Matrícula garantida

Juiz manda Unip fazer matrícula de aluna independente de débitos

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9 de setembro de 2002, 19h40

O juiz substituto da 2ª Vara de Araçatuba (SP), Wilson Pereira Junior, concedeu liminar em Mandado de Segurança, e garantiu a uma estudante o direito de efetuar matrícula na Universidade Paulista (UNIP), campus de Araçatuba. A liminar garante também que a aluna freqüente as aulas, independentemente da existência de débitos referentes às mensalidades do curso. Caso não cumpra a determinação, a Unip deve pagar multa diária de R$1,5 mil.

Segundo a decisão do juiz, a estudante, regularmente matriculada desde 1999 no curso de Direito da UNIP, tem bolsa de estudo porque a mãe é professora da universidade. A aluna estudou, até o primeiro semestre deste ano, sem que fosse exigida a quitação das mensalidades do curso.

De acordo com a estudante, agora a universidade se recusa a aceitar sua matrícula alegando débitos anteriores. Para o juiz, a discussão nesse processo não é acerca do valor das mensalidades e nem sobre o direito à bolsa de estudo ou crédito educativo. Ele disse que a discussão é apenas sobre o direito ou não da aluna a matricula.

A decisão do juiz determina que a Unip efetue a matrícula da estudante no curso de Direito e inclua seu nome na lista de presença. A instituição deve providenciar as medidas necessárias para que a aluna possa prestar os exames e provas do curso, desde que não haja nenhum outro motivo que não o noticiado no processo.

Leia a decisão:

Mandado de Segurança

Processo nº. 2002.61.07.005262-0

2ª Vara da Justiça Federal em Araçatuba/SP

Decisão

Vistos.

Trata-se de Mandado de Segurança, com pedido de liminar, impetrado por Renata Cavalcante Fortes Martins contra ato supostamente coator da representante da Universidade Paulista – UNIP – Campus de Araçatuba/SP, alegando o impedimento do impetrante às aulas regulares, matrícula etc, haja vista a suposta existência de débitos anteriores, referentes às mensalidades do CURSO DE DIREITO.

A teor do artigo 7º, inciso II, da Lei no. 1.533/51, defiro a liminar, em termos, assegurando à impetrante o direito à matrícula e rematrícula, até o julgamento definitivo do presente feito. Estão presentes os requisitos legais para concessão da medida liminar, notadamente o fumus boni juris.

Ressalte-se aqui a existência de três relações distintas, mas interligadas: a Sra. Adalberta é professora da UNIP; a impetrante é aluna da UNIP; a impetrante é filha da Sra. Adalberta. Não se pode discutir aqui, em sede de mandamus, a relação trabalhista entre a Sra. Adalberta e a UNIP; menos ainda a relação entre a impetrante e sua genitora; cabe, porém, a discussão do reflexo das relações em questão com a condição da impetrante de aluna do curso de Direito da UNIP. Explico: a impetrante está regularmente matriculada desde 1999, no curso de Direito da UNIP, com bolsa de estudo decorrente da relação empregatícia estabelecida entre sua mãe e a UNIP. Estudou no ano de 1999, 2000, 2001 e primeiro semestre de 2002, sem que fosse exigida a quitação das mensalidades do curso, em razão de acordos coletivos vigentes à época.

Agora, na rematrícula, surpreendeu-se com a exigência do pagamento de débitos anteriores (1º semestre de 2001), como condição para a referida rematrícula e prosseguimento dos estudos. A exigência do pagamento dos débitos (e possível repercussão trabalhista daí decorrente), não se dará nos presentes autos; é matéria afeta à jurisdição trabalhista, a quem rendemos nossas homenagens. A relação entre a impetrante e a impetrada, porém, é matéria afeta à jurisdição federal, e como tal será tratada.

A Lei de Introdução ao Código Civil define o direito adquirido, em seu artigo 6º, § 2º, que cito: “Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição prestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem”. No caput do referido artigo, consta: “A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”.

Qual seria a natureza do contrato de trabalho firmado entre as partes senão lei entre as partes? Assim, a alteração do contrato de trabalho, ainda que por ato bilateral de vontade, não afetará o direito adquirido, ou seja, a situação jurídica daqueles que já se beneficiavam da situação fática vigente à época da alteração contratual. A alteração, portanto, não pode atingir relação fática ou jurídica pré-estabelecida e efetivamente utilizada.

A discussão da exigência ou não dos valores das mensalidades, segundo alegação do impetrante, decorreria da interpretação de nova convenção coletiva de trabalho firmada entre professores e Universidade; mas, e o direito dos alunos, filhos dos professores, já exercentes do direito de cursar a Universidade sem ônus com mensalidades? Não se confunde, aqui, o atraso parcial, decorrente da interpretação da validade ou não de normas coletivas de trabalho, com a inadimplência; enquanto uma é mera situação fática, passageira, como parece ser o caso, a outra é situação consolidada e irreversível, decorrente da rescisão contratual. Presente também o periculum in mora, uma vez que a não rematrícula da impetrante, na forma exposta, implicará no perdimento do ano letivo, caso a segurança seja concedida apenas ao final.

Observo, por outro turno, que a presente liminar não atinge a discussão acerca do valor das mensalidades, tampouco direito à bolsa de estudo ou crédito educativo (ou outro genérico, da mesma índole), até porque refere-se à matéria fática e passível de acordo entre as partes, ou imposição judicial. A discussão – e este é o teor da liminar – atinge o direito ou não à matrícula (ou rematrícula – ou outro nome genérico) do aluno impetrante. Entendo que, neste tocante, a competência é – isto sim – da Justiça Federal. A jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 3ª Região é farta neste sentido:

TRIBUNAL:TR3 ACORDÃO DECISÃO:11-12-1995

PROC:REO NUM:03017685-5 ANO:89 UF:SP

TURMA:06 REGIÃO:03

REMESSA EX-OFICIO

Fonte: DJ DATA:13-03-96 PG:014764

Ementa:

ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. MENSALIDADES DEPOSITADAS EM JUÍZO. DIREITO À MATRÍCULA.

– COMPROVADO O DEPÓSITO DAS MENSALIDADES EM AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO, É DEFERIDO AO ALUNO DIREITO DE RENOVAÇÃO DE MATRÍCULA.

– SENTENÇA CONFIRMADA.

– REMESSA OFICIAL DESPROVIDA.

Relator: JUIZA MARLI FERREIRA

Referência Legislativa:

LEG:FED PRT:000261 ANO:1987

Catálogo: POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO A REMESSA OFICIAL.

Outras Referências:

REO N. 89.03.18071-2, TRF 3 REG., REL. J. OLIVEIRA LIMA.

AI N. 90.03.25407-9, TRF 3 REG., REL. J. ANNAMARIA PIMENTEL.

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TRIBUNAL:TR3 ACORDÃO DECISÃO:11-12-1995

PROC:REO NUM:03017685-5 ANO:89 UF:SP

TURMA:06 REGIÃO:03

REMESSA EX-OFICIO

Fonte: DJ DATA:13-03-96 PG:014764

Ementa:

ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. MENSALIDADES DEPOSITADAS EM JUÍZO. DIREITO À MATRÍCULA.

– COMPROVADO O DEPÓSITO DAS MENSALIDADES EM AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO, É DEFERIDO AO ALUNO DIREITO DE RENOVAÇÃO DE MATRÍCULA.

– SENTENÇA CONFIRMADA.

– REMESSA OFICIAL DESPROVIDA.

Relator: JUIZA MARLI FERREIRA

Referência Legislativa:

LEG:FED PRT:000261 ANO:1987

Catálogo: POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO A REMESSA OFICIAL.

Outras Referências:

REO N. 89.03.18071-2, TRF 3 REG., REL. J. OLIVEIRA LIMA.

AI N. 90.03.25407-9, TRF 3 REG., REL. J. ANNAMARIA PIMENTEL.

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TRIBUNAL:TR3 ACORDÃO DECISÃO:09-09-1997

PROC:AMS NUM:03021762-0 ANO:91 UF:SP

TURMA:02 REGIÃO:03

APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA

Fonte: DJ DATA:08-10-97 PG:083007

Ementa:

CONSTITUCIONAL: MANDADO DE SEGURANÇA. REGULAR EXERCÍCIO DAS ATIVIDADES ACADÊMICAS. OBJEÇÃO. ILEGALIDADE.

I – HÁ DIREITO LÍQUIDO E CERTO DOS IMPETRANTES À REGULAR VIDA ACADÊMICA ATÉ DECISÃO FINAL DA QUESTÃO REFERENTE ÀS MENSALIDADES DISCUTIDA EM AÇÃO PRÓPRIA.

II – REMESSA DE OFICIO E APELAÇÃO IMPROVIDAS.

Relator: JUIZ ARICE AMARAL

Catálogo: UNANIME, NEGAR PROVIMENTO A REMESSA DE OFICIO E A APELAÇÃO.

Outras Referências:

MS N 91.03.19051-0, 4T, REL. J. LUCIA FIGUEREDO, DJU 30/08/93.

Assim, parece, ao menos em sede de cognição sumária – suficiente para concessão de liminar – que o impetrante está quite com a instituição, ao menos em parte – bem como deseja quitá-lo, integralmente, ainda que utilizando-se do benefício decorrente da situação fática e jurídica consolidada no tempo. Ademais, a impetrada poderá valer-se da via própria para exigir o pagamento dos valores que entende devidos, sem causar o constrangimento – até aqui verificado – ao impetrante, estudante hipossuficiente e fragilizado ante os meios utilizados pela impetrante para coagi-lo aos pagamentos referidos. Frise-se, aqui, a situação de litígio que poderia envolver, inclusive, a genitora da impetrante, funcionária da Universidade impetrada. Na dúvida, portanto, deve ser deferida a liminar, parcialmente e em termos, sob pena de perecimento do objeto se apenas ao final apreciada a matéria, apenas para propiciar ao impetrante a regular presença às aulas, sem qualquer tipo de impedimento e/ou constrangimento.

Posto isso, CONCEDO PARCIALMENTE – e em termos – A LIMINAR, determinando à autoridade impetrada que proceda, salvo se houver outro motivo válido que não o declinado na impetração, imediatamente, à matrícula ou rematrícula da impetrante, no curso declinado na Petição Inicial, incluindo-a na lista de presença da respectiva sala em que rematriculado, na referida Universidade, e providenciando o necessário para que a aluna possa freqüentar as aulas, prestar os exames e provas no referido curso, impedindo, pois, que a impetrada utilize-se de quaisquer medidas restritivas à impetrante com relação à freqüência e demais providências necessárias para levar a termo o curso que iniciou. Com base nos §§ 3º e 4º, do artigo 461, do CPC, imponho, de ofício, multa diária no valor de R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais), devida pela autoridade impetrada à impetrante, em caso de não cumprimento da liminar concedida, devida até o efetivo cumprimento da presente decisão, sem prejuízo das sanções penais, civis e administrativas, eventualmente cabíveis.

Cumpra-se, inclusive através da utilização de fax, se o caso; proceda, a secretaria, à expedição de mandado judicial, a ser cumprido por oficial de justiça, consignando-se a data e horário da intimação, bem como a qualificação completa da pessoa impetrada, caso haja qualquer tentativa de inviabilizar o cumprimento da ordem judicial, seja pela autoridade impetrada ou qualquer outra que faça suas vezes.

Poderá a impetrante, se necessário, fazer uso de cópia autenticada da presente decisão, que passa a valer como salvo-conduto para o exercício das prerrogativas inerentes ao aluno regularmente matriculado na Universidade.

Araçatuba, 6 de setembro de 2002.

Wilson Pereira Junior

Juiz Federal Substituto

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