Fatia do garçom

Cobrança obrigatória de 10% do garçom fere o Código do Consumidor

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26 de março de 2002, 15h13

Há poucos dias, este site divulgou artigo de autoria do advogado Sérgio Tannuri, dando conta de que um mal hábito da maioria das casas noturnas do país é ilegal. Tratava da “consumação mínima” que os estabelecimentos impõem com naturalidade e desenvoltura mas que contraria o Código de Defesa do Consumidor.

Essa excrescência faz par com outro tipo de cobrança: os 10% de gorjeta que, de prêmio para casos especiais de bom atendimento, passou a ser imposto mesmo quando o consumidor é maltratado.

O artigo de Tannuri gerou centenas de manifestações e mensagens enviadas ao autor e a este site.

As narrativas revelam alto grau de inconformismo e, ao mesmo tempo, a prepotência dos que se habituaram a essas práticas ilegais. Mostram também a indiferença ou ignorância dos que, encarregados de zelar pelo cumprimento da lei, acabam por contribuir para a manutenção desse tipo de abuso.

A imposição da consumação mínima, da gorjeta obrigatória e de artifícios como o couvert que não é solicitado e cobrado mesmo quando não consumido são práticas que, repelidas pelo consumidor, podem ser extintas.

Nesta semana, depois de pagar sua conta em uma casa noturna de São Paulo, já na rua, um cliente foi abordado pelo segurança que lhe pediu para voltar ao estabelecimento. Com uma “comanda” em nome de outra pessoa, uma mulher, a gerente da casa Manga Rosa acusou-o de ter fraudado a papeleta. De nada adiantou explicar que o papel apresentado pertencia a outra pessoa.

Além da conta original, de R$ 40,00, exigiu-se o pagamento de R$ 200,00, a título de multa. A resistência custou ao cliente a retenção na casa por cerca de 4 horas, período em que chegou a ser algemado. O cárcere privado só foi interrompido com a chegada da PM, que foi chamada ao local por uma terceira pessoa.

Embora liberado, o cliente, já acompanhado de seu pai, insistiu em levar o caso ao 15º Distrito Policial. Ainda não se sabia que um dos seguranças da casa noturna era agente policial – o que é muito comum em todas as capitais brasileiras.

A delegada de plantão, Daniela Mott, ignorou o flagrante referente ao cárcere privado e à cobrança indevida e tentou evitar a lavratura do boletim de ocorrência. Diante da insistência dos reclamantes, que tiveram de esperar por duas horas para se avistarem com o escrivão, a ocorrência foi registrada mas os acusados indevidamente liberados.

O caso deve ser examinado agora pela Corregedoria da Polícia Civil de São Paulo.

O autor do artigo que gerou a celeuma, Sérgio Tannuri, se ofereceu para narrar suas experiências. Em incidente registrado em um bar do interior de São Paulo, ele gastou R$ 10,00 mas queriam lhe cobrar R$ 33,00 (R$ 30,00 da consumação mínima e 10% do garçom). Por isso, ficou irritado com o “abuso” e disse que não iria pagar. Foi proibido de deixar o local. Então, resolveu ligar para a Polícia.

O investigador, que era estudante de Direito, esteve no local e confirmou a ilegalidade da cobrança. O gerente aceitou o pagamento de R$ 10,00 e o advogado deixou o bar sem precisar ir à Delegacia.

Não foi a primeira vez que o advogado se meteu em confusão para poder exercer seus direitos de consumidor. Ele já foi parar na delegacia outras duas vezes por se negar a pagar a consumação mínima exigida pela maior parte das casas noturnas. “Cansei de ser explorado”, afirma.

Há um ano, o advogado paga apenas o valor consumido em qualquer bar, restaurante ou danceteria que freqüenta.

Em outras duas ocasiões, a história foi mais longe. Chegou a ir para a delegacia juntamente com os gerentes dos estabelecimentos. Quando os delegados disseram para os gerentes que a cobrança feria o Código de Defesa do Consumidor, eles decidiram voltar atrás. Novamente, Tannuri pagou apenas o valor que havia consumido.

“Quando aviso que vou pagar apenas o valor consumido, os gerentes pensam que estou agindo de má-fé. Mas quando constatam nas delegacias que realmente tenho esse direito, recuam”, afirmou. O advogado disse que se cada consumidor agisse dessa forma, os abusos seriam evitados. “É preciso ter paciência. O impasse dura cerca de uma hora, mas compensa exercer a cidadania”.

Tannuri disse que apenas nessas três situações precisou levar o caso para as últimas conseqüências. Em alguns bares e restaurantes, basta dizer que vai pagar apenas o valor consumido. “Alguns estabelecimentos têm consciência que a cobrança da consumação mínima é abusiva”.

Leia artigo sobre a ilegalidade da cobrança

Revista Consultor Jurídico, 26 de março de 2002.

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