Dívida de jogo

Justiça livra jogador de dívida contraída em bingo do RS

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25 de dezembro de 2004, 12h54

Cidadão foi ao bingo, jogou demais, perdeu e agora quer o perdão da dívida sob a alegação de que foi induzido ao jogo. A 19ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul acatou o pedido de extinção de obrigatoriedade de pagamento de dívida contraída em casa de bingo. O débito somava mais de R$ 18 mil, mais correção monetária pelo IGPM a partir do ajuizamento da ação, em 28 de janeiro de 2003, e de juros de 1% ao mês. Ainda cabe recurso.

O devedor, para reverter a sentença da primeira instância, alegou que haveria flagrante impossibilidade jurídica da cobrança do valor pretendido, pois a dívida teve origem em jogo. Argumentou, ainda, ter sido estimulado a continuar apostando, já que o estabelecimento lhe concedia créditos facilitados para continuar jogando. Afirmou também que foi “seduzido, corrompido, viciado no jogo, perdendo completamente o senso da realidade”.

O relator do processo, desembargador José Francisco Pellegrini, destacou que o julgamento da primeira instância, ao optar pela procedência da ação, deixou de levar em conta o caráter financista assumido pela casa de bingo. Para o magistrado, ao liberar crédito para o cliente, sob razão de ser “comercialmente importante”, incorreu em prática desautorizada.

“A atividade financeira é exclusiva das entidades devidamente estabelecidas para tanto. Deferir-se igual liberdade de ação para empresas patrocinadoras do jogo, atividade sempre suspeita e capaz de reduzir pessoas à insolvência, é dar respaldo a fins ilícitos”. E completou: “não pode a apelada invocar boa-fé ou mesmo surpresa pelo não-pagamento”.

Conforme o desembargador, o fato de o Estado permitir a prática do jogo representa a emulação da sociedade a uma atividade de lazer e diversão, não sendo, porém, “autorização para que sejam criadas estratégias pelas quais se mantém o usuário cativo, vulnerável ao fascínio do jogo, mormente quando endividado, ocasião em que passa a ver na manutenção da jogatina a esperança de pagar o que deve e quiçá, ter algum lucro”, advertiu.

O desembargador Mário José Gomes Pereira, ao referir o artigo 815 do novo Código Civil, considerou que em qualquer empréstimo realizado com o intuito de aposta ou jogo está desautorizado o reembolso. “O Código assim dispõe com o fito de desencorajar o vício e não sujeitar o jogador à exploração de um terceiro interessado nisso, como é o dono da casa de jogos que lhe empresta dinheiro sabendo do seu destino”, explicou.

Com base nos argumentos, foi extinta a ação e concedido o benefício da Assistência Judiciária Gratuita. Votou ainda o juiz-convocado ao TJ gaúcho Heleno Tregnago Saraiva.

Processo nº 70008269813

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