No Brasil, ao contrário dos EUA, existe uma série de previsões legais para situações não atingidas pelo Direito do Autor. Estão previstas pelo art. 46 da Lei 9.610/98 (Lei dos Direitos Autorais) e pelo art. 6º da Lei do Software. Anteriormente, eram previstos pelo art. 49 da antiga Lei 5.988/73. Na verdade, sob um ponto de vista científico, esses artigos confundem os limites ao direito do autor propriamente ditos com certas atividades que deveriam ficar à margem da proteção ao direito do autor. O direito a uma cópia privada sem o intuito de lucro, na verdade, é uma expressão do princípio da liberada do uso privado [1]. O direito à reprodução está implícito, assim como a restrição quanto ao lucro. Afinal, como o Direito do Autor é um meio de incentivo econômico, o exclusivo é exatamente o direito de exploração econômica da obra, não podendo esta ser utilizada para fins de lucro sem autorização.
A Lei do Software também prevê certas hipóteses próprias a este tipo de obra protegida. O art. 6º, em seu inciso I, consagra no direito brasileiro o direito de cópia de segurança (backup) com a redação: "a reprodução, em um só exemplar, de cópia legitimamente adquirida, desde que se destine à cópia de salvaguarda ou armazenamento eletrônico, hipótese em que o exemplar original servirá de salvaguarda". Já o inciso II do mesmo artigo expressamente determina ser lícito "a ocorrência de semelhança de programa a outro, preexistente, quando se der por força das características funcionais de sua aplicação, da observância de preceitos normativos e técnicos, ou de limitação de forma alternativa para a sua expressão". Este artigo é muito relevante ao direito brasileiro, pois enfatiza o Princípio Constitucional de Livre Concorrência e as limitações do Direito do Autor quanto a impossibilidade de proteger idéias e elementos funcionais. Em sintonia com a melhor prática do Direito encontra-se a Lei Brasileira, e no mesmo sentido tem caminhado o Direito nos EUA, através de decisões judiciais, como no caso SEGA vs. Accollade ou Lotus Development Corp. vs. Borland International em 1995, e da Comunidade Européia [2]. Infelizmente, a lei Brasileira é omissa no que tange à engenharia reversa de software.
O caso Lotus Development Corp. vs. Borland International [3] foi uma disputa judicial entre duas empresas produtoras de Software. A Lotus produzia o Lotus 1-2-3, e a Borland, o Quattro Pro. A Borland produziu seu programa de computador com a interface idêntica ao da Lotus, de maneira que os usuários da Lotus 1-2-3 pudessem usar o Quattro Pro sem dificuldades. A Lotus entrou com ação em face da Borland por infração de Copyright. Grande parte da controvérsia foi a respeito da possibilidade de se proteger pelo direto do autor a mera interface do programa. Por fim a decisão final achou "absurdo" sugerir que "se alguém faz uso de vários programas diferentes, seja forçado a aprender como efetuar cada a mesma operação de maneiras diferentes em cada programa utilizado". A corte decidiu que, se uma empresa atinge um monopólio, por conseqüência a maioria do mercado fica bem adaptada à interface de seu programa. Desse modo, é justo que um competidor utilize a mesma interface como meio de concorrência. Podemos entender que no mesmo sentido caminha a Lei do Software brasileira, em consonância com os princípios constitucionais.
Como vimos, a expansão do Direito do Autor e o Controle Tecnológico de proteção tem colocado em xeque os tradicionais limites do Direito do Autor. Nos EUA, existe um grande debate sobre a hierarquia das normas que tratam desta questão: pode uma lei estabelecer uma nova proteção ao direito do autor que efetivamente neutralize a doutrina do Fair Use, ou esta doutrina constituiria um direito que não poderia ser afetado? De fato, naquele país, a expansão da proteção ao direito do autor vem erodindo progressivamente o Fair Use, visto que os titulares do direito do autor agora detêm a capacidade de expandir seu controle sobre a obra. Esta expansão tem sido alcançada por dois meios. O primeiro é a utilização de mecanismos tecnológicos de controle de acesso à obra que são mesclados em suas fixações, e o segundo ocorre por uso de licenças de utilização, tais como as "Shrink-Wrap" e "Click-Wrap" [4], sobre quais o usuário final não detém nenhum controle. São contratos de adesão que podem impor ao usuário condições e restrições mais fortes do que as previstas na legislação e virtualmente neutralizam a doutrina do Fair Use. Nos EUA, como as possibilidades utilização vêm progressivamente sendo codificadas na própria fixação da obra, e esse código é protegido pela Lei e pelas licenças de uso, quem está determinando as limitações são os próprios produtores, e não a sociedade através de leis.
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