Cláusulas leoninas

Os abusos cometidos contra o consumidor no mercado imobiliário

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1 de março de 2004, 13h07

Uma prática que infelizmente tem sido muito comum no mercado imobiliário brasileiro é a imposição, por parte das incorporadoras e construtoras, das chamadas cláusulas abusivas ou leoninas nos contratos de compra e venda da casa própria. Ou seja, os consumidores, em posição técnica e financeira inegavelmente inferior à dessas empresas, são obrigados a se submeter a disposições contratuais que os colocam em grande desvantagem no negócio.

Nem é preciso dizer que se trata de um grave problema social, uma vez que a aquisição da casa própria constitui o sonho da grande maioria das famílias brasileiras.

Além disso, os prejuízos financeiros decorrentes dessa prática são enormes, principalmente nos dias atuais, em que o país atravessa uma longa recessão, com índices de desemprego atingindo patamares cada vez mais elevados.

O quadro que tem se revelado muito freqüente nesse mercado é o seguinte. Depois de serem seduzidos pelos irresistíveis apelos de marketing utilizados pelas incorporadoras e construtoras, os consumidores se deparam com uma dura realidade: não conseguem arcar com as prestações do financiamento direto e se vêem obrigados a buscar a rescisão de seus contratos.

Isso ocorre, na maioria dos casos, porque os consumidores nem sequer tinham condições financeiras de assumirem tal compromisso, mas, apesar disso, tiveram os seus créditos aprovados, sem quaisquer dificuldades ou formalidades, pelas incorporadoras e construtoras que, na realidade, acabam se beneficiando com as rescisões contratuais.

É que somente depois de se depararem com o problema é que os consumidores vão ler com a necessária atenção os seus extensos contratos, que foram previamente impressos, de forma unilateral e com letras minúsculas, pelas próprias incorporadoras e construtoras, quando então se deparam com cláusulas que, na prática, prevêem, em caso de rescisão por culpa dos promissários compradores, a perda de praticamente todas as parcelas que, com muito suor e sacrifício, até então conseguiram quitar.

Ressalte-se que, além de receberam a abusiva multa, que tem variado de 60% a 100% das prestações pagas, as promitentes vendedoras ainda podem renegociar o imóvel objeto do contrato rescindido, num círculo extremamente vicioso, cruel e cada vez mais freqüente.

O pior é que, em muitos casos, existe uma previsão contratual para que o saldo apurado após a retenção da leonina multa seja restituído aos promissários compradores em tantas parcelas e na mesma periodicidade daquelas que já foram pagas. Ou seja, além de receberem uma ninharia, os consumidores terão de aguardar um longo período para que o referido saldo lhes seja integralmente restituído.

Como não bastasse, nesses casos em que a rescisão contratual dá-se em razão da inadimplência dos promissários compradores, as incorporadoras e construtoras têm procurado fazer justiça com as próprias mãos, impingindo aos consumidores a submissão irrestrita a essas iníquas disposições contratuais, sob pena não haver, por tempo indeterminado, a liberação dos vínculos contratuais.

Ocorre que todas essas práticas que lamentavelmente têm sido adotadas por grande parte das empresas que exploram esse importantíssimo ramo de atividade econômica vão de encontro a diversos dispositivos da Lei nº 8.078/90, mais conhecida como Código de Defesa do Consumidor.

Além disso, os nossos pretórios, especialmente o Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que é aquele que acaba dando o veredicto final em ações que versam sobre o tema, têm rechaçado veementemente essas malfadadas práticas, reduzindo a multa pela rescisão culposa do contrato para 10% de retenção sobre as parcelas que até então foram pagas pelos compradores inadimplentes.

Portanto, os consumidores que se encontrarem nessa situação – e não são poucos – podem e devem movimentar o Poder Judiciário, a fim de que essas cláusulas abusivas sejam judicialmente modificadas, e as incorporadoras e construtoras condenadas a lhes restituir, de uma só vez, o saldo equivalente a, no mais das vezes, 90% das prestações até então quitadas, prestações essas que deverão ser monetariamente corrigidas, a partir de cada desembolso.

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