Dívidas no ar

United Airlines não deve pagar débitos da Pan Am no Brasil

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1 de março de 2004, 14h59

A United Airlines não é responsável pela quitação dos débitos trabalhistas contraídos pela falida Pan American World Airways Inc. (Pan Am) no Brasil. A decisão foi tomada, por maioria de votos, pela Subseção de Dissídios Individuais 2 do Tribunal Superior do Trabalho.

O TST concedeu um recurso ordinário à empresa aérea norte-americana, isentando-a de um passivo trabalhista estimado em, no mínimo, meio milhão de reais. O entendimento foi firmado com base no voto da relatora do processo, ministra Maria Cristina Peduzzi.

O julgamento cancela decisão do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, que deferiu ação rescisória proposta por 18 ex-empregados da Pan Am. Em sua decisão, o TRT entendeu que a United Airlines deveria ser considerada como a substituta processual da Pan Am em relação às parcelas de natureza trabalhista não saldadas pela empresa falida.

A substituição foi determinada diante da constatação de que os bens remanescentes da Pan Am no Brasil não eram suficientes para cobrir o valor do passivo trabalhista.

No TST, os ministros consideraram que a substituição processual determinada pelo TRT – diante do fato da United ter arrematado em leilão, nos EUA, as rotas utilizadas pela Pan Am na América Latina, incluindo o Brasil – não possuía respaldo jurídico.

“A sucessão trabalhista pressupõe dois requisitos: a transferência total ou parcial do fundo de comércio ao sucessor e a continuidade da prestação de serviços dos antigos empregados à nova empresa”, afirmou Cristina Peduzzi. “No caso, nenhum dos requisitos citados está presente”, acrescentou a relatora.

O caso teve origem em 4 de dezembro de 1991, quando os aeroviários brasileiros ligados à Pan Am foram dispensados devido à declaração de falência emitida pela matriz da empresa, nos Estados Unidos.

Como não receberam salários e demais débitos, os demitidos entraram com reclamações trabalhistas na Justiça. Entre elas, uma que correu na 5ª Vara do Trabalho de Guarulhos (SP), reconheceu seu direito aos saldos salariais do mês de dezembro, verbas rescisórias, como o levantamento dos depósitos do FGTS e a multa indenizatória de 40%, além dos valores correspondentes a férias vencidas, horas extras e outros.

Paralelamente ao trâmite das ações trabalhistas, em 1º de julho de 1992, o titular da 5ª Vara de Falências e Concordatas da Comarca do Rio de Janeiro decretou a falência da Pan Am no Brasil. De três imóveis localizados pelo juízo da falência, chegou-se, em agosto de 1994, a um total de R$ 450 mil para a composição da massa falida e, assim, cobrir todos os débitos da empresa, inclusive os trabalhistas.

“Valor esse que mal dará para pagar os encargos do processo de falência, sendo certo que além dos créditos dos ora autores (18 aeroviários), há outros créditos trabalhistas ainda não quitados, como é o caso do processo da 4ª Vara do Trabalho de Guarulhos, com oito autores e do processo da 31ª Vara do Trabalho de São Paulo, com 60 autores”, sustentaram os advogados dos profissionais demitidos.

A insuficiência de recursos, de acordo com os advogados, também foi motivada pelo retorno imediato, ao território norte-americano, das aeronaves da Pan Am que estavam no Brasil, após a declaração de falência nos EUA.

Diante da inexistência de fundos para cobrir os débitos, os autores da ação em curso na 5ª Vara do Trabalho de Guarulhos, já na fase de execução de seus direitos, solicitaram a inclusão da United no processo, na condição de substituta da Pan Am.

Para tanto, argumentaram que as rotas da empresa falida para a América Latina foram leiloadas pela justiça norte-americana e arrematadas, por US$ 135 milhões, pela United. A aquisição teria, então, resultado no dever da empresa estrangeira em responder pelo passivo da Pan Am, com base no artigo 211 do Código Brasileiro de Aeronáutica (efeitos da substituição aeronáutica).

A United ingressou com um recurso ordinário no TST, a fim de que fosse reconhecida a inviabilidade da substituição. Os argumentos apontados pela empresa levaram ao deferimento de seu recurso.

Após demonstrar a inexistência dos elementos que caracterizam a sucessão trabalhista, Cristina Peduzzi frisou que “a aquisição do direito de explorar as rotas não se deu por força de negócio jurídico de cessão entre a United e a Pan Am, mas decorreu de arrematação feita em expropriação de bens da massa falida no Poder Judiciário americano”.

Outro ponto destacado correspondeu a inexistência de prestação de serviço dos aeroviários demitidos à United. “Tal circunstância não é objeto de controvérsia, pois os próprios autores explicam que requereram a condição de sucessora da United tão-somente porque não conseguiram encontrar bens penhoráveis da Pan Am, sem afirmar que tenham trabalhado, por um só dia, para a empresa aérea (United)”.

“Se sucessão houver em tal caso, então esta também ocorrerá toda vez que uma empresa quebrar e seus imóveis forem à praça pública e adquiridos por uma terceira pessoa, o que configura absurdo”, argumentou a ministra do TST.

Cristina Peduzzi analisou, ainda, o artigo 211 do Código Brasileiro de Aeronáutica e demonstrou que o dispositivo refere-se a situação em que a empresa substituída, por ato espontâneo, designa uma substituta, que aceita assumir os encargos trabalhistas e as demais dívidas em troca da exploração das rotas aéreas.

“No caso, porém, não há a designação da substituta. A Pan Am quebrou. Não requereu à autoridade brasileira sua substituição. Houve, isto sim, concessão direta do serviço público por ato administrativo normativo do governo brasileiro – decreto – após a aquisição do direito de voar as linhas aéreas”, concluiu a relatora. (TST)

ROAR 667.949/00

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