Saída alternativa

Aplicação de penas alternativas pode amenizar lotação carcerária

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6 de maio de 2004, 15h13

O Brasil tem hoje em torno de 300 mil detentos. Estudos indicam que pelo menos 20% deles — cerca de 60 mil pessoas — poderiam cumprir sua pena por meio de prestação de serviço à comunidade, por exemplo, como trabalhar em um hospital ou dar assistência em uma creche. É a aplicação das penas restritivas de direito — conhecidas como penas alternativas.

Hoje, as penas alternativas são cumpridas por apenas cerca de 30 mil pessoas no Brasil. Ou seja, aplicação em apenas 10% dos casos. No Reino Unido, a aplicação de penas alternativas chega a 80% das condenações no país. As possibilidades de recuperação de quem cometeu um delito considerado leve, segundo especialistas, são comprovadamente muito maiores quando o condenado não cumpre sua pena em regime fechado. Além disso, as chances de a pessoa reincidir são menores.

O tema foi discutido em seminário que termina nesta quinta-feira (6/4), promovido pelo Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional de Justiça. O evento aconteceu na Academia Nacional de Polícia.

Operadores de Direito do Brasil e de outros países relataram dados e experiências com aplicação das medidas. O trabalho fez parte do esforço do Ministério da Justiça em ampliar a aplicação das medidas restritivas de direitos — que fariam com que a superlotação dos presídios fosse amenizada, e, apontam dados, evitariam a reincidência criminal. (MJ)

Leia trechos do discurso que do ministro Márcio Thomaz Bastos

“(…) a aplicação das penas alternativas é melhor do que a aplicação da pena de prisão. Melhor para a sociedade, uma vez que, à uma conduta desviante, responde o Estado com uma imposição capaz de reintegrar o praticante de um pequeno desvio aos valores da boa conduta e, não raro, reconduzi-lo à divisão social do trabalho. Melhor para o perpetrador do delito, que não se verá forçado a entrar no sistema penitenciário e correr o risco de com sua entrada ver-se credenciado a entrar também, pelo convívio, na irracionalidade dos valores criminosos. Melhor para o Estado, posto que o dinheiro poupado com a internação poderá ser melhor empregado e em maior número em penas alternativas, reduzindo assim a população carcerária e os malefícios da superlotação. O custo de aplicação de uma pena privativa de liberdade custa em média R$ 680 por mês aos cofres públicos, ao passo que a aplicação de uma pena alternativa custa em média apenas R$ 70 por mês”.

“(…) precisamos agir em algumas frentes, todas elas em parceria com o Poder Judiciário. Citarei três das que considero mais importantes.

A primeira dela é a ampliação do número de decisões judiciais que determinem ao condenado o cumprimento de sua pena fora do estabelecimento prisional. Hoje no Brasil menos de dez por cento das sentenças criminais impõem ao condenado o cumprimento de penas alternativas ao cárcere. De acordo com as 37 centrais de apoio e acompanhamento às Medidas Alternativas que mantém convênio com o Ministério da Justiça, pouco mais de 35 mil pessoas são beneficiadas por penas alternativas.

Para modificar isso, o Ministério da Justiça está empenhado em ampliar o papel da Comissão Nacional de Penas Alternativas para, além da discussão doutrinária, trabalhar pelo fomento das penas junto aos juízes e promotores.

É pelo convencimento dos pares, pelos resultados fáticos positivos obtidos por essa via que contamos disseminar a aplicação e ampliar esse percentual. Além disso, exortamos os tribunais estaduais a criarem em todas as unidades da federação Varas de Execução especializadas em penas alternativas. Hoje existem apenas cinco no país (Fortaleza, Recife, Porto Alegre, Salvador e Belém). Esperamos que em pouco tempo, ao menos nas capitais, tenhamos uma vara especializada que possa acompanhar com atenção o cumprimento da pena.

A segunda frente diz respeito à luta conjunta do Executivo e do Judiciário pela interiorização da aplicação das penas alternativas à prisão. Aqueles que praticam pequenos crimes nas cidades do interior vêem-se costumeiramente privados desta possibilidade”.

“(…) A terceira frente de fomento visa instigar a doutrina e a jurisprudência a alargarem suas interpretações quanto à possibilidade de cumprimento das penas alternativas. É de suma relevância nos opormos à idéia de que somente o encarceramento molesta aquele que cometeu um crime. A pena alternativa à prisão não significa impunidade, ao contrário disso. É uma espécie de punição mais bem elaborada, fruto de uma análise capaz de correlacionar de forma ainda mais subjetiva o perfil do sentenciado e o crime que cometeu”.

“(…) Poderíamos cogitar a hipótese de, no caso de descumprimento da pena alternativa, revertê-la para outra mais grave, mas também alternativa ao cárcere. A prisão deve sempre ser a última possibilidade de punição, aquela que impõe temor no horizonte do apenado, não a solução mais fácil”.

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