Mandado de Segurança

Nova lei vem para corrigir erro histórico no Mandado de Segurança

Autor

21 de julho de 2004, 11h44

O estudo do processo denominado Mandado de Segurança sempre foi tarefa realizada por juristas das mais variadas formações. Malgrado a natureza processual do assunto, importantes obras sobre o tema foram escritas, no Brasil e no estrangeiro, não só por processualistas, mas também por especialistas em diversos outros campos do Direito.

Essa tradição interdisciplinar do instituto, decerto proveitosa em diversos campos do conhecimento, importou em bom número de venturas, porém também causou alguns insucessos. Somam-se às dezenas os institutos presentes no processo de Mandado de Segurança que, conquanto possam encontrar confortável conceituação doutrinária na teoria geral do direito processual, vagam perdidos e carentes de enquadramento científico rigoroso, causando sérios problemas no dia-a-dia do aplicador do Direito.

JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA já observou que existe no Brasil “certa tendência a ver no Mandado de Segurança uma entidade exótica, estranha, insuscetível de enquadramento nas categorias tradicionais do Direito Processual”, atribuindo o autor “um pouco dessa tendência ao fato de que, nos primeiros tempos da sua existência, o Mandado de Segurança foi estudado menos por processualistas que por estudiosos, por especialistas de outros campos do direito” (Mandado de Segurança – Uma Apresentação. In “Mandado de Segurança”, coordenação por Aroldo Plínio Gonçalves, Editora Del Rey, Belo Horizonte, 1996, p. 83)

Assim, apesar de a Lei 1.533, de 31 de dezembro de 1951, já ter ultrapassado cinqüenta anos de vigência, ainda é necessário investigar os institutos que caracterizam o Mandado de Segurança sob o cuidado de uma percepção conceitualista, sem descurar, por óbvio, da concomitante perspectiva instrumental ou teleológica que inspira o processualista moderno, constantemente ocupado com as repercussões de seu pensamento no campo do acesso à justiça e da efetividade do processo.

Tema que há anos merece depuração legislativa é o que diz respeito à garantia do contraditório no procedimento do writ.

Nos dias atuais pouco se discute acerca da legitimação passiva no processo de Mandado de Segurança, assunto que, em passado recente, mereceu acalorado debate na doutrina nacional. Posicionavam-se os autores em dois grandes grupos: o que considerava ser a autoridade coatora a legitimada passiva e o que conferia tal posto à pessoa jurídica a que pertence a autoridade coatora. O tema, no entanto, foi perdendo interesse tanto quanto foi se consolidando e ganhando hegemonia o entendimento sustentado pelo segundo desses grupos. Hoje, poucos são os autores que continuam atribuindo à própria autoridade coatora o posto de ré na relação jurídica constituída no processo de Mandado de Segurança.

Faltava, no entanto, encarar a conseqüência lógica desse entendimento e reconhecer o direito à pessoa jurídica de direito público de, antes mesmo da sentença, defender o ato apontado com coator; assegurando-se, dessa forma, o pleno respeito ao princípio do contraditório no procedimento do Mandado de Segurança (CF/88, art. 5º, LV).

A recente Lei 10.910, de 15 de julho de 2004, pretendeu corrigir o histórico erro alterando a redação do art. 3º da Lei 4.348, de 26 de junho de 1964, que passou a vigorar nos seguintes termos:

“Art. 3o. Os representantes judiciais da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios ou de suas respectivas autarquias e fundações serão intimados pessoalmente pelo juiz, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, das decisões judiciais em que suas autoridades administrativas figurem como coatoras, com a entrega de cópias dos documentos nelas mencionados, para eventual suspensão da decisão e defesa do ato apontado como ilegal ou abusivo de poder”.

Mesmo não tendo sido instituída a citação da pessoa jurídica de direito público para, querendo, responder a demanda, a alteração legislativa já introduziu um significativo avanço na democratização do procedimento, assegurando a intimação das decisões liminares para que o representante judicial da ré promova a “defesa do ato apontado como ilegal ou abusivo de poder”. Ajunte-se que a intimação deve ser feita pessoalmente aos representantes judiciais da entidade de direito público a que pertence a autoridade apontada como coatora, não bastando a mera publicação da decisão no órgão de imprensa oficial.

Dessa forma, fica definitivamente superada a esdrúxula sistemática, até então vigente, segundo a qual competia à própria autoridade impetrada o dever de, em quarenta e oito horas, reportar a decisão liminar ao representante judicial do ente público, que, apenas por via transversa, tomava conhecimento da demanda.

Registre-se, por fim, que a inovação legislativa (sob pena de nulidade do procedimento) aplica-se aos processos pendentes, sendo da tradição de nosso ordenamento processual o acatamento à teoria do isolamento dos atos processuais (CPC, art. 1.211 e CPP, art. 2o), segundo a qual a lei processual nova não atinge os atos já realizados no curso do processo, mas se aplica aos atos processuais a praticar.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!