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Conheça estudo sobre contrato de adesão e suas implicações

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28 de janeiro de 2004, 18h50

Texto extraído da Enciclopédia Jurídica de autoria de Leib Soibelman. A íntegra pode ser encontrada no CD-ROM em www.elfez.com.br

Contrato de adesão — Contrato no qual uma das partes estipula todas as cláusulas a que a outra adere sem poder modificá-las. Com efeito, o contrato de adesão se caracteriza pela ausência de participação de uma das partes na estipulação das cláusulas contratuais, de forma que a parte inativa simplesmente a elas adere.

Importa salientar, como bem observa Nelson Nery Junior (in CDC Comentado, pg. 551, Ed. Forense Universitária, 6ª Edição, 1999), que existem duas figuras, a saber, o contrato por adesão e o contrato de adesão. O primeiro seria aquele no qual as cláusulas já estão previamente estipuladas sem possibilidade de modificação pelo aderente, freqüentemente concebidas pelo Poder Público, enquanto que o segundo seria modificável, de tal maneira que se o aceita no seu todo ou não. Observe-se que a inclusão de cláusula no formulário não exclui a condição adesiva, conforme preceitua o § 1º do art. 54 do CDC. Opõe-se, portanto, ao chamado contrato de mútuo acordo, no qual as cláusulas são convencionadas, ponto a ponto, como indica o citado jurista.

Eis que no Novo Código Civil há previsão desta figura, sem que conste, no entanto, uma definição do que seja, coisa que o projeto de lei 6.960/02 ensaia fazer. Está, portanto, enunciado de forma muito incompleta, nos arts. 423 e 424, o seguinte: “Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente”. “Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio”.

Alguns entendem que a presença dos aludidos dispositivos no Novo Código Civil chancela a existência de contratos de adesão fora da relação de consumo, com o que não concordamos, muito embora reconheçamos, para o caso de estarmos em equívoco, que sua inclusão no novel diploma permite a invocação de direitos peculiares ao instituto para a tutela de situações assemelhadas. A redação do projeto original do Código Civil foi realizada em 1975, inexistindo, portanto, o Código de Defesa do Consumidor, sendo comuníssimo o seu uso, de forma que se fazia necessária, então, a sua disciplina, ainda que de forma rareada, tal como está no novo código ora em comento. Com o advento do CDC resta superada a necessidade.

Não conseguimos, portanto, conceber nenhuma situação onde ele possa ocorrer sem ser na relação consumerista. Os que pugnam pela sua existência à parte do direito do consumidor, apontam algumas hipóteses que confirmariam esta possibilidade, tais como: a) a fiança, quando o fiador simplesmente adere a um contrato com cláusulas previamente estabelecidas ou se vê obrigado a renovar o pacto fidejussório em face da cláusula de estar obrigado até a entrega das chaves; b) um contrato de franquia, no qual o comerciante, que não é destinatário final do produto, não possuindo assim a condição de consumidor (CDC, art. 2º), se obriga a receber toda e qualquer mercadoria do franqueador; c) o condômino que adere à convenção condominial ao tornar-se proprietário do imóvel; d) o contrato administrativo ao qual aderiria, em tese, o vencedor de uma licitação.

Expomos a seguir a razões pelas quais refutamos este ponto de vista bem como os exemplos acima citados.

Sabemos que a unanimidade da doutrina entende que este contrato é caracterizado pela imposição unilateral de cláusulas, mas nos insurgimos contra a pretensa suficiência desta noção por entendermos que na prática se verifica uma outra característica além desta, representada pelo seguinte: o contrato de adesão comumente deriva de um fato e não de uma deliberação consciente; são os casos do consumidor que compra a caixa fechada sem saber como são os detalhes da garantia ou o serviço que é contratado sem ciência prévia das implicações, como, por exemplo, a prática condenável de certos estacionamentos rotativos de colocar em letras minúsculas no ticket de entrada do automóvel a cláusula de que não se responsabilizam pelo furto de toca-fitas e outras coisas no interior do veículo.

Há, portanto, um fato dirigido ao bem da vida que tem a adesão como efeito secundário, o que seria, para nós, definível como princípio da secundariedade dos contratos de adesão.

Freqüentemente o sujeito não quer contratar, não há a expressa declaração da vontade ou ao menos aquela intenção direcionada para os efeitos jurídicos contratuais que embasa a própria teoria do negócio jurídico, (V. ato jurídico, fato jurídico, ato jurídico não negocial, negócio jurídico e negócio jurídico (importância prática da noção) e negócio jurídico e declaração de vontade), o que, dito em outras palavras, significa que o agente não deseja realizar nenhum negócio jurídico, quer simplesmente fruir de um produto ou serviço.

Não se tratasse o contrato de adesão de uma relação jurídica obrigacional estaria muito mais próximo do ato jurídico que do negócio jurídico. É cabal a sua diferença para com o contrato paritário, afastando inteiramente a reciprocidade convencional pela qual as partes ponderam em mútuo acordo para alcançar, através das cláusulas, os efeitos por elas queridos e estimados. Vejamos agora os exemplos: os dois primeiros exemplos citados (fiança e franquia) são de casos em que há interação entre os contratantes, que somente assentem em contratar através de manifestação dirigida primariamente a este fim; não deriva de um fato, mas de uma ação consciente.

No caso da fiança, frise-se que a súmula 214 do STJ e a jurisprudência já eliminaram há muito a possibilidade de renovação do contrato sem anuência do fiador, mesmo com a cláusula de ser a garantia prestada até a entrega das chaves. Quanto ao contrato de franquia saliente-se que o franqueado pode analisar perfeitamente as estipulações clausuladas antes de a ele aderir. Não há, nestes dois casos, um fato que tenha como efeito secundário esta adesão nem uma impossibilidade de modificação, sendo oportuno recordar que não somente por concordar inteiramente com um contrato preestabelecido existirá adesão; fosse assim todo contrato redigido inteiramente por uma parte com o qual concordasse a outra seria por isto classificável como adesivo.

O terceiro exemplo (adesão à convenção condominial) não cuida de contrato formado entre o novo condômino e os demais, ou seja, o novo condômino simplesmente passa a integrar a relação contratual preexistente, onde o estatuto não foi formado unilateralmente, mas por consórcio de todos os condôminos, sendo esta condição verdadeira obrigação propter rem, ou seja, acompanha a coisa, muito embora possa a referida convenção ser conceituada como contrato plurilateral.

Finalmente, com relação ao quarto exemplo, (adesão do licitante ao contrato administrativo), diga-se que é ampla a análise das condições especificadas no edital, por parte do proponente; além disto, o contrato administrativo goza de cláusulas exorbitantes que permitem vantagens interpretativas e condicionais para administração pública, o que esvazia por completo aquela idéia de hiposufisiência do aderente que seria justificadora da função protetiva que as normas do contrato de adesão prescrevem para este; em todas estas hipóteses aventadas nos exemplos acima há possibilidade de minudente apreciação das condições, não sendo de forma alguma simples ato que possui como efeito um contrato.

Feitas estas observações, cumpre registrar que nossa modestíssima opinião é mais do que contestável e não encontramos na doutrina opinião semelhante, salvo numas poucas linhas de Venosa (in Direito Civil, II, Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos, pg. 384, 3ª Edição, Ed. Atlas, São Paulo, 2003).

Seguindo, portanto, nossa linha de pensamento, é próprio reproduzir a definição do CDC, art. 54º, do contrato de adesão: “Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.” São nulas as cláusulas que importem em renúncia de direitos (CDC, art. 51, I e NCC, art. 424), como o são a cláusula de não indenizar, renúncia a demandar pela evicção, vícios redibitórios, etc.

O contrato de adesão rege-se pelo princípio da transparência, devendo ser claras as suas cláusulas (art. 423 do NCC e 54, § 3º do CDC), de forma que em caso de dúvida, ambigüidade ou contrariedade serão as mesmas sempre interpretadas em favor do aderente.

Vigora também o princípio da legibilidade (art. 54, § 4º do CDC), pelo qual se determina que as cláusulas que implicarem em limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão. As características do contrato de adesão são, segundo Marco Aurélio Bezerra de Melo (in Novo Código Civil Anotado, III, Contratos, Tomo I, Ed. Lumen Juris, Rio de Janeiro – RJ, 2003): as seguintes: a) relativização do princípio da autonomia da vontade; b) superioridade técnica de uma das partes; c) ausência de deliberação prévia por uma das partes; d) uniformidade e imutabilidade de suas cláusulas.)

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