art. 22, parágrafo único, da Lei 7.492/86 (por 21 vezes); bem como dos crimes dos arts. 299 (por 3 vezes) e 288, ambos do CP, perpetrados todos na forma do art. 29 e 69 do mesmo Codex; e

b) ODILON CÂNDIDO BACELLAR NETTO pela prática do crime do art. 22, parágrafo único, da Lei 7.492/86 (por 1 vez); bem como dos crimes dos arts. 299 (por 1 vez) e 288, ambos do CP, perpetrados todos na forma dos arts. 29 e 69 do mesmo Código.

Passo a dosimetria da sanção penal, na forma do art. 68 do CP.

3.1. Do réu ALTEMIR ANTONIO CASTELI

O acusado é maior, mentalmente são e, portanto, imputável.

Na primeira fase de aplicação da pena, cumpre analisar as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal. Assim, e como visto, o réu ALTEMIR ANTONIO CASTELI agiu com culpabilidade elevada, posto que alto o grau de reprovabilidade de sua conduta; entretanto, tal já foi analisado quando da tipicidade in casu; ainda, e conquanto existam diversas informações sobre os seus antecedentes criminais, envolvendo inclusive fatos análogos aos presentes, mister considerar que se tratam, ou de inquéritos não finalizados, ou que já embasaram as denúncias acima informadas (assim: fls. 118, 306, 695/696); a personalidade e conduta social do acusado revelam desvirtuamento, eis que pôde ser constatado nos autos, não guardou restrições em, inobstante deter emprego público em instituição financeira, envolver-se em comércio clandestino e evasões de divisas em desfavor do Banco Central e Sistema Financeiro Nacional; ademais possui registros criminais recentes (fl. 163), que muito embora não possam ser considerados como antecedentes (art. 76§6º da Lei 9.099) tornam-se relevantes na análise de sua vida social; quanto aos motivos dos delitos, veja-se que os crimes foram praticados mediante paga, além do induzimento de terceiros (‘laranjas’); entretanto, tal será sopesado oportunamente, como agravante; em relação às circunstâncias dos delitos, tem-se que foram graves, dado que as transações contínuas, por um longo período de tempo, lograram ser ocultadas das autoridades competentes; as conseqüências dos crimes, também são graves sobremaneira se considerada a magnitude da lesão na hipótese, sendo que em nada foi ainda ressarcida a vítima (aliás, já lesada em seus interesses abstratos de mero ‘perigo de dano’, qual seja, a integridade do Sistema Financeiro Constitucional); sobre o comportamento da vítima, tem-se-no como irrelevante na espécie. Partindo de tal análise das circunstâncias judiciais, tem-se que, no tocante à sanção corporal cominada pelo legislador, demonstra-se necessário e suficiente para a reprovação e prevenção dos crimes a fixação da pena-base em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa (para o tipo penal do art.22 da Lei 7492/86); em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa (para o tipo do art. 299, do CP) e em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão (para o tipo do art. 288, do CP). Consigno que a pena privativa de liberdade foi aumentada em ¼, tomando-se em conta seus patamares mínimos e máximos; quanto aos montantes de dias-multa vêm fixados em razão da gravidade dos delitos, consoante leciona a doutrina, e tomando-se por base a parametricidade do art.22 da Lei 7492 (para o primeiro tipo penal), e do art. 49, do CP (para os demais). Os respectivos valores serão fixados a seguir, com base nas mesmas disposições e levando-se em conta a situação econômica do réu.


Na segunda fase de aplicação da pena, vislumbro a presença das agravantes previstas nos incisos II e IV, do art. 62, CP, no que tange ao delito de evasão de divisas. De fato, pela provas dos autos, foi possível concluir que, além de ter emprestado o seu próprio nome e contas para as transações, ALTEMIR aliciou outras duas pessoas, induzindo-as a participarem (ainda que indiretamente) de novas operações fraudulentas, tudo em vista das confessas recompensas (em torno de 200 dólares por conta-corrente). Diante de tal, majoro a pena-base fixada para o delito do art. 22, da Lei 7.492, em 1/5 – salvo quanto à multa (cf. art. 11 do CP) –, pelo que fica estabelecida, provisoriamente, em 3 anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa. Ausentes outras agravantes (art.61, 62), e atenuantes (art.64, 65, 66), ficam mantidas as penas anteriores.

Por fim, na terceira fase de aplicação, não vislumbro a presença de causas de especial aumento ou diminuição das penas até aqui aplicadas, cabendo apenas considerar, para cada qual, o aumento decorrente da continuidade delitiva (art. 71 do CP). De fato, e conquanto as razões ministeriais, vejo que cada modalidade criminosa foi praticada por diversas vezes, mas em condições de tempo, lugar e modo de execução que podem ser havidas uma como continuação da outra. Assim, tendo o acusado praticado o delito previsto no art. 22, parágrafo único da Lei 7.492/86, por 21 (vinte e uma) vezes – pro reu, como já dito –, aumento a pena fixada em 1/3, restando, em definitivo, em 04 (quatro) anos de reclusão. Quanto à multa, é devida indistintamente (art. 72), pelo que deve arcar o acusado com o pagamento dos mesmos 15 (quinze) dias-multa, no que tange a tal tipo penal. Ainda, tendo o acusado praticado também o delito previsto no artigo 299, do CP, por 3 (três) vezes, aumento a pena até então fixada em 1/5, restando, por definitivo, em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão, e os mesmos 15 (quinze) dias-multa, para este tipo penal. Quanto ao art. 288, do CP, fica mantida em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

Resta, ainda, somá-las em razão do concurso material (art.69), pelo que, fica ALTEMIR ANTONIO CASTELLI condenado, definitivamente em:

– 06 (seis) anos e 9 (nove) meses de reclusão e 30 (trinta) dias-multa, cada qual no valor da ½ (metade) do salário mínimo vigente em dezembro de 1997, época do último fato reconhecido, sem prejuízo da atualização monetária prevista no § 2º do art. 49 do Código Penal.

Justifico que a fixação de tal montante toma por base as declarações do acusado perante esse juízo (fl. 176), sem olvidar que “Não obstante ser a condição econômica do réu fator determinante na quantificação da multa, não deve ser desconsiderado o montante do resultado lesivo” (TRF 4ª Região, Ap. Crim. 98.04.07918-6-PR, Rel. Juiz Guilherme Beltrami, j. 25.04.00).

DA FORMA DE EXECUÇÃO DA PENA:

Realizo o exame conjugado dos arts. 33 e 59 do CP. Para início do cumprimento das penas privativas de liberdade, é fixado, em observância ao disposto nos §§2º e 3º do art. 33 CP, o regime semi-aberto, a ser cumprido na forma do art.35, CP.

Da substituição da pena privativa de liberdade imposta:

A pena tem essência retributiva (Fragoso) mas seu fim é preventivo (Soller). Com efeito, decorre da realização da conduta e depende da culpabilidade do agente e gravidade do delito praticado. Todavia, nos termos do caput e parágrafos do art. 44 do Código Penal, na redação da Lei nº 9.714/98, a pena privativa de liberdade imposta ao réu não é passível de substituição.

Do sursis da pena:

Descabe o sursis da pena, nos termos do art.77 CP.

Efeitos da Condenação:

a)Do direito de apelar em liberdade:

Analisando-se, conjuntamente as disposições dos arts. 594 CPP c/c art.30 da Lei 7492/86, tenho que resta facultado ao réu o direito de apelar em liberdade. Com efeito, e ainda que tenha permanecido preso durante todo o processo, parece não ecoar com parcela mínima de lógica ficar detido, uma vez que o regime inicial de cumprimento de sua pena definitiva foi o semi-aberto.

3.2. Do réu ODILON CÂNDIDO BACELLAR

O acusado é maior, mentalmente são, e, portanto, imputável.

Na primeira fase de aplicação da pena, cumpre analisar as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal. Assim, e como visto, o réu ODILON agiu com culpabilidade bastante elevada, posto que alto o grau de reprovabilidade de sua conduta; seus interrogatórios – todos colhidos na presença de defensores – evidenciam que tinha plena consciência de suas práticas ilícitas (tanto que, na fase inquisitorial, as assumiu); todavia, isto já foi levado em consideração quando da análise do dolo in casu; há diversas informações sobre seus péssimos antecedentes, envolvendo, inclusive sentenças condenatórias proferidas e outras investigações recentes, o que faz concluir pela reiteração criminosa, habitual e desmedida (a tanto, vide: certidão das fls. 126/127; certidão da fl. 193 complementada pela explicativa da fl. 322 e fls. 237/239, estas envolvendo fatos dentre 1998 e 2002); a personalidade e conduta social do acusado revelam exagerado desvirtuamento, posto ser constatado dos autos que não guardava restrições em envolver-se, diariamente e através de seus aperfeiçoados conhecimentos técnicos, a serviço do esquema fraudulento e criminoso – tal e como por ele próprio descrito; quanto aos motivos dos delitos, tem-se que os crimes foram praticados mediante paga, além do induzimento de terceiro (‘laranja’); entretanto, tal será sopesado oportunamente, como agravante; em relação às circunstâncias dos delitos, tem-se que foram graves, dado que as transações contínuas, por um longo período de tempo, lograram ser ocultadas das autoridades competentes; as conseqüências dos crimes, também são graves sobremaneira se considerada a magnitude da lesão na hipótese, sendo que em nada foi ainda ressarcida a vítima (aliás, já lesada em seus interesses abstratos de mero ‘perigo de dano’, qual seja, a integridade do Sistema Financeiro Constitucional); sobre o comportamento da vítima, tem-se-no como irrelevante na espécie. Partindo de tal análise das circunstâncias judiciais, tem-se que, no tocante à sanção corporal cominada pelo legislador, demonstra-se necessário e suficiente para a reprovação e prevenção dos crimes a fixação da pena-base em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa (para o tipo penal do art.22 da Lei 7492/86); em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa (para o tipo do art. 299, do CP) e em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão (para o tipo do art. 288, do CP). Consigno que a pena privativa de liberdade foi aumentada em ¼, tomando-se em conta seus patamares mínimos e máximos; quanto aos montantes de dias-multa vêm fixados em razão da gravidade dos delitos, consoante leciona a doutrina, e tomando-se por base a parametricidade do art.22 da Lei 7492 (para o primeiro tipo penal), e do art. 49, do CP (para os demais). Os respectivos valores serão fixados a seguir, com base nas mesmas disposições e levando-se em conta a situação econômica do réu.


Na segunda fase de aplicação da pena, vislumbro a presença das agravantes previstas nos incisos II e IV, do art. 62, CP, no que tange ao delito de evasão de divisas. De fato, pela provas dos autos, foi possível concluir que, além de servir à organização criminosa em tela, ODILON aliciou a Roger Sebastião (dentre outras pessoas, aliás, confessas), induzindo-o a participar de novas operações, tudo em vista da anunciada recompensa (comissões de corretagem). Diante de tal, majoro a pena-base fixada para o delito do art. 22, da Lei 7.492, em 1/5 – salvo quanto à multa (cf. art. 11 do CP) –, pelo que fica estabelecida, provisoriamente, em 3 anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa. Ausentes outras agravantes (art.61, 62), e atenuantes (art.64, 65, 66), ficam mantidas as penas anteriores.

Por fim, na terceira fase de aplicação, não vislumbro a presença de causas de especial aumento ou diminuição das penas até aqui aplicadas, restando apenas somá-las, em razão do concurso material (art.69), pelo que, fica ODILON CÂNDIDO BACELLAR NETO condenado definitivamente em:

– 05 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 30 (trinta) dias-multa, cada qual no valor de 2 (dois) do salário mínimo vigente em outubro de 1997, época do fato reconhecido, sem prejuízo da atualização monetária prevista no § 2º do art. 49 do Código Penal.

Justifico que a fixação de tal montante toma por base as declarações do acusado perante esse juízo (fl. 178), sem olvidar que “Não obstante ser a condição econômica do réu fator determinante na quantificação da multa, não deve ser desconsiderado o montante do resultado lesivo” (TRF 4ª Região, Ap. Crim. 98.04.07918-6-PR, Rel. Juiz Guilherme Beltrami, j. 25.04.00).

DA FORMA DE EXECUÇÃO DA PENA:

Realizo o exame conjugado dos arts. 33 e 59 do CP. Para início do cumprimento das penas privativas de liberdade, é fixado, em observância ao disposto nos §§2º e 3º do art. 33 CP, o regime semi-aberto, a ser cumprido na forma do art.35, CP.

Da substituição da pena privativa de liberdade imposta:

A pena tem essência retributiva (Fragoso) mas seu fim é preventivo (Soller). Com efeito, decorre da realização da conduta e depende da culpabilidade do agente e gravidade do delito praticado. Todavia, nos termos do caput e parágrafos do art. 44 do Código Penal, na redação da Lei nº 9.714/98, a pena privativa de liberdade imposta ao réu não é passível de substituição.

Do sursis da pena:

Descabe o sursis da pena, nos termos do art.77 CP.

Efeitos da Condenação:

a)Do direito de apelar em liberdade:

Analisando-se, conjuntamente as disposições dos arts. 594 CPP c/c art.30 da Lei 7492/86, tenho que resta facultado ao réu o direito de apelar em liberdade. Com efeito, e ainda que tenha permanecido preso durante todo o processo, parece não ecoar com parcela mínima de lógica ficar detido, uma vez que o regime inicial de cumprimento de sua pena definitiva foi o semi-aberto.

Das custas processuais:

Deverão os réus arcar com as despesas do processo, proporcionalmente (art.804 CPP).

Disposições finais:

Após o trânsito em julgado, lancem-se os nomes dos réus no rol dos culpados; façam-se as comunicações de praxe (principalmente para os fins do art.15, III, CF); calculem-se os valores da multa e das custas, intimando-se então os réus para pagá-las no prazo legal.

Desde logo, todavia:

a) expeçam-se os Alvarás de Soltura, determinando sejam os réus colocados imediatamente em liberdade, se por outro motivo não houverem de permanecer presos;

b) juntem-se as petições apresentadas pelas Partes, no ínterim, e que se encontram na contra-capa do 5º volume dos autos;

c) arquivem-se no sistema os PCDs e incidentes distribuídos por dependência à presente, já devidamente decididos, apensando-nos a esta ação penal em volumes numerados e identificados;

d) cumpra-se regularmente o item 1 do decisório da fl. 633 (remessa à SRIP para exclusão dos não mais processados por aqui);

e) diligencie-se acerca dos bens em depósito, certificando nos autos.

Publique-se, registre-se e intimem-se.

Curitiba, 24 de março de 2004.

BIANCA GEORGIA CRUZ ARENHART

Juíza Federal Substituta

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