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Primeira Leitura: Genoino reavalia defesa do PT de mínimo de US$ 100

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4 de maio de 2004, 12h23

Silêncio calculado

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva quebrou o silêncio que, calculadamente, manteve durante quatro dias sobre o reajuste de R$ 20 do salário mínimo, para R$ 260. Lula foi aconselhado a não se pronunciar sobre o assunto — que desgasta o governo desde quinta-feira — até depois do 1º de Maio, o Dia do Trabalho.

Morre uma promessa

No programa de rádio quinzenal Café com o Presidente, Lula reconheceu que o reajuste do benefício é “pequeno” e usou o déficit da Previdência para justificar a decisão. Segundo o presidente, conceder um reajuste maior seria “total irresponsabilidade”.

Nasce outra promessa

Mesmo, na prática, sepultando a promessa de campanha de dobrar o salário mínimo em quatro anos — já não há mais tempo para isso — Lula fez outra promessa, só que imune a cobranças. Agora, o que ele anuncia é a intenção de “dar um jeito” de melhorar o mínimo, seja lá o que isso signifique.

Mais mea-culpa

Andam ficando cansativos os exercícios de mea-culpa do presidente do PT, José Genoino. Ontem, ele afirmou que o reajuste, para R$ 260, foi o “possível em razão da realidade econômica e financeira do país”. Diante das cobranças em relação à defesa intransigente que o PT fazia, quando era oposição, de um mínimo de US$ 100, Genoino não se constrangeu em dizer que o partido que preside deveria ter agido “com mais consistência” antes.

Tradução

Levada ao extremo, a desculpa de que o PT deveria, na oposição, ter agido “com mais consistência” pode ser usada para justificar qualquer mudança de posição em relação às propostas que levaram à vitória de Lula.

Congresso

Nenhum dos dois negou, no entanto, o desgaste que a medida impinge ao governo. Os aliados e a oposição sabem disso e vão pressionar por mudanças. Hoje, a bancada do PT na Câmara discute formas de propor um valor maior.

Blindagem

Para blindar o governo das pressões no Congresso, Lula convocou para quinta-feira uma reunião do Conselho Político, uma instância que reúne os presidentes dos partidos aliados e que não funciona desde a campanha.

Mudar sem mudar

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, saiu-se com uma frase de efeito para defender o crescimento da economia e, ao mesmo tempo, garantir que nada muda num dia em que o mercado deu novos sinais de estresse. “É claro que queremos, que temos o dever de crescer. Mas não há atalho. É preciso perseverar na direção correta”, disse. Enquanto isso, no mercado financeiro, havia nova rodada de desvalorização de Brasil: o risco do país se aproximou dos 700 pontos, o dólar quase encostou em R$ 3.

Assim falou… Luiz Inácio Lula da Silva

“É por isso que nós não podemos dar um salário mínimo que eu, particularmente, gostaria de dar e, tenho certeza, que o ministro Palocci gostaria de dar, que o ministro Dirceu… Dar um aumento que pudesse chegar a R$ 300. Agora, fazer isso sabendo que não tem dinheiro seria total irresponsabilidade nossa.” Do presidente da República.

O semeador de Garotinhos

O ministro José Dirceu esteve em São Paulo para um encontro que reuniu personalidades na casa do jornalista e escritor Fernando Morais, aquele que escreveu alguns best sellers, entre eles, A Ilha. Em 1976, durante a ditadura brasileira, Morais transformou um campo de concentração, Cuba, comandada por um tirano que manda jornalistas e escritores para a cadeia, num paraíso de resistência ideológica e acabou abrindo caminho para a fama.

Afrontava a nossa ditadura, que ensaiava os primeiros passos da abertura, fazendo a apologia de outra, que vivia o auge do seu vigor. Em tempo: se alguém ficou chateado com o que leu até aqui, o teste é simples: a ditadura que todos combatíamos à época permitia a publicação de livros como A Ilha.

Até hoje, a ilha de Fidel só permite a publicação de livros que não combatam a ditadura. Mas curiosa, mesmo, foi a avaliação que Dirceu fez sobre o futuro do Brasil. Ele disse que é mais fácil alguém como Garotinho suceder a Lula do que alguém do PSDB vir a ganhar a Presidência da República em 2006. Terão os presentes rido de satisfação, medo, sarcasmo? Seria, então, Lula um semeador de Garotinhos?

* A coluna é produzida pelo site Primeira Leitura – www.primeiraleitura.com.br

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