Cobrança proibida

TJ gaúcho libera escritório de advocacia de pagar alvará anual

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10 de agosto de 2004, 11h24

Os escritórios de advocacia do município gaúcho de Osório estão desobrigados de pagar a taxa anual de “renovação de fiscalização, funcionamento e vistoria”, o alvará. O entendimento unânime é da 21ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Cabe recurso.

A ação — assinada pelo advogado Gilberto Dalpias — foi ajuizada pela Subseção da OAB de Osório (RS) em nome de todos os profissionais da advocacia, que atuam no município.

A primeira instância negou mandado de segurança. O julgamento do TJ gaúcho, no entanto, reformou a sentença de primeiro grau.

Em 1999, na gestão do prefeito Alceu Moreira, foi revigorada a legislação municipal para a cobrança das taxas.

A apelação da Subseção da OAB sustentou que “para a exigibilidade das taxas de funcionamento e alvará sanitário é imprescindível o efetivo exercício do poder de polícia pelo Município, prova que cabia à autoridade coatora e que não veio aos autos”.

A 21ª Câmara — ao reformar a sentença e conceder a segurança — afirmou que “não se submete o advogado ao poder de polícia municipal, subordinando-se sua atividade às normas da lei 8.906/94 – sendo, pois, a OAB competente para o exercício do poder de polícia sobre a atividade exercida pelos advogados”.

Para o desembargador relator, Francisco José Moesch “não há confundir fiscalização do exercício da Advocacia, Medicina, Odontologia, ou Bioquímica etc., com fiscalização do estabelecimento”.

O TJ-RS declarou “a invalidade da cobrança anual da taxa de licença para localização ou funcionamento dos escritórios de Advocacia estabelecidos no município de Osório”.

Segundo o site Espaço Vital, o precedente abre caminho para idênticas ações nos municípios onde as administrações também exigem a taxa, que — reconhecidamente — é ilegal.

Leia o acórdão

APELAÇÃO CÍVEL. ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. COBRANÇA DA TAXA DE FISCALIZAÇÃO, FUNCIONAMENTO E VISTORIA. DESCABIMENTO. Precedentes.

DERAM PROVIMENTO AO APELO.

Apelação Cível

Vigésima Primeira Câmara Cível

Nº 70007032964

Comarca de Osório

ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – SEÇÃO DO RIO GRANDE DO SUL

APELANTE

MUNICÍPIO DE OSÓRIO

APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Vigésima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des.ª Liselena Schifino Robles Ribeiro e Des. Genaro José Baroni Borges.

Porto Alegre, 31 de março de 2004.

DES. FRANCISCO JOSÉ MOESCH,

Relator.

RELATÓRIO

Des. Francisco José Moesch (RELATOR)

Trata-se de apelação interposta pela ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – SEÇÃO DO RIO GRANDE DO SUL, porquanto inconformada com a sentença que denegou a ordem no mandado de segurança coletivo impetrado contra ato do SR. PREFEITO MUNICIPAL DE OSÓRIO, objetivando a inexigibilidade da cobrança da taxa de licença para localização e funcionamento e da taxa de alvará sanitário dos escritórios de advocacia situados em Osório.

Nas razões recursais, afirma que não há previsão legal na legislação municipal para a cobrança das taxas de vistoria e fiscalização, sendo, portanto, ilegal sua cobrança. Aduz que para a exigibilidade das taxas de funcionamento e alvará sanitário é imprescindível o efetivo exercício do poder de polícia pelo Município, prova que cabia à autoridade coatora e que não veio aos autos. Sustenta que os documentos de fls. 139-140, que em tese demonstrariam a fiscalização pelo impetrado, são irregulares, não configurando a ação do Município. Requer, portanto, a reforma da sentença.

Foram apresentadas contra-razões.

O Ministério Público opinou pelo desprovimento.

Vieram conclusos.

É o relatório.

VOTOS

Des. Francisco José Moesch (RELATOR)

Merece provimento a presente irresignação.

Com efeito, não se submete o advogado ao poder de polícia municipal, subordinando-se sua atividade às normas da lei 8906/94 – EOAB, sendo, pois, a Ordem dos Advogados do Brasil competente para o exercício do poder de polícia sobre a atividade exercida pelo autor da ação. A matéria já foi apreciada inúmeras vezes pelo Superior Tribunal de Justiça, tendo sido considerada “ilegítima a cobrança, pelo Município, da taxa de localização e permanência de escritório de advocacia. 2. Orientação traçada pelos Tribunais Superiores. 3. O advogado é indispensável à administração da Justiça e sua atividade só se subordina às normas éticas e estatutárias instituídas por lei específica. (…)” (STJ, 2ª turma, RESP 191279 julgado em 04/05/2000).

Com efeito, o tema relacionado com a taxa de localização e funcionamento já foi objeto de julgamento no MS 193232766, da 1ª CCível deste Tribunal, sendo Relator o Des. ARNO WERLANG, que afastou a cobrança da referida taxa, correspondente ao exercício de 1993, entendendo que ela somente poderia ser cobrada uma vez, quando do licenciamento, ocorrido em 1990. Da mesma forma, como bem salienta o douto magistrado a quo, “descabida igual exigência nos anos posteriores.”

Segundo regra do artigo 145 da Constituição Federal, a União, Estados, Distrito Federal e Municípios poderão instituir taxas, espécie de tributo, cujo fato gerador pode ser o exercício efetivo e regular do poder de polícia ou então a utilização, efetiva ou potencial, de qualquer outro serviço público, específico e divisível, posto à disposição do contribuinte.

O caso dos autos enquadra-se na primeira hipótese, na medida em que o débito exeqüendo diz com a denominada taxa de fiscalização, localização e funcionamento.

A taxa só é devida quando há efetiva ou potencial prestação do serviço público, o que não ocorre no caso concreto.

Não há confundir fiscalização do exercício da advocacia ou medicina, etc., com fiscalização do estabelecimento. É que nesses tipos de atividades (advocacia, medicina, odontologia e bioquímica), dificilmente a Administração Pública poderá limitar ou disciplinar direito, interesse ou liberdade, regular a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos (art. 78, CTN).

Nesse sentido:

“TRIBUTARIO. TAXA DE LICENÇA PARA LOCALIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO. ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. E INEXIGÍVEL PELO MUNICÍPIO A COBRANÇA ANUAL DA DENOMINADA TAXA DE LICENÇA PARA LOCALIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DE ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA, POR INEXISTIR O EXERCÍCIO DO PODER DE POLICIA QUE PODERIA JUSTIFICAR A COBRANÇA DAS TAXAS, ESPECIALMENTE A DE LICENÇA PARA LOCALIZAÇÃO. APELO PROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 195115514, PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE ALÇADA DO RS, RELATOR: ARNO WERLANG, JULGADO EM 28/11/1995)”

“APELO VOLUNTÁRIO E REEXAME NECESSÁRIO. TAXA DE LOCALIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO. ESCRITÓRIO DE ADVOGADO. RENOVAÇÃO. INOCORRENDO O FATO GERADOR, NOS TERMOS DO ART-77 DO CTN, REVELA-SE ILEGAL A EXIGÊNCIA DA TAXA INCABÍVEL COBRANÇA ANUAL DE TAXA DE LICENÇA PARA LOCALIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DE ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA, POR NÃO EXISTIR O EXERCÍCIO DO PODER DE POLICIA E NEM SERVIÇO ESPECIFICO E INDIVISÍVEL PRESTADO OU POSTO A DISPOSIÇÃO DO CONTRIBUINTE. PRECEDENTES. RECURSO VOLUNTÁRIO IMPROVIDO. SENTENÇA CONFIRMADA EM REEXAME NECESSÁRIO. UNÂNIME. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 197158454, DÉCIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: OTÁVIO AUGUSTO DE FREITAS BARCELLOS, JULGADO EM 02/12/1998)”

“ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. TAXA DE LOCALIZAÇÃO. ANUALIDADE. NÃO CABE COBRANÇA RENOVADA ANO A ANO DESSA TAXA, POIS A LICENÇA PARA LOCALIZAÇÃO OCORRE UMA ÚNICA VEZ, APENAS NA CONCESSÃO INICIAL, QUANDO O MUNICÍPIO TEM DE AFERIR AS CONDIÇÕES DO ESTABELECIMENTO E VER SE TRATA DE EMPREENDIMENTO CONSENTÂNEO COM AS POSTURAS LOCAIS. SENTENÇA CONFIRMADA EM REEXAME NECESSÁRIO. (REEXAME NECESSÁRIO Nº 196212294, PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE ALÇADA DO RS, RELATOR: TERESINHA DE OLIVEIRA SILVA, JULGADO EM 06/05/1997)”

Também o Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal: RESP 191.279-SC; RESP 32.050-5-SP; RESP 46.222-3-RJ; RE 108.348-4 SP.

Diante do exposto, dou provimento ao apelo, concedendo a segurança pleiteada para declarar a invalidade da cobrança anual da Taxa de Licença para localização ou funcionamento dos Escritórios de Advocacia estabelecidos na Cidade de Osório.

Custas pelo impetrado. Sem honorários, face ao entendimento das Súmulas 105 do Superior Tribunal de Justiça e 512 do Supremo Tribunal Federal, em que pese posição pessoal contrária.

É o voto.

Des.ª Liselena Schifino Robles Ribeiro (REVISORA) – De acordo.

Des. Genaro José Baroni Borges – De acordo.

Julgador(a) de 1º Grau: ANAISA ACORSI PERUFFO

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