Operação Anaconda

Ministro que muda de Turma não pode levar HC, dizem advogados.

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19 de agosto de 2004, 13h23

O Pleno do Supremo Tribunal Federal, composto por 11 ministros, deve julgar Agravo Regimental ajuizado por advogados de um dos acusados presos na Operação Anaconda, na próxima quarta-feira (25/5). A Operação, deflagrada em outubro do ano passado, sustenta a formação de uma suposta quadrilha de venda de sentenças judiciais.

Durante a Operação Anaconda foram presos o juiz federal João Carlos da Rocha Mattos, sua ex-mulher, Norma Cunha, o agente federal Cesar Hermann Rodrigues, o delegado federal José Augusto Bellini, e ainda Wagner Rocha, Sérgio Chiamarelli, Carlos Alberto da Costa Silva e Jorge Luis Bezerra da Silva.

O Agravo Regimental contra os desdobramentos da Operação Anaconda foi ajuizado pelos advogados de Wagner Rocha, Miguel Pereira Neto, Antonio Carlos Galdino Fraga e Maurício Zan Bueno, do escritório Lacaz Martins, Halembeck, Pereira Neto, Gurevich & Schoueri Advogados.

Fiando-se no artigo 10 do Regimento Interno do STF, a dispor sobre a prevenção de Turmas do Supremo, os advogados postulam que a competência de julgamento de Habeas Corpus é adstrita para a Turma a qual pertence o ministro, e não à figura do ministro. Como se sabe, o ministro Joaquim Barbosa, depois de altercações com o ministro Marco Aurélio, saiu da Primeira Turma e bandeou-se para a Segunda, notoriamente mais conservadora.

“O ministro Joaquim Barbosa personalizou e levou o caso com ele. Isso não pode acontecer. O caso pertence à Turma. O Supremo é o guardião dos direitos individuais do cidadão, que não pode ser prejudicado dessa forma”, explica o advogado Miguel Pereira Neto.

Como arma legal, os advogados do acusado Wagner Rocha encomendaram um parecer ao jurista Vicente Greco Filho, professor titular de Direito da Universidade de São Paulo. Esse memorial foi remetido aos dez ministros do Pleno do Supremo e dele constam argüições técnicas contra a decisão de Joaquim Barbosa.

Leia o Parecer:

PARECER – Quesito complementar

CONSULENTE:

ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA LACAZ MARTINS, HALEMBECK, PEREIRA NETO, GUREVICH & SCHOUERI

VICENTE GRECO FILHO

Professor Titular da Faculdade de

Direito da Universidade de São Paulo,

Procurador de Justiça Aposentado

Ex-Consultor Chefe do Ministério das Comunicações,

Ex-Presidente do CEPAM – Centro de Estudos

e Pesquisas de Administração Municipal,

Ex-Chefe da Assessoria Jurídica das Secretarias Municipais

da Administração e Negócios Jurídicos de São Paulo

2004

AGOSTO

Quesito complementar:

Considerando-se a urgência com que foi formulada a consulta ao quesito complementar, adotaremos o histórico do Consulente, e pedimos vênia pela objetividade da resposta.

Relata-nos a Consulente.

“Em 7.1.2004, houve a impetração do Habeas Corpus nº 83.883-9, em favor de um outro acusado nos autos da Ação Penal nº 128-SP (Registro nº 2003.03.00.065344-4), instaurada perante o Colendo Órgão Especial, do Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª (Terceira) Região, notadamente o Co-Réu CARLOS ALBERTO DA COSTA SILVA, impugnando venerando acórdão prolatado pela Colenda Quinta Turma do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo como relator o Douto Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA (doc. nº 1 – registros intitulados “DETALHES” e “ANDAMENTOS” obtidos via Internet, no site mantido at http:/www.stf.gov.br).

Observa-se que, em 9.1.2004, o então Digníssimo Presidente do Excelso Supremo Tribunal Federal, o Nobre Ministro MAURÍCIO CORRÊA, acabou denegando a ordem judicial liminar pleiteada. Posteriormente, em 2.2.2004, houve a distribuição daquele writ ao Eminente Ministro JOAQUIM BARBOSA, que, na ocasião, integrava a Colenda Primeira Turma, daquele Excelso Tribunal (docs. nº 1 e 2) .

No venerando acórdão datado 30.4.2004, referente ao Habeas Corpus nº 83.883-9, consta inequivocamente o julgamento proclamado pelos integrantes da Colenda Primeira Turma, daquele Excelso Tribunal, nos seguintes termos:

‘Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a presidência do ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em conceder parcialmente o habeas corpus, para anular o acórdão do Superior Tribunal de Justiça e determinar que outro seja prolatado, com observância do voto do relator. Vencidos os ministros Sepúlveda Pertence, presidente, e Marco Aurélio, que entendiam que o mérito poderia ser, de logo, apreciado (doc. nº 3).

Foram impetrados, na seqüência, habeas corpus pelos demais acusados nos autos da Ação Penal nº 128-SP (Registro nº 2003.03.00.065344-4), em curso perante o Colendo Órgão Especial, do Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª (Terceira) Região, notadamente os Habeas Corpus nºs 84.265, 84.266, 84.275, 84.284, 84.301, 84.369, 84.388, 84.409 e 84.456, impugnando venerando acórdãos proferidos pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça (docs. nº 3 a 11).


Pelo que evidencia a partir dos documentos carreados a esta consulta, o Eminente Ministro JOAQUIM BARBOSA acabou indeferindo a concessão de ordem judicial liminar em todos aqueles writs.

Deve-se destacar, no entanto, que os Insignes Ministros JOSÉ PAULO SEPÚLVEDA PERTENCE e MARCO AURÉLIO MENDES DE FARIA MELLO, também integrantes da Colenda Primeira Turma, daquele Excelso Tribunal, atuaram como relatores também nos Habeas Corpus nºs 84.263, 84.265, 84.266, 84.275, 84.284, 84.301, 84.369, 84.388, 84.409 e 84.456, em decorrência do disposto no inciso I, do artigo 38, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.

Nesse sentido, vale considerar que o Eminente Ministro MARCO AURÉLIO proferiu a respeitável decisão datada de 8.5.2004, nos autos do Habeas Corpus nº 84.265, tendo decidido, ao final, o seguinte sobre a concessão de ordem judicial liminar em favor do Co-Réu CARLOS ALBERTO DA COSTA SILVA (“Diário de Justiça da União” nº 93, de 17.5.2004, Ata nº 70, “Relação de Processos Originários – Despachos dos Relatores”):

“Esses dados são suficientes, por si sós, a deferir-se a medida acauteladora, afigurando-se considerável a argumentação sobre a atipicidade dos fatos, a quebra do tratamento isonômico – no que acusados permanecem em liberdade -, a postura de inicio adotada pelo paciente – apresentando-se a autoridade policial -, a questão do exercício da profissão, a inversão da ordem natural das coisas – como que se presumindo a culpa – e o dilatado período em que o paciente se acha sob custodia preventiva, a alcançar mais de seis meses. 3. Defiro a medida acauteladora, relativamente a prisão implementada no Processo n. 2003.03.00.065343-2 do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Expeça-se o alvará de soltura a ser cumprido com as cautelas legais, ou seja, caso o paciente não se encontre preso por motivo diverso do retratado no ato que encerrou, nesse processo, a prisão preventiva. 4. Venham aos autos as informações do Superior Tribunal de Justiça, acompanhadas do acórdão referente a apreciação do Habeas Corpus nº 32.102/SP. 5. Publique-se. Brasília, 8 de maio de 2004. Ministro MARCO AURELIO Relator” (doc. nº 12).

Ainda nos autos daquele habeas corpus, aquele mesmo Eminente Ministro teceu algumas considerações sobre o pedido de extensão da liminar supracitada que foi formulado pelo Paciente VAGNER ROCHA (“Diário de Justiça da União” nº 94, de 18.5.2004, Ata nº 71, “Relação de Processos Originários – Despachos dos Relatores”):

“Petição/STF n. 49.861/2004 DECISÃO SUBSTITUIÇÃO ARTIGO 38, INCISO I, DO REGIMENTO INTERNO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ALCANCE HABEAS CORPUS LIMINAR PEDIDO DE EXTENSÃO. 1. Eis as informações prestadas pela assessoria: Vagner Rocha insiste na apreciação por Vossa Excelência do pedido de extensão da medida acauteladora deferida em favor do paciente Carlos Alberto da Costa Silva, no habeas corpus acima mencionado. Fundamenta que .o pedido de extensão, como o proprio instituto do artigo 580, combinado com o artigo 654, . 2., ambos do Código de Processo Penal, integra a decisão e nela esta contido, da mesma forma que os embargos declaratórios, devendo ser decidido pelo mesmo magistrado que proferiu a decisão. Consigno que os autos foram encaminhados, no dia 7 do mês em curso, a Vossa Excelência para exame do pedido de concessão de liminar formulado pelo citado paciente, ante a ausência do ministro Joaquim Barbosa, relator deste habeas, e do ministro Sepúlveda Pertence. Encaminho-lhe copia da Informação n. 487 na qual consta o despacho proferido por Vossa Excelência determinando a Secretaria de Processamento Judiciário da Corte a observância do artigo 38, inciso I, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Registre-se que, conforme o Relatório de Andamentos por Processo deste Tribunal, os autos estão conclusos ao ministro Sepúlveda Pertence para apreciação do mencionado pedido de extensão da liminar deferida. 2. A atuação a partir do disposto no artigo 38, inciso I, do Regimento Interno do Tribunal, ou seja, em substituição ao relator, faz-se no campo da eventualidade. Pressupõe a ausência daquele a quem coube o processo por distribuição e, sucessivamente, do ministro que normalmente o substituiria. Assim ocorreu quando da analise do pedido de concessão de medida acauteladora e deferimento no Habeas Corpus n. 84.265-8. Com o pronunciamento, cessou a atividade em substituição. No caso, estivesse na Corte o ministro relator, o pedido de extensão a ele seria submetido. Não estando, observa-se a norma do artigo 38, inciso I, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, indo o processo, como foi, ao substituto imediato, o ministro Sepúlveda Pertence. A liminar por mim implementada decorreu do fato de ambos estarem ausentes, conforme certificado no processo. Compreendendo a angustia do impetrante e o denodo com que defende o interesse do paciente, não tenho, porem, ante a organicidade e dinâmica do Direito, como atuar na hipótese. 3. Remeta-se a peca ao ministro Sepúlveda Pertence. 4. Publique-se. Brasília, 12 de maio de 2004. Ministro MARCO AURELIO Relator” (doc. nº 13) .


Já nos autos do Habeas Corpus nº 84.263, o Eminente Ministro MARCO AURÉLIO MENDES DE FARIA MELLO decidiu o seguinte sobre o pedido de concessão de ordem judicial liminar, durante a ausência do Douto Ministro JOAQUIM BARBOSA (“Diário de Justiça da União” nº 99, de 25.5.2004, Ata nº 76, “Relação de Processos Originários – Despachos dos Relatores”):

“DECISÃO – LIMINAR HABEAS CORPUS LIMINAR AUSÊNCIA DE INFORMAÇÕES REQUERIDAS PELO RELATOR DO PROCESSO ATUAÇÃO SUBSTITUTIVA INDEFERIMENTO. 1. Atuo no caso a partir da seguinte certidão: Certifico e dou fé que, de acordo com a informação do funcionário Marcos, o Excelentíssimo Senhor Ministro- Relator estará ausente do pais ate 20 de maio de 2004. Certifico ainda que foi informado pela Dra. Regina Maria Parente Vives, Assessora do Ministro Sepúlveda Pertence, que Sua Excelência viajou. Secao de Processos de Direitos e Garantias Fundamentais, em 14 de maio de 2004. Assim, teve-se presente, considerada a sucessividade, o disposto no artigo 38, inciso I, do Regimento Interno, vindo-me a exame petição na qual o impetrante requer seja apreciado o pedido de concessão de medida acauteladora. A peca fez-se acompanhada do acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região e do voto, sem revisão, condutor do julgamento procedido no Superior Tribunal de Justiça, alem de outros documentos. 2. Constato que, a folha 1969, o relator, ministro Joaquim Barbosa, despachou no sentido de serem solicitadas informações ao Superior Tribunal de Justiça, registrando que o acórdão prolatado pela citada Corte não fora ainda publicado. Vale dizer, Sua Excelência teve como indispensável aguardar-se não só tal publicação, como também as informações do próprio Tribunal. Esse despacho foi observado pelo ministro Sepulveda Pertence, ao proferir decisão indeferindo a extensão, para beneficiar o ora paciente, da medida acauteladora que foi por mim implementada no Habeas Corpus n. 84.265-8, impetrado em beneficio de Carlos Alberto da Costa Silva. Então, Sua Excelência, deixou consignado: De qualquer sorte, superado que fosse o obstáculo processual, o certo e que, no HC 84263, do ora requerente, o em. ministro Joaquim Barbosa, também seu relator, entendeu necessário solicitar informações previas da decisão liminar lá requerida. Esse o quadro ainda quando estivesse convencido da admissibilidade em tese da extensão e, em concreto, da identidade objetiva das situações -, não me sentiria autorizado a atropelar a orientação do relator e, sem as informações sobre o HC 84263, só ontem pedidas, conceder aqui, a guisa de extensão de decisão proferida em outro processo, a liminar para a decisão da qual Sua Excelência entendeu necessário conhecer a integra do acordo impugnado. Ora, diante desse quadro, não vejo como dar as pecas trazidas pelo impetrante, por sinal não declaradas autenticas artigo 544, . 1., do Código de Processo Civil – o conteúdo de verdadeiras informações. Ha de aguardar-se a vinda de copia do ato apontado como de constrangimento. A esta altura, óptica diversa implicaria divergência intestina, provocando perplexidade. 3. Em atuação excepcional e ante os atos judicantes dos ministros relator Joaquim Barbosa e Sepúlveda Pertence, este em substituição, indefiro a liminar, sem prejuízo, evidentemente, de, recebidos os dados do Superior Tribunal de Justiça, vir-se a apreciar o pleito. 4. Publique-se. Brasília, 14 de maio de 2004. Ministro MARCO AURELIO em substituição ao Relator (artigo 38, I, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal)” (doc. nº 12) .

Pois bem, teve-se notícia de que, pouco antes do último recesso, o Eminente Ministro JOAQUIM BARBOSA acabou mudando para a Colenda Segunda Turma, do Excelso Supremo Tribunal Federal. Diante de tal fato, instaurou-se uma dúvida quanto à competência por prevenção da Colenda Primeira Turma, para julgar os referidos writs, de maneira que advogados de vários dos pacientes suscitaram questão prejudicial nos respectivos autos.

Na respeitável decisão proferida às fls., dos autos do Habeas Corpus nº 84.263, o Douto Ministro JOAQUIM BARBOSA suscitou a interpretação de que o artigo 69, do Regimento Interno desse Excelso Supremo Tribunal, definiria a competência do relator, de maneira que não haveria prevenção por parte da Colenda Primeira Turma, pois não teria havido o julgamento por parte daquele órgão colegiado na presente espécie, mas, sem comentar a questão do julgamento do Habeas Corpus nº 83.883-9.

I – O QUESITO ORA FORMULADO

Narrados esses fatos, faz-se o seguinte questionamento:

É fato que a distribuição do Habeas Corpus nº 83.883-9, impetrado em favor do Co-Réu CARLOS ALBERTO DA COSTA SILVA, fixou a competência, por prevenção, do Eminente Ministro JOAQUIM BARBOSA. Desse modo, indaga-se, se houve também a fixação de competência, por prevenção, da Colenda Primeira Turma, do Excelso Supremo Tribunal Federal, considerando o julgamento que aquele órgão jurisdicional proclamou nos autos do Habeas Corpus nº 83.883-9. Considere-se, outrossim, o fato de que os Eminentes Ministros JOSÉ PAULO SEPÚLVEDA PERTENCE e MARCO AURÉLIO MENDES DE FARIA MELLO, integrantes da Colenda Primeira Turma, do Excelso Supremo Tribunal Federal, proferiram decisões, na qualidade de relatores substitutos nos autos dos Habeas Corpus nºs 84.265, 84.266, 84.275, 84.284, 84.301, 84.369, 84.388, 84.409 e 84.456. Respondida essa questão, pergunta-se, em consonância com o Regimento Interno daquela Excelsa Corte, qual seria o órgão jurisdicional competente para julgar os habeas corpus que os demais acusados nos autos da Ação Penal nº 128-SP (Registro nº 2003.03.00.065344-4), em curso perante o Colendo Órgão Especial, do Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª (Terceira) Região, impetraram posteriormente, considerando a transferência do Douto Ministro JOAQUIM BARBOSA para a Douta Segunda Turma, do Excelso Supremo Tribunal Federal.”

Resposta ao Quesito: A prevenção básica é da Turma. A prevenção do Relator é dentro da Turma. Não pode ser outra a interpretação do Regimento uma vez que o Relator pode ser nomeado Presidente do Tribunal ou Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, o que significaria, na interpretação contrária, uma impossibilidade de “acompanhamento” do processo ao antigo Relator agora Presidente. Assim, também, quando ocorre o falecimento ou aposentadoria do Relator primitivo. Permanece o processo na Turma, redistribuindo-se a novo Relator entre seus componentes.

São Paulo, 05 de agosto de 2004.

Vicente Greco Filho

Professor Titular da Faculdade

de Direito da Universidade de São Paulo

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