Feitiço e feiticeiro

Empresa que coagiu empregados terá de devolver 40% do FGTS

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23 de junho de 2004, 10h18

A Seção Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a legitimidade do Ministério Público do Trabalho para ajuizar ação civil pública a fim de obrigar uma empresa a devolver a multa de 40% sobre o FGTS a todos os empregados que foram coagidos a abrir mão da quantia como condição de admissão em outra empresa, que a sucedeu na prestação de serviços ao tomador. A decisão foi tomada por maioria de votos.

O caso ocorreu em Natal (RN) e envolve a empresa Servis – Segurança Ltda., que atua na terceirização de serviços de vigilância. É notória a rotatividade nesse ramo de prestação de serviço: empresas surgem e se desfazem de acordo com o resultado das licitações promovidas pelas empresas tomadoras. Em muitos casos, os empregados vêem-se sem emprego e sem direitos trabalhistas ao final de cada contrato não renovado.

Segundo o site do TST, a Servis pagou as verbas rescisórias aos seus empregados após perder uma licitação pública, mas em troca da garantia de contratação pela empresa vencedora da licitação coagiu os empregados a lhe devolver a multa de 40% sobre o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), devida em função da demissão sem justa causa. A coação foi possível pois é comum o aproveitamento de pessoal pela empresa vencedora da concorrência.

A empresa terá de restituir os valores aos ex-empregados com os acréscimos legais e foi proibida de praticar qualquer tipo de coação por ocasião da demissão de seus empregados, sob pena de cominação de multa no valor de R$ 5 mil, corrigida monetariamente, por cada obrigação descumprida e com relação a cada trabalhador lesado. A multa será revertida ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

A relatora original do recurso foi a ministra Maria Cristina Peduzzi, que votou pela ilegitimidade do Ministério Público do Trabalho para propor ação em defesa de direitos individuais. Segundo ela, não se trata de interesse difuso ou coletivo, pois é possível determinar os respectivos titulares (os empregados da Servis), que poderiam propor reclamação trabalhista para evitar que os descontos fossem realizados.

A tese, entretanto, não vingou. Ao abrir a divergência, o ministro Lélio Bentes Corrêa votou pela legitimidade do Ministério Público, liderando a corrente vencedora. O ministro, que é egresso do MPT, fez uma longa análise das funções do órgão.

Ele explicou que a ação civil pública tem por finalidade proteger os direitos e interesses metaindividuais — difusos, coletivos e individuais homogêneos — de ameaças e lesões. Em seguida, detalhou cada um deles para concluir que o que determina sua classificação é a pretensão e a causa de pedir, podendo um mesmo fato dar ensejo aos três tipos de interesse, conforme o pedido formulado em juízo.

Lélio Bentes ressaltou que, no caso em questão, foram feitos três pedidos na ação civil pública: a imposição de “obrigação de fazer”, consistente em restituir a multa de 40% sobre o FGTS; a imposição de “obrigação de não fazer”, consistente em fazer com que a Servis abstenha-se de praticar quaisquer formas de coação, e a cominação de multa no equivalente a R$ 5 mil por cada obrigação descumprida.

“No tocante à obrigação de não fazer, consistente em se abster da prática de qualquer forma de coação, não resta dúvida de que se trata de direito coletivo, já que a pretensão é cominatória e relativa ao futuro, interessando não somente aos que já foram demitidos e coagidos a devolver a multa de 40% do FGTS, mas a todo aquele que trabalha ou vier a trabalhar na Servis e que estará potencialmente sujeito a ser vítima da conduta empresarial”, registrou.

Quanto ao pedido do MPT para que a multa seja devolvida aos trabalhadores, o ministro Lélio Bentes afirmou que ele envolve direitos individuais homogêneos.

“Isso porque o direito individual homogêneo nada mais é do que direito coletivo em sentido lato, uma vez que todas as forma de direitos metaindividuais passíveis de tutela mediante ação civil pública são coletivos, na medida em que envolvem grupos”, frisou o ministro.

E-RR 379.855/1997.1

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