Advogado indispensável

Juiz garante presença de advogado em Juizado Especial Federal

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26 de agosto de 2004, 15h05

A representação pessoal pelo autor de ações impetradas nos Juizados Especiais Federais deve ter limites para que não haja colisão com o disposto no artigo 133 da Constituição Federal, que afirma que o advogado é indispensável à administração da Justiça.

O entendimento é do juiz federal João Batista Lazzari, da Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais. Ele decidiu anular um processo em que a autora foi representada em juízo por um contador, embora a lei dos JEFs permita que o autor ajuíze ação pessoalmente ou por meio de representante.

O presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil de Santa Catarina, Adriano Zanotto, disse que a falta de obrigatoriedade da presença do advogado é um flagrante desrespeito às partes, que deixam de contar com um profissional habilitado para garantir que seus direitos não sejam violados.

A OAB já propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade para mudar os dispositivos das Leis 9.099/95 e 10.259/01. A OAB de Santa Catarina também marcou presença no debate e elaborou minuta de projeto de lei, que torna obrigatória a presença de advogado nos Juizados Especiais. O PL foi encaminhado em 2003 ao deputado federal catarinense Cláudio Vignatti.

Leia a íntegra do voto do relator:

Trata-se de ação previdenciária em que o Autor postula:

a) o reconhecimento do labor rural nos períodos de 11.07.1968 a 30.11.1978 e de 01.06.1982 a 30.10.1983;

b) o reconhecimento da atividade exercida em condições especiais nos períodos de 01.12.1989 a 30.12.1994, com direito à conversão para tempo comum;

c) a averbação do labor urbano nos períodos de 02.01.1995 a 31.01.1999 e de 01.03.1999 a 31.07.1999;

d) a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/ contribuição;

e) a condenação do INSS ao pagamento das parcelas em atraso.

O Magistrado a quo julgou o pedido parcialmente procedente, para:

a) reconhecer o tempo de atividade rural nos períodos de 11.07.1968 a 10.07.1970 e de 01.01.1977 a 30.11.1978;

b) reconhecer o labor urbano nos períodos de 02.01.1995 a 31.01.1999 e de 01.03.1999 a 31.07.1999;

c) reconhecer a especialidade da atividade exercida de 01.12.1989 a 30.12.1994;

d) condenar o INSS a conceder a aposentadoria por tempo de serviço proporcional;

e) condenar o INSS a pagar das parcelas em atraso.

O INSS interpôs recurso inominado. O autor apresentou contra-razões. VOTO Da análise da inicial observo que o autor foi representado pelo contador XX , com endereço profissional em XX (SC), ao qual foi outorgado mandato procuratório nos seguintes termos (fl. 11):

“PODERES: Poderes para representá-lo no foro em geral, podendo transigir, firmar compromissos e acordos, dar e receber quitação, especialmente para propor ação previdenciária contra o INSS, no Juizado Especial Federal Previdenciário, podendo interpor recursos, praticar enfim, todos os atos inerentes ao bom desempenho do presente mandato, não podendo o outorgado, em hipótese alguma, atuar em nome do outorgante, em outros processos judiciais ou administrativos que não digam respeito a ação supra mencionada, enfim praticar todos os demais atos necessários ao fiel e cabal cumprimento do presente mandato, o que tudo dará por bom, firma e valioso”.

O artigo 10, caput, da lei nº 10.259/2001 estabelece que:

“As partes poderão designar, por escrito, representantes para a causa, advogado ou não”. Norma similar encontra-se na lei nº 9.099/95, que prevê: “Art. 9º. Nas causas de valor até vinte salários mínimos, as partes comparecerão pessoalmente, podendo ser assistidas por advogado; nas de valor superior, a assistência é obrigatória”.

Referidas normas objetivam democratizar e simplificar o acesso ao judiciário, especialmente às pessoas desprovidas de recursos para contratar profissional habilitado a postular em juízo. Essa situação leva em consideração a precária assistência judiciária prestada aos cidadãos pelo Estado. Muito embora o texto legal que instituiu os JEFs faculte ao Autor ajuizar o seu pleito pessoalmente ou por representante, essa representação deve ter limites para que não haja colisão com o disposto no art. 133 da Constituição Federal, segundo a qual o advogado é indispensável à administração da justiça. Ou seja, a exceção à regra de que o advogado é essencial à administração da justiça, merece interpretação restritiva no sentido de tão-somente franquear-se ao Autor o ajuizamento da própria ação ou, ainda, por pessoa que o represente, nos casos de impossibilidade de locomoção ou de dificuldade de expor sua pretensão.

O juiz federal Antônio F.S. do Amaral e Silva comenta esse dispositivo assinalando que: “Os representantes devem ser parentes ou pessoas conhecidas do autor(a), de sua confiança, que possam representá-lo na impossibilidade de comparecer na audiência.”

Dessa forma, a admissão da representação da parte autora por outros profissionais que não o advogado, tais como contadores ou despachantes, implica violação direta do art. 133 da Constituição Federal e ao art. 1º da Lei nº 8.906/1994, caracterizando o exercício ilegal da profissão. Por sua vez, a representação em Juízo por profissionais não habilitados implica a nulidade dos atos processuais, a teor do que dispõe o art. 4º da Lei 8.906/94. Sendo assim, concluo que o processo deve ser anulado pelo fato de o Autor haver sido representado por Contador, desde o pedido inicial até o momento em que tomou ciência da interposição do Recurso Inominado pelo INSS, quando então constituiu advogado para apresentar contra-razões (fl. 126).

Em face do exposto, voto no sentido de anular o processo e determinar o retorno dos autos ao Juizado de origem, a fim de que o autor seja intimado para ratificar os termos da petição inicial por intermédio de seu advogado, constituído à fl. 126, ou para que o próprio autor subscreva a petição inicial.

Sala de Sessões da Turma Recursal.

Florianópolis, 19 de agosto de 2004.

João Batista Lazzari Juiz federal.

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