Brasileiro paga

Impostos deixam contribuintes mais pobres e Tesouro mais rico

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20 de abril de 2004, 14h31

Depois de ter encolhido 0,2% em 2003, o Brasil começa, efetivamente, o ano de 2004. Ele se inicia após a ressaca do carnaval dando uma demonstração ao mundo de que, afora o desfile dos indicadores econômicos negativos, o único espetáculo assistido até agora é o descompasso existente entre o discurso e a prática do governo petista.

O mesmo governo que, há mais de um ano, prometeu inverter, a curto prazo, uma lógica perversa que ainda hoje permanece intacta na estratégia monetarista que inspira os donos do poder. Enquanto a economia permanece estagnada, a receita tributária segue seu curso ascendente, alimentada por uma carga de impostos monstruosa que, mensalmente, deixa o contribuinte mais pobre enquanto o Tesouro coleciona recordes de arrecadação.

O insaciável ímpeto arrecadatório que se viu ao longo do ano passado está de volta. Em 2003, R$ 280,3 bilhões foram drenados da economia para os cofres do Tesouro, “comendo” uma parte significativa do resultado das empresas. Este fato ajudou a brecar o crescimento da economia do país, por meio de uma espécie de “efeito confisco” sobre os investimentos produtivos.

O efeito pode se repetir neste ano, talvez ainda mais forte, haja vista a propensão dos políticos de distribuírem benesses em ano eleitoral. Não podemos nos esquecer que esta conta é debitada ao contribuinte, na forma de emendas orçamentárias que inflam o passivo e criam receitas que, sob a ótica contábil, nem sempre são realizáveis.

Os números divulgados até o momento mostram, com absoluta clareza, que enquanto o asteróide da recessão está apontado para o setor produtivo, um verdadeiro carnaval de impostos e contribuições enriquece cada vez mais a União.

De acordo com dados divulgados pela Receita Federal, em fevereiro a arrecadação total chegou a R$ 22,5 bilhões, representando um acréscimo de 3,24% sobre a receita do mesmo período do ano passado. Na prática, o governo arrecadou R$ 1 bilhão acima do previsto depois da revisão do orçamento de 2004, repetindo o que já tinha acontecido em janeiro, quando a Receita também arrecadou R$ 1 bilhão a mais.

A elevação da receita tributária revela, sobretudo, um aumento fantástico, mais uma vez, de carga tributária em conseqüência das mudanças de alíquotas feitas no final de 2003. Além do aumento de quase 40% na arrecadação do IPI sobre fumo, destacam-se também as alterações na alíquota da Cofins e do PIS que contribuíram, sem dúvida, para engordar os cofres da União.

Outra mudança significativa foi em relação aos prestadores de serviços. Desde de fevereiro, eles tiveram descontos em seu faturamento equivalentes a 4,65% para o pagamento de Cofins, PIS e CSLL. Porém, mantendo o seu discurso descolado da prática, o governo não admite o aumento de carga; prefere outro nome: “incremento de arrecadação”, como disse o secretário-adjunto da Receita Federal, Ricardo Pinheiro.

Apesar do fardo cada vez mais pesado representado pela carga tributária, por trás dos números exibidos pela Receita, há um exercício de criatividade de fazer inveja aos que tentam, por meio do chamado “fogo amigo”, subjugar a estratégia de engordar cada vez mais o superávit fiscal, impondo um rumo desenvolvimentista à política econômica.

Em resumo, não se pode negar que a área fiscal do governo tem atuado com exemplar obediência às determinações do Fundo Monetário Internacional. Mas, para o bem do país, seria conveniente que Brasília se empenhasse num pacto de eficiência ao longo da Esplanada dos Ministérios, buscando criar um ambiente propício ao investimento através de ações que fortaleçam o setor produtivo e que estimulem a geração de riquezas.

Esse caminho é mais do que um clamor da sociedade civil: representa a única forma matemática capaz de acabar com o descompasso entre os setores do governo que querem aumentar cada vez mais o superávit fiscal, por meio de recordes de arrecadação, e aqueles que defendem correção de rumo na política econômica. Seja como for, é preciso que se defina, logo, para que lado vai o barco e quem estará no comando, sob pena de chegarmos ao final do ano, mais uma vez, com a economia naufragada na inoperância e na recessão.

Traduzindo, se não houver uma guinada urgente na defesa de políticas que visem não apenas transferir renda da sociedade civil para os cofres da União que vimos assistindo há anos, por meio de sucessivos malabarismos para aumentar a arrecadação, mas que preserve e estimule a galinha dos ovos de ouro, estaremos todos condenados ao fracasso. Esse é o risco a que todos estamos expostos, enquanto o aparelho de Estado continuar sendo visto, eternamente, como um palanque eleitoral, e não como uma instância a serviço dos cidadãos. O país não agüenta mais tanto desmando. Basta de falta de rumo.

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