Decisão à vista

Cade julga pleito da Telecom Itália até o final deste mês

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16 de março de 2004, 16h51

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) julgará, até o final deste mês, a legalidade do retorno da Telecom Itália ao bloco controlador da Brasil Telecom. A empresa italiana, que tem participação no controle da TIM Celular, quer voltar a integrar o Conselho da Brasil Telecom, que já começou a operar a BrT Celular. As outorgas da TIM e da BrT se sobrepõem regional e nacionalmente.

A previsão do prazo de julgamento é do conselheiro Fernando de Oliveira Marques, relator de medida cautelar requerida pela Animec (Associação Nacional de Investidores do Mercado de Capitais), alegando que o retorno limitaria e prejudicaria a concorrência no setor de telecomunicações.

Oliveira Marques apresentará o seu relatório depois de ter consultado e recebido as manifestações da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça, Secretaria de Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda, Ministério Público Federal e Procuradoria-geral do Cade.

Até o final da semana, o conselheiro já tinha em sua posse as manifestações da Anatel, do Ministério Público Federal, da Seae e da SDE. A Anatel e o Ministério Público Federal são favoráveis ao pleito da Telecom Itália.

A Seae e a SDE, por sua vez, recomendaram o acolhimento da cautelar da Animec, ou seja, o impedimento do retorno da Telecom Itália. A Seae entende que “o mero fato de que terão [a TIM] acesso às informações relativas, por exemplo, às estratégias de investimento e marketing da Brasil Telecom Celular [BrT] já coloca esta empresa em situação de competição desigual relativamente à TIM”.

Este é o mesmo argumento da SDE. “O uso [pela TIM] de informações privativas da empresa, no caso a BrT, uma vez acessadas, podem ser utilizadas para mitigar a concorrência”, argumenta, em seu parecer, o secretário de Direito Econômico, Daniel Krepel Goldberg.

Goldberg acrescenta ainda que “o acesso a tais informações, hoje, constitui, desde logo, condição suficiente para potencial alteração do comportamento concorrencial entre as empresas”. (veja a íntegra do parecer)

O subprocurador-geral da República, Moacir Guimarães Morais Filho,

considerou que a Animec, por ser uma associação de investidores e não pertencer ao setor de telecomunicações, não tem legitimidade para requerer a cautelar. Ele também apoiou sua decisão no parecer da Anatel, cujos pontos principais transcreve em seu relatório.

Leia o parecer do MPF e, em seguida, o da SDE:

Ministério Público Federal

Procuradoria Geral da República

N.º 577/2004/CADE/MGMF

MEDIDA CAUTELAR N.° 08700.00018/2004-68

REQUERENTE: ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE INVESTIDORES DO MERCADO DE CAPITAIS (ANIMEC).

RELATOR: CONSELHEIRO FERNANDO DE OLIVEIRA MARQUES

Direito Econômico. Medida Cautelar. Mercado regulado de telecomunicações. Ausência dos pressupostos do fumus boni juris e do periculum in mora. Preliminar. Ilegitimidade de parte ativa. Questão de natureza privada. Requerente que não atua no mercado de telecomunicações.

Medida Cautelar buscando obstar o reingresso da Requerida TELECOM ITÁLIA no grupo de controle da SOLEPAR, controladora da BRASIL TELECOM. Fato superveniente. Publicação do Ato ANATEL n.° 41.780, em 19/01/2004. Anuência da Agência Reguladora quanto ao retorno da TELECOM ITÁLIA ao controle da SOLPAR e, consequentemente, ao da BRASIL TELECOM.

Alegado “periculum in mora” não comprovado. Inexistência de imposição por parte da ANATEL para a renúncia da BRASIL TELECOM do direito de explorar as licenças de Serviço Móvel Pessoal (SMP), Longa Distância Nacional (LDN) e Longa Distância Internacional (LDI). Reversibilidade da operação preservada. Impedimento da TELECOM ITÁLIA de participar, direta ou indiretamente, em todas as instâncias decisórias, das deliberações sobre matérias relacionadas a outorgas onde ocorreu sobreposição. Prazo de 18 meses. Ato de Concentração submetido ao Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência. Posterior análise do mérito da operação.

Parecer do Ministério Público Federal, preliminarmente, pela ilegitimidade ativa da Requerente ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE INVESTIDORES DO MERCADO DE CAPITAIS (ANIMEC), e caso superada a preliminar, manifesta-se pela não concessão da Medida Cautelar, por não comprovação dos pressupostos do periculum in mora e do fumus boni juris, sem prejuízo da manifestação ministerial quanto ao mérito da operação.

Trata-se de Medida Cautelar requerida pela ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE INVESTIDORES DO MERCADO DE CAPITAIS (ANIMEC), contra as empresas TELECOM ITÁLIA INTERNATIONAL N.V., TECHOLD PARTICIPAÇÕES S/A. e TIMEPART PARTICIPAÇÕES LTDA., no Ato de Concentração n.º 53500.002400/2004, a fim de impedir o retorno da TELECOM ITÁLIA ao bloco de controle da BRASIL TELECOM S/A., assegurando a esta empresa telefônica o pleno exercício do direito de explorar as licenças de Serviço Móvel Pessoal (SMP), Longa Distância Nacional (LDN) e Longa Distância Internacional (LDI).


2. As empresas Requeridas (TELECOM ITÁLIA, TECHOLD e TIMEPART) são todas detentoras de participação societária na SOLPART PARTICIPAÇÕES S/A., a qual é controladora da BRASIL TELECOM S/A.

3. Alega a Requerente ANIMEC, a existência de um “aditivo ao acordo de acionistas da SOLPART”, firmado pela Requeridas em agosto de 2002, estabelecendo a saída da TELECOM ITÁLIA do grupo de controle da SOLPART, com um possível retorno.

4. A retro-transferência das ações da SOLPART para a TELECOM ITÁLIA, que antes eram detidas pela TIMEPART e pela TECHOLD, estava sujeito a termo (01/01/2004) ou condição suspensiva (certificação da antecipação das metas da BRASIL TELECOM pela ANATEL), hipótese que ocorresse primeiro.

5. A saída da TELECOM ITÁLIA do grupo de controle da SOLPART é objeto do Ato de Concentração n.° 53500.005049/2002, tendo sido apresentado e aprovado pela Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), aguardando julgamento por parte do CADE (Conselheiro-Relator Fernando de Oliveira Marques).

6. Por sua vez, o retorno da TELECOM ITALIA ao controle da SOLEPAR, mediante o exercício do direito de recompra das participações acionárias após o implemento das condições apostas no Acordo de Acionistas Aditado e Consolidado, ocorreu em 21/01/2004, sendo objeto do Ato de Concentração n.° 53500.002400/2004, ainda em instrução.

7. Segundo a ANIMEC, o eventual retorno da TELECOM ITÁLIA ao grupo de controle da SOLPART limitará e prejudicará a concorrência no setor de telecomunicações, pois ambas adquiriram autorização para explorar, direta ou indiretamente, o SMP na Região II do PGO e o direito de explorar os serviços de LDN e LDI em todo o território nacional.

8. Para a Requerente ANIMEC, o retorno da TELECOM ITÁLIA ao grupo de controle da SOLPART implica diminuição da concorrência no mercado de telecomunicações, já que é impossível haver exploração simultânea por parte do Grupo TELECOM ITÁLIA e da BRASIL TELECOM, direta ou indiretamente, de um mesmo serviço de telecomunicações em uma mesma área, porque as normas de telecomunicações vedam que um mesmo grupo preste o mesmo serviço em região coincidente.

9. Em sua manifestação, a TELECOM ITÁLIA aduziu que a Requerente ANIMEC já havia ingressado, em 05/12/2003, com Medida Cautelar perante o Juízo da 17.ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal (2003.34.00042426-1), requerendo liminar para impedir que a TELECOM ITÁLIA retornasse ao grupo de controle da BRASIL TELECOM.

10. O pedido de liminar foi indeferido por ausência de demonstração dos pressupostos do periculum in mora e do fumus boni juris, não tendo havido recurso da ANIMEC contra esta decisão.

11. A TELECOM ITÁLIA pleiteia a extinção da Medida Cautelar sem julgamento do mérito, em razão da perda de objeto, em razão de fato superveniente, consubstanciado no Ato ANATEL n.° 41.780, publicado em 19/01/2004, que aprovou a operação de retorno da TELECOM ITÁLIA, ao grupo de controle da SOLPART, e consequentemente, ao da BRASIL TELECOM.

12. Alega, ainda, a TELECOM ITÁLIA, que não estão presentes nenhum dos dois requisitos necessários à concessão da medida cautelar, pois a presença da TELECOM ITÁLIA no bloco de controle da BRASIL TELECOM (SOLPART) não traz qualquer prejuízo à concorrência, já que não altera as relações concorrenciais no mercado de telecomunicações.

13. Menciona o fato de que, no caso, não existe a alegada irreversibilidade do retorno da TELECOM ITÁLIA ao grupo de controle da BRASIL TELECOM, porque na hipótese de se verificar qualquer efeito anticoncorrencial, poderá ser desfeito pelo CADE.

14. É o relatório, segue o parecer do Ministério Público Federal.

15. Preliminarmente, entende o Ministério Público Federal que a ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE INVESTIDORES DO MERCADO DE CAPITAIS (ANIMEC) não possui legitimidade para pleitear a presente Medida Cautelar.

16. A Requerente ANIMEC é uma associação de classe, que representa investidores minoritários do mercado brasileiro de capitais, não atuando no mercado de telecomunicações, quer no plano horizontal, quer no plano vertical.

17. A Resolução n.° 24/2002, que dispõe sobre a medida cautelar no âmbito do CADE, estabelece que a medida cautelar poderá ser deferida de ofício, pelo Relator ou pelo Plenário, ou em virtude de requerimento escrito e fundamentado da SEAE, SDE, Procuradoria do CADE ou qualquer legítimo interessado no ato de concentração analisado.

18. No caso, falta à Requerente ANIMEC legítimo interesse em pleitear a concessão da Medida Cautelar, visto que não atua no mercado de telecomunicações objeto do Ato de Concentração n.° 53500.002400/2004.

19. O fato de se dizer substituta de pequenos investidores assegura à ANIMEC apenas a defesa de interesses privados individuais quanto a valores mobiliários constituídos pela participação acionária de seus associados nas empresas Requeridas. Esta é uma questão fora do âmbito do direito da concorrência a ser resolvida na defesa do direito societário, segundo as normas estabelecidas pela Comissão de Valores Mobiliários para as sociedades de capital aberto.


20. Superada a preliminar, entende o Ministério Público Federal que a concessão da Medida Cautelar requerida pela ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE INVESTIDORES DO MERCADO DE CAPITAIS (ANIMEC) está prejudicada pela ausência dos pressupostos do fumus boni juris e do periculum in mora.

21. Com efeito, o pedido da Medida Cautelar é o de impedir o reingresso da TELECOM ITÁLIA ao grupo de controle da SOLPART, a fim de assegurar à BRASIL TELECOM e à BRASIL TELECOM CELULAR o pleno exercício da exploração das licenças do Sistema Móvel Pessoal (SMP), Longa Distância Nacional (LDN) e Longa Distância Internacional (LDI).

22. Ocorre que, em 19/01/2004, ou seja após a protocolização da presente Medida Cautelar, que se deu em 05/01/2004, a ANATEL publicou o Ato n.° 41.780, no qual anuiu com a operação de retorno da TELECOM ITÁLIA ao grupo de controle da SOLPART, e conseqüentemente, ao da BRASIL TELECOM.

23. O Ato ANATEL n.° 41.780 também repeliu os argumentos da Requerente ANIMEC, de que com o reingresso da TELECOM ITÁLIA ao grupo de controle da SOLPART, a BRASIL TELECOM perderia o direito de explorar as licenças SMP, LDN e LDI, nas regiões onde houvesse superposição de outorgas.

24. De fato, os artigos 8.° e 9.° do Ato ANATEL n.° 41.780, não impôs que a BRASIL TELECOM renunciasse às licenças SMP, LDN e LDI. Ao contrário, estabeleceu prazo máximo de 18 (dezoito) meses, a contar de 19/01/2004, para que a TELECOM ITÁLIA e BRASIL TELECOM, adotem medidas necessárias para que deixe de haver superposição de outorgas.

25. Cabe mencionar, ainda, que o Ato ANATEL n.° 41.780, afasta o periculum in mora, pois garante a reversibilidade da operação quando estabelece que, enquanto permanecerem as superposições das outorgas, a TELECOM ITÁLIA, direta ou indiretamente, fica impedida de participar, em todas as instâncias decisórias, das deliberações sobre matérias relacionadas a estas outorgas.

26. Ademais, a não concessão da presente Medida Cautelar não retira do CADE a possibilidade de analisar eventuais efeitos anticoncorrenciais decorrentes do retorno da TELECOM ITÁLIA ao controle da SOLEPAR, uma vez que esta operação é objeto do Ato de Concentração n.° 53500.002400/2004, ainda em instrução, podendo a operação ser rejeitada ou aprovada com restrições.

27. Por ora, não vê o Ministério Público Federal os requisitos do periculum in mora e do fumus boni juris para o deferimento da Medida Cautelar, até porque antes de qualquer decisão a esse respeito, compete ao Relator intimar as partes Requerentes do Ato de Concentração, sobre a possibilidade de celebração de um Acordo de Preservação de Reversibilidade da Operação (APRO).

28. Toda Medida Cautelar objetiva evitar um risco e a ineficácia do resultado final do processo, e o APRO não é medida a ser tomada apenas por iniciativa das partes, mas também por iniciativa do Relator, nos termos do artigo 9.°, da Resolução CADE n.° 28/2002.

29. A decisão sobre a aplicação de Medida Cautelar, no entender do Ministério Público Federal, não pode ser tomada sem que o CADE antes examine a conveniência ou não da celebração de um APRO.

30. A excepcionalidade da concessão da Medida Cautelar pelo Relator, sem a oitiva das empresas Requerentes do Ato de Concentração, só ocorrerá se houver demora que possa acarretar ineficácia, total ou parcialmente, à concessão da medida.

31. Diante do exposto, opina o Ministério Público Federal, preliminarmente, pela ilegitimidade ativa da Requerente ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE INVESTIDORES DO MERCADO DE CAPITAIS (ANIMEC), e caso superada a preliminar, manifesta-se pela não concessão da Medida Cautelar, por não comprovação dos pressupostos do periculum in mora e do fumus boni juris, sem prejuízo da manifestação ministerial quanto ao mérito da operação.

Brasília/DF, 25 de fevereiro de 2004.

MOACIR GUIMARÃES MORAIS FILHO

Subprocurador-Geral da República

Representante do MPF junto ao CADE – Portaria PGR n.° 846, de 09/12/2002

Parecer da SDE

Data de entrada: 19 de fevereiro de 2004

Autos nº: 08012.001279/2004-53

Natureza: Manifestação acerca do requerimento de Medida Cautelar

Requerente: Associação Nacional de Investidores do Mercado de Capital – ANIMEC

Requeridas: Telecom Itália International N.V.; Techold Participações S.A.; Timepart Participações Ltda.; e Solpart Participações S.A.

Senhor Secretário,

1. DOS FATOS

Trata-se de Medida Cautelar proposta pela Associação Nacional de Investidores do Mercado de Capital – ANIMEC (1) contra os acionistas controladores da Brasil Telecom S/A (doravante denominada “BrT”), tendo em vista a tentativa da empresa Telecom Itália Internacional N.V. (doravante denominada “TII”) de retorno ao bloco de controle dessa empresa.


Segundo a Requerente, esse retorno visa impedir que a BrT explore serviços de telecomunicações. Por sua vez, a TII alega estar fundada no “Aditivo ao Acordo de Acionistas da Solpart” (2) firmado entre TII, Techold Participações S.A. (doravante denominada “TECHOLD”) e Timepart Participações Ltda. (doravante denominada “TIMEPART”) em 27/08/2002. Tal acordo permitiu a saída da TII do grupo de controle da Solpart Participações S.A. (doravante denominada “SOLPART”) e, ainda, estabeleceu a possibilidade de retorno da TII a esse mesmo grupo de controle, sujeito a determinadas condições que constituem condição suspensiva de eficácia.

O Ato de Concentração nº 53500.005049/2002, relativo à primeira parte do “Aditivo ao Acordo de Acionistas da Solpart” – saída da TII do grupo de controle da SOLPART, já foi analisado pela ANATEL que emitiu parecer favorável a sua aprovação e, por ora, aguarda julgamento pelo CADE.

Em 31/12/2003, a TII notificou à ANATEL e ao CADE um novo AC nº 53300.002400/2004 que consiste, por sua vez, na segunda reestruturação societária da SOLPART e resultará no retorno da TII ao grupo de controle da BrT.

Segundo a Requerente, o retorno da TII ao grupo de controle da SOLPART limitará e prejudicará a concorrência no setor de telecomunicações, pois ambas adquiriram autorização para explorar, direta ou indiretamente, o Serviço Móvel Pessoal (“SMP”) na Região II do Plano Geral de Outorgas (“PGO”) e o direito de explorar os Serviços Telefônicos Fixos Comutados (“STFC”) de Longa Distância Nacional (“LDN”) e Longa Distância Internacional (“LDI”) em todo o território nacional – TIM Celular S.A. (doravante denominada “TIM”) pelo Grupo Telecom Itália, controlador da TII; e Brasil Telecom Celular S.A. (doravante denominada “BRASIL TELECOM CELULAR”) pela BrT.

A Requerente destaca, ainda, que as normas de telecomunicações, mais especificamente, o art. 68 da Lei nº 9.472/97, o art. 8º do Plano Geral de Autorizações e o art. 9º do Regulamento do SMP, vedam que um mesmo grupo preste o mesmo serviço em região coincidente, como forma de assegurar a concorrência.

De acordo com a Requerente, a determinação da Medida Cautelar requerida pretende, manter o status concorrencial anterior ao ato (retorno da TII) antes de seu julgamento final, com o intuito de evitar, que sejam praticadas (a) alterações societárias; (b) transferência ou renuncias de direitos e obrigações, (c) mudanças no grupo de controle, (d) interrupção de projetos e de investimentos da BrT e da BRASIL TELECOM CELULAR para desenvolver o SMP, o LDN e o LDI, e, ainda, (e) transferência ou renúncias de direitos e obrigações relativas ao SMP, LDN e LDI.

Ainda segundo a ANIMEC, a TII adquiriu em 13/02/2001 e 13/03/2001, autorizações para explorar o serviço SMP (bem como o LDN e o LDI) em todo o Brasil – por meio da TIM, e teria impedido a BrT de participar desse certame, através do uso do direito de veto que lhe havia sido assegurado no Acordo de Acionistas. Tendo recebido as mencionadas autorizações, a TII teria tentado obrigar a BrT a realizar a antecipação do cumprimento de metas de universalização de 2003 para 2001, para que a TIM pudesse operar o SMP. Contudo, a BrT se recusou a antecipar o cumprimento de metas, pois não havia adquirido as autorizações para explorar o SMP (o que fez a TII isoladamente).

Nesse contexto, viu-se a TII na contingência de deixar o grupo de controle da BrT para que a TIM pudesse imediatamente explorar o SMP. Em vista disso, a TII, a TECHOLD e TIMEPART formalizaram o já mencionado “Aditivo ao Acordo de Acionistas da Solpart”, em 27/08/2002, e a TII retirou-se, assim, da sociedade.

A ANATEL autorizou o ato referente à retirada da TII do grupo de controle da SOLPART, com base no fato de que se mantém inalterado o controle acionário da BrT, detido pela BRASIL TELECOM PARTICIPAÇÕES S.A., e, ainda, inalterado o controle acionário da BRASIL TELECOM PARTICIPAÇÕES S.A., detido pela SOLPART, configurando-se somente a alteração no grupo de controle desta última. Portanto, por não configurar transferência de controle acionário da concessionária BrT, ou de sua controladora, BRASIL TELECOM PARTICIPAÇÕES S.A., a ANATEL não encontrou óbices legais que impedissem a referida operação. Entende a ANATEL, ainda, que tal operação seria “pró-competitiva”, já que resultaria na entrada de mais uma prestadora de serviços de telecomunicações.

Na licitação seguinte, então, como a BrT já não tinha mais o Grupo Telecom Itália em seu bloco de controle, ela adquiriu autorizações para explorar o SMP na Região II.

A TII, por sua vez, detém autorização para explorar o SMP, o LDN e LDI em todo o território nacional. A BrT detém autorização para explorar o LDN e LDI em todo o território nacional e o SMP na Região II. Desta forma, tanto a BrT quanto a TII detêm autorizações para explorar o SMP na Região II, bem como de LDN e LDI em todo o território nacional.


Por todo o exposto, a Requerente acredita ser inadmissível, depois de realizados pesados investimentos pela BrT para explorar o SMP, LDN e LDI, que a BrT seja obrigada a deixar de explorar tais serviços, para, de outro lado, permitir que a TII retorne ao grupo de controle da SOLPART, e o Grupo Telecom Itália, através da TIM, seja o único integrante do grupo a explorar o SMP, LDN e LDI.

A TII, de sua parte, acredita contudo, que o Aditivo ao Acordo de Acionistas da Solpart, mais especificamente a cláusula 5.1, regula a restauração de certos direitos da TII, com respeito às suas participações diretas e indiretas na SOLPART, Brasil Telecom Participações S.A. e BrT. Conforme descrito, in verbis:

“5. RESTAURAÇÃO DE DETERMINADAS SEÇÕES SUSPENSAS DO CONTRATO DE ACIONISTAS DE 2002 E DETERMINADAS OBRIGAÇÕES DAS PARTES. 5.1. Em (i) 1º de janeiro de 2004, (ii) data de publicação, conforme aplicável, do reconhecimento da ANATEL que a Companhia Operacional relevante atendeu às suas metas de universalização de 31 de dezembro de 2003, ou (iii) se a qualquer momento após o atendimento da condição descrita na seção 7.2 abaixo, por lei, regulamentação, ato administrativo ou decisão judicial (incluindo, sem limitação, atos e decisões que não forem finais), (A) a TIM for impedida de realizar quaisquer serviços SMP em virtude da participação da TII na Companhia ou (B) a TII for impedida de manter os efeitos e validade da transferência de ações mencionada na Seção 2 acima, o que ocorrer primeiro (“Evento Ocasionador de Restauração”), as Seções Suspensas descritas na Seção 4 acima serão automática e imediatamente restauradas a pleno vigor e efeito sem necessidade de outra ação pelas Partes, devendo ser observadas e reforçadas [levadas a efeito] pelas Partes, seus respectivos diretores, representantes e projetistas [prepostos], incluindo, mas não se limitando ao Presidente das Assembléias de Acionistas ou do Conselho de Administração da COMPANHIA, COMPANHIA CONTROLADORA ou Companhia Operacional relevante.”

A esse respeito, nota-se que, em 19/01/2004, a ANATEL publicou no D.O.U. o Ato nº 41.780, de 16/01/2004, no qual homologou, para fins regulatórios, a restauração dos direitos da TII que estavam suspensos por força do Aditamento, concedendo um prazo de 18 (dezoito) meses para que as empresas envolvidas adotassem as medidas necessárias para resolverem a questão das sobreposições de autorizações e concessões. A ANATEL estabeleceu, ainda, que a TII ficaria impedida de participar, em todas as instâncias decisórias, das deliberações sobre matérias relacionadas a estas outorgas, enquanto se mantiverem as sobreposições. Conforme descrito, in verbis:

“Art. 7º Anuir com a operação de retorno da TELECOM ITÁLIA INTERNATIONAL N.V. ao grupo de controle da Solpart Participações S.A., e, conseqüentemente, ao da BRASIL TELECOM PARTICIPAÇÕES S.A. e ao da BRASIL TELECOM S.A.

Art. 8º Estabelecer o prazo máximo de 18 (dezoito) meses, contado da publicação deste Ato, para que as empresas do grupo TELECOM ITÁLIA INTERNATIONAL N.V. e BRASIL TELECOM S.A., detentoras de Autorizações e Concessões para prestação do STFC, nas modalidades LONGA DISTÂNCIA NACIONAL e LONGA DISTÂNCIA INTERNACIONAL, adotem as medidas necessárias para que deixe de haver superposição de outorgas nas Regiões I, II e III do PGO, sob pena de aplicação das sanções previstas na legislação.

Art. 9º Estabelecer o prazo máximo de 18 (dezoito) meses, contado da publicação deste Ato, para que as empresas do grupo TELECOM ITÁLIA INTERNATIONAL N.V. e BRASIL TELECOM S.A., detentoras de Autorizações para prestação do SMP, adotem as medidas necessárias para que deixe de haver superposição de outorgas em relação à Região II do PGA-SMP, sob pena de aplicação das sanções previstas na legislação.

Art. 10º Estabelecer que, enquanto permanecerem as superposições das mencionadas outorgas, a TELECOM ITÁLIA INTERNATIONAL N.V., direta ou indiretamente, fica impedida de participar, em todas as instâncias decisórias, das deliberações sobre matérias relacionadas a estas outorgas.”

Pelo exposto acima, a TII argumenta que as alegações da Requerente a respeito de possíveis: (i) alterações societárias; (ii) transferência ou renuncias de direitos e obrigações, (iii) mudanças no grupo de controle, (iv) interrupção de projetos e de investimentos da BrT e suas subsidiárias para desenvolver o SMP, o LDN e o LDI, e, ainda, (v) transferência ou renúncias de direitos e obrigações relativas ao SMP, LDN e LDI, não procedem, pois estas condutas não seriam permitidas pela ANATEL com base no Ato acima descrito.

A TII informou, ainda, que a Requerente protocolou petição na ANATEL requerendo que aquela Agência impedisse o retorno da TII ao bloco de controle da SOLPART. Ante a falta de resposta da ANATEL, tentou impedir, também sem sucesso, junto ao Poder Judiciário, a restauração da posição da TII no bloco de controle da SOLPART, ajuizando Medida Cautelar perante o juizo da 17ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, cujo pedido liminar, conforme mencionado, foi indeferido.


Portanto, a TII entende que a propositura da Medida Cautelar ora em análise não passa de “uma tentativa da Requerente de manipular o CADE para obter o que a ANATEL e o Poder Judiciário lhe negaram, e que se situa no plano exclusivamente privado, porque nada mais é do que a vantagem indevida de determinados acionistas da BrT”.

Em 19/02/2004, então, o CADE encaminhou o Ofício Gab FOM nº 079/2004, em 19/02/2004, solicitando o pronunciamento desta SDE a respeito das operações em questão.

Este é o relatório.

2. DA APLICABILIDADE DA MEDIDA CAUTELAR

A Constituição Federal de 1988 estabelece, em seu artigo 170, que a Ordem Econômica tem como fundamento a valorização do trabalho humano e orientada, dentre outros, pelos princípios da livre concorrência, da defesa do consumidor e da livre iniciativa. Por sua vez, o artigo 173, § 4.º, estatui que a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.

Promulgada sob esse arcabouço constitucional, a Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994, “dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, orientada pelos ditames constitucionais de liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico”, sendo a coletividade a titular dos bens protegidos pela Lei.

Para atingir esse escopo, a Lei nº 8.884/94 prevê o controle de atos de concentração e as hipóteses de infração à ordem econômica, legislando sobre o direito material, como também estabeleceu regras procedimentais próprias, legislando especialmente sobre o direito processual nesse âmbito.

Entretanto, visando claramente a suprir quaisquer lacunas eventualmente existentes na aplicação de seus preceitos processuais, o legislador teve o cuidado de fazer inserir na Lei nº 8.884/94 um dispositivo que prevê a aplicação subsidiária da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil), destinado especificamente a integrar as legislações processuais, de uma forma complementar. É o que dispõe o diploma antitruste, in verbis:

“Art. 83. Aplicam-se subsidiariamente aos processos administrativo e judicial previstos nesta lei as disposições do Código de Processo Civil e das Leis nº 7.347, de 24 de julho de 1985 e nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.”

Portanto, por força do dispositivo legal acima, na falta de disposição específica de cunho processual na Lei nº 8.884/94 para uma determinada situação, deve o intérprete buscar, nas normas processuais estatuídas pelo Código de Processo Civil, aquelas que incidam sobre a situação fática em exame.

Nesse passo, da interpretação das normas contidas nos artigos 14, inciso XI, 9.º, inciso IV, e 52, da Lei nº 8.884/94, observa-se que o legislador procurou dotar o órgão responsável pela instrução (SDE) e o órgão responsável pelo julgamento (CADE) dos processos administrativos em matéria concorrencial de amplo poder cautelar para prevenir, em qualquer fase do processo, a coletividade de práticas dos agentes econômicos nos mercados que possam vir a causar ou que já estejam causando efeitos perniciosos à ordem econômica.

Com base nesse fundamento, uma análise teleológica da Lei nº 8.884/94 autoriza concluir que a mens legis transparecida no diploma concorrencial é a de investir os órgãos de defesa da concorrência no poder de aplicar medidas eficazes, de caráter urgente e provisório, com a finalidade de prevenir cautelarmente quaisquer atos que estejam gerando ou possam vir a gerar efeitos lesivos à ordem econômica.

Entretanto, a possibilidade de adoção de medida preventiva, pelo Secretário de Direito Econômico e pelo Conselheiro do CADE, é prevista expressamente apenas em sede de processos administrativos, por meio do artigo 52 da Lei nº 8.884/94. A Lei, todavia, é omissa no que concerne à medida a ser adotada em caso de iminência de dano de difícil reparação identificado nos atos analisados sob a rubrica do artigo 54 da Lei nº 8.884/94.

Assim sendo, a não existência de uma previsão expressa, nos dispositivos que tratam de matéria processual na Lei nº 8.884/94, acerca da aplicação de medidas preventivas no curso da análise de atos previstos no art. 54 remete necessariamente o intérprete à aplicação subsidiária dos dispositivos do Código de Processo Civil que tratam do poder geral de cautela do julgador, quando verificados atos sob qualquer forma manifestados que possam estar ocasionando ou possam vir a ocasionar efeitos anticoncorrenciais capazes de causar prejuízos à coletividade, potencializados ainda pelo tempo demandado na análise do mérito da operação.

OVÍDIO A. BAPTISTA DA SILVA, com apoio em CALAMANDREI, leciona que o poder geral de cautela “corresponde ao conceito de medida cautelar como ‘polícia judiciária’ ou como o grupo de poderes que o juiz exerce para disciplinar a boa marcha do processo, preservando-lhe de todos os possíveis percalços que possam prejudicar a função e utilidade final de seu resultado.” (3)


Com efeito, dispõe referido Estatuto Processual, em seu Livro III, que trata do “Processo Cautelar”, in verbis:

“Art. 798. Além dos procedimentos cautelares específicos, que este Código regula no Capítulo II deste Livro, poderá o juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação.”

A aplicação do referido dispositivo ao processo administrativo concorrencial indica que o CADE, que detém poderes para aplicar medidas preventivas e provisórias no curso do processo administrativo, terá igualmente poderes para aplicar a medida cautelar no curso do trâmite do ato previsto no artigo 54 da Lei de regência. Ressalte-se que o fato de a Lei nº. 8.884/94 ter adotado o sistema de controle posterior não afasta o poder geral de cautela de autorizar a adoção de medidas excepcionais, quando presentes os requisitos legais. Tal argumento é corroborado, também, pelo art. 45, da Lei nº 9.784/99, que admite a adoção de medidas acautelatórias, pela Administração Pública, em caso de risco iminente.

Portanto, o Conselheiro-Relator do CADE tem competência para aplicar medida cautelar no curso do trâmite do ato apresentado nos termos do artigo 54, sempre que preenchidos os requisitos para a sua concessão, quais sejam, o fumus boni iuris e o periculum in mora.

2.1 Do “fumus boni iuris”:

Segundo Vicente Greco Filho, “o fumus boni iuris (fumo do bom direito) [sic] é a probabilidade ou possibilidade da existência do direito invocado pelo autor da ação cautelar e que justifica a sua proteção, ainda que em caráter hipotético. (…) Para a aferição dessa probabilidade não se examina o conflito de interesses em profundidade, mas em cognição superficial e sumária, em razão mesmo da provisoriedade da medida. O fumus boni iuris não é um prognóstico de resultado favorável no processo principal, nem uma antecipação do julgamento, mas simplesmente um juízo de probabilidade, perspectiva essa que basta para justificar o asseguramento do direito” (4).

Por fumus boni iuris, aplicável especificamente no âmbito antitruste, em sede de atos de que trata o artigo 54 da Lei nº 8.884/94, entende-se a aparência do bom direito ou o fundamento relevante que indique a necessidade de intervenção, in limine, dos órgãos antitruste, em razão de uma operação de concentração que possa vir a ocasionar prejuízos ao mercado e à coletividade.

Ou seja, da realização de uma operação de concentração econômica que, ao menos em análise superficial, possa criar, aos agentes econômicos nela envolvidos, plenas condições de exercício abusivo de posição dominante (5), causando ainda prejuízos ao bem estar do consumidor, exsurge o fumus boni iuris, consistente no direito da coletividade à intervenção dos órgãos antitruste, visando a proteger a sociedade de práticas no mercado que tenham potencial de causar limitação ou prejuízo à livre concorrência, ou resultem na dominação de mercado relevante de bens ou serviços.

Por outro lado, convém salientar que o requisito em comento exige apenas a aparência do bom direito, dispensando prova cabal dele, na lição de HUMBERTO THEODORO JR. (6)

“para a ação cautelar, não é preciso demonstrar-se cabalmente a existência do direito material em risco, mesmo porque esse, freqüentemente, é litigioso e só terá sua comprovação e declaração no processo principal.”

Desse modo, passa-se a seguir a analisar a presença do requisito do fumus boni iuris nas operações em pauta, ressaltando se tratar de uma análise preliminar, em conformidade com um dos requisitos da ação cautelar, como já dito acima.

A operação ora contestada pela Requerente envolve os mercados de telefonia fixa e móvel, mais especificamente o SMP na Região II e os serviços STFC, nas modalidades LDN e LDI, em todo o território nacional.

De acordo com o Plano Geral de Autorizações do Serviço Móvel Pessoal (“PGA-SMP”), o território brasileiro está dividido em três áreas distintas, que correspondem às mesmas áreas do PGO (8). O mercado geográfico relevante à presente análise, a respeito do SMP, é a Região II, na qual se observou sobreposição de outorgas da BrT-Cel e TIM. Na Região II há quatro grandes grupos econômicos atuantes neste mercado, são eles: Vivo, TIM, Claro e BrT-Cel (9).

O mercado geográfico de serviço STFC, nas modalidades LDN e LDI, corresponde a todo o território nacional, no qual se observou, também, sobreposição de outorgas entre BrT e TIM. Neste mercado, concorrem as seguintes empresas: BrT, Telemar, Telefônica, Embratel, Intelig, Global Village Telecom, bem como todas as prestadoras de SMP acima citadas: Vivo, TIM e Claro.

As normas de telecomunicações, a saber: o art. 68 da Lei nº 9.472/97, o art. 8º do Plano Geral de Autorizações e o art. 9º do Regulamento do SMP, vedam que um mesmo grupo preste o mesmo serviço em região coincidente, como forma de assegurar a concorrência. Assim, além de as operações em análise constituírem questão de cunho societário entre as empresas envolvidas, constituem também questão de cunho regulatório e, ainda, de cunho concorrencial. Contudo, a análise do SBDC deve levar em consideração somente a defesa da concorrência, do livre funcionamento do mercado e do bem estar do consumidor final.


Segundo a Requerente, a decisão proferida pela ANATEL, em 19/01/2004, não abordou a questão concorrencial da operação, pois o retorno da TII ao grupo de controle da BrT com limitação do seu poder deliberativo, mas com ilimitado acesso à informação e atribuição dos cargos de diretoria que lhe pertenciam anteriormente à sua saída, quando ainda não era sua competidora, causará a limitação ou, ao menos, o desvirtuamento das condições normais de concorrência.

Ainda, segundo a Requerente, caso a decisão do retorno da TII ao grupo de controle da BrT seja mantida, um dos três cenários abaixo seria efetivado, in verbis:

“a) A TII utilizará as informações estratégicas a que tem acesso para ganhar vantagens competitivas de forma diversa da eficiência de seus produtos e serviços, impedindo que a estratégia da BrT tenha êxito, causando um prejuízo não somente à BrT, mas também aos mercados relevantes em questão, pois causará, em médio prazo, a retirada da BrT de mercado, uma opção a menos de serviço ao consumidor e a diminuição da concorrência, que é sua meta confessa;

b) A TII, utilizando-se de seus cargos executivos fundamentais na diretoria, pode retardar ou prejudicar a implementação de projetos, para beneficiar-se na prestação dos serviços TIM, causando um prejuízo não somente à BrT, mas sim aos mercados relevantes em questão, pois causará, em médio prazo, a retirada da BrT de mercado, uma opção a menos de serviço ao consumidor e a diminuição da concorrência; e

c) A TII utilizará tanto as informações a que terá acesso como seus cargos de diretoria para ganhar vantagens competitivas de forma diversa da eficiência dos seus produtos e serviços e retardar ou prejudicar a implementação dos projetos da BrT, causando um prejuízo não somente à BrT, mas sim aos mercados relevantes em questão, pois causará, em médio prazo, a retirada da BrT de mercado, uma opção a menos de seriço ao consumidor e a diminuição da concorrência.”

Pelo exposto, observa-se que o receio da Requerente reside no fato de que o retorno da TII ao bloco de controle da BrT resultará no compartilhamento de informações e na posse de cargos executivos por um concorrente que está no comando do outro, que para ela somente poderá causar prejuízo para o mercado e para os consumidores.

A TII, por sua vez, alega que a Requerente não pode demonstrar o prejuízo à livre concorrência, e assim mostrar existir fumus bonis iuris, pois os serviços não ficarão mais caros, não haverá por parte da TII infração à ordem concorrencial, não haverá redução de oferta e não haverá restrição na prestação do serviço. A TII, alega, também, que os receios da Requerente não possuem fundamentos, tendo em vista que a ANATEL por meio de seu Ato nº 41.780, de 16/01/2004, publicado no D.O.U. em 19/01/2004, determinou o retorno da TII ao grupo de controle da BrT, e, ainda, impôs que a TII, direta ou indiretamente, ficasse impedida de participar, em todas as instâncias decisórias, das deliberações sobre matérias relacionadas às outorgas que envolvem os serviços de SMP e STFC, nas modalidades LDN e LDI.

Contudo, cabe destacar que a BrT é uma empresa atuante no mercado de STFC, nas modalidades LDN e LDI, em todo o território nacional, e entrante no mercado de SMP na Região II, mercados nos quais a TII já atua, por meio da TIM. Ou seja, a BrT e a TIM são, hoje, concorrentes. Tais mercados apresentam consideráveis barreiras à entrada, pois são mercados regulados e nos quais são necessários elevados investimentos em infraestrutura e tecnologia.

Assim sendo, verifica-se que a atual configuração, tanto do mercado de serviços SMP, quanto de STFC, nas modalidades LDN e LDI, têm a BrT e a TIM como concorrentes diretas. Considerando tratar-se de um mercado com elevadas barreiras à entrada, como mencionado acima, conjugado com o número de players, o nível de acesso a informações que a qualidade de acionista indireto da BrT conferiria à TIM, viabiliza a utilização de tais informações de modo a mitigar as relações de concorrência que se estabeleceriam entre elas. Assim, observa-se que o acesso a informações entre concorrentes pode tornar-se um instrumento de alteração do nível de concorrência nos mercados em tela, o que é prejudicial, como já exposto nesta exordial, tanto ao mercado, objeto de proteção da Lei nº. 8.884/94, como aos consumidores, o que evidencia a presença do requisito de fumus boni iuris.

Note-se, ademais, que a validade do argumento da TII de que à volta desta ao bloco de controle da BrT não implicaria serviços mais caros, infração à ordem concorrencial por parte da TII, redução de oferta e restrição na prestação do serviço, será objeto de análise e resultará na aprovação ou não do referido ato de concentração. Identifica-se, portanto, estar presente o requisito do fumus boni iuris, tendo em vista que o ingresso da TII no grupo de controle da BrT reduziria o número de concorrentes e que o acesso a informações privilegiadas da BrT poderia neste momento falsear a concorrência, ainda que a operação venha a ser reprovada no futuro.


Assim, demonstrado o fumus boni iuris, resta verificar a existência do requisito do periculum in mora.

2.2 Do “periculum in mora”:

Por periculum in mora, aplicável também no âmbito antitruste, entende-se o receio de dano irreparável ou de difícil reparação ao mercado, merecendo a suspensão in limine do fato que o provoca para preservar a função e a utilidade final do resultado do feito. No caso, tratando-se de direito difuso, o dano a ser verificado é o dano ao mercado e à própria coletividade.

A necessidade de adoção de medida cautelar, em atos de concentração, decorre, ainda, da possibilidade de alterações irreversíveis ou de difícil reversibilidade decorrentes da efetivação da operação, inclusive com efeitos em relação a terceiros. Tais alterações acabam por dificultar ou impossibilitar a intervenção dos órgãos de defesa da concorrência ao final da análise do processo, onerando, em muito, a não aprovação da operação ou a imposição de condições para a aprovação, com prejuízos inclusive aos terceiros afetados.

Nas palavras de HUMBERTO THEODORO JR., o periculum in mora pode ocorrer “quando haja o risco de perecimento, destruição, desvio, deterioração, ou de qualquer mutação das pessoas, bens ou provas necessários para a perfeita e eficaz atuação do provimento final do processo principal.” (10). Em se tratando de antitruste, especificamente do caso em análise, o receio de alteração das estruturas do mercado, bem como das condições ou das características do mercado, que possa se efetivar no decorrer da análise do ato pelo SBDC, fundamentam a adoção da cautelar.

Adicione-se a isso o tempo demandado para a análise dos feitos pelo SBDC, ainda mais quando se tratem de operações complexas, que envolvam mercado específicos, de difícil determinação.

OVÍDIO A. BAPTISTA DA SILVA (11), sobre o fator temporal do processo, assevera:

“Sucede, porém, que o tempo é um fator ineliminável em qualquer ordenamento jurídico real. Como antes dissemos, a idéia de processo não se concilia com a instantaneidade. As leis de processo poderão reduzir os inconvenientes que o tempo provoca, inevitavelmente, na vida dos direitos, procurando afeiçoá-las às exigências dos casos concretos, porém jamais poderão suprimir inteiramente o fator temporal.” (g.n.)

Na mesma linha, a esclarecedora lição do Prof. CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO :

“O tempo é inimigo do processo e o seu decurso destempera a boa qualidade do provimento jurisdicional, quando a demora deste traz prejuízos, sofrimentos, ansiedades e quando o provimento tardo acaba por se tornar dispensável ou, quiçá, inútil. Por isso é que o Direito Processual em sua disciplina positiva e na interpretação correta que se espera dos tribunais e demais destinatários, há de ser um sistema equilibrado entre dois ideais: de um lado o zelo pela perfeição e boa qualidade dos resultados do processo; de outro, a preocupação pela celeridade. Não importa que, em nome desta, algum risco se corra de imperfeição na prestação jurisdicional, desde que o sistema ofereça, em compensação, meios idôneos para a correção de eventuais erros. As normas processuais hão de equilibrar adequadamente a exigência de certeza com o risco de errar, contentando-se às vezes, com a mera probabilidade da ocorrência de certos fatos ou da existência de um direito, para que se possa sempre extrair do processo o melhor resultado útil possível; é assim que o bom instrumento deve servir aos fins a que se destina. Portanto, é necessário que se evitem delongas que favoreçam o perdurar do estado de violação de direitos protegidos, sendo a celeridade do processo cautelar co-essencial à própria garantia, como contrapeso da agilidade que o princípio da auto-executoriedade confere à atividade administrativa”. (g.n.)

Da análise preliminar da estrutura dos mercados, denota-se, como já explicitado, que as condições apresentadas para a operação em questão poderão ter sérios impactos sobre a dinâmica concorrencial nestes mercados e, de forma mediata, sobre o bem-estar do consumidor, particularmente no momento em que um novo concorrente está prestes a entrar no mercado. Assim, resta claro que o retorno da TII ao grupo de controle da BrT, sua concorrente, poderá ferir a estrutura concorrencial já existente, na medida em que uma concorrente passa a gerir outra, compartilhar informações confidenciais e, ainda, participar dos órgãos de gerência e administração da companhia.

É preciso esclarecer que o que se apresenta com a volta da TII ao grupo de controle da BrT é a possibilidade de a primeira passar a interferir nas decisões da segunda, inclusive decisões de mercado. Além disso, implicaria a possibilidade de acessar e, por conseqüência, utilizar-se de informações estratégicas, relativas à prestação de serviços nos mercados de SMP e STFC, nas modalidades LDN e LDI, em benefício próprio.


Não obstante, ainda que a ingerência administrativa esteja impedida em virtude da decisão da ANATEL, o uso de informações privativas da empresa, no caso a BrT, uma vez acessadas, podem ser utilizadas para mitigar a concorrência, como se observou. Destaca-se que o acesso a tais informações, hoje, constitui, desde logo, condição suficiente para potencial alteração do comportamento concorrencial entre as empresas, na hipótese de se decidir que a TII não poderá voltar ao grupo de controle da BrT.

Nesse contexto, a efetivação da operação poderá ocasionar alterações irreversíveis ou de difícil reparação no processo concorrencial nestes mercados, que poderão tornar a decisão do presente feito completamente inócua, pois jamais terá o condão de restabelecer a situação anterior (status quo ante).

Desse modo, entende-se que a medida cautelar se faz necessária para evitar os ditos danos irreparáveis ou de difícil reparação ao mercado, trazidos pela união de esforços entre a Requerente, passíveis de ocorrer pelo tempo demandado para a análise do feito pelo SBDC.

Destarte, verifica-se o preenchimento in totum do requisito do periculum in mora.

3. Conclusão:

Diante do exposto supra, verifica-se a possibilidade de tal operação ocasionar alterações irreversíveis na dinâmica concorrencial neste mercado, motivo pelo qual se impõe uma ação enérgica e de caráter preventivo por parte do SBDC, com vistas a evitar a ocorrência de danos irreparáveis à coletividade.

Assim, uma vez verificado o preenchimento dos requisitos legais do fumus boni juris e periculum in mora no caso sub examine, esta Secretaria manifesta-se no sentido de recomendar ao CADE, nos termos do artigo 83, da Lei nº 8.884/94, art. 798, do CPC, e art. 45, da Lei nº 9.784/99, a concessão da MEDIDA CAUTELAR.

Sugere-se que, além das restrições já impostas pela ANATEL em seu Ato nº 41.780, citado anteriormente, determine-se à TII, ou a qualquer outra empresa do Grupo Telecom Itália, que se abstenha de:

Executar as previsões das Cláusulas 4.2 e 4.3 do Acordo de Acionistas, mencionadas na Cláusula 3.1 do Aditivo ao Acordo de Acionistas, especificamente, eleger ou substituir membros do Conselho de Administração; participar, juntamente com a TECHOLD, da escolha e/ou destituição de 02 (dois) membros do Conselho de Administração; eleger o Presidente do Conselho de Administração;

Executar as previsões das Cláusulas 4.4 e 4.5 do Acordo de Acionistas, mencionadas na Cláusula 3.1 do Aditivo ao Acordo de Acionistas, especificamente, eleger ou substituir diretores, sob qualquer denominação; indicar, ao Conselho de Administração, pessoas para ocupar qualquer cargo de diretoria; participar, juntamente com a TECHOLD, da escolha e/ou destituição de 02 (dois) membros do Conselho de Administração; eleger o Presidente do Conselho de Administração;

participar de deliberação, negociação, discussão e reunião, a qualquer pretexto, que trate do desenvolvimento dos negócios da BrT, com relação às outorgas de serviços SMP e STFC nas modalidades LDN e LDI;

participar de deliberação, negociação, discussão e reunião acerca de alteração ao Acordo de Acionistas;

participar de Reuniões de Acionistas ou reuniões do Conselho de Administração, bem como das reuniões prévias às estas, conforme mencionado na Cláusula 4.7 do Acordo de Acionistas, mencionadas na Cláusula 3.1 do Aditivo ao Acordo de Acionistas, da SOLPART, ou qualquer uma de suas subsidiárias/afiliadas; e

requerer, na qualidade de acionista, documentos, papéis e informações de qualquer natureza, que tratem do desenvolvimento dos negócios da BrT, com relação às outorgas de serviços SMP e STFC nas modalidades LDN e LDI;

Importante ressalvar, uma vez mais, que a presente manifestação não vinculará esta SDE, quando da análise do mérito da referida operação.

Brasília, 05 de março de 2004.

LUÍS CLÁUDIO L. PINHEIRO

Assessor Técnico

MARIANA TAVARES DE ARAUJO

Coordenadora-Geral

BARBARA ROSENBERG

Diretora do DPDE

De acordo. Encaminhe-se ao CADE para ciência.

Brasília, 05 de março de 2004.

DANIEL KREPEL GOLDBERG

Secretário de Direito Econômico

Notas de rodapé:

1- A ANIMEC neste ato representa os mais de 2 milhões de acionistas minoritários da BrT.

2 – A SOLPART é controladora da BrT.

3 – BAPTISTA DA SILVA, Ovídio A.,“Do Processo Cautelar”,2.ª ed., Rio de Janeiro:Editora Forense, 1999, p. 99.

4 – GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2000. v. 3. p. 154. O exposto pelo doutrinador, apesar de referente ao art. 798 do CPC, pode ser aplicado ao quanto previsto no art. 52 da Lei 8.884/94. É certo que, no direito antitruste, a medida em comento não se presta a proteger direitos de cunho eminentemente privatistas, mas sim a coletividade e o bom funcionamento do mercado.

5 – Na lição de Paula A. Forgioni, “a posição dominante é decorrência e, ao mesmo tempo, se identifica com o poder detido, pelo agente, no mercado, que lhe assegura a possibilidade de atuar um comportamento independente e indiferente em relação a outros agentes, impermeável às leis de mercado.” FORGIONI, Paula A., “Os Fundamentos do Antitruste”, 1ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 272.

6 – THEODORO Jr., Humberto, “Curso de Direito Processual Civil”, 26ª ed., Rio de Janeiro: Editora Forense, 1999, p. 371.

7 – A Região I corresponde aos seguintes Estados: Amazonas, Roraima, Amapá, Pará, Maranhão, Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Paraíba, Alagoas, Bahia, Sergipe, Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro. A Região II abrange os Estados de Rondônia, Acre, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiânia, Tocantins, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Distrito Federal. A Região III corresponde exclusivamente o Estado de São Paulo.

8 – Segundo a Requerente, a BrT-Cel, subsidiária integral da BrT, adquiriu as licenças de SMP e está pronta para iniciar a operação.

9 – Ob. cit., p. 372.

10 – Ob. cit., p. 71.

11 – in RT 543, janeiro de 1981, pg. 26 e ss.

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