Cobrança de ICMS

ICMS incide sobre programas de computador, diz advogado.

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27 de março de 2002, 14h52

Com o avanço tecnológico ocorrido na área da informática, as empresas especializadas nas atividades cibernéticas passaram a desenvolver programas de computador de todos os tipos e com a finalidade de atender as inúmeras necessidades dos usuários.

Logicamente, com o desenvolvimento de novos programas de computador que começaram a facilitar as execuções das tarefas diárias nas empresas, bem como a vida de pessoas que necessitam cada dia mais de agilidade nos negócios, a atenção dos administradores estaduais e municipais, foi despertada no que se refere a questão de quem seriam os impostos arrecadados sobre as operações realizadas com este novo produto, o software.

A legislação vigente não definia se o imposto incidente sobre o software, seria o estadual ICMS ou municipal ISSQN, haja vista que a Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998, falava exclusivamente sobre a proteção da propriedade intelectual de programa de computador e sua comercialização no país.

A lei retro mencionada, se preocupou em definir o que era o programa de computador, dar proteção aos direitos de autor e ao registro, disciplinar os contratos de licença de uso, de comercialização e de transferência de tecnologia, e fixar as infrações e as penalidades.

A disciplina na comercialização do programa de computador mencionado na Lei nº 9.609/98 não define que tributo deve incidir no momento da sua venda ou transferência e ou cessão. Simplesmente, determina em seu artigo 10 o seguinte:

“Os atos e contratos de licença de direitos de comercialização referentes a programas de computador de origem externa deverão fixar, quanto aos tributos e encargos exigíveis, a responsabilidade pelos respectivos pagamentos e estabelecerão a remuneração do titular dos direitos de programa de computador residente ou domiciliado no exterior”.

O artigo acima transcrito, exige que nos contratos de aquisições de programas de computador de origem externa, deve ficar explicito de quem será a obrigação pelo pagamento do imposto que incidir sobre a operação, mas, não esclarece o tipo do tributo que irá onerá-lo e a quem seria recolhido.

A mesma dificuldade deparamos com os softwares nacionais, no momento da sua venda ou transferência de direito de uso.

A definição coube ao Poder Judiciário em fixar o tipo de imposto que deveria incidir nas operações realizadas com os programas de computador e a quem seria recolhido, se aos cofres estaduais ou municipais, mesmo porque, as fiscalizações de ambos, começaram a autuar as pessoas físicas e jurídicas que desenvolviam programas, exigindo o recolhimento a seu favor.

Com a controvérsia instaurada, os nossos tribunais na medida em que iam ocorrendo o julgamento das ações, foram desvendando a questão, usando como definição central o brilhante ensinamento de Rui Saavedra que, em preciosa monografia acadêmica apresentada à Universidade de Coimbra, “A Proteção Jurídica do software e a Internet, Don Quixote, Lisboa, 1998”, trouxe os esclarecimentos necessários que serviram de norte à questão:

“É a sua natureza imaterial na medida em que substância tangível, e é, em si, um bem imaterial. O software apresenta-se, pois, como um produto, simultaneamente, utilitário e imaterial. Sendo o software um dos chamados bens informacionais ou produtos de informação, ele não pode ser objeto duma proteção eficaz contra os actos dos não proprietários.Tal protecção só poderá relevar do Direito Intelectual, ou seja, através da organização de um direito de exclusivo a favor daqueles que elaboram o software.”

Classifica Rui Saavedra (obra citada) os programas de computador, segundo o grau de estandardização, nas seguintes categorias, vejamos:

“Os programas standard, observa o autor, constituem, em regra, pacotes de programas bem definidos, estáveis, concebidos para serem dirigidos a uma pluralidade de utilizadores, e não a um utilizador em particular, com vista a uma mesma aplicação ou função.

São, portanto, concebidos para tratamento das necessidades de uma mesma categoria de utilizadores. Mas possibilitam uma configuração adequada para que cada utilizador,em concreto, encontre solução para a sua realidade específica – serão o esqueleto a que falta o revestimento muscular. São como que vestuário de pronto-a-vestir, este software produto acabado. Alguns destes programas dependendo da sua compatibilidade podem ser utilizados em diferentes equipamentos, são programas fabricados em massa e, como são vocacionadas a um vasto público, são até comercializados nos hipermercados, daí que também se fale aqui de software “off the shelf.”

Já os programas por encomenda ou à medida da solicitação do cliente são desenvolvidos a partir do zero para atender às necessidades específicas de um determinado usuário. Escreve a propósito Rui Saavedra (obra acima citada):

“Em todo o mundo, os serviços informáticos das empresas desenvolvem programas para atender às necessidades internas. Mas, paralelamente,há empresas produtoras de software que fazem programas para os seus clientes conforme o pedido e as solicitações destes, e que visam satisfazer as respectivas necessidades específicas. Trata-se de programas aplicacionais, que geralmente não se mantêm estáveis e acabados como os programas standard; pelo contrário, são continuamente adaptados, corrigidos e melhorados para responder aos requisitos internos e externos das empresas.”

“Por fim, os programas adaptados ao cliente (customized) constituem uma forma híbrida entre os programas standard e os programas à medida do cliente. Baseiam-se em programas standard que são modificados para se adequarem às necessidades de um cliente particular (customization). Essa adaptação pode ser realizada tanto pelo fornecedor do programa como pelo próprio utilizador.

Seja qual for o tipo de programa, contudo, é certo, não se confundirão a aquisição do exemplar e o licenciamento ou cessão do direito de uso, também presente até quando se cuide do software enlatado ou de prateleira”.

Após tais considerações, podemos definir com exatidão que os programas de computador gravados mais de uma vez em disquete ou outro sistema para venda avulsa, sob o sistema de licenciamento ou cessão do direito de uso, operação que faz com que o bem objeto da venda ganhe a feição de mercadoria, ficando sujeito ao imposto estadual ICMS. Ocorre a hipótese de incidência do ISSQN somente quando a própria empresa concebe o programa ou sistema por encomenda e segundo a necessidade exclusiva do usuário, se encarregando de instalá-lo no computador do cliente e prestar assistência técnica.

O Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do Recurso Especial nº 123022/RS, o fez em consonância com o entendimento acima expressado. Vejamos:

“Ementa

Tributário. ICMS. ISS. Programas de computador (SOFTWARE). Circulação.

1. Se as operações envolvendo a exploração econômica de programa de computadores são realizadas mediante a outorga de contratos de cessão ou licença de uso de determinado “software” fornecido pelo autor ou detentor dos direitos sobre o mesmo, com fim específico e para atender a determinada necessidade do usuário, tem-se caracterizado o fenômeno tributário denominado prestação de serviços, portanto, sujeito ao pagamento do ISS (item 24, da Lista de Serviços, anexo ao DL 406/68).

2. Se, porém, tais programas de computação são feitos em larga escala e de maneira uniforme, isto é, não se destinando ao atendimento de determinadas necessidades do usuário a que para tanto foram criados, sendo colocados no mercado para aquisição por qualquer um do povo, passam a ser considerados mercadorias que circulam, gerando vários tipos de negócio jurídico (compra e venda, troca, cessão, empréstimo, locação etc), sujeitando-se, portanto, ao ICMS.

(…)

4. Recurso especial improvido. Confirmação do acórdão hostilizado para reconhecer, no caso, a legitimidade da cobrança do ICMS.”

Conclusão.

Apesar do entendimento dos nossos tribunais estar mais refinado sobre a matéria exposta, recomendamos que cada um analise a sua situação, e defina com muita clareza o seu tipo de atividade e nunca colocar no mesmo contrato a prestação de serviço de instalação, treinamento, assistência técnica e manutenção de programa de computador, com venda do software.

Agindo dessa forma, torna-se mais fácil a sua defesa, em caso de eventual autuação por parte da fiscalização estadual ou municipal.

Revista Consultor Jurídico de março de 2002.

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