Pegue e pague

Telemar proibida de cobrar assinatura básica de telefonia

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15 de dezembro de 2004, 21h02

A cobrança da assinatura básica de telefonia infringe o sistema jurídico, pois não há lei que autorize a cobrança conjunta de pulsos e assinatura. Ela caracteriza, ainda, prática abusiva, proibida pelo Código de Defesa do Consumidor. Com esse entendimento, o juiz Josias Menescal de Oliveira, da 12ª Vara Cível de Fortaleza, proibiu a cobrança da taxa pela Telemar e fixou multa de R$ 50 diários caso seja descumprida a decisão.

Para Menescal, a tarifa mensal viola a lei do consumidor, segundo a qual ele só é obrigado a pagar por aquilo que efetivamente consumiu. A assinatura básica, afirma, também “frustra qualquer tentativa do consumidor de economizar nos gastos com o telefone fixo, posto que se vê obrigado a pagar por um consumo mínimo pré-determinado, ainda que nada tenha utilizado” o serviço.

No entendimento do juiz, a suspensão da tarifa não deve ser vista como prejudicial às empresas de telefonia. Isso porque, para Menescal, a cobrança tem levado consumidores a optar pelos serviços de telefone celular pré-pago, que não prevê a taxa. Em última analise, diz ele na decisão, o ato reduz “o número de consumidores, fato que fatalmente implicará numa elevação dos custos para os ainda assinantes, transformando-se em um círculo infinito, dado que a diminuição contínua do número de assinantes implicará em outros aumentos”.

Além de se basear no Código de Defesa do Consumidor, Menescal fundamentou a decisão na existência de “dano irreparável” à consumidora, segundo ele, sem condições financeiras de arcar com os custos da tarifa básica.

A cobrança da assinatura mensal nas contas telefônicas tem sido motivo de freqüentes contestações na Justiça em vários estados do país. Por ora, a Justiça não chegou a um consenso em suas decisões. A maioria dos consumidores que recorrem à Justiça alega que a cobrança de assinatura mensal é ilícita por falta de fundamento legal e contratual.

As empresas de telefonia, por outro lado, sustentam que a assinatura é fundamental para a prestação e universalização dos serviços de telefonia fixa. Argumenta também que essa cobrança ocorre em praticamente todos os países do mundo e é autorizada pela legislação federal.

Leia a íntegra da decisão

PODER JUDICIÁRIO

ESTADO DO CEARÁ

COMARCA DE FORTALEZA

12ª VARA CÍVEL

Ref.:

Processo: 3701/04 (2004.02.59445-2)

Ação: Declaratória de Nulidade

Autora: Narlia Gomes de Matos Mota

D E C I S Ã O

R. H.

Vistos, em permanente e contínua correição.

Trata-se de ação declaratória de nulidade movida por NALIA GOMES DE MATOS MOTA contra TELEMAR NORTE LESTE S/A, todos devidamente qualificados.

Afirma a Autora haver firmado contrato de prestação de serviços de telefonia com a Ré há mais de 07 anos. Sustenta haver sido obrigada ao pagamento mensal de uma tarifa fixa que independe da efetiva utilização do serviço. Alega, por fim, ser ilegal a cobrança da tarifa supramencionada, motivo pelo qual requereu, em sede de tutela antecipada, a suspensão da cobrança da tarifa mensal. Requer, ainda, a apresentação pela Ré do contrato firmado entre as partes, sob a alegação de nunca ter lhe sido fornecida uma cópia.

Ao pedido juntou instrumento procuratório, fl. 13, declaração de pobreza, fl. 13, bem como a documentação de fls. 14 usque 18.

Manifestação do Parquet às fls. 21/22, postulando pela citação da Promovida.

Eis o que de importante havia por ser relatado.

Passo a decidir sobre o pedido de tutela antecipada.

Diante da declaração à fl. 13, bem como pelo fato de a Autora estar sendo representada pela Defensoria Pública do Estado, concedo, de pronto, os benefícios da justiça gratuita.

A antecipação da tutela encontra-se prevista no art. 273, verbis:

“Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: (Redação dada pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou (Redação dada pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. (Redação dada pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

§ 1o Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

§ 2o Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

§ 3o A execução da tutela antecipada observará, no que couber, o disposto nos incisos II e III do art. 588. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)


§ 3o A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4o e 5o, e 461-A. (Redação dada pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002)

§ 4o A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

§ 5o Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

§ 6o A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002)

§ 7o Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002) ”

De princípio, devo reconhecer tratar-se a presente, evidentemente, de relação de consumo, onde figura a parte Autora como consumidora. Aplicável, in casu, o Código de Defesa do Consumidor. Defiro, de plano, a inversão do ônus probante, previsto no art. 6º, inc. VIII do Código de Defesa do Consumidor, diante da hipossuficiência da Demandante, pois evidente a impossibilidade material pela mesma de produzir prova quanto aos serviços prestados.

Sustenta a Autora estar sendo compelida ao pagamento mensal de um valor mínimo, denominado “Assinatura Residencial”, a partir do qual lhe é concedido o direito de uso de 100 (cem) pulsos telefônicos.

Na verdade, a “Tarifa de Assinatura Residencial” nada mais é que uma condição imposta pela concessionária do serviço de telefonia, de forma que o consumidor é obrigado a adquirir um pacote mínimo de serviços. Isto porque, mesmo que o serviço não seja simplesmente efetivado, todo mês a cobrança é realizada, sob a alegação de ser concedida uma franquia de 100 pulsos.

Ora, tal atitude vulnera a lei consumerista, segundo a qual o consumidor só está obrigado a pagar por aquilo que efetivamente consumiu.

Forçoso, assim, reconhecer que essa conduta caracteriza prática abusiva, proibida pelo Código de Defesa do Consumidor.

A este respeito, veja-se o art. 39 de tal avançada Codificação:

“Art. 39 – É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços dentre outras práticas abusivas:

I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos.” (grifos não existentes no original)

Como se vê, a cobrança da referida “Assinatura Residencial” é ilegal, vez que abusiva.

Essa cobrança frustra qualquer tentativa do consumidor de economizar nos gastos com o telefone fixo, posto que se vê obrigado a pagar por um consumo mínimo pré-determinado, ainda que NADA tenha utilizado do serviço.

Tal cobrança, aliás, está sendo a maior responsável pela “fuga” dos consumidores, principalmente de mais baixa renda, dos telefones fixos, em direção aos celulares pré-pagos, onde inexiste tal cobrança, pois, principalmente para estes, tal cobrança mensal é um fardo praticamente impossível de ser carregado, incompatível e inconciliável com o estrito e minguado orçamento doméstico.

Sob tal prisma, a suspensão, embora possa, à primeira vista, ser prejudicial às empresas de telecomunicação fixa, pode, em última instância, ser às mesmas até benéfica, dado que impediria tal migração, o que, em última análise, está a reduzir o número de consumidores, fato que fatalmente implicará numa elevação dos custos para os ainda assinantes, transformando-se em um círculo infinito, dado que a diminuição contínua do número de assinantes implicará em outros aumentos, o que facilmente poderá prejudicar a própria continuidade do fornecimento do serviço.

O Código de Defesa do Consumidor faz clara referência às obrigações consideradas abusivas e exageradas contra o consumidor, e que, conforme o próprio Código determina, são nulas de pleno direito. Presume-se abusiva, entre outros casos, a vantagem que ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence.

Assim sendo, evidencia-se que a cobrança de “Assinatura Residencial” infringe o sistema jurídico, pois não há Lei autorizadora da cobrança conjunta de pulsos e assinatura.

Na verdade, a questão foi decidida por mera portaria da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) que, infelizmente, é de se reconhecer, tem atuado muito mais como extremosa defensora das empresas de telecomunicação, em detrimento dos consumidores, a ponto de ter sido, recentemente, a ÚNICA a recorrer contra decisão do Eg. TRF da 5ª Região que, mui acertadamente, suspendeu o prazo de validade dos cartões dos celulares pré-pagos.


A questão do fim da assinatura mensal já vem sendo ardorosamente debatida em outros Estados da Federação, tendo sido, inclusive, objeto de recente Ação Civil Pública no Estado de São Paulo, onde foi concedida liminar determinando a suspensão da cobrança naquele Estado. A Ação Civil Pública com pedido de liminar contra a empresa Telefônica foi ajuizada pelo Centro de Defesa do Consumidor e Cidadania – CDCDN.

Transcrevo, então, a decisão do ilustre Colega Paulista:

“1ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE CATANDUVA. PROCESSO Nº 1.597/2004-07-12

AUTOR: CENTRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E CADADANIA – CDCDN

RÉ: – TELECOMUNICAÇÕES DE SÃO PAULO S/A – TELESP – TELEFÔNICA

Trata-se de ação ordinária declaratória de nulidade com repetição de indébito, presente pedido de antecipação de tutela.

Celebração de contrato indicado na inicial restou comprovado, não pelo instrumento em si, outrossim, por documentos que levam a esta conclusão, mormente o que diz respeito à cobrança da dita assinatura mensal, a qual se afigura sem o devido suporte necessário, presentes assim, os requisitos ao deferimento da tutela em antecipação, mormente reversibilidade da medida deferida.

Não se olvida o preconizado na Lei nº 9.472/97, ou seja, a Lei Geral das Telecomunicações, mormente o previsto no inciso VI, do artigo 1º, art. 93 e 103, vez que na hipótese em tela, não teria a prestação do serviço que daria ensejo à cobrança, além do mais, por meio de tarifa (preço público).

Faço consignar só fazer presente o fundado receio de ser dificultosa a reparação do dano, vez que volume dos ganhos da ré, se faz como consabido em grande proporção no que diz respeito à cobrança da dita assinatura e, caso não mais contando com dita fonte, não há saber-se como poderia efetivamente honrar com as devoluções a quem estaria obrigada na eventualidade do pedido inicial ser julgado procedente.

De outra parte, caracterizada a relação de consumo, de imposição a aplicação no caso, do Código de Defesa do Consumidor, inclusive com a inversão do ônus da prova pela hipossuficiência técnica por parte do autor (a), presente a impossibilidade material pelo mesmo de produzir prova, adrede de posse da ré, quanto ao serviço já prestado.

Assim sendo, defiro a tutela antecipada na forma requerida, citando-se como pleiteado na inicial.

Catanduva, 23 de junho de 2004.

PAULO CÍCERO AUGUSTO PEREIRA

Juiz de Direito”

Em assim sendo, é evidente que há o fundado receio de dano irreparável ou, ao menos, de difícil reparação, dado que a Autora, reconhecidamente hipossuficiente, certamente sofrerá sério abalo financeiro se continuar a arcar com esta cobrança, que, ademais, é vedada pelo CDC.

Por outro lado, não vislumbro qualquer possibilidade de irreversibilidade da medida visto que a Autora, beneficiada com tal suspensão, certamente continuará a fazer uso dos serviços da Ré que, alem disto, tem, com seu imenso faturamento, muito maiores condições de ultimar as medidas para efetuar a cobrança de tais valores, se vencedora a final da demanda.

Por tudo o que foi exposto e tendo em vista estarem presentes os requisitos necessários à concessão de antecipação de tutela, DEFIRO o pleito da Autora, determinando à parte RÉ que SUSPENDA IMEDIATAMENTE a cobrança da tarifa denominada “ASSINATURA RESIDENCIAL”, restando autorizada, única e exclusivamente, a cobrança pelo serviço efetivamente utilizado pela Autora. Para o caso de descumprimento da presente decisão arbitro multa diária no valor de R$50,00 (cinqüenta reais). No prazo de contestação deverá a Ré, ainda, apresentar cópia do contrato celebrado entre as partes sob pena de ser aplicada a mesma multa já estipulada.

Cite-se a Ré para, querendo, apresentar defesa no prazo de 15 (quinze dias), sob pena de revelia, intimando-a, mais, para que tomem conhecimento do teor da presente decisão.

Como a Autora é representada por douto membro da sofrida Defensoria Pública, determino sua intimação pessoal, bem como de seu ilustre Patrono, da presente decisão.

Dê-se, ainda, ciência ao MP, por intermédio de sua douta Representante nesta Vara.

Fortaleza, 15 de dezembro de 2004.

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