Confisco on line

Juízes e especialistas repelem bloqueio de faturamento

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15 de dezembro de 2004, 10h16

A Academia Brasileira de Direito Tributário lançou esta semana um alerta sobre um movimento que põe em risco a combalida saúde de empresas em recuperação econômica. O perigo, alerta o diretor da ABDT, Marcelo Campos, consiste na tentativa de indisponibilizar ou penhorar o faturamento de empresas em caso de dívida mesmo quando existem outras alternativas ou quando o débito é apenas suposição.

Na última quinta-feira (9/12), a base petista no Congresso fez a sua terceira tentativa para adotar o confisco do faturamento como mecanismo de rotina. Tentou-se emendar a Medida Provisória 216, que trata de desconto de crédito na contribuição social sobre lucro líquido, PIS/Pasep e Cofins.

Na semana anterior, usando uma MP que trata da modernização portuária, a 206, os petistas, na primeira investida tentaram emplacar a penhora de 30% do faturamento. Na segunda, 15%. A proposta foi repelida até mesmo por setores alinhados com o governo, mas a retenção ou penhora de faturamento continua pairando como uma ameaça à recuperação de empresas em dificuldades.

Para o ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio, “não se pode chegar ao extremo de penhorar algo que inviabilize a vida civil do suposto devedor”. Em especial, assinala o ministro, quando existe a alternativa de outros bens a indisponibilizar. “Impedir a sobrevivência do devedor, matar a empresa não atende o interesse de ninguém”. Na mesma linha, identificam a excepcionalidade da medida os ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes.

Para o constitucionalista Ives Gandra Martins, bloquear o faturamento de empresa fora da execução, sem que a dívida seja apurada ou definida “é um absurdo total”. Invocando o inciso LV do artigo 5º da Constituição, Gandra Martins aponta flagrante violação da Carta, já que, sem recursos, a empresa tem o seu direito de defesa reduzido.

Na mesma linha, em decisão que derrubou a indisponibilidade de faturamento de uma empresa, o ministro Franciulli Netto, do Superior Tribunal de Justiça, assinalou que o entendimento do tribunal é o de que “a constrição judicial sobre o faturamento da empresa pode inviabilizá-la”, o que frustra, por certo “a possibilidade de a devedora enfrentar seus débitos, comprometendo a sua estabilidade financeira”.

Segundo Franciulli Neto, “é firme a orientação deste Sodalício, esposada em inúmeros julgados desta Corte, no sentido de que a penhora sobre o faturamento da empresa somente poderá ocorrer em hipóteses excepcionais. Dessa forma, a penhora sobre o faturamento bruto mensal da empresa executada somente pode ocorrer em último caso”.

O tributarista Raul Haidar afirma que a faixa de bloqueio de 30% do faturamento como se tentou impor na MP 206 “é o mesmo que decretar a falência da empresa”, argumenta, lembrando que “empresa nenhuma, atualmente, tem lucro de 30%”.

Segundo o jornal Valor desta quarta-feira (15/12), o governo desistiu “por enquanto” desse objetivo. Esse por enquanto, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, é o período do recesso.

Leia a notícia publicada no jornal Valor Econômico

Governo quer penhora de faturamento na legislação

Josette Goulart e Zínia Baeta

De São Paulo

O governo desistiu, por enquanto, de inserir em lei a previsão de penhora do faturamento de empresas devedoras do fisco. Mas ainda encampa a idéia e pretende apresentá-la novamente no Congresso Nacional. Em menos de um mês, foram três tentativas de inserir em duas medidas provisórias a previsão legal da penhora, mas houve uma chiadeira da bancada dos empresários na Câmara dos Deputados e os dispositivos que permitiam tal procedimento foram retirados.

As duas primeiras foram tentativas de inserir emendas à Medida Provisória nº 206, que trata de questões tributárias do mercado financeiro e de capitais e cria o Regime Tributário para Incentivo à Modernização e Ampliação da Estrutura Portuária (Reporto). A primeira proposta era de fazer a penhora sobre 30% do faturamento e em seguida reformulou-se o texto para um percentual de 15%.

A terceira tentativa ocorreu na semana passada, quando o relator da Medida Provisória nº 219 – que dispõe sobre o desconto de crédito na apuração da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e Contribuição para o PIS/Pasep e Cofins não cumulativas – propôs a inserção de um artigo que previa a penhora, sem definir um percentual, e também previa que o fiel depositário seria o próprio dono da empresa.

As medidas são reinvidicações da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Apesar de sair de cena no momento, a PGFN não desistiu da idéia e pretende retoma-la em um momento mais tranqüilo. “Houve um acordo para a retirada da proposta de pauta porque vimos que este fim de ano não era o momento adequado para se discutir o assunto”, afirma o procurador-geral da Fazenda Nacional, Manoel Felipe Rêgo Brandão.

Segundo Brandão, a questão é polêmica, mas não é nova. O Poder Judiciário, segundo ele, autoriza a penhora do faturamento, normalmente no percentual de 30%, depois que a empresa devedora não pagou o débito ou apresentou bens. O problema em relação à questão é que as decisões judiciais determinam que a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional seja a depositária, ou seja, tenha alguém para acompanhar o faturamento. “O que na prática é inviável”, afirma Brandão. Por esta razão, a procuradoria busca uma inserção em texto legal determinando que o empresário seja o depositário e não a procuradoria.

Alguns tributaristas protestam e líderes de empresariais dizem que a medida pode gerar uma quebradeira nas empresas que teriam confiscados seus faturamentos. Mas o procurador da Fazenda frisa que a penhora só ocorre quando o contribuinte já se defendeu e perdeu na Justiça. E, primeiramente, o juiz cita a parte para pagar ou oferecer bens à penhora. A penhora do faturamento ocorreria apenas em último caso.

O advogado tributarista Raul Haidar critica a posição da procuradoria e diz que se a intenção é coibir sonegação, a medida não ajudará. “As empresas que sonegam deliberadamente têm mecanismos para fugir desse controle, até porque escondem faturamento”, diz Haidar. Além disso, o advogado diz que, como trata-se de uma lei federal, a mudança da legislação não deveria ser por uma medida provisória e que as alterações deveriam ser feitas pelo Congresso Nacional por meio de um projeto de lei.

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