Delegado de polícia que se afasta do cargo quatro meses antes do pleito não pode ter o registro de candidatura negado. A decisão foi tomada pelo Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso.
Os desembargadores reformaram sentença da 15ª Zona Eleitoral, de São Félix do Araguaia, que havia negado o registro ao delegado Marco Antônio Alves Fonseca, candidato a vereador do município, com o argumento de que o período de afastamento teria de ser de seis meses.
O relator do recurso, desembargador Marcelo de Souza de Barros, afirmou que “a administração pública deve ser preservada e os afastamentos devem ser os mais curtos possíveis”. Ele citou também a Resolução 19.491, do Tribunal Superior Eleitoral, que ratifica o entendimento.
Segundo Marcelo de Barros, “a atividade política partidária de servidores públicos não deve ser razão e motivo para se conceder férias longas ou licenças eternas para funcionários que, como se sabe, durante os prazos de desincompatibilização continuam recebendo normalmente do erário, sem prestar a contrapartida da prestação dos seus serviços, com autorização da lei”.
Leia a decisão
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL
PROCESSO Nº: 1019/04 – CLASSE V
RECORRENTE: MARCO ANTÔNIO ALVES FONSECA
RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL
RELATÓRIO
Cuida-se de recurso eleitoral interposto por Marco Antônio Alves Fonseca, contra decisão do Juízo da 15ª Zona Eleitoral – São Félix do Araguaia, que julgou improcedente o pedido de registro de candidatura do recorrente, nos termos da Lei Complementar nº 64/90 (artigo 1º, inciso VII, alínea “b”).
Inconformado, o recorrente sustenta que a decisão merece reforma, pois preencheu os requisitos de elegibilidade, porque afastou das suas funções de Delegado de Polícia 04 (quatro) meses antes do pleito.
O parquet, em contra-razões, requer a improcedência do recurso.
A Procuradoria Regional Eleitoral, em parecer de lavra do Dr. Mário Lúcio de Avelar, manifesta pelo conhecimento e improvimento do recurso.
É o relatório.
MARCELO DE SOUZA DE BARROS
RELATOR
VOTO
Os autos revelam que o recorrente – Delegado de Polícia Civil – aportou na Justiça Eleitoral buscando o registro de sua candidatura à Câmara Municipal, pleito indeferido pela sentença de fls. 80/85, por ter o juízo a quo reconhecido a ocorrência de desincompatibilização em prazo menor do que estipula a Lei das Inelegibilidades, vez que o irresignado deixou o cargo apenas 04 (quatro) meses antes do pleito, quando o correto — no entendimento da magistrada — seria ele afastar-se com 06 (seis) meses de antecedência.
A questão não é de fácil deslinde, valendo esclarecer ao Egrégio Plenário que o Colendo Tribunal Superior Eleitoral já expediu várias orientações sobre o tema, por meio de instruções e julgados.
Vejamos o conteúdo da Resolução nº 19.491, expedida em 28 de março de 1.996, resultado da Consulta Eleitoral nº 112, do Distrito Federal, da qual foi relator o Ministro Ilmar Galvão, cuja parte interessante ao deslinde desta causa está vazado nos seguintes termos:
ELEIÇÃO PARA VEREADOR. DESINCOMPATIBILIZAÇÕES. AFASTAMENTOS.
Os membros do Ministério Público e Defensoria Pública em exercício na Comarca, deverão afastar-se nos quatro meses anteriores ao pleito, sem prejuízo dos vencimentos integrais (art 1º, inc. VII, “b”, c/c inc. IV, “c”, da LC 64/90);
As autoridades policiais, civis ou militares, com exercício no Município, também deverão afastar-se, nas mesmas condições, quatro meses antes do pleito (art 1º, inc. VII, “b”, c/c inc. IV, “c”, da LC 64/90).
Como se vê, a orientação transcrita revela a viabilidade do acolhimento do recurso aforado, sem embargos de outras posições — jurisprudenciais e divergentes — sobre o tema.
Estou convencido de que o prazo para afastamento do delegado de polícia para concorrer à vereança é de quatro meses, exatamente porque tal autoridade é servidor público latu sensu, inclusive assemelhado ao Membro do Ministério Público e do Defensor Público, cujos prazos exigidos pela lei das inelegibilidades é exatamente quatro meses anteriores às eleições.
Aliás, recentemente esta Corte julgou recurso onde o Ministério Público verberava a ilegalidade do afastamento de Defensor Público quatro meses antes do pleito, apelo eleitoral improvido, com voto condutor do culto colega e Juiz Membro deste Regional, Dr. Lélis Gonçalves.
Não bastasse isso, a lei em debate — Complementar 64/90 — admite ao delegado de polícia o afastamento quadrimensal quando o mesmo desejar concorrer ao cargo de prefeito ou vice-prefeito, situação jurídica que recomenda, também, a observância de igual prazo para o desejoso de disputar a vereança.
Além dos argumentos já despendidos, a administração pública deve ser preservada e os afastamentos devem ser os mais curtos possíveis, notadamente considerando que a atividade política partidária de servidores públicos não deve ser razão e motivo para se conceder férias longas ou licenças eternas para funcionários que, como se sabe, durante os prazos de desincompatibilização continuam recebendo normalmente do erário, sem prestar a contra partida da prestação dos seus serviços, com autorização da lei.
Portanto, o Judiciário deve interpretar a norma de forma sistemática, buscando extrair da lei a sua finalidade social e o atendimento ao interesse coletivo, tendo em mira, sempre, que a preservação do erário é norte a ser buscado, não podendo o servidor e o exegeta da norma – de que nível ou categoria for – utilizar as letras frias da lei para conceder longas férias ou licenças intermináveis para seus funcionários.
Com essas considerações, conheço e dou provimento ao recurso, para o fim de reformar a sentença recorrida e deferir o pedido de registro do recorrente.
É como voto.
MARCELO SOUZA DE BARROS
RELATOR
EMENTA
RECURSO ELEITORAL – PRAZO DE DESINCOMPATIBILIZAÇÃO – QUATRO MESES – DELEGADO DE POLÍCIA – CANDIDATO À VEREADOR – INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DA NORMA – RECURSO PROVIDO.
Delegado de Policia é servidor público latu sensu e deve se desincompatibilizar quatro meses antes, para concorrer ao cargo de vereador, notadamente considerando a interpretação sistemática da Lei Complementar 64/90 e a circunstância de se admitir esse prazo para o afastamento de membro do Ministério Público e Defensor Público.
O Judiciário deve interpretar a lei e permitir o menor tempo possível de afastamento ao servidor para as atividades políticas, especialmente tendo em mira que a condição de candidato não deve ensejar longas férias ou eternas licenças ao funcionário, que continua recebendo do erário sem servir a população, nesse tempo.