Reforma do Judiciário

Súmula vinculante é criticada em encontro de advogados

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25 de agosto de 2004, 21h28

A súmula vinculante engessa a criatividade dos juízes de primeiro grau, que não poderão mais julgar de forma contrária ao que já decidiu o STF. Torna, ainda, inviáveis mudanças ou modernização na jurisprudência e no Direito brasileiro.

A opinião é do presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Roberto Busato, e dos presidentes das Seccionais da Ordem na região Nordeste e no Rio de Janeiro, que criticaram, nesta quarta-feira (25/8), a adoção da súmula para o Supremo Tribunal Federal. As opiniões foram expressas no encerramento da reunião do Colégio de Presidentes das Seccionais da OAB da Região Nordeste.

Se o Legislativo aprovar a súmula, estará, segundo Busato, “abrindo mão de sua função de legislar”. Para ele, o país não está preparado para adotar tal medida. “Uma decisão judicial com força vinculante criará outro viés muito perigoso para a construção jurídica do país”, que já teve amputado parte de suas funções legislativas com a aprovação das medidas provisórias.

A utilização da súmula vinculante para o STF já foi aprovada no texto base da Reforma do Poder Judiciário (Proposta de Emenda Constitucional 29/00), mas sua aplicação ampla é um dos 165 destaques ainda a serem examinados no Plenário do Senado Federal.

Veja a opinião dos presidentes sobre a súmula

Marcos Bernardes de Melo (Alagoas)

“A súmula vinculante é o maior passo para trás que o Direito brasileiro já deu. Desde o tempo das colônias, não existe nada pior para o desenvolvimento do nosso Direito do que tal mecanismo. Ela acaba totalmente com a possibilidade de criatividade por parte do advogado. No momento em que os tribunais superiores se dizem com o direito de decidir politicamente, vão estabelecer súmulas para o país, o que é um absurdo. O advogado, que hoje tem a liberdade de propor ações, de formular questões e de discutir as teses, ficará totalmente inibido, situação que só servirá para prejudicar o desenvolvimento do Direito no Brasil”

Dinailton Oliveira (Bahia)

“A súmula vinculante é um desserviço à inteligência do advogado, do magistrado, do promotor, do procurador, de todos os operadores do Direito. Ela não serve nem mesmo ao seu propósito, que é o de diminuir o volume de recursos para os tribunais superiores. Poderíamos utilizar outra metodologia, até mesmo por meio da criatividade, para diminuir o problema do volume de recursos, em especial para o Supremo Tribunal Federal. Não acredito que a súmula vinculante vai obter o resultado esperado por quem a idealizou. Isso, o tempo provará”

Hélio das Chagas Leitão Neto (Ceará)

“Sou visceralmente contra a súmula vinculante porque entendo que ela engessa o poder criativo do magistrado de primeiro grau. Uma vez a súmula admitida, nós teremos aquilo que se pode definir bem como a ditadura das cúpulas judiciárias. Isso efetivamente não seria bom para a democracia brasileira. Entendemos a preocupação com a celeridade processual, pois sabemos que a morosidade no trâmite dos processos é o grande câncer do Poder Judiciário. Mas a súmula vinculante definitivamente não é o melhor caminho para isso porque macula a magistratura de primeiro grau em seu poder criativo”

José Caldas Góis (Maranhão)

“Sou contra a adoção da súmula vinculante. Acredito que ela engessa os juízes de primeira instância. Não é boa para os advogados. Não é boa para a sociedade e muito menos para a Justiça brasileira”

Arlindo Carolino Delgado (Paraíba)

“Estou assustado diante dessa decisão recente do Supremo, que praticamente rasgou a Constituição. Se tivermos a súmula vinculante valendo, podemos dizer, com toda a certeza, que a Justiça brasileira ficará engessada. Sou daqueles que defendem uma Justiça absolutamente livre, que tenha a contribuição de todos os seus integrantes e que a cúpula dos tribunais seja apenas o retrato da vontade da expressão jurídica e da Justiça que existe no país, manifestada por meio de todos os juízes. Sou totalmente contra a adoção da súmula vinculante e não vejo nenhuma razão que a justifique. O emperramento das ações nos tribunais superiores decorre, na maioria das vezes, da imprudência do governo, que recorre de tudo e por tudo. Se adotarmos uma outra filosofia de trabalho, não haverá a necessidade de se pensar em súmula vinculante com o objetivo de agilizar a Justiça“

Octávio Augusto Brandão Gomes (Rio de Janeiro)

“A súmula vinculante não resolverá o problema da morosidade do Judiciário. Não se pode impedir que um juiz de primeira instância, que é quem lida diretamente com o processo e o manuseia toda hora, que ouve as testemunhas, fica frente a frente com as partes, seja tolhido e impedido de julgar conforme a sua consciência e com as provas dos autos. Temos é que ter um governo que pare de recorrer indiscriminadamente e de entulhar o STJ e o STF com recursos meramente protelatórios. Mais de 75% dos recursos são causas do governo e o pior: em cima de decisões mais do que sacramentadas. Então, a súmula vinculante é mesmo um retrocesso. O Direito é dinâmico, quem faz o Direito são os advogados e os juízes e ele está sempre mudando, de acordo com o momento e com a sociedade. Temos, cada vez mais, que incentivar o progresso da jurisprudência, pois a jurisprudência é dinâmica e a doutrina também. E como é que elas se formam? Por meio do processo, da discussão que se trava entre o autor da ação e o réu e a decisão do juiz de primeira instância, que está sempre frente a frente com as partes. Repito: a súmula vinculante não vai resolver a morosidade do Judiciário. O que precisamos realmente é de um Judiciário que abra mais cedo, de um Juizado Especial com campos maiores de atuação, melhor infra-estrutura e pessoal para a Justiça. Dinheiro? Os caras do Rio de Janeiro têm muito, mas não iniciam o expediente às 9h da manhã, não fecham às 18h nem fazem dois turnos. Nos Juizados também há o caos, já que eles não possuem a menor infra-estrutura”.

Joanilson de Paula Rego (Rio Grande do Norte)

“Sempre achei que a súmula vinculante retira o que existe de principal no Direito, que é a proximidade do Direito com os fatos e com a realidade das pessoas. É a primeira instância que realmente tem condição de colocar na realidade a teoria do Direito e as leis. Agora, recentemente, deu para imaginar o que será a súmula vinculante depois dessa decisão do Supremo Tribunal Federal (taxação dos inativos) que, em até certo ponto, decretou a insegurança jurídica no Brasil quando atingiu cláusulas pétreas da Constituição. Diante disso, a súmula vinculante ainda vai receber mais críticas por parte das pessoas que praticam o Direito, prezam a liberdade e anseiam por um Judiciário livre”

Henri Clay Santos Andrade (Sergipe)

“A súmula vinculante será extremamente prejudicial para a dinâmica do Direito porque engessa o pensamento crítico e jurídico do próprio Poder Judiciário na sua base e a criação e interpretação do Direito. A súmula vinculante, da forma em que está exposta no projeto da Reforma, não passa de uma ditadura do Supremo Tribunal Federal sobre os juízes de primeira instância”.

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