No último ano as operações da Polícia Federal ganharam destaque na mídia. Não apenas pelos desdobramentos da ação, mas também pelos nomes curiosos que as investidas da PF receberam: Operação Anaconda, Albatroz, Capela, Diamante, Matusalém e, mais recentemente, Saia Justa. Se, por um lado, todas essas investigações têm chamado a atenção da opinião pública por seus resultados, prendendo políticos, policiais e até juízes, por outro têm levantado questionamento e restrições pelos métodos que adotam e pelos resultados que apresentam.
Na última quinta-feira (16/12), o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil do Pará, Ophir Cavalcante Júnior, encaminhou um ofício ao presidente nacional da entidade, Roberto Busato, reclamando das ações da Polícia Federal. Para Cavalcante, a PF vem agindo de forma inadequada nas últimas operações, “atentando contra a dignidade do ser humano”.
O presidente da OAB-PA reclama especialmente do cerceamento dos advogados, impedidos de acessar os processos que incriminam seus cleintes, e do uso indiscriminado da algema com o fito de humilhar acusados que não oferecem resistência à prisão ou apresentam alguma ameaça à ordem.
Leia o ofício do presidente da OAB do Pará
Senhor Presidente,
Honrado em cumprimentá-lo, venho manifestar a preocupação do Conselho Seccional do Pará com a condução das ações da Polícia Federal em todo o Brasil, nas diversas operações que tem realizado por determinação judicial, especialmente no que diz respeito ao uso humilhante das algemas.
Vivemos hoje, e a OAB contribuiu decisivamente para isso, em um estado democrático de Direito em que o devido processo legal e a presunção de inocência são exigências constitucionais inarredáveis.
Somos favoráveis a que se apure e puna as pessoas envolvidas em crimes de colarinho branco e outros praticados em desfavor da administração pública, no entanto, não podemos concordar com a condução das operações da Polícia Federal, que, sempre acompanhada da Imprensa (única a conhecer previamente que as operações serão encadeadas), invade casas, retira violentamente cidadãos que, na maioria das vezes, não esboçam qualquer reação e que ainda não foram condenados judicialmente e os algemam como se fossem bandidos da mais alta periculosidade, permitindo que sejam fotografados e filmados, gerando um prejuízo incalculável aos mesmos por atentar, sem que haja condenação penal transitada em julgado (princípio da presunção de inocência), contra a norma constitucional que resguarda a proteção à imagem (art. 7º, X, CF).
Não! Não pode ser essa postura de uma Polícia, como afirma o Ministro da Justiça, republicana, pois tal conduta não se adequa aos princípios democráticos do estado de direito e atenta contra a dignidade do ser humano.
Quer nos parecer que estamos retrocedendo, voltando ao tempo em que a Polícia prendia para averiguar, pois em muitas dessas operações não há provas consistentes, cabendo, neste aspecto, uma ampla discussão com as Associações dos Juízes e dos Procuradores Federais a respeito desses procedimentos.
Por outro lado, os advogados têm sido vítimas dessas ações quando não se lhes permite defender seus clientes sob o argumento do sigilo. Que os processos tenham caráter sigiloso é natural em situações dessa natureza, no entanto, não se pode violar o princípio do devido processo legal e da ampla defesa, impedindo que os advogados, legalmente constituídos, tenham acesso aos processos para conhecer os fatos e promover a defesa de seus constituintes.
Assim, Sr. Presidente, a OAB Pará propõe que se abra, em todo o Brasil, uma grande discussão sobre esses temas, sob a coordenação do Conselho Federal com a participação do Ministério da Justiça (Polícia Federal) e Associações de Juízes e de Procuradores Federais com vistas a regulamentar os procedimentos tendo sempre como parâmetro a Constituição Federal.
Atenciosamente,
Ophir Cavalcante Junior
Presidente da OAB-PA