Na pele

Rocha Mattos diz que está em condições subumanas de tratamento

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22 de abril de 2004, 10h16

O juiz federal João Carlos da Rocha Mattos, preso durante a Operação Anaconda, está ilegalmente mantido na custódia da Polícia Federal, em Brasília, e em condições subumanas de tratamento. A afirmação é de sua advogada, Daniela Pellin, do escritório Bacco & Pellin, de São Paulo.

Rocha Mattos quer ser transferido para o Quartel do Regimento 9 de Julho, da PM, em São Paulo, único lugar do Brasil a dispor de uma cela de Estado-Maior. A advogada entrou com um Habeas Corpus no Superior Tribunal de Justiça para pedir a transferência. Segundo ela, as determinações vigentes na Loman — Lei Orgânica da Magistratura — não têm sido respeitadas.

“Estive com ele na semana passada. As condições ali não são humanas. Apurei que já há contra essa custódia da PF uma ação civil pública, do MPF, de Brasília, pedindo o fechamento dela, por falta de condições humanas de tratamento e manutenção do preso. Não há pátio. Ele toma banho gelado, come comida podre, azeda. Dorme no chão. Por que outro magistrado detido, o juiz Nicolau dos Santos Neto, não foi submetido a essas subcondições?”, questiona a advogada Daniela Pellin em entrevista à revista Consultor Jurídico.

Enquanto esteve detido na sede da Polícia Federal em São Paulo, Rocha Mattos nunca reclamou do tratamento que lhe era dispensado.

Leia a íntegra do HC

Excelentíssimo senhor doutor Ministro do Superior Tribunal de Justiça, José Arnaldo Fonseca.

HC n. 34672-SP (2004/0047010-4)

JOÃO CARLOS DA ROCHA MATTOS, juiz federal temporariamente afastado e preso preventivamente, por sua advogada e bastante procuradora, nos autos supramencionados que move em face do ÓRGÃO ESPECIAL DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA TERCEIRA REGIÃO, vem, respeitosamente, expor e requerer o que passa a coligir como sendo de fato e de direito:

É importante ressaltar os critérios previstos em “leis” vigentes em nosso País para os fins que pretende atingir.

Prima facie, invoca-se que a Lei de Execução Penal se aplica a preso provisório (art. 2, Lei 7210/84), sendo garantido a este tipo de preso todos os direitos assegurados por este diploma legal (art. 3 da Lei), como é o caso do Doutor João Carlos da Rocha Mattos, isto sem adentrar, por enquanto, no mérito das prerrogativas garantidas pela LOMAN.

Atenta a referida lei, pelo critério da isonomia constitucional entre condenado e preso provisório que todos têm direito à assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa (art. 10 Lei Execução Penal), sob pena de ser um indivíduo irrecuperável à convivência social.

Pois bem, nas condições em que se encontra o magistrado preso naquela carceragem não se resguarda, sequer, os critérios mínimos de garantia à pessoa humana protegidos pela LEI DE EXECUÇÃO PENAL, 7.210/84, senão vejamos:

1- Há infração no art. 12 – O magistrado não tem o fornecimento adequado de alimentação condizente com a prescrição médica, porque a PF não diferencia com diligência o fornecimento terceirizado da alimentação do magistrado, colocando em risco a saúde e vida do juiz, servindo comida podre, azeda; não tem condições de higiene porque aquela carceragem fede, é úmida, não tem ventilação adequada, não tem luz solar, não tem ar fresco, não tem espaço, não tem leitura, não tem atividade; o chuveiro é com água fria e a PF diz que é para manter a segurança do local, forçando o magistrado junto com os outros presos a tomarem banho frio.

Acerca disso, PAULO LÚCIO NOGUEIRA diz o seguinte: “Sempre entendemos que a pessoa do preso deve merecer todo o respeito, pois como criatura humana não pode de modo algum ter um tratamento que aumente seus sofrimentos, decorrentes da própria pena que tenha recebido, ou da liberdade que tenha perdido (…)

2. Da Infração ao artigo 14 – O magistrado, embora tenha sido deferido aqui em SP o tratamento odontológico e médico, dado o caráter emergencial, com a transferência para Brasília na calada da noite, foi-lhe cerceado o atendimento necessário, colocando em risco sua saúde que já se encontra em estado agravado, pois naquela custódia os presos ficam em estado de abandono e prestam as assistências solicitadas com descaso, em estado de abandono, em tempo muito distante da necessidade.

3-Da infração ao artigo 40 – O magistrado, na custódia da PF/DF, tem tido violada a sua integridade física posto que toma banho frio, fica de final de semana 60 horas trancafiado na cela sem banho de sol, não dispõe de pátio adequado para tomar banho de sol ou espaço físico para exercícios, a alimentação é servida podre, azeda, o colchão que dorme o juiz não é adequado para o seu tamanho, fazendo-o dormir no chão, o magistrado divide cela comum com outra pessoa que ironicamente dispõe de uma placa sinalizando “cela especial”, não pode ter contato físico com os familiares no dia da visita, podendo, tão somente, falar pelo parlatório, o qual não permite privacidade alguma, não dispõe de atividade intelectual, não tem biblioteca, não tem acesso a livros.

De outra forma, tem violada sua condição moral dado o descaso da autoridade coatora, da autoridade da custódia que tem o magistrado em regime de isolamento e castigo, causando-lhe com o isolamento pressão psicológica insustentável, para quem tem prerrogativa legal (art. 5 da CF e 35 da LOMAN).

Ainda nesta previsão legal de proteção e na mesma medida de infração, o magistrado tem limitação ao direito de visita e de entrevista com o advogado, cerceando-lhe o direito de defesa e contato constante com o advogado, impostas arbitrariamente, pela autoridade policial, inclusive desaforadamente, imposta pela DELEGADA DE POLÍCIA FEDERAL MARIA FÁTIMA RAMOS LEITE, a qual sujeitou esta patrona ao abuso de poder e arbitrariedade, cerceando-lhe o direito de entrevista com o magistrado –o que, obviamente, ensejará medida adequada para apuração, mas esta Corte deve saber do que lá acontece.

Portanto, além da infração legal à Lei de Execução Penal, de igual forma, verificando tais infrações comuns, se infringe a LOMAN que confere ao magistrado a garantia de estar em local adequado e que não ofereça pressão psicológica pelo isolamento e pelos maus tratos conduzidos por aquela autoridade que fica à margem da Relatora do TRF.

Posto isto, aguarda apreciação imediata do pedido, determinando a transferência do magistrado, como pedido anteriormente, ao Regimento de Polícia Montada “9 de Julho” da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Assim,

Espera deferimento

São Paulo para Brasília, 19 de abril de 2004

Daniela Pellin

OAB/SP 158.067

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