A juíza federal substituta da 1ª Vara Cível de São Paulo, Paula Mantovani Avelino, julgou extinto, sem julgamento de mérito, o processo que visava a correção da base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Física pela taxa Selic, a partir da Medida Provisória 22/2002.
A Ação Civil Pública foi impetrada pela Força Sindical e Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de São Paulo, Mogi das Cruzes e Região, contra a União Federal.
Paula Mantovani entendeu que a matéria discutida no processo não cabe em Ação Civil Pública e que a utilização da mencionada via somente é possível para proteção das relações de consumo, "o que não se verifica no caso em tela".
"A pretensão dos autores vincula-se diretamente a um dos critérios essenciais para a instituição do tributo, no caso o Imposto de Renda, razão pela qual não poderia ter sido veiculada por meio de Ação Civil Pública", afirmou a juíza.
Leia a íntegra da decisão:
1ª VARA CÍVEL - SEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO.
Ação Civil Pública
Processo n.º 2003.61.00.003247-7
Autores: Força Sindical e Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico e São Paulo, Mogi Das Cruzes e Região
Ré: União Federal.
SENTENÇA
Vistos, etc.
Trata-se de Ação Civil Pública, com pedido de tutela antecipada, em que os autores visam ver assegurada a correção da base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Física, pela Taxa Selic, a partir da edição da Medida Provisória n.º 22, de 08 de janeiro de 2002.
Segundo alegam, apenas com a correção da base de cálculo do mencionado imposto cessaria a ofensa a diversos princípios constitucionais tributários, tendo em vista que com a correção dos salários dos sindicalizados, o imposto de renda passou a incidir sobre os rendimentos de pessoas antes isentas e também houve a aplicação de alíquotas maiores sobre os rendimentos de outras. Alegam que a correção dos salários representa apenas a recomposição das perdas, sem configurar aumento real ou riqueza nova.
A inicial veio acompanhada de documentos.
Entendo que a hipótese em tela ser refere à tutela de direito individual homogêneo. Em tais casos, cabem as considerações seguintes.
Inicialmente, observo que o art.1º, IV da Lei da Ação Civil Pública apenas faz menção aos demais direitos difusos e coletivos.
No que tange aos individuais homogêneos, são estes regulados pelo Código de Defesa do Consumidor, que a eles se reporta expressamente para fins de utilização de ações coletivas.
Ocorre que a utilização da mencionada via somente é possível para proteção das relações de consumo, o que não se verifica no caso em tela.
Em relação a matérias de outra natureza somente se admite a propositura de ação civil pública para tutela de direito individual homogêneo quando o interesse social for relevante, sendo que, nesse caso, tem legitimidade ativa apenas o Ministério Público, nos termos do art. 127, "caput" da Constituição Federal.
Por estas razões, considero não configurada, no presente caso, a legitimação ativa para a propositura da ação coletiva.
De qualquer forma, ainda que os autores fossem partes legítimas, entendo que a matéria veiculada na inicial não pode ser discutida por meio de Ação Civil Pública. Senão vejamos.
Preceitua o parágrafo único do art. 1º da Lei 7.347/85, in verbis:
"Não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias...." (grifo nosso).
Ora, a correção da tabela do imposto de renda, com a aplicação da Taxa Selic, nada mais é que a alteração de um dos elementos constitutivos do tributo, qual seja a base de cálculo.
Com efeito, ao lado da alíquota, tem a base do cálculo a função de quantificar o tributo, isto é, dar sua dimensão numérica. Nos dizeres de Paulo de Barros Carvalho, in 'Curso de Direito Tributário', Ed. Saraiva, 7ª edição, p.227 " ... a base de cálculo é a grandeza instituída na conseqüência da regra-matriz tributária, e que se destina,primordialmente, a dimensionar a intensidade do comportamento inserto no núcleo do fato jurídico, para que, combinando-se à alíquota, seja determinado o valor da prestação pecuniária." e ainda " Uma das funções da base de cálculo é medir a intensidade do núcleo factual descrito pelo legislador. Para tanto, recebe a complementação de outro elemento que é a alíquota, e da combinação de ambos resulta a definição do 'debitum' tributário"
A base de cálculo, no caso dos impostos, encontra-se diretamente relacionada com o fato gerador, devendo ser prevista na lei instituidora do tributo, que contempla a regra matriz de incidência tributária. Nesta linha de raciocínio tem-se que a base de cálculo e alíquota constituem o critério quantitativo do tributo.
Assim, a pretensão dos autores vincula-se diretamente a um dos critérios essenciais para a instituição do tributo, no caso o Imposto de Renda, razão pela qual não poderia ter sido veiculada por meio de ação civil pública.
Outro não pode ser o entendimento, tendo em vista a literalidade do parágrafo único do ar. 1º da lei 7.347/85.
Dessa forma, entendo ausente uma das condições da ação, qual seja o interesse, que se traduz no binômio necessidade e adequação. Não basta aos autores que necessitem do pronunciamento judicial acerca dos fatos narrados na inicial; é necessário, ainda, que veiculem sua pretensão através do meio processual adequado, o que não ocorre nos autos.
Posto isso, com base na fundamentação expendida, julgo extinto o processo, sem julgamento de mérito, nos termos do art. 267, inc.VI, do Código de Processo Civil.
Custas ex lege.
Sem condenação em honorários, por não constituída a relação processual.
P.R.I.
São Paulo, 27 de janeiro de 2003.
PAULA MANTOVANI AVELINO
Juíza Federal Substituta
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