Nestlé-Garoto

OAB-SP critica politização da decisão sobre a fusão Nestlé-Garoto

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16 de fevereiro de 2004, 12h27

A OAB paulista divulgou nota oficial criticando a politização da decisão do Conselho Administrativo de Defesa Econômica sobre a fusão Nestlé/Garoto. A Ordem sugeriu a fixação de um prazo para decisões do Cade em casos como esse.

Leia a nota:

“Em todas as nações desenvolvidas e países que buscam sua inserção, com maior eficiência e amplitude, no mercado globalizado, a defesa da livre iniciativa e da livre concorrência – pressupostos fundamentais de um comércio saudável e competitivo – implica a existência de órgãos independentes para o controle do abuso do poder econômico.

No Brasil não é diferente. A Constituição Federal, no capítulo destinado aos “Princípios Gerais da Atividade Econômica”, assegura a valorização da livre iniciativa e também do princípio instrumental que dela deriva, a liberdade de concorrência, pela formação dos preços dos bens e serviços pelas regras da oferta e da procura. Para que as forças muitas vezes cegas do mercado não dêem margem a uma competição danosa e destrutiva, o próprio texto magno determina que “a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros” (§4º do art. 173 da CF).

Os órgãos integrantes do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC) têm competência legal para opinar (SEAE), instruir e opinar (SDE) e julgar os atos de concentração – fusões, aquisições, joint-ventures – e condutas potencialmente danosas ao mercado (CADE).

Infelizmente, apesar da importância fundamental ao País – a fim de garantir a preservação da livre concorrência e a atratividade do investimento estrangeiro – os órgãos do SBDC estão sobrecarregados e com as suas estruturas prejudicadas pela ausência de investimentos públicos e organização compatível com as necessidades mais prementes da sociedade brasileira, no que se refere à defesa da concorrência.

No recente episódio Nestlé-Garoto – sem se adentrar no mérito da decisão – não há dúvida de que a sociedade está estarrecida pelo longo tempo de tramitação da questão junto aos órgãos do SBDC. Isto gera insegurança jurídica de todo nefasta. Sabe-se, no entanto, que até mesmo nos países desenvolvidos por vezes a tramitação de um processo de tal complexidade e magnitude pode levar um ou dois anos. Mas, talvez mesmo pelo fato da cultura concorrencial ser recente no Brasil, seja o caso de os procedimentos administrativos estarem submetidos a prazos mais rígidos para deliberação.

A OAB-SP vê com profunda preocupação a politização da questão Nestlé-Garoto. A guerra fiscal tão deletéria ao País – mediante a concessão abusiva de subsídios e incentivos fiscais – não deverá se estender à pressão política sobre decisões de natureza técnica dos órgãos de jurisdição administrativa, para fazer prevalecer interesses imediatos, mas que não necessariamente se projetem na preservação dos interesses mais amplos e legítimos da sociedade em longo prazo.

A OAB-SP espera que a serenidade conduza os debates sobre a defesa da concorrência – também na questão Nestlé-Garoto – para que o interesse público mais elevado volte a conduzir o eixo das discussões. É natural que as partes perdedoras de uma contenda demonstrem seu inconformismo e busquem os meios legais disponíveis para a defesa de seus legítimos interesses. No entanto, por vezes, não deixa um julgamento do CADE de ser fruto de um contencioso: ou seja, de interesses contraditórios sendo levados a julgamento.

A OAB-SP, cumprindo com o seu papel institucional de defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos e a justiça social, levará adiante estudos e painéis voltados à discussão da defesa da concorrência, pugnando pela rápida administração da justiça também em sua vertente administrativa, para aperfeiçoamento das instituições e órgãos que compõem o SBDC. Tudo isto voltado à segurança da relações jurídicas, à proteção dos interesses mais elevados da sociedade brasileira e ao incentivo do investimento estrangeiro direto, tão necessário para a geração de empregos e crescimento econômico do País.

São Paulo, 13 de fevereiro de 2004.

Luiz Flávio Borges D´Urso

Presidente

OAB-SP

Fernando Passos

Presidente

Comissão de Estudos da Concorrência e Regulação Econômica

Antonio Carlos Rodrigues do Amaral

Presidente

Comissão de Comércio Exterior e Relações Internacionais (OAB)

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