Brasil vulnerável
Um dia depois da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central de manter a taxa básica de juros em 16% ao ano, o mercado reagiu com venda de ações de empresas na Bovespa, alta do dólar, dos juros futuros e da taxa de risco do país e com a desvalorização dos títulos brasileiros no exterior.
Wall Street
Para grandes bancos de Wall Street, a decisão reforçou a percepção de investidores de que o Brasil está desprotegido no atual cenário de turbulência. A reação, de certo modo, ocorreria se o Copom tivesse, ao contrário do que fez, reduzido a Selic. Como o mercado estava dividido nas suas apostas, era previsível que haveria insatisfeitos.
Complicador
A novidade foi a intensidade da reação, que acabou maior por causa do resultado das contas externas do Brasil, que mostrou forte queda do investimento estrangeiro em abril (veja abaixo).
Números da crise
O dólar fechou ontem em alta de 2,55%, cotado a R$ 3,214. A Bovespa, em queda de 2,4%. Os contratos de juros com vencimento em janeiro, que são os mais negociados, projetaram taxa de 17,8% ao ano, alta expressiva em relação ao fechamento de quarta, quando estava em 17,04%. E o risco do país aumentou 6,32%, para 756 pontos básicos.
Palavras duras
Uma mostra do que ocorreu em Wall Street é o depoimento da diretora-adjunta de Economia Internacional do banco Bear Stearns, Emy Shayo. Segundo ela, ao manter os juros em 16%, “o Banco Central, em vez de guiar o mercado, está seguindo o mercado”.
Mais palavras
Para o economista-chefe para América Latina do fundo Alliance Capital Management, James Barrineau, manter a taxa-Selic foi um “erro evidente” do Copom, que teria, com isso, sancionado a idéia de que o Brasil não é capaz de conduzir política monetária num cenário de volatilidade, mesmo que os números da inflação venham comportados.
E agora?
Outros bancos relatam a piora das expectativas quanto ao crescimento e a possibilidade de o BC só encontrar espaço para uma redução dos juros em dois ou três meses. Se encontrar.
Versão light
O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, procurou fazer uma avaliação serena do cenário. Ele disse acreditar que a turbulência nos mercados é passageira. “É um processo de ajuste”, resumiu, não algo que possa fugir do controle.
Perigo?
Os investimentos estrangeiros diretos somaram US$ 381 milhões em abril, bem abaixo das previsões do governo, de entrada de US$ 500 milhões, e do resultado do mesmo período de 2003, quando ingressaram US$ 796 milhões. O dado consta de relatório divulgado ontem pelo Banco Central. O desempenho é o pior desde outubro do ano passado, quando os ingressos totalizaram US$ 314 milhões.
Perigo!
A Região Metropolitana de São Paulo criou 124 mil empregos em abril. Mesmo assim, a taxa de desemprego registrou leve alta, de 20,6% da população economicamente ativa (PEA) em março, para 20,07% no mês passado. Esse quadro é decorrente da entrada de 168 mil pessoas no mercado de trabalho. A taxa de desemprego, assim, bateu novo recorde. O número de desempregados na região já é de 2,044 milhões. Os dados são da pesquisa do convênio Dieese-Seade.
Assim falou… João Paulo Cunha
“A vida na Câmara continua, e as nossas também. Eu queria só comunicar isso a todos vocês de uma forma singela.”
Do presidente da Câmara (PT-SP), ao anunciar que não tentaria colocar em votação, novamente, a emenda que permitiria sua recondução ao cargo em fevereiro do ano que vem. O texto foi rejeitado em sessão na quarta-feira.
O asno de Buridan
Já ouviram falar do asno de Buridan? Simboliza, a um só tempo, a indecisão e o dilema. Está prestes a morrer de fome entre a água e a alfafa. A opção por qualquer um dos dois é trágica: come uma e morre de sede, bebe a outra e morre de fome. Foi mais ou menos o que se deu com o Planalto, na quarta-feira, durante a votação da emenda que permitiria a reeleição dos presidentes da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), e do Senado, José Sarney (PMDB-AP).
A emenda foi rejeitada. Ganham com a decisão os senadores Renan Calheiros (PMDB-AL) e Aloizio Mercadante (PT-SP), o ministro Antonio Palocci, o PMDB e o PFL. Perdem, é claro, Sarney e João Paulo, mas também o governo Lula, que conseguiu criar uma crise sem nenhuma ajuda da oposição. O governo perdeu o controle sobre sua base e talvez tenha de enfrentar a revanche de pessoas que foram chave nos seus primeiros 500 dias.
* A coluna é produzida pelo site Primeira Leitura – www.conjur.com.br