Contrato quebrado

Marítima é condenada a indenizar segurado por danos morais

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17 de março de 2004, 19h05

A juíza Mariella Ferraz de Arruda P. Nogueira, da 9ª Vara Cível de Campinas, condenou a Marítima Seguros ao pagamento de 30 salários mínimos (R$ 7,2 mil) por danos morais pelo não cumprimento de um seguro residencial.

A decisão também determina que a seguradora reponha os bens estragados em estado novo até o valor da apólice, de R$ 10 mil, ao segurado Carlos Eduardo Monteiro, morador de Campinas, São Paulo. A Marítima já apelou da sentença.

Em outubro de 2000, uma forte chuva que caiu sobre a região danificou um guarda-sol e quebrou os tampos de vidro de duas mesas que encontravam à beira da piscina da casa de Monteiro. Acionada, em razão do seguro residencial, a Marítima reembolsou a importância de R$2.176,60, mas se recusou a ressarcir as mesas, sob o argumento de que poderiam ser reparadas, não sendo necessária sua substituição.

Monteiro, então, ajuizou a ação. Seu advogado pediu para que a seguradora cumprisse com as obrigações contratuais e arcasse com os prejuízos decorrentes do sinistro, na quantidade e qualidade dos bens segurados. Pediu também a indenização por danos morais.

A juíza Mariella acolheu os argumentos do autor, que foi representado pelo advogado Marcos Eduardo Pimenta. A Marítima foi também condenada a arcar com custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 15% sobre o valor da condenação.

Leia os principais trechos da sentença

PODER JUDICIÁRIO

SÃO PAULO

9º VARA CÍVEL – COMARCA DE CAMPINAS

PROC. N. 4.426/02

VISTOS

CARLOS EDUARDO MONTEIRO ajuizou ação de INDENIZAÇÃO em face de MARÍTIMA SEGUROS S/A. Afirma que celebrou contrato de seguro residencial em 9 de março de 2.000, assumindo a seguradora a obrigação de indenizar riscos decorrentes de vendaval/fumaça, em importância não superior a R$10.000,00.

Na vigência do contrato, em 23 de outubro de 2.000 houve tempestade com forte chuva na cidade de Campinas, com avarias na residência do autor, danificando um guarda-sol e sua base, da marca “Tropitone” e duas mesas com tampo de vidro. Foram feitos orçamentos e postulada à seguradora, que reembolsou apenas a importância de R$2.176,60, recusando-se a ressarcir as mesas, sob o argumento de que poderiam ser reparadas, não sendo necessária sua substituição.

Diante da conduta irregular da fé, com recusa à indenização e cumprimento das obrigações contratuais que assumiu, busca seja condenada a indenizar os prejuízos decorrentes do sinistro, na quantidade e qualidade dos bens segurados, bem como danos morais causados ao autor pelo desconforto e dor que seu comportamento acarretara, acrescidos de custas processuais e honorários advocatícios. Juntou documentos.

Citada a ré, ofereceu contestação. Afirma que a recusa à indenização pleiteada pelo segurado se deu pela pretensão de reposição de produtos de qualidade superior às existentes no riso e outros não incluídos na vistoria local, sendo realizada a indenização apurada nos termos do relatório de sinistro e apólice contratada. Insurge-se, ainda, contra a pretensão de indenização dos danos morais, invocando o disposto no artigo 1.061 do CC / 1.916 e aduzindo que se traduz em abuso de direito e busca de enriquecimento indevido. Busca a improcedência da ação.

Nova manifestação do autor a fls. 85/94, com ciência à parte contrária dos documentos que anexou.

É O RELATÓRIO. D E C I D O

Desnecessária a dilação probatória, pois a matéria versada nestes autos é exclusivamente de direito, autorizando o julgamento antecipado da lide.

As partes celebram contrato de seguro residencial, cobertos os riscos causados por vendaval/fumaça, até o limite de R$10.000,00. Em razão de forte chuvas e vendaval ocorridos em Campinas em outubro/2.000 o autor sofreu danos em objetos instalados em sua residência, buscando a indenização correspondente.

Esses fatos são incontroversos, residindo a discussão no cumprimento ou não do contrato pela ré ao disponibilizar ao autor a importância de R$ 2.174,60, apontada pelo segurado como insuficiente a reparar os danos que sofreu.

O laudo de vistoria realizado pela seguradora descreveu os bens sinistrados: um toldo, duas mesas da marca “Tropitone” com vidros, um guarda-sol e sua base de aço. A controvérsia se dá quanto às mesas e tampo de vidro, sustentando a seguradora que seria possível a realização de reparos na estrutura metálica das mesas, estimado o custo do conserto em R$300,00, com a aquisição em separado dos vidros, ao preço de R$760,00.

Não assiste razão à seguradora ao pretender a indenização pelo valor suficiente à realização de reparos, o que se extrai da leitura do contrato, em especial a clausula IX:

In verbis: “Para Prédios” e “conteúdos” a Seguradora indenizarás os prejuízos cobertos pelo Valor Novo (V.N.), ou seja, o custo da reposição nas mesmas condições a preços correntes no dia e local do sinistro.

Mais a frente descreve o que seria o Valor de Novo: “Representa o valor do bem no estado de novo. É o valor de aquisição acrescido de custos de instalação, frete, tributações, armazenagens, etc”. (fls. 76).

Diante desse quadro, forçoso reconhecer que ao oferecer ao autor indenização que não correspondia ao valor suficiente à aquisição de novos bens, a substituir os danificados, pretendendo compeli-lo a aceitar montante suficiente ao reparo quanto a alguns deles, e não à reposição das peças, não atentou para o cumprimento das obrigações assumidas no contrato de seguro.

(…)

O valor da indenização deverá ser apurado ao tempo da execução da sentença, mediante a apresentação de novo orçamento ou nota fiscal dos produtos adquiridos pelo autor. Não é possível definir o valor da indenização pelo valor do orçamento já exibido, uma vez que os produtos são objetos de importação e portanto seu preço é variável segundo a moeda americana.

No que diz respeito aos danos morais, inegável o constrangimento e dissabor causados ao autor pela conduta abusiva da ré. Não se ignora que o objetivo da contratação de um seguro é justamente obter tranqüilidade, assegurando-se que fatos do cotidiano – sejam eles de ordem natural, como chuvas, terremotos, vendavais, ou humana, como furtos e roubos, não se transformem em grandes transtornos e prejuízos a seus titulares. Ou seja, paga-se por um risco possível para que em havendo sua ocorrência haja garantia de reposição “stato quo ante”.

Contudo, sistematicamente tem-se observado que as facilidades encontradas para a contratação de um seguro não se repetem ao tempo do cumprimento das obrigações pelas seguradoras, que se apegam a pequenos detalhes para recusar indenização, ignorando o bom senso e as regras contratuais que estabeleceram, já que todos os contratos de seguro são de adesão.

Esse procedimento pode ser identificado no caso concreto, onde se constata que contra cláusula contratual expressa quanto à obrigação de reposição de bem em iguais condições e em estado de novo, procura a ré se liberar da obrigação oferecendo quantia que não se mostra suficiente a ressarcir os prejuízos sofridos, fazendo com que o autor, passados quase três anos desde o sinistro, ainda não tenha logrado êxito na reparação dos danos objeto do contrato de seguro.

Evidente o menoscabo com que é tratado o autor, com frustração quanto à expectativa do objeto do contrato, em atitude suficiente a violar sua moral. Forçoso reconhecer que o descumprimento de obrigação contratual extrapola os danos meramente patrimoniais, lesionando o fim de satisfação e gozo que eram esperados do ajuste, frustrando o ânimo que justificou a própria contratação – -comodidade, segurança, tranqüilidade de espírito, paz.

Assim, verificada a conduta culposa da ré, e estabelecida a relação de causa e efeito entre ela e os danos causados ao autor, devida a reparação pretendida.

A indenização por dano moral não guarda relação com acréscimos impostos à obrigação principal em razão do não cumprimento no tempo e modo especificados no contrato, como é o caso dos juros e multa.

Considerando a capacidade financeira da vítima e ofensor, a repercussão da lesão, e que o propósito da indenização, além de reparar o dano, é também o didático, incutir temos ao responsável pela prática de novo ato e evitar novo tentado, fixo a indenização em 30 (trinta) salários mínimos.

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a ação, para condenar MARÍTIMA SEGUROS a pagar ao autor a indenização:

a – contratada na apólice, apurada segundo a qualidade e quantidade dos bens sinistrados em estado de novo (guarda-sol, base e duas mesas com tampos de vidro, da marca “Tropitone”), o que será apurado pela exibição de orçamento vigente ao tempo da execução da sentença, quando passará a incidir atualização monetária. Deverá também ocorrer o reembolso ao valor da apólice, com dedução da franquia.

b – pelos danos morais, arbitrados em 30(trinta) salários mínimos, vigente aso tempo da sentença, a partir de quando incidirá atualização monetária.

Os juros de mora legais são devidos da citação. Responderá a ré por custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 15%sobre o valor da condenação ora estabelecida.

P.R.I.C.

Campinas, 28 de outubro de 2.003.

Mariella Ferraz de Arruda P. Nogueira

Juíza de Direito

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