Questão de confiança

Controle externo já vem tarde, diz Cezar Britto ao criticar TJ-SE.

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21 de abril de 2004, 14h36

O secretário-geral da Ordem dos Advogados do Brasil, Raimundo Cezar Britto, afirmou nesta quarta-feira (21/4) que as irregularidades envolvendo o concurso público feito pelo Tribunal de Justiça de Sergipe são um exemplo claro da necessidade de criação imediata de um controle externo para o Judiciário. “Quando o próprio Judiciário dá um exemplo contrário à credibilidade, é preciso que um órgão superior interfira e restaure essa característica, que deve ser essencial à Justiça”, afirmou o secretário-geral da OAB, que é de Aracaju. “O controle externo já vem tarde no Brasil”.

Cezar Britto acompanhou nos últimos dias a tramitação de ação civil pública ajuizada pela OAB de Sergipe, na qual a entidade pede a anulação do concurso. Entre as irregularidades apontadas figuram clonagem de questões de concursos anteriores, suspeita de favorecimento de parentes diretos de políticos, magistrados e desembargadores sergipanos e a contratação sem licitação de uma fundação para aplicar as provas. A ação tramita na Terceira Vara da Seção Judiciária de Sergipe.

Segundo Cezar Britto, a OAB está confiante de que a ação civil pública será julgada nos moldes do parecer emitido nesta segunda-feira pelo Ministério Público Federal, que opinou pela anulação imediata do concurso. “Não estamos brigando com as pessoas que fazem o Judiciário, lutamos sim para que essas pessoas pertençam a um Poder digno”, acrescentou Cezar Britto.

Leia a entrevista:

As fraudes que estão sendo apuradas no concurso público realizado pelo Tribunal de Justiça de Sergipe são mais um exemplo de que deve ser implantado com urgência o controle externo para o Judiciário brasileiro?

Não há dúvidas.O Poder Judiciário deve se alimentar sempre da credibilidade. Se este Poder perder a sua credibilidade, estará autorizando a sociedade a buscar Justiça com as próprias mãos. É por isso que atitudes como essa, de fraudar um concurso público, não deveriam existir jamais. Quando o próprio Judiciário dá um exemplo contrário à credibilidade, é preciso que um órgão superior interfira e restaure essa característica, que deve ser essencial à Justiça. Isso é controle externo. Ele deve ser exercido por um órgão independente, autônomo e que busque restabelecer a credibilidade do Judiciário sempre que o Judiciário dela abusar. Esse é um exemplo típico de que o controle externo já vem tarde no Brasil.

O que mais chamou a atenção da OAB com relação às irregularidades envolvendo o concurso do TJ de Sergipe?

Ressalto o fato de a OAB, que sempre teve um bom relacionamento com o Judiciário, ter primeiro tentado resolver a situação administrativamente, buscando fazer com que o Tribunal entendesse que era preciso dar o bom exemplo e anular o concurso. A resistência do Tribunal nos causou enorme estranheza e agora vemos que essa estranheza está explicada. Grande parte dos candidatos aprovados estava diretamente relacionada com o próprio Tribunal, o que não pode acontecer de forma alguma.

A possibilidade de que tenha ocorrido favorecimento de candidatos é, por si só, motivo suficiente para requerer a anulação. O exemplo de ética é fundamental para o Judiciário e, no entanto, quando não observou que vários parentes de funcionários e de políticos estavam inscritos, o Tribunal deu um péssimo exemplo ao Estado e ao País. É uma pena porque Sergipe sempre foi referência brasileira de seriedade e de um Poder Judiciário sério e isento.

Diante do parecer do Ministério Público Federal, que opinou pela suspensão do concurso, o senhor espera que a Justiça federal siga o mesmo posicionamento e determine a sua anulação?

É o que a OAB espera. Até porque se diz que a Justiça se resume a um tripé: a OAB, o Ministério Público e o Judiciário. Se isso for realmente verdade, nós estamos na frente, com um placar de dois a zero, já que a OAB e o Ministério Público entendem que a credibilidade do Judiciário deve ser restabelecida com a nulidade do concurso.

Nós estamos atuando em defesa da credibilidade do próprio Judiciário, defendendo a idéia de que ainda é possível acreditar na Justiça, um órgão tão importante para a democracia. É isso que nós queremos. Não estamos brigando com as pessoas que fazem o Judiciário, lutamos sim para que essas pessoas pertençam a um Poder digno.

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