Tempo suficiente

Delegado candidato pode se afastar quatro meses antes das eleições

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23 de agosto de 2004, 19h32

Delegado de polícia que se afasta do cargo quatro meses antes do pleito não pode ter o registro de candidatura negado. A decisão foi tomada pelo Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso.

Os desembargadores reformaram sentença da 15ª Zona Eleitoral, de São Félix do Araguaia, que havia negado o registro ao delegado Marco Antônio Alves Fonseca, candidato a vereador do município, com o argumento de que o período de afastamento teria de ser de seis meses.

O relator do recurso, desembargador Marcelo de Souza de Barros, afirmou que “a administração pública deve ser preservada e os afastamentos devem ser os mais curtos possíveis”. Ele citou também a Resolução 19.491, do Tribunal Superior Eleitoral, que ratifica o entendimento.

Segundo Marcelo de Barros, “a atividade política partidária de servidores públicos não deve ser razão e motivo para se conceder férias longas ou licenças eternas para funcionários que, como se sabe, durante os prazos de desincompatibilização continuam recebendo normalmente do erário, sem prestar a contrapartida da prestação dos seus serviços, com autorização da lei”.

Leia a decisão

TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL

PROCESSO Nº: 1019/04 – CLASSE V

RECORRENTE: MARCO ANTÔNIO ALVES FONSECA

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso eleitoral interposto por Marco Antônio Alves Fonseca, contra decisão do Juízo da 15ª Zona Eleitoral – São Félix do Araguaia, que julgou improcedente o pedido de registro de candidatura do recorrente, nos termos da Lei Complementar nº 64/90 (artigo 1º, inciso VII, alínea “b”).

Inconformado, o recorrente sustenta que a decisão merece reforma, pois preencheu os requisitos de elegibilidade, porque afastou das suas funções de Delegado de Polícia 04 (quatro) meses antes do pleito.

O parquet, em contra-razões, requer a improcedência do recurso.

A Procuradoria Regional Eleitoral, em parecer de lavra do Dr. Mário Lúcio de Avelar, manifesta pelo conhecimento e improvimento do recurso.

É o relatório.

MARCELO DE SOUZA DE BARROS

RELATOR

VOTO

Os autos revelam que o recorrente – Delegado de Polícia Civil – aportou na Justiça Eleitoral buscando o registro de sua candidatura à Câmara Municipal, pleito indeferido pela sentença de fls. 80/85, por ter o juízo a quo reconhecido a ocorrência de desincompatibilização em prazo menor do que estipula a Lei das Inelegibilidades, vez que o irresignado deixou o cargo apenas 04 (quatro) meses antes do pleito, quando o correto — no entendimento da magistrada — seria ele afastar-se com 06 (seis) meses de antecedência.

A questão não é de fácil deslinde, valendo esclarecer ao Egrégio Plenário que o Colendo Tribunal Superior Eleitoral já expediu várias orientações sobre o tema, por meio de instruções e julgados.

Vejamos o conteúdo da Resolução nº 19.491, expedida em 28 de março de 1.996, resultado da Consulta Eleitoral nº 112, do Distrito Federal, da qual foi relator o Ministro Ilmar Galvão, cuja parte interessante ao deslinde desta causa está vazado nos seguintes termos:

ELEIÇÃO PARA VEREADOR. DESINCOMPATIBILIZAÇÕES. AFASTAMENTOS.

Os membros do Ministério Público e Defensoria Pública em exercício na Comarca, deverão afastar-se nos quatro meses anteriores ao pleito, sem prejuízo dos vencimentos integrais (art 1º, inc. VII, “b”, c/c inc. IV, “c”, da LC 64/90);

As autoridades policiais, civis ou militares, com exercício no Município, também deverão afastar-se, nas mesmas condições, quatro meses antes do pleito (art 1º, inc. VII, “b”, c/c inc. IV, “c”, da LC 64/90).

Como se vê, a orientação transcrita revela a viabilidade do acolhimento do recurso aforado, sem embargos de outras posições — jurisprudenciais e divergentes — sobre o tema.

Estou convencido de que o prazo para afastamento do delegado de polícia para concorrer à vereança é de quatro meses, exatamente porque tal autoridade é servidor público latu sensu, inclusive assemelhado ao Membro do Ministério Público e do Defensor Público, cujos prazos exigidos pela lei das inelegibilidades é exatamente quatro meses anteriores às eleições.

Aliás, recentemente esta Corte julgou recurso onde o Ministério Público verberava a ilegalidade do afastamento de Defensor Público quatro meses antes do pleito, apelo eleitoral improvido, com voto condutor do culto colega e Juiz Membro deste Regional, Dr. Lélis Gonçalves.

Não bastasse isso, a lei em debate — Complementar 64/90 — admite ao delegado de polícia o afastamento quadrimensal quando o mesmo desejar concorrer ao cargo de prefeito ou vice-prefeito, situação jurídica que recomenda, também, a observância de igual prazo para o desejoso de disputar a vereança.

Além dos argumentos já despendidos, a administração pública deve ser preservada e os afastamentos devem ser os mais curtos possíveis, notadamente considerando que a atividade política partidária de servidores públicos não deve ser razão e motivo para se conceder férias longas ou licenças eternas para funcionários que, como se sabe, durante os prazos de desincompatibilização continuam recebendo normalmente do erário, sem prestar a contra partida da prestação dos seus serviços, com autorização da lei.

Portanto, o Judiciário deve interpretar a norma de forma sistemática, buscando extrair da lei a sua finalidade social e o atendimento ao interesse coletivo, tendo em mira, sempre, que a preservação do erário é norte a ser buscado, não podendo o servidor e o exegeta da norma – de que nível ou categoria for – utilizar as letras frias da lei para conceder longas férias ou licenças intermináveis para seus funcionários.

Com essas considerações, conheço e dou provimento ao recurso, para o fim de reformar a sentença recorrida e deferir o pedido de registro do recorrente.

É como voto.

MARCELO SOUZA DE BARROS

RELATOR

EMENTA

RECURSO ELEITORAL – PRAZO DE DESINCOMPATIBILIZAÇÃO – QUATRO MESES – DELEGADO DE POLÍCIA – CANDIDATO À VEREADOR – INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DA NORMA – RECURSO PROVIDO.

Delegado de Policia é servidor público latu sensu e deve se desincompatibilizar quatro meses antes, para concorrer ao cargo de vereador, notadamente considerando a interpretação sistemática da Lei Complementar 64/90 e a circunstância de se admitir esse prazo para o afastamento de membro do Ministério Público e Defensor Público.

O Judiciário deve interpretar a lei e permitir o menor tempo possível de afastamento ao servidor para as atividades políticas, especialmente tendo em mira que a condição de candidato não deve ensejar longas férias ou eternas licenças ao funcionário, que continua recebendo do erário sem servir a população, nesse tempo.

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