Tiro n’água

Juiz nega pedido de Maluf para tirar programação da Globo do ar

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14 de julho de 2004, 18h55

O pedido feito por Paulo Maluf — de suspensão da programação da Rede Globo por 14 horas e a aplicação de multa à emissora — foi julgado improcedente pelo juiz auxiliar da propaganda eleitoral da 1ª Zona Eleitoral, Roberto Maia Filho. O candidato a prefeito de São Paulo usou como base da ação uma reportagem veiculada pela Globo. Ainda cabe recurso.

A notícia tratava das investigações sobre os supostos desvios de verbas de obras públicas e lavagem de dinheiro. Conforme a decisão, “o artigo divulgado pela requerida se insere no contexto da análise política, perfeitamente admissível num regime democrático”.

Maia Filho entendeu que a reportagem deu espaço para que fossem esclarecidas as duas versões dos fatos — as acusações do Ministério Público e a defesa de Maluf. Considerou também que ela tratava de um fato verdadeiro, a existência das investigações contra o candidato, de acordo com informações do TRE paulista.

Leia íntegra da decisão:

Processo nº 04/2004

Vistos.

Trata-se de REPRESENTAÇÃO formulada por PAULO SALIM MALUF em face de REDE GLOBO DE TELEVISÃO, em razão de haver esta veiculado, em sua programação de 08/7/2004, às 20:40 horas, matéria contendo opinião contrária ao requerente.

Pede, em razão disso, a suspensão da programação por 14 horas, bem como a aplicação de multa, conforme previsto nos artigos 45, § 2° e 56, da Lei nº 9.504/97.

Notificada, a requerida ofertou defesa. Alega que houve matéria jornalística na qual não foram veiculadas afirmações contrárias ao candidato, tendo sido obedecida a legislação eleitoral.

O Ministério Público opinou pela improcedência.

É o relatório.

D E C I D O.

Conforme bem observado pelo Ministério Público Eleitoral, não assiste razão ao requerente. Não se pode considerar que a matéria divulgada pela requerida conteve opinião contrária ao requerente, violando a lei, a ensejar suspensão da programação e imposição de multa.

Pelo que se nota das transcrições realizadas na peça vestibular, a reportagem se limitou a mencionar algo que a imprensa em geral já há um bom tempo vem divulgando: que se realizam investigações para apurar se houve um suposto desvio de verbas de obras públicas e ainda eventual lavagem de dinheiro, bem como se ocorreu o depósitos de tais valores em contas bancárias no exterior.

Segundo o Ministério Público do Estado, haveria envolvimento do requerente, o que este nega com veemência e, assim, tais investigações prosseguem.

Observa-se, portanto, que tais afirmações contidas na reportagem aqui questionada não têm nenhum caráter ofensivo e revelam as duas diferentes posições (do MPE e do candidato) quanto a um fato verdadeiro (existência das investigações).

Finalmente, o requerente alega que houve quebra do sigilo decretado em processo que tramita numa das Varas da Fazenda Pública, mas isto deve ser apreciado em outra seara, que não a justiça eleitoral.

Não se vê, portanto, nenhuma opinião pessoal contrária ao requerente. Outrossim, só resta considerar que o artigo divulgado pela requerida se insere no contexto de análise política, perfeitamente admissível num regime democrático.

Admitir o contrário equivaleria a engessar demasiadamente a campanha, dando guarida a suscetibilidades exacerbadas em detrimento do livre debate de idéias.

Assim decidiu o E. TRE/SP em julgado relatado pelo Juiz VITO GUGLIELMI (acórdão nº 135.372, processo nº 14.455, julgado em 07.08.2000 por v.u.).

No mesmo diapasão: “Qualquer homem público, que se lance à carreira política, há de suportar os debates e as críticas que, certamente, o acompanharão nesta empreitada” (Relator Des. Viseu Júnior, Processo nº 04/2004 acórdão nº 131.488, processo nº 13.176, classe 2ª, julgado em 22.09.98).

Em igual sentido, tem decidido o E. T.S.E., como se nota nos seguintes arestos: “Divulgação de fato jornalístico. Improcedência

do pedido. A informação jornalística que noticia, sem ofensa à honra pessoal de candidato, fato comprovadamente verdadeiro, não se situa no âmbito tutelado pela legislação eleitoral, de modo a assegurar direito de resposta. (Acórdão nº 16.802, de 7.12.2000, Relator Ministro Maurício José Corrêa)”.

“Constitucional. Eleitoral. Direito de resposta. Liberdade de imprensa. 1. A liberdade de imprensa é valor indissociável da democracia. Sem a liberdade de imprensa fica mais difícil o exercício das demais liberdades. 2. A informação jornalística que difunde, sem ofensa a

honra pessoal de candidato, fato comprovadamente verdadeiro e a opinião editorial que, no campo das idéias, aplaude ou critica posições de partidos ou candidatos sobre temas de natureza institucional, não se confundem com propaganda eleitoral nem com discurso político. Não se situam, portanto, nos espaços tutelados pela Lei Eleitoral de modo a assegurar direito de resposta. 3. Não cabe argüir direito de resposta quando o veículo de comunicação, ao constatar que a informação obtida, como no caso, de repartição do poder público, não é verdadeira e se apressa em desmentí-la, corrigindo-a no mesmo

espaço e com igual destaque. 4. Recurso conhecido e provido.” (Acórdão nº 105, de 15.9.98, Relator Ministro Edson Vidigal).

Assim sendo, é de rigor a rejeição dos pedidos formulado na peça inaugural.

Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTE a REPRESENTAÇÃO formulada por PAULO SALIM MALUF em face de REDE GLOBO DE TELEVISÃO, indeferindo a pretensão deduzida na inicial.

Oportunamente, arquivem-se.

P. R. I. , dando-se ciência ao M.P..

São Paulo, 14 de julho de 2.004.

ROBERTO MAIA FILHO

Juiz Eleitoral

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