Fumaça nociva

Souza Cruz é condenada a pagar R$ 500 mil a família de ex-fumante

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3 de junho de 2004, 10h51

A Souza Cruz foi condenada a pagar R$ 500 mil de indenização por danos morais à família de José da Silva Martins, que fumou por mais de 50 anos e morreu por doença causada pelo cigarro. A decisão é da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Ainda cabe recurso.

Além da indenização, a empresa foi obrigada a ressarcir despesas relativas a tratamento médico, em aproximadamente R$ 41 mil, e pagamento dos salários que a vítima deixou de receber, a partir de sua demissão em decorrência da doença, até a data de sua morte, em 2001.

José da Silva Martins começou a fumar aos 16 anos, consumindo as marcas Hollywood, Continental e Minister, segundo prova testemunhal. Foi acometido por enfisema pulmonar e cardiopatia isquêmica, diagnosticados em 1992.

Laudo pericial do Departamento Médico Judiciário atestou a relação das doenças ao vício do tabagismo. Em 1° instância a ação havia sido considerada improcedente.

O relator da apelação interposta no Tribunal de Justiça, juiz convocado José Conrado de Souza Júnior, tomou por base o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e invocou o conceito de produto defeituoso, que não oferece a segurança que legitimamente se espera, expondo a riscos a saúde dos consumidores.

O juiz apontou a necessidade de os produtos oferecidos no mercado apresentarem informações precisas sobre seu uso e os riscos esperados, desde a publicidade veiculada até os dados contidos na própria embalagem.

“A Souza Cruz ignorou desde sua origem a necessidade de informar detalhada e ostensivamente a composição e os riscos do produto”, afirmou. O juiz descreveu detalhadamente os elementos presentes na composição do tabaco, e os efeitos prejudiciais de cada um, mencionando que a fumaça do cigarro libera mais de cinco mil substâncias, sendo prejudicial inclusive a não-fumantes. “As portarias regulamentadoras do Ministério da Saúde são insuficientes e vinculadas à questão tributária”, disse.

Com relação à publicidade veiculada pela empresa, o juiz afirmou que ela age sobre o subconsciente do consumidor, que é levado a subestimar os efeitos do produto, com advertências insuficientes. “O glamour afeta o discernimento. Por ser lícita a atividade de comercialização do cigarro, há necessidade ainda maior de informação ostensiva de sua nocividade”.

O voto foi acompanhado pelo desembargador Artur Arnildo Ludwig, que acrescentou que à época em que o autor da ação começou a fumar, os riscos reais da utilização do cigarro eram desconhecidos, com veiculação de publicidade massiva e enganosa ao longo de décadas. E que só houve regulamentação em relação à informação a ser veiculada pelas empresas a partir de 1990.

O presidente da Câmara, desembargador Cacildo de Andrade Xavier, divergiu dos colegas e que manteve os fundamentos da sentença. Mas foi voto vencido.

Segundo ele, o hábito de fumar é decorrente do livre arbítrio. “O próprio autor admitiu que desde cedo foi aconselhado a parar de fumar”, disse. Ele citou ainda julgado anterior da própria Câmara, do qual foi relator, e decisão da 5ª Câmara Cível, no mesmo sentido.

Processo: 70.000.840.264

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