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STF suspende decreto de falência da Transbrasil, pedido pela GE.

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17 de dezembro de 2004, 15h25

Atendendo a dois recursos diferentes, o Supremo Tribunal Federal suspendeu o decreto de falência da empresa aérea Transbrasil, nesta sexta-feira (16/12). A decisão, do ministro Eros Grau, revoga provisoriamente o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo em favor da General Eletric Capital Corporation, proferido em 2002.

Em longo despacho, Eros Grau afirma que o procedimento da Justiça paulista “à primeira vista, parece teratológico”, em razão das falhas verificadas no processo. A decisão é válida até o julgamento do recurso impetrado pela Transbrasil no STF. A empresa é representada pelos advogados Valeska Teixeira e Cristiano Zanin Martins, do escritório Roberto Teixeira Advogados.

Segundo o ministro, o processo não contém provas necessárias para embasar a decisão do TJ. Isso porque, já na primeira instância da Justiça, o pedido formulado pela GE foi extinto. Ficou entendido, na ocasião, que o título devido pela Transbrasil no valor de R$ 2,7 milhões já havia sido quitado. De acordo com a defesa da companhia aérea, extratos emitidos pelo Banco do Brasil comprovam o pagamento da dívida.

Apesar disso, o TJ decretou a falência da empresa. Para Eros Grau, durante a tramitação do processo falimentar, “foram desprezadas as garantias constitucionais do devido processo legal, de ampla defesa e do contraditório”. O ministro entendeu que o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo vem impedindo, “de maneira injustificada” que a Transbrasil recorra às instâncias superiores.

A medida cautelar foi concedida em razão do risco financeiro que a empresa corre pelo bloqueio dos bens, sem que provas do não pagamento da dívida fossem apresentadas pela GE e sem que o recurso extraordinário seja apreciado pelo TJ-SP.

Bastidores

A disputa entre a Transbrasil e a General Eletric envolve bastidores que vão além da garantia de pagamento da suposta dívida. Há, no decorrer da batalha judicial, dados como o parecer de dois engenheiros que testemunharam uma alegada tentativa de coação por parte dos executivos da GE.

A empresa teria tentado convencer a companhia aérea a declarar uma de suas aeronaves como irrecuperável. O interesse da GE estaria no fato de ela ser uma das beneficiadas do seguro. Diante da recusa da Transbrasil em atender ao pedido, por poder ter sua avaliação de risco prejudicada, a GE teria promovido as retaliações que culminaram no pedido de falência.

O pedido de falência da Transbrasil pode ser considerado, ainda, juridicamente um ato de litigância de má-fé, uma vez que a legislação não admite que companhias aéreas – concessionárias de serviço público federal – sejam alvo de pedido de falência por dívida. Assim como acontece com os bancos, elas devem ser primeiro submetidas a intervenção federal e depois sofrer liquidação.

Leia a decisão do ministro Eros Grau

Ação cautelar 572-8 São Paulo

RELATOR: Min. Eros Grau

REQUERENTE: Transbrasil S/A Linhas Aéreas

ADVOGADO: Cristiano Zanin Martins e outros

REQUERIDO: General Eletric Capital Corporation

ADVOGADO: Solano de Camargo e Outros

DECISÃO: Consta dos autos que a empresa General Eletric Capital Corporation requereu a decretação da falência da companhia de aviação Transbrasil S/A Linhas Aéreas. O juízo da falência julgou antecipadamente a lide e declarou a improcedência do pedido formulado pela autora, porque o título que embasava a pretensão estava quitado e, conseqüentemente, não autorizava a decretação da quebra.

2. Contra essa sentença foi interposta apelação. A 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo deu provimento ao recurso e, incontinenti, decretou a falência da empresa Transbrasil S/A Linhas Aéreas. Não se atentou o Tribunal de Justiça para o fato de que a extinção do processo ocorreu em seu nascedouro, não existindo, por isso, instrução probatória necessária a autorizar a decisão.

3. Vencida nessa instância, a empresa Transbrasil S/A interpôs embargos infringentes contra a parte não unânime do julgado. Desprovidos os embargos, foram protocolados os recursos especial e extraordinário, que estão pendentes da prolação do primeiro juízo de admissibilidade pela Presidência daquele tribunal.

4. Ainda nessa fase processual, o relator, a quem foram distribuídos os embargos infringentes, determinou, de ofício, que o juízo da falência procedesse à execução provisória. O juízo de primeira instância comunicou ao Tribunal de Justiça a impossibilidade de cumprir a providência, porque não estar em posse dos autos principais e o ofício que lhe for remetido estar desacompanhado das cópias indispensáveis à execução. Em virtude dessa comunicação, o relator do embargos infringentes decretou o bloqueio dos bens da Transbrasil Linhas Aéreas S/A e, de imediato, nomeou o síndico da massa.

5- A companhia aérea, utilizando-se dos meios de impugnação adequados, requereu perante o Presidente do Tribunal de Justiça a concessão do efeito suspensivo aos seus recursos especial e interposto contra essa decisão foi desprovido.

6- Infrutíferas todas as intervenções processuais possíveis para, chamando o processo à ordem, restabelecer o devido processo legal, a Transbrasil Linhas Aéreas requereu junto ao Superior Tribunal de Justiça a concessão de medida cautelar para obstar a execução determinada pelo Tribunal de Justiça. Ressaltou a requerente que se impunha àquela corte tão-somente reformar a sentença que julgou antecipadamente a lide e remeter os autos ao juízo da falência para prosseguir à instrução processual. No entanto olvidou-se aquele Tribunal da imprescindibilidade da instrução probatória para decretar a quebra da empresa, da observância ao juízo natural do processo falimentar, não se atentando para primado da ampla defesa e do devido processo legal nos procedimentos administrativos e judiciais.

7- Assim, em face do risco iminente de dano irreparável e difícil reparação, tendo presentes os requisitos necessários ao deferimento cautelar, pugnou a empresa pela concessão de feito efeito suspensivo ao recurso especial, para obstar a execução provisória determinando pelo juízo a quo. O Superior Tribunal de Justiça, no entanto, indeferiu sua pretensão, sob o arguemto de que o reexame da questão implicaria revolvimento das provas coligidas para os autos. Interposto agravo regimental, foi ele também desprovido. O recurso extraordinário protocolado contra esse julgado teve indeferido seu processamento, vindo ao Supremo Tribunal Federal o agravo e instrumento — AI/STF 530.601 — , a qual dei provimento, A seguir, veio a minha relatoria a presente ação cautelar da qual companhia aérea pede a concessão de efeito suspensivo ao recurso extraordinário interposto nos autos da medida cautelar intentada perante o Superior Tribunal de Justiça. Deferi a pretensão da empresa, porque presentes os requisitos necessários (vide Ação Cautelar n. 569/STF).

8- Nova medida cautelar foi requerida pela Companhia Transbrasil Linhas Aéreas S/A. Desta feita, após reprisar os fatos que deram ensejo à causa, afirma que o recurso extraordinário interposto contra o acórdão proferido nos autos dos Embargos Infringentes encontra-se informalmente sobrestado pela Presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo há 01 (um) ano e 02 (dois) meses. Assim, somente restou a alternativa prevista o artigo 312, inciso III c/c o inciso II, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, uma vez que, injustificadamente, por mais de trinta dias, o Presidente do Tribunal de Justiça não determina o processamento do extraordinário.

9- É o relatório

10. Decido.

11. No caso em exame, está evidenciado que, de maneira injustificada, e enquanto se processa a execução provisória do acórdão proferido nos embargos infringentes, o recurso extraordinário não é processado, impedindo o acesso da parte interessada à instância superior. A hipótese desses autos encontra amparo na jurisprudência desta Corte, como se verifica da decisão exarada nos autos da media cautelar 48GO, pela qual o Ministro Carlos Velloso, em 25 de agosto de 2003, deferiu medida liminar “para fim de determinar o regular processamento do recurso extraordinário”.

12- No que diz respeito à presença dos pressupostos necessários à concessão da medida cautelar, verifico da narrativa dos fatos a estranha tramitação do processo falimentar, em que foram desprezadas as garantias constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório: relegou-se os limites das questões devolvidas ao Tribunal de Justiça pelo recurso de apelação; sem que houvesse instrução processual probatória a autorizá-la, o Tribunal de Justiça decretou a falência da empresa e incontinenti, de ofício e supondo tratar-se de hipótese em que se admite o impulso oficial do magistrado, decretou-se o bloqueio dos bens da companhia aérea pelo Juízo da falência. O procedimento, à primeira vista, parece ser teratológico.

13. Agrava-se a situação processual e põe em risco a garantia do status quo da empresa o fato de aviar-se desde logo o processo de execução provisória, sem que houvesse qualquer garantia oferecida pelo suposto credor, bem assim a resistência até então havido quanto ao processamento do recurso extraordinário que, ainda hoje, aguarda a prolação de juízo de admissibilidade.

14. Fixadas essas premissas, impõe-se assegurar a requerente o resultado útil do processo e não o perecimento de seu direito, como ressaltado pelo Ministro Carlos Velloso na Pet (Ag) nº 982/SP, decisão publicada no DJU de 14.5.2001.

15. Ante o exposto, com base no artigo 21, incisos IV e V, do RISTF, defiro a medida cautelar requerida para determinar o imediato processamento do recurso extraordinário que, injustificadamente, encontra-se sobrestado no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Para maior efetividade da liminar concedida, concedo efeito suspensivo ativo ao recurso extraordinário em processamento, para obstar a execução provisória dos acórdãos proferidos pelo Tribunal de Justiça, até o julgamento do recurso a ser submetido à exame desta Corte.

16. Intime-se.

17. Comunique-se, com urgência, ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, bem assim o juízo da 19ª Vara Cível da Capital.

Brasília, 17 de dezembro de 2004

Ministro Eros Grau

Relator.

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