Empréstimo questionado

Eletricista entra com ação contra BNDES e Banco Santos

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12 de fevereiro de 2004, 18h02

O eletricista Danilo Bigaran, de São Caetano do Sul (SP), entrou com ação popular contra o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, Banco Santos S.A., e Cabelte – Indústrias do Brasil S.A. Ele alega que há “imperfeições” em determinado empréstimo concedido para a Cabelte. Por isso, entrou com a ação na 1ª Vara Cível de São Paulo.

Em 2002, o Banco Santos S.A. intermediou junto ao BNDES um empréstimo, no valor de US$ 7.500 milhões, concedido para a Cabelte. O empréstimo era destinado a melhoria da produção de cabos de fibras ópticas e cabos OPGW e a financiar o incremento da exportação.

A Cabelte ingressou, no Juízo da 1ª Vara Cível, da Comarca de Itajubá (MG), com pedido de concordata preventiva dilatória, 58 dias após obter o empréstimo. O juízo deferiu o pedido.

Segundo os autos, a Cabelte confessou dever ao Banco Santos S.A., a quantia de R$ 36.984.906,11. Segundo Bigaran, “o desvio da finalidade é óbvio demais. O dinheiro sumiu. Certamente encontra-se no mercado especulativo. É ótimo emprestar dinheiro público, quase de graça, e com ele especular, num mercado financeiro como o nosso, onde os juros praticados chegam a estratosfera. Esqueceram-se que isto é imoral e criminoso.” Na ação, o eletricista requer a quebra do sigilo bancário e fiscal dos réus e a apuração das reais dimensões do empréstimo.

Leia a resposta do banco enviada à revista ConJur e, em seguida, a ação:

Essa pretensa ação é descabida e sem finalidade objetiva.

Quanto aos fatos o Banco Santos pode apenas informar que :

1. a operação foi regularmente contratada com a Cabelt e visava o financiamento para a exportação de itens de sua fabricação

2. em seu curso, fomos informados de que por força de falta de pedidos tantos de exportação, como de fornecimento local, a empresa se via incapacitada de honrar seus compromissos

3. em decorrência da concordata da empresa, o financiamento foi integralmente liquidado pelo Banco Santos junto ao BNDES, sendo que agora segue nas providencias jurídicas contra a empresa devedora e contra o grupo econômico a que a mesma pertence, com sede em Portugal, para obter o ressarcimento de seus prejuízos.

O site deve abster-se de oferecer espaço a iniciativas desse tipo, onde a desinformação de uma pessoa que impetra ou ameaça impetrar medidas jurídicas de efeito questionável, pode causar danos sérios à imagem de uma instituição financeira, que é protegida por lei.

Banco Santos

Leia a ação:

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz Federal da Vara Cível. Comarca da Capital. Estado de São Paulo

DANILO BIGARAN, brasileiro, casado, eletricista, filho de xxx e de xxx, natural de São Caetano do Sul, neste Estado, onde nasceu no dia 12 de outubro de 1951, portador de cédula de identidade registro geral (IIRGD.SP) número X.XXX.XXX (documento de número 01), inscrito no CPF.MF sob número XXX.XXX.XXX-XX (documento de número 02), portador do título de eleitor número XXXX-XX, Zona XXX, Seção 0024 (documento de número 03), residente e domiciliado na Rua XXXX, número XXXX, Bairro XXXX, XXXXXX, neste Estado (CEP XXXXX-XXX), com fundamento no artigo 5º, inciso LXXIII, da Constituição Federal e na Lei Federal número 4717/65, de 29.06.65, por intermédio de seu advogado (documento de número 04), vem a Vossa Excelência, propor a presente AÇÃO POPULAR, em face de: BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL (BNDES), com sede na Avenida XXXX, número XXXX – Centro, Rio de Janeiro – Estado do Rio de Janeiro (CEP XXXXXX-XXX); BANCO SANTOS S.A., com sede na Rua XXXX, número XXXX, XXXXXX, nesta Capital; e CABELTE – INDÚSTRIAS DO BRASIL S.A., com sede na XXXXX, Quilômetro XX – LOTE XXXX – Cidade de XXXX – Estado de XXXX, pelos seguintes fatos e fundamentos.

O Banco Santos S.A., na condição de agente financeiro autorizado, no apagar das luzes do Governo Fernando Henrique Cardoso, mais precisamente, no dia 24.10.2002, intermediou e obteve junto ao BNDES um empréstimo em condições excepcionais, no valor de US$ 7.500.000,00 (sete milhões e quinhentos mil dólares americanos), na modalidade PRÉ-EMBARQUE ESPECIAL, concedido à CABELTE, tornando-se, por ele, responsável, também.

O empréstimo telado tinha por fim a melhoria e aumento da produção de cabos de fibras ópticas e cabos OPGW e financiar o incremento à exportação, com juros ínfimos, bem abaixo daqueles praticados pelo mercado. Trata-se de dinheiro público, oriundo do Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT e Depósitos Especiais do Fundo de Participação do PIS/PASEP.

Acontece, no entanto, que no dia 20.12.2002, 58 (cinqüenta e oito) dias depois de obter tão vultoso empréstimo, a beneficiária dele (CABELTE) ingressa, perante o Juízo da 1ª (primeira) Vara Cível, da Comarca de Itajubá, Estado de Minas Gerais (processo número 324.02.003590-7) e requer Concordata Preventiva Dilatória, confessando, despudoramente, sua insolvência (documentos de números 05 a 209).

A concordata foi, pelo juízo referido, deferida. No processo respectivo, não há qualquer referência à obrigação contraída com o BNDES. Confessa, porém, ser devedora do Banco Santos S.A., da importância de R$ 36.984.906,11 (trinta e seis milhões, novecentos e oitenta e quatro mil, novecentos e seis reais e onze centavos), nos termos dos inclusos documentos de números 134 e 135, cópia da relação dos credores quirografários, que instruiu o requerimento.

O desvio da finalidade é óbvio demais. O dinheiro sumiu. Certamente encontra-se no mercado especulativo. É ótimo emprestar dinheiro público, quase de graça, e com ele especular, num mercado financeiro como o nosso, onde os juros praticados chegam a estratosfera. Esqueceram-se que isto é imoral e criminoso.

É possível que o Banco Santos S.A. tenha sido ilaqueado em sua boa fé. Seria esta, contudo, a segunda vez na história dos banqueiros, por instinto cautelosos, que um deles, contabiliza prejuízo. A primeira vez, como sabemos, foi com Shylock, célebre emprestador de dinheiro, que o gênio imortal deShakespeare nos legou em “O Mercador de Veneza”.

Entre a contratação do empréstimo (24.10.2002) e o requerimento de concordata preventiva (confissão da insolvência) que formulou (20.12.2002) a empresa beneficiária do empréstimo público, há um hiato de apenas 58 (cinqüenta e oito) dias. Impossível gastar, em tão curto espaço de tempo, todo este dinheiro.

O empréstimo concedido pelo BNDES, infringiu, certamente, regras básicas. Há notícia, no processo de concordata, da existência de títulos protestados. O balanço apresentado ao juízo demonstra, pelos números, a incapacidade financeira de contrair empréstimo deste nível. Todo seu ativo está superavaliado. Daí a possibilidade de fraude.

Não há explicação plausível. Trabalhadores da CABELTE, revoltados, propiciaram, com informações, a viabilidade da presente ação popular.

Se o dinheiro não teve a destinação original, o empréstimo não se justifica. O agente financeiro deve, então, de imediato, restituí-lo ao BNDES, agora com as taxas de juros e outras pertinentes praticadas no mercado, com as sanções da cláusula penal se houver, ou que vierem a ser fixadas pelo juízo.

As sucessivas alterações contratuais, de nomes, inclusive, na composição societária da ré CABELTE, até agora constatadas, visam diluir a responsabilidade.

Pelo exposto, requer a Vossa Excelência, digne-se quebrar o sigilo bancário e fiscal dos réus, a fim de que se possa apurar, nesta ação, em toda a sua extensão, as reais dimensões do malsinado empréstimo. O BNDES deverá informar ao juízo, com a urgência que o caso comporta, as condições da avença. Deverá fazê-lo com cópias do cadastro que lhe foi endereçado, proposta, pré-contrato, contrato, inclusive.

Deverá informar ao juízo, as condições em que o agente financeiro saldaria a obrigação, em caso de insolvência da beneficiária do empréstimo.

O autor popular avaliará, após as contestações, a possibilidade de requerimento da antecipação da tutela, para a devolução imediata e integral, pelo agente financeiro, do valor contratado com os cofres públicos.

Requer, ainda, a Vossa Excelência, digne-se mandar citar os réus, primeiramente, por via postal, para responderem, querendo, a pretensão. Deverão ser advertidos para os efeitos da revelia. Acompanhá-la, em seus ulteriores termos, até final, quando deverá ser julgada procedente, para declarar, por sentença, rescindido o contrato de financiamento celebrado entre BNDES e CABELTE, com intermediação do Banco Santos S.A., condenando-os, solidariamente, a devolver ao BNDES o valor contratado, integralmente, com juros de mercado, multa por infração contratual, e demais sanções legais, tudo corrigido monetariamente.

Deverão ser condenados, ainda, ao pagamento das custas, taxas, despesas judiciais, além dos honorários advocatícios.

Protesta provar o alegado, por todos os meios que em direito se permite sem exclusão de quaisquer, especialmente, a prova pericial.

Da presente, o Ministério Público Federal deverá, obrigatoriamente, ter ciência.

Dá-se à causa o valor de R$ 25.000.000,00 (vinte e cinco milhões de reais), provisoriamente. Eventual ajuste ocorrerá quando a pretensão estiver corretamente instruída.

Deverá ser oficiado a Polícia Federal, requisitando a instauração de inquérito policial, para apurar possível fraude, com a conivência de funcionários públicos ou autoridades a eles equiparadas, inclusive, na concessão do empréstimo aqui noticiado.

Deverá ser oficiado, também, ao INSS para informar este juízo, se na data de 24.10.2002, a empresa CABELTE nada lhe devia, estando, portanto, apta a receber certidão negativa de débitos e, em conseqüência, contrair empréstimo com o poder público.

Cópia da pretensão deduzida nesta ação popular, deverá ser encaminhada ao Juízo da 1ª (primeira) Vara Cível, da Comarca de Itajubá, Estado de Minas Gerais, a quem foi distribuído o requerimento de Concordata Preventiva, a fim de que dela tome ciência e providências, se for o caso.

Nestes termos,

pede deferimento.

São Paulo,28 de janeiro de 2004.

Antônio Roberto Barbosa

oab./sp.: 66.251

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