Cena brasileira

Ministro do STJ não deverá responder ação penal por assédio sexual

Autor

16 de junho de 2004, 18h02

O ministro do Superior Tribunal de Justiça Paulo Medina não será processado por assédio sexual. O Supremo Tribunal Federal negou, por maioria de votos, nesta quarta-feira (16/6), a queixa-crime ajuizada por Glória Maria Pádua Ribeiro Portella. Ela é ex-assessora de Medina e filha do também ministro do STJ, Antônio de Pádua Ribeiro. O procurador-geral da República Cláudio Fonteles opinou pela aceitação da queixa-crime.

O presidente do STF Nelson Jobim e os ministros Ellen Gracie, Carlos Ayres Britto, Cezar Peluso, Gilmar Mendes, Joaquim Barbosa e Carlos Velloso e Celso de Mello votaram pela rejeição da queixa-crime. O ministro Marco Aurélio, voto vencido, foi o único a pedir a instauração do processo penal.

Na queixa-crime, encaminhada ao Supremo Tribunal Federal em agosto de 2003, Glória Maria afirma que há cerca de seis meses sofria com atitudes estranhas do ministro. Desde fevereiro daquele ano, segundo ela, Medina lhe dirigia olhares pouco usuais, palavras de sentido duplo como quando disse ter “ficado excitado com os ‘tapinhas’ que ela havia lhe dado nos ombros’”.

Glória Maria alega que ficou tão abalada com os acontecimentos que teve de iniciar tratamento contra depressão e foi aconselhada pelo médico a se afastar do STJ por 30 dias.

A defesa de Medina argumenta que as acusações teriam sido motivadas pela decisão do ministro em mudar a assessora de sala. Ele afirma, que ao saber da determinação, Glória Maria perdeu a compostura e afirmou que não iria trabalhar próxima a “uma corja de incompetentes”. Teria então começado a lançar impropérios e por esta razão foi exonerada em 3 de julho de 2003 pelo ministro do STJ.

Para o presidente do STF, os documentos apresentados pela acusação não comprovam a denúncia. Ele justificou o voto pela não aceitação da queixa-crime afirmando que as testemunhas citadas não presenciaram os fatos e não poderiam, assim, relatar a veracidade do assédio sexual. Segundo o ministro, não há indícios da formalização do crime.

“Todos os ministros do STJ têm assessores. Alguns já devem ter feito dedicatórias a eles, assim como eu já fiz. Algumas assessoras podem ter quadro de emagrecimento rápido e depressão e nem por isso os ministros podem ser acusados de eventual assédio sexual”, disse Jobim. O processo penal não pode ser transformado em “caso de desavença”, segundo o ministro.

A ministra Ellen Gracie acompanhou o voto de Jobim. Ela afirmou que um dos principais elementos para comprovar o crime, que é a dependência financeira da vítima para com quem assedia, não existe.

Glória Maria não se encontrava à mercê de Medina por ser funcionária concursada do Superior Tribunal de Justiça. De acordo com Ellen Gracie, ela poderia ter pedido transferência para qualquer outro gabinete do tribunal depois de ter começado a sofrer com as atitudes do ministro.

A falta de companheiros de gabinete no rol de testemunhas foi usada pelo ministro Carlos Ayres Britto como justificativa para seguir o voto de Jobim. Ele alegou não haver provas “suficientes para sustentar acusação”.

Também acompanhou o voto do presidente da Corte o ministro Cezar Peluso, que entendeu não haver justa causa e interesse jurídico, seja do Estado ou de particular, que legitimem ação penal. “É preciso que a suspeita seja fundada e que exista materialidade do delito. A ação penal não pode ser transformada em inquérito ou promessa de apuração de um caso que não possui sequer indícios de ter acontecido”. Peluso foi acompanhado por Gilmar Mendes.

Único voto divergente, Marco Aurélio afirmou que o “assédio é feito na reserva de certo ambiente, entre quatro paredes, onde estão presentes apenas o agente e a vítima, e não sob os olhos de terceiros”.

Ele solicitou ao tribunal que aguarde a declaração das testemunhas e a fase probatória para que os fatos sejam elucidados. “Os indícios não merecem apoteose maior, mas também não merecem excomunhão. Devem ser acolhidos sem qualquer juízo de valor para comprovar a conseqüência ou inconseqüência dos fatos”, disse.

Segundo ele, ao contrário do que alegaram os ministros que votaram anteriormente, “a inicial não merece, como ressaltou o procurador-geral da República Claudio Fonteles, tarja de inepta”. Em seguida, o ministro Celso de Mello, acompanhou o voto de Jobim, ao entender que não existem elementos ou convicções mínimas que possam justificar a abertura do procedimento penal.

“Meras conjecturas não podem conferir fundamento material e não legitimam instauração de ação penal”, afirmou. O Supremo deve, segundo Celso de Mello, impedir a instauração de processo “contra qualquer acusado”. A ação não pode ser resultado de uma vontade pessoal do acusador, pelas “gravíssimas implicações ético e jurídico-sociais que derivam da instauração do processo penal”. O julgamento durou mais de três horas.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!