Livres para não pagar

TRF da 1ª Região isenta Unimed Rondônia de pagar Cofins

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18 de dezembro de 2004, 10h00

A Unimed Rondônia está isenta de recolher a Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social). A decisão é do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. O desembargador Tourinho Neto, relator do processo, indeferiu um agravo regimental da Fazenda Nacional que contestou a decisão dada anteriormente em favor da cooperativa de saúde.

Em primeira instância, a Unimed não conseguiu se livrar da cobrança da Cofins. Mas, quando o caso chegou ao TRF-1, Tourinho Neto, em decisão monocrática, atendeu o pedido da cooperativa que alegou ser inconstitucional a cobrança para entidades desse gênero.

A Fazenda Nacional não aceitou a decisão e impetrou um agravo regimental no TRF-1. O tribunal indeferiu o pedido da Fazenda.

Para o advogado da Unimed Rondônia, Breno de Paula, o acórdão do TRF-1 abre precedentes para que outras cooperativas possam pleitear a isenção no recolhimento da Cofins. “O interessante é que esse tema, mesmo no TRF-1, era uma matéria pacifica até bem pouco tempo. As entidades como a Unimed nunca conseguiam se livrar dessa cobrança. Mas, depois que o caso subiu para o Superior Tribunal de Justiça, a situação começou a mudar. Nos últimos tempos, o STJ têm sido favorável ao pleito das cooperativas nesse sentido”, ressaltou.

Para o advogado, o fato de a decisão inicial ter sido monocrática, mostra que o assunto começa a ganhar uma jurisprudência pacífica. Ele disse acreditar que, embora a questão ainda não tenha sido enfrentada pelo Supremo Tribunal Federal, a tendência é que o STF tome a mesma posição adotada pelo STJ.

Leia a íntegra do acórdão

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2004.01.00.012672-0/RO

RELATOR: O EXMO. SR. JUIZ TOURINHO NETO

AGRAVANTE: UNIMED RONDONIA – COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO

ADVOGADO: BRENO DE PAULA E OUTRO(A)

AGRAVADO: FAZENDA NACIONAL

PROCURADOR: PEDRO CAMARA RAPOSO LOPES

E M E N T A

CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. LEI COMPLEMENTAR. LEI ORDINÁRIA. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO STJ. DECISÃO. MANIFESTAÇÃO OBITER DICTUM DO STF. CPC, ART. 557, §1º–A.

1. Se a lei complementar trata de matéria própria de lei ordinária, pode por essa lei ser alterada, uma vez que sua natureza jurídica é de lei ordinária. (Assim votei, em 2001, em voto-vista na Argüição de Inconstitucionalidade 1999.01.00.0969533-2).

2. Autoriza o art. 557, § 1º–A, do CPC, que o juiz dê provimento ao recurso que estiver “em manifesto confronto com súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior. Na hipótese, do Superior Tribunal de Justiça, temos, sobre a matéria, uma súmula, e do Supremo Tribunal Federal, uma manifestação obiter dictum”. Logo, deve o juiz atentar para a súmula do STJ.

3. Agravo regimental improvido.

R E L A T Ó R I O

O EXMO. SR. JUIZ TOURINHO NETO (RELATOR):

1. A UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL), por seu ilustre Procurador Amom Albernaz Pires, agrava regimentalmente decisão da minha lavra, de fls. 32/34, que, com fundamento, no art. 557, §1º–A, do C.Pr.Civil, e com base na Súmula 276/STJ, deu provimento ao agravo de instrumento da autora, ora agravada, UNIMED RONDÔNIA – COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO.

Alega a agravante, primeiramente, que a ora agravada, no agravo de instrumento, não cumpriu o disposto no art. 526 do C.Pr.Civil.

Diz, também, que não foi intimada para apresentar contraminuta.

No mérito, sustenta que a ora agravada não demonstrou o periculum in mora.

2. É o relatório.

V O T O

O EXMO. SR. JUIZ TOURINHO NETO (RELATOR):

1. A preliminar

O parágrafo único do art. 526 do C.Pr.Civil determina que cabe ao agravado argüir e provar que o agravante não cumpriu o disposto no caput do artigo. Cabia, pois, à agravada, ora agravante, alegar e provar que a determinação legal fora descumprida.

2. A contraminuta

Se de plano ao recurso foi dado provimento, com fundamento no art. 557, § 1º-A, do C.pr. Civil, não cabia intimar-se a agravada, ora agravante, para apresentar contraminuta.

3. Tive sempre o entendimento de que se a lei complementar trata de matéria própria de lei ordinária, essa sua natureza jurídica pode ser por lei ordinária alterada. Nesse sentido, votei, em 2001, na Argüição de Inconstitucionalidade 1999.01.00.096053-2 (“Pedi vista para examinar a questão da inconstitucionalidade formal, visto que, quanto a isso, não tinha dúvida em seguir a maioria, data venia, do ilustre relator …”).

É certo que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADC 1, de, (DJ 16.0695), o relator, Min. Moreira Alves, declarou no seu voto:

A jurisprudência desta Corte, sob o império da Emenda Constitucional . 1/69 – e a Constituição atual não alterou esse sistema – se firmou no sentido de que só se exige lei complementar para as matérias para cuja disciplina a Constituição expressamente faz tal exigência, e, se porventura a matéria, disciplinada por lei cujo processo legislativo observado tenha sido o da lei complementar, não seja daquelas para que a Carta Magna exige essa modalidade legislativa, os dispositivos que tratam dela se têm como dispositivos de lei ordinária (destaquei).

Contra as decisões do STJ, que tem aplicado a Súmula 276, a União Federal tem apresentado Reclamações perante o Supremo, que as têm negado seguimento.

Na de nº 2.517, disse o Min. Joaquim Barbosa, 18.12.1993 (DJ 25.02.2004):

Pretende a reclamante conferir efeito vinculante a trecho do voto do Ministro Moreira Alves na ADC 1. É bem verdade que, no caso, o voto do Ministro Moreira Alves sagrou-se vencedor. Todavia, é certo que o efeito vinculante das decisões em Ações Declaratórias de Constitucionalidade não abrange os chamados obiter dicta, proferidos em votos específicos. No caso da ADC 1, a afirmação do Ministro Moreira Alves de que a Lei Complementar 70/91 possui natureza de lei ordinária é um típico obiter dicutm. Isso porque, da análise do acórdão da ADC 1, não se percebe a afirmação citada como fundamento determinante da decisão – não alcançando, assim, o efeito vinculante. De fato, tudo leva a crer que o afirmado pelo Ministro Moreira Alves constitui-se um verdadeiro obiter dictum. Tanto que o Ministro Carlos Velloso foi expresso em despacho na Rcl 2475: “O efeito vinculante é da decisão proferida na ação declaratória de constitucionalidade. A decisão proferida na ADC 1/DF, relatada pelo Ministro Moreira Alves, limitou-se a “conhecer em parte da ação, e, nessa parte, julgá-la procedente, para declarar, com os efeitos vinculantes previstos no parágrafo 2º do artigo 102 da Constituição Federal, na redação da Emenda Constitucional nº 3/93, a constitucionalidade dos artigos 1º, 2º e 10, bem como da expressão ‘A contribuição social sobre o faturamento de que trata esta lei complementar não extingue as atuais fontes de custeio da Seguridade Social’, contida no artigo 9º, e também da expressão ‘Esta lei complementar entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir do primeiro dia do mês seguinte aos noventa dias posteriores, àquela publicação,…’, constante do artigo 13, todos da Lei Complementar nº 70, de 30.12.1991” (RTJ 156/722).

A decisão, está-se a ver, não assentou ser a Lei Complementar 70/91 lei complementar simplesmente formal. É verdade que, no voto do Ministro Relator isso foi dito (RTJ 156/745). Trata-se, entretanto, de um obiter dictum. Também no meu voto expressei obiter dictum igual (RTJ 156/752). Assim, pelo menos ao primeiro exame, não vejo configurado o fumus boni juris que autorizaria o deferimento da liminar”.

Outro motivo impede o seguimento da presente Reclamação. Se é verdade que lei ordinária alterou o disposto na lei complementar no que tange à isenção da COFINS, também é verdade que decisão deste Tribunal na ADC 1 não julgou a alteração da lei complementar, mas a sua constitucionalidade antes da alteração. Ou seja, ainda que o afirmado pelo Ministro Moreira Alves representasse a voz da maioria – e não um obiter dictum -, a violação à autoridade do julgamento desta Corte seria, quando muito, indireta, pois não foi objeto de julgamento pelo Tribunal a alteração da lei complementar por lei ordinária posterior e nem se disse que isso deveria ter sido feito. Diante do exposto, e com base no art. 21, § 1º do RISTF, nego seguimento à Reclamação.

Um mês antes, em 19.11.2003, na Recl. 2475 MD/MG (DJ 26.11.2003), o Ministro Carlos Velloso assim decidiu:

O efeito vinculante é da decisão proferida na ação declaratória de constitucionalidade. A decisão proferida na ADC 1/DF, relatada pelo Ministro Moreira Alves, limitou-se a “conhecer em parte da ação, e, nessa parte, julgá-la procedente, para declarar, com os efeitos vinculantes previstos no parágrafo 2º do artigo 102 da Constituição Federal, na redação da Emenda Constitucional nº 3/93, a constitucionalidade dos artigos 1º, 2º e 10, bem como da expressão ‘A contribuição social sobre o faturamento de que trata esta lei complementar não extingue as atuais fontes de custeio da Seguridade Social’, contida no artigo 9º, e também da expressão ‘Esta lei complementar entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir do primeiro dia do mês seguinte aos noventa dias posteriores, àquela publicação,…’, constante do artigo 13, todos da Lei Complementar nº 70, de 30.12.1991” (RTJ 156/722). A decisão, está-se a ver, não assentou ser a Lei Complementar 70/91 lei complementar simplesmente formal. É verdade que, no voto do Ministro Relator isso foi dito (RTJ 156/745). Trata-se, entretanto, de um obiter dictum. Também no meu voto expressei obiter dictum igual (RTJ 156/752). Assim, pelo menos ao primeiro exame, não vejo configurado o fumus boni juris que autorizaria o deferimento da liminar. Do exposto, indefiro a liminar.

No voto que proferiu na ADC 1, o Ministro Velloso disse: “Esclareça-se, aliás, que esta lei é, no ponto, materialmente ordinária, quer dizer, não é materialmente, lei complementar, dado que o art. 56 do ADCT não exige lei complementar para a instituição dessa contribuição”.

Obter dictum, Ministros do Supremo foram de entendimento de que se a matéria tratada na lei complementar é de natureza a ser disciplinada por lei ordinária por lei ordinária pode ser alterada. O entendimento não integra o dispositivo da decisão, nem se sujeita ao efeito vinculante.

O Superior Tribunal de Justiça, no entanto, na questão sub exame, certo ou errado, declarou que as “as sociedade civis de prestação de serviços profissionais são isentas da Cofins, irrelevante o regime tributário adotado”.

E o art. 557, § 1º-A, do C.Pr. Civil, autoriza que o juiz dê provimento ao recurso que estiver “em manifesto confronto com súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior” (destaquei).

Do Superior Tribunal de Justiça, temos, sobre a matéria, uma súmula e do Supremo Tribunal Federal, temos uma manifestação obiter dictum.

3.1. Do periculum in mora

Alega a agravante que inexiste o periculum in mora, uma vez que a agravante, ora agravada, “vinha recolhendo a Cofins regularmente sem nenhum problema, por que só agora, de repente, não mais pode recolhê-la, sob pena de estorvos em suas atividades?”.

O fato de a empresa sempre ter recolhido a Cofins não significa que não exista, agora, o periculum in mora. Há permanentemente dano de difícil reparação, uma vez que a repetição de indébito constitui uma dolorosa via crucis.

4. Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

5. É o voto.

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