Extorsão é caracterizada mesmo que roubo não seja concretizado
12 de junho de 2004, 12h09
Basta que o assaltante coloque a vítima no carro e exija a senha do cartão do banco para que seja caracterizado o crime, mesmo que ele não consiga roubar nenhum dos pertences ou retirar dinheiro do caixa eletrônico.
Com esse entendimento, o juiz do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo Ivan Sartori negou o pedido de absolvição ou redução da pena de 12 anos de reclusão, em regime fechado, a um condenado de extorsão mediante seqüestro.
Segundo a decisão de Sartori, a extorsão, em qualquer de suas modalidades, é crime formal ou de consumação antecipada, independendo da obtenção da vantagem perseguida. A condenação final, nesse contexto, é a somatória das penas por roubo e extorsão.
De acordo com o relato constante do voto, o acusado foi preso em flagrante no momento em que, juntamente com comparsas, estava a caminho do banco para apanhar o dinheiro do resgate. “Houve perseguição e troca de tiros inclusive, a determinar o falecimento de um dos agentes, resultando ferido o detido, enquanto um terceiro veio a se evadir”.
Sartori considerou “inegável, igualmente, a forma qualificada, dês que a lesada permaneceu em poder de seus algozes por mais de 24 horas, a par de afigurar-se patente a associação em bando ou quadrilha à prática nefasta cuidada”.
Ainda segundo a decisão, a alegação de participação de menor importância no crime não pode ser acatada “quando relevante sua função, vale dizer, a de, ao menos, garantir o resultado efetivo de toda ação delituosa, assegurando o recebimento e a incolumidade do valor do resgate, bem como a fuga dos comparsas”.
Leia íntegra do voto
APELAÇÃO nº 1433793/9
Comarca: ITAPECERICA DA SERRA – (Ação Penal nº 595/02)
Juízo de Origem: 1ª Vara
Órgão Julgador: Primeira Câmara Extraordinária
Apelante: ROBERTO FRANCISCO MACIEL
Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO
Relator
VOTO DO RELATOR
Ação penal em que incurso o réu no art. 159, parágrafo 1o, c/c o art. 29, ambos do Código Penal. A r. sentença é de procedência, imposta a pena de doze (12) anos de reclusão, regime integralmente fechado. Recorre o vencido, buscando absolvição ou, subsidiariamente, o reconhecimento de participação de menor importância.
A Procuradoria de Justiça é pelo desprovimento.
Recurso bem processado.
É o relatório, adotado, no mais, o de primeiro grau.
Não colhe o reclamo, pese o esforço da ilustrada defensoria.
O acusado foi preso em flagrante no exato momento em que, juntamente com comparsas, visava apanhar o dinheiro do resgate. Houve perseguição e troca de tiros inclusive, a determinar o falecimento de um dos agentes, resultando ferido o detido, enquanto um terceiro veio a se evadir.
A vítima foi levada ao hospital para reconhecer o seqüestrador ferido, ora apelante, quando se surpreendeu, porque ele trabalhara para seu pai, momento em que o apelante até se desculpou. Lembrou-se a lesada, ainda, de que o pré-nome do inconformado fora mencionado por um dos agentes, estando o crime em andamento.
Também reconheceu o falecido como seqüestrador líder da quadrilha (fls. 07/20, 24/7 e 28/9). Posteriormente, confessou o denunciado sua participação no delito como motorista, dando todos os detalhes da empreitada e justificando que foi coagido por um dos integrantes do bando (fls. 70/5).
Lavraram-se autos de apreensão e entrega (fls. 31/2, 33 e 69).
No pretório, a prova administrativa foi plenamente roborada (fls. 214/49), voltando a vítima a discorrer, inclusive, sobre o pedido de desculpas que partiu do ora recorrente, o qual teria dito, ainda, ter praticado o gravíssimo ilícito porque estava desempregado, manifestação também ouvida pelo irmão daquela (fls. 220/1 e 233/4).
Policiais oficiantes, por seu turno, relataram a dinâmica apuratória e da prisão, com absoluta coerência (fls. 237/49).
Constata-se, pois, que a seqüestrada narrou os fatos de forma clara, incisiva e minuciosa, não olvidado que, em casos que tais, se tem emprestado valor significativo à palavra do ofendido, justamente porque nenhum seu interesse em incriminar graciosamente o réu, além de se tratar de infração cometida, em regra, à sorrelfa.
Não é, outrossim, de duvidar-se da narrativa dos policiais, em inexistindo fator ao revés e prestando eles compromisso como qualquer testemunha (STF – HC 72.500/SP, 1a. Turma, rel. Min. Sydney Sanches, DJU 04.8.95, p. 22448, “in” Jurisprudência do STF e do STJ Criminal, Alfredo de Oliveira Garcindo Filho, 6a. ed., Ed. do Autor, Curitiba, 2001, p. 455), sem se falar que sua versão confere com os outros elementos dos autos.
Ademais, a confissão vale não pelo local em que prestada, mas por sua força de convencimento, o que se pode atribuir àquela apresentada na fase inquisitorial, tanto mais que detalhada e em consonância com o contexto probatório.
Descabida a pretensa coação, acrescente-se, quando o acionado admitiu ter aderido à conduta dos demais, assumindo para a vítima e seu irmão, de cuja família era próximo, que entrou no negócio criminoso porque estava desempregado.
Irreversível, destarte, a condenação, mesmo porque as testemunhas de defesa nada trouxeram de notável ao desfecho da pendência (fls. 257/9), gizado que o depoimento de Valtair, além de pouco convincente, pode ser fruto de percepção parcial do que acontecia, como bem ponderou a douta magistrada (fl. 320).
Inconcusso ter se consumado o delito, porque a extorsão, em qualquer de suas modalidades, é crime formal ou de consumação antecipada, independendo da obtenção da vantagem perseguida (cf. Súmula 96 do STJ e Código Penal Interpretado, Julio Fabbrini Mirabete, 1a. ed., 4a. tiragem, 2001, Atlas, p. 1026/7).
Inegável, igualmente, a forma qualificada, dês que a lesada permaneceu em poder de seus algozes por mais de 24 horas (fl. 220), a par de afigurar-se patente a associação em bando ou quadrilha à prática nefasta cuidada.
E não é de cogitar-se de participação de menor importância por parte do ora sentenciado, quando relevante sua função, vale dizer, a de, ao menos, garantir o resultado efetivo de toda ação delituosa, assegurando o recebimento e a incolumidade do valor do resgate, bem como a fuga dos comparsas.
A pena ficou no linde inferior, porque, antes exasperada por razões suficientes, foi reduzida em face da confissão, embora presente retratação judicial (fls. 321/2), com o que se conformou a acusação.
Por fim, o regime prisional era mesmo de ser o integralmente fechado, a teor dos arts. 1º, IV, e 2º, parágrafo 1º, da Lei 8.072/90.
Tal vem sendo sufragado pela Suprema Corte (HC 74.806/SP, 2ª Turma, rel. desig. min. Maurício Corrêa, DJU 25.05.2001, p. 10, ementário 02032-03, p. 490), inclusive após o advento da Lei 9.455/97, que permite progressão nos crimes de tortura (HC 81.055/SP, rel. Min. Maurício Corrêa, 2ª Turma, DJ 28.09.2001, p. 49, ementário vol. 02045-02, p. 234).
Nesse diapasão, também o Superior Tribunal de Justiça (STJ, HC 14.285/SP, 6ª Turma, min. Vicente Leal, DJ 05.03.01, p. 242; HC 9.567/PR, rel. min. José Arnaldo da Fonseca, 5ª Turma, DJ 13.09.99, p. 080).
Em suma: mantém-se o bem lançado édito monocrático, encampada sua motivação.
Nega-se provimento.
IVAN SARTORI
Relator
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