Ela escapou

Nicéa Camargo vence ACM e escapa de mais uma ação

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16 de março de 2002, 15h00

A ex-primeira-dama Nicéa Camargo (ex-Pitta) foi absolvida das acusações de calúnia e difamação feitas por Antônio Carlos Magalhães. A decisão transitou em julgado no início do ano e acaba de ser publicada no Diário Oficial.

O juiz da 11ª Vara Criminal de São Paulo, Alex Tadeu Zilenovski, acatou as argumentações de Nicéa Camargo. A ex-primeira-dama é representada pela advogada criminal Andréa Guedes Miquelin.

O ex-presidente do Senado entrou na Justiça contra Nicéa, em 2000, por causa de uma entrevista concedida ao programa ‘Globo Repórter’, da TV Globo. Na ocasião, Nicéa falou sobre o suposto envolvimento de ACM em esquemas de corrupção da cidade de São Paulo.

De acordo com Nicéa, ACM usava o ex-senador Gilberto Miranda (PFL) para pressionar o então prefeito Celso Pitta a saldar dívidas do município com a construtora OAS. Um dos proprietários da construtora é genro de ACM.

A defesa argumentou que a ex-primeira-dama se limitou a narrar fatos verdadeiros de que tomou conhecimento. Por isso, não houve dolo.

Segundo o juiz, "não restou caracterizado o crime de calúnia por parte da querelada, eis que não há prova clara de que ela tivesse ‘conhecimento da inocência do caluniado’".

A ex-primeira-dama já obteve algumas vitórias relativas às acusações de difamação, calúnia e injúria propostas pelos políticos Paulo Maluf, Flávio Maluf, Carlos Augusto Meimberg, Miriam Athiê, Naji Nahas, Jorge Yunes, Getúlio Hanashiro e Paulo Roberto Faria Lima.

Veja os trechos principais da sentença

Processo nº 050.00.022043-4 – C. 431/00.

"Vistos, etc…

ANTÔNIO CARLOS MAGALHÃES, qualificado nos autos, ingressou com a presente queixa-crime contra NICÉA CAMARGO DO NASCIMENTO, também qualificada nos autos, com base nos arts. 20 (calúnia) e 21 (difamação), da Lei 5.250/67, a ‘Lei de Imprensa’.

Narra a queixa-crime que no programa ‘Globo Repórter’ da Rede Globo de Televisão, levado ao ar em rede nacional por volta das 23:00h do dia 10 de Março de 2000, ‘reproduzido em todas as revistas e jornais editados no Brasil’, a querelada lançou uma série de pesadas acusações contra diversos cidadãos domiciliados na cidade de São Paulo – detentores de cargos públicos ou integrantes do meio empresarial – acusando-os de participarem de imenso ‘esquema de corrupção’ na Câmara de Vereadores e no Executivo Municipal’.

Em aditamento à queixa-crime (fls. 49 e s.), o querelante afirmou que a difamação praticada pela querelada ‘não consistiu tão só em algumas palavras que, isoladamente, possam ser destacadas, mas no conjunto das declarações da querelada, envolvendo o nome do querelante nesse triste episódio que a imprensa denominou ‘mar de lama’. Prosseguiu o querelante afirmando que:

‘a querelada não acusa o querelante – explicitamente – de corrupção, como faz com o seu marido e com os ex-amigos. Mas o animus diffamandi é de uma evidência claríssima, dele defluindo o animus calumniandi, porquanto seus grosseiros comentários, a narrativa inteiramente falsa, está inserida no contexto das pesadíssimas acusações que atirou contra adversários políticos seus e/ou de seus mentores, todos do Estado de São Paulo, circunstância que deixa claro o propósito de atirar sua lama sobre o querelante, que nenhuma ligação direta ou indireta tem com essa ‘política’ da cidade de São Paulo. Aliás, é de observar-se que todos os atingidos, à exceção do querelante, são políticos militantes em São Paulo.

Nenhum é da Bahia ou de qualquer outro estado brasileiro’.

‘misturar gratuitamente o querelante com pessoas de caráter duvidoso, tentar envolver o seu nome nesse lamaçal é animus diffamandi – propósito de ofender sua honra objetiva, seu conceito, sua reputação. E o animus calumniandi emerge claro dos grosseiros e reticentes comentários, peculiares aos detratores da honra alheia. Acusa implícita e falsamente o querelado do delito – nomen juris – ‘advocacia administrativa”.

Seguiu o querelante afirmando que:

’em meio a essas acusações domésticas e ao grupo dos seus até então amigos íntimos e/ou correligionários do marido, deu-se a querelada de querer atirar sua lama contra o querelante, ao dizer que ele ‘tendo como intermediário o ex-Senador Gilberto Miranda’, ‘pressionara o seu marido a pagar dívidas da Prefeitura com a Construtora OAS, da qual um dos donos é genro de ACM’; que tais dívidas foram ‘herdadas’da administração anterior, do prefeito Paulo Maluf’.


Segundo o querelante, a querelada o ofendeu ao afirmar que:

‘Ele (o ex-Senador Gilberto Miranda) era o intermediário do senador presidente do Senado, Antônio Carlos Magalhães, na cobrança que a Prefeitura deveria pagar, e que já era uma dívida herdada, também do sr. Paulo Maluf de uma empresa que é a OAS, que é da família do senador Antônio Carlos Magalhães’.

Prosseguiu o querelante afirmando que as ofensas continuaram quando a querelada respondeu ao repórter:

‘I. Porque o prefeito Celso Pitta poderia temer o fato do senador Antônio Carlos Magalhães estar tão bravo com ele?:

Resposta de Nicéa: Meu marido ficou assustado porque ele queria que o meu marido pagasse não sei quantas prestações das dívidas que a prefeitura tinha com a OAS,a empresa deles, e meu marido, me parece que naquela época não tinha, realmente, a verba suficiente para fazer este pagamento. Mas era uma pressão muito forte.

II. O senador Antônio Carlos Magalhães, naquele momento, poderia fazer algum mal à administração do seu marido, ou à vida pública dele?:

Resposta de Nicéa: Poderia porque ele é senador e teria lá no senado estavam votando a CPI dos precatórios.’

Segundo o querelante, com tais palavras, a querelada imputou-lhe crime, qual seja, advocacia administrativa (art. 321, Cód. Penal).

A exordial e respectivo aditamento vieram acompanhadas dos documentos de fls. 12/24, inclusive de cópia de vídeo do aludido programa de televisão, com o trecho atacado.

A querelada foi citada para apresentação de defesa prévia (art. 43, § 1º da Lei de Imprensa), peça esta que foi juntada aos autos a fls. 30/38 e 63/72).

O Ministério Público manifestou-se nas oportunidades cabíveis.

A queixa-crime foi, então, recebida (fls. 84/85), quando foi designada a audiência de instrução.

A testemunha arrolada pelo querelante, Celso Roberto Pitta do Nascimento, valendo-se da faculdade do art. 206, Cód. Processo Penal, recusou-se a depor (fls. 161).

Em audiência foram ouvidas as testemunhas Gilberto Miranda Batista (fls. 172/174), Nícea Aparecida de Camargo Arno (fls. 175,176), João Ferreira de Melo (fls. 177/178), Maria Alice Antônio (fls. 224), Vítor Pitta Camargo do Nascimento (fls. 228/229) e foi interrogada a querelada (fls. 189/191).

Em suas considerações finais (fls. 264/278) o querelante – após analisar a prova produzida – reiterou o pedido de condenação.

A querelada, por sua vez (fls. 314/332), entendeu demonstrado haver agido com ‘animus narrandi’, sem qualquer intenção de ofender o querelante.

O Ministério Público (fls. 364/370) opinou pela improcedência da queixa-crime.

É o relatório. Decido.

(…)

Destarte, verifica-se que restaram controversos os fatos que, materialmente, teriam dado ensejo às declarações da querelada, tomadas como difamantes e caluniosas pelo querelante.

Fato é que as negativas da ocorrência da tal ‘cobrança indevida’ feitas pelas testemunhas arroladas pelo querelante – o ex-Senador Gilberto Miranda (pessoalmente em Juízo) e pelo ex-Prefeito Celso Pitta (por meio de documentos juntados aos autos), eram óbvias, já que – caso assim não fosse – estariam confessando prática de crimes (advocacia administrativa ou constrangimento ilegal e prevaricação, por exemplo).

Note-se que o fato da querelada ter se referido ao querelante – então presidente do Senado da República – em suas declarações à televisão, em rede nacional – guarda certo sentido, pois, embora o fulcro das declarações/denúncias da querelada fossem políticos e autoridades locais (de São Paulo), o fato por ela referido e atinente ao então Presidente do Senado, também guardavam pertinência com a administração municipal, pois, consoante disse ela, era o Prefeito de São Paulo (portanto, o Tesouro Municipal) quem estaria sendo ilegitimamente pressionado a pagar dívidas atrasadas para com uma certa empreiteira.

Cumpre ponderar que o tom da entrevista dada pela querelada à televisão foi, claramente, o de uma ‘denúncia’, ou seja, ao fazer suas afirmações sérias e contundentes – inclusive contra a Administração do então marido, círculo que até então integrava – passando por importantes pessoas ligadas à Prefeitura e ao mundo político – a querelada deixou transparecer estar ‘desvendando o véu’, ou melhor, ‘deixando cair o pano’, quiçá, ‘levantando o tapete’ que – segundo descreveu – encobria um sem-número de irregularidades, imoralidades e ilicitudes.


Foi neste clima, notadamente, tenso e emocionado, que a querelada falou, e falou muito, de modo corajoso e contundente, quiçá abalando conceitos, práticas e carreiras, quiçá prestando bom serviço à moralidade pública, hoje um conceito tão em voga e fundamental para o aprimoramento da Democracia.

Outrossim, bem sabemos que:

‘Para configurar a calúnia é, assim, indispensável: a) a imputação de um crime e não apenas de um simples fato desonroso; b) que a imputação seja objetivamente falsa; e c) que o autor tenha conhecimento da inocência do caluniado’ (FREITAS NOBRE, Comentários à Lei de Imprensa, São Paulo, Saraiva, 2ª ed., 1978, p.95)

Nos diversos depoimentos colhidos em Juízo, inclusive no termo de interrogatório da querelada, verifica-se que – insistentemente – a querelada e algumas pessoas a ela ligada, afirmaram que: as ‘pressões’ indevidas feitas ao prefeito de São Paulo, efetivamente, existiram; ou que ela afirmava que tais ‘pressões’ existiam; ou que o prefeito dizia a ela que tais ‘pressões’ indevidas existiam.

Fato é que – ao que se pode aferir de suas declarações e de testemunhas ouvidas – a querelada acreditava que o então marido e então prefeito era alvo de ‘pressões’ indevidas, de cunho político inadmissível.

Se tal crença foi resultado de má compreensão da realidade por parte da querelada, ou de sua indução a erro ou mesmo de sua má-fé, é fato que a prova destes autos não deixou claro.

Neste sentido:

‘É impossível a condenação de agente como incurso no art. 20 da Lei 5.250/67, se este acreditar ser verdadeiro o fato a outrem imputado, sendo que para que haja dolo, preciso que o réu saiba ou desconfie que o fato veiculado é falso’ (TACRIMSP – AC. 734.735 – Rel. Gonzaga Franceschini).

Assim, não restou caracterizado o crime de calúnia por parte da querelada, eis que não há prova clara de que ela tivesse ‘conhecimento da inocência do caluniado’.

Ao contrário, a prova produzida, como visto, está a indicar que a querelada – ciente de certos fatos graves – ou acreditando estar ciente da efetividade de certos fatos graves – dirigiu-se a poderoso veículo de divulgação e narrou ao país tais distorções.

Poderemos que ao agir desta maneira, a querelada – até então íntima do poder político local – fez, via imprensa, o papel típico e primordial da Imprensa, qual seja, narrou fatos – que sabia ou acreditava saber – à população. Aliás, ‘se é função da imprensa a informação (a narração), não se poderia pretender efeitos de Direito Penal sobre notícia de tal gênero, pois aí se vislumbraria apenas o jus narrandi.

Existe, inquestionavelmente, um interesse público que reclama da imprensa, instantemente, notícias, informações, opiniões, exposições etc. E é, em regra, com a atenção voltada sobre essa exigência que a imprensa se realiza. O interesse público antecede a elaboração da notícia jornalística. E a verdade é que o povo tem o direito de reclamar informes sobre tudo o que ocorre no meio em que vive. Quer saber dos bons acontecimentos, das boas ações porque, assim, está se educando e instruindo. Quer saber das más ações, dos escândalos, dos crimes, porque, assim, está se defendendo, prevenindo-se contra o risco do contágio. Como vimos, o noticiário da imprensa, em tese, está sob proteção quer da compreensível teoria dos animus narrandi quer do instituto da bona fides (Serrano Neves, O Direito de Imprensa, ed. 1977, p. 201 s.).’

Por outro lado, discorrendo sobre a vedação da exceptio veritatis contida no art. 20, § 3º, da Lei de Imprensa, o saudoso FREITAS NOBRE lembrou que:

‘Criticando o § 3º do art. 20, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, Aliomar Baleeiro (Folha de São Paulo, 9-2-1977), teve ocasião de condenar algumas das supressões feitas ao texto da lei de Imprensa de 1953, bem como determinados acréscimos de caráter antidemocrático.

Disse, textualmente, a propósito daquele parágrafo, o professor de Direito e magistrado aposentado: ‘Faz do Presidente da república e de outros funcionários graúdos umas criaturas divinas e intocáveis, acima do bem e do mal, cujos crimes e fatos desabonadores, embora verdadeiros, não podem ser denunciados ou comentados’.


E, ainda, com suas candentes observações comparou essa situação jurídica com recente episódio vivido pelos Estados Unidos da América do Norte: ‘Imagine-se que se instale, no Alvorada, um Nixon e os jornalistas sem o insultarem, como aliás ocorreu com os de Watergate, desfiem o novelo de seus crimes, corrupções e vilanias. O Nixon caboclo poderá metê-los na cadeia e o Supremo Tribunal não poderá conhecer da prova da verdade. Os magnatas têm prerrogativas de segredo e impunidade’.

Conclui suas observações lembrando que o jornalista ‘numa democracia de verdade, tem o direito de criticá-los por seus crimes e leviandades, em matéria pública’ e, ‘mais do que direito, dever cívico’.’ (Comentários à Lei de Imprensa, São Paulo, Saraiva, 2ª ed., 1978, p.99).

Claro está, portanto, que a existência desta lamentável restrição ao direito de defesa, previsto na lei, resquício de uma época que não deixa saudades aos brasileiros, obstaculizou a cognição da verdade do fato (pressões indevidas) proclamado pela querelada em rede nacional.

E que pese o querelante tenha movido ação em nome próprio, fato é que na época era presidente do Senado Federal e, portanto, a imputação do fato criminoso feita pela querelada não poderia ser comprovada por ela neste processo por meio da exceptio veritatis por expressa vedação legal.

Restou-lhe, então, a defesa no curso do feito, inclusive com avanço sobre a cognição do fato criminoso materialmente referido (cf. docs. de fls. 291/305), tudo como decorrência do princípio – este sim constitucional – da ampla defesa (art. 5º, LV, da Constituição da República).

Pondere-se que seria salutar que detentores de funções públicas – em especial aqueles de maior carga de Poder – tomassem a iniciativa de provar à sociedade e à opinião pública que determinados fatos a eles imputados são falsos e que não cometeram os crimes a eles atribuídos, jamais valendo-se de favores legais de legitimidade discutível.

Numa Democracia representativa, quem tem Poder o exerce em nome do povo e a ele deve todo tipo de satisfação, em especial quando alguém lhe imputa prática de crime, pois ‘Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição’ (C.R., art. 1º, par. único).

Então, cabe ao bom representante do Povo vir a público e comprovar que o fato criminoso a ele imputado é falso, caso contrário, permite que pairem dúvidas sobre a falsidade ou veracidade do ataque recebido.

Por outro lado, alega o querelante que ao referir-se à sua pessoa em meio a denúncias várias – um verdadeiro ‘mar de lama’ – a querelada o difamou, pois o colocou lado a lado com pessoas de moral e prática política discutíveis.

Não obstante, como visto, ao que pode-se aferir de suas declarações e de testemunhas ouvidas – a querelada acreditava que o então marido e então prefeito era alvo de ‘pressões’ indevidas, de cunho político inadmissível. Se tal crença foi resultado de má compreensão da realidade por parte da querelada, ou de sua indução a erro ou mesmo sua má-fé, é fato que a prova destes autos não deixou claro.

Bem sabemos que declarações feitas apenas com simples ânimo de narrar não configuram difamação já que:

‘A transmissão radiofônica dentro dos limites do ‘jus narrandi’ não caracteriza o crime de difamação, caso contrário a imprensa resultaria imprestável, se tivesse de lhe suprimir a faculdade de informar o público pelo simples motivo de poder isso ser prejudicial à reputação, ao decoro ou à honra de alguém envolvido em qualquer ocorrência mais ou menos escandalosa’ (TACrim – São Paulo – AC 396.841 – Rel. Benedicto Campos).

Por outro lado, como visto, não existe a necessária certeza de que o intuito da querelada tenha sido o de ultrajar a honra do querelante, de modo que não restou comprovada a difamação, já que:

A prova da existência de palavras ou escritos que, objetivamente, tenham sentido ofensivo não basta para caracterizar a infração do art. 21 da lei 5250/67. É indispensável a indicação segura e que são motivados pelo ‘animus diffamandi’, ou seja, pela vontade livre e consciente e se ultrajar a honra de alguém (TACrim-São Paulo – AC 430.139 – Rel. Gomes de Amorim).


Por fim, consoante verificado, a prova produzida está a indicar que a querelada – ciente de certos fatos graves – ou acreditando estar ciente da efetividade de certos fatos graves – dirigiu-se a poderoso veículo de divulgação e narrou ao país tais distorções. Agindo desta maneira, a querelada – até então íntima do Poder político local – fez o papel típico e primordial da Imprensa, via imprensa, qual seja, narrou fatos – que sabia ou acreditava saber – à população.

Lembre-se, aliás, que:

‘Não se vislumbrando na reportagem inserida em jornal a preocupação de ofender a honra alheia, mas de defender o interesse público, não há falar em difamação’ (TACrim-São Paulo – Rel. Djalma Lofrano – RT 504/563).

Ante o exposto, conclui-se que é impossível o acolhimento da pretensão punitiva deduzida em Juízo, pois o querelante não logrou desconstituir a presunção de inocência existente em favor da querelada, nos termos do art. 5º, inc. LVII, da Constituição Federal.

Como visto, a prova produzida sob o contraditório não autoriza a conclusão de que os fatos se deram tal como descritos na queixa-crime, de modo que não inspira a necessária certeza acerca daquilo que, efetivamente, aconteceu, impondo-se, claramente, como melhor solução para o caso o ‘non liquet’.

Assim, há que se concluir que a Defesa e o Ministério Público agiram corretamente quando pediram a absolvição.

Como visto, nenhuma prova segura acerca dos fatos descritos na queixa foi produzido sob a luz constitucional do contraditório.

É impossível, em casos que tais, o embasamento de qualquer édito condenatório tão-só em assertivas feitas e não devidamente ratificadas perante o Magistrado.

Assim, se no processo o querelante se propõe a demonstrar que a querelada praticou certa infração e, ao cabo da instrução, restam dúvidas relevantes acerca do tipo subjetivo próprio das espécies e, conseqüentemente, acerca da caracterização das infrações, impõe-se a sua absolvição como medida acautelatória de seus direitos subjetivos, constitucionalmente tutelados.

De fato, a expedição de um édito condenatório pelo Poder Judiciário é medida grave e exige embasamento sólido e confiável.

De conformidade com a Constituição Federal, que acolheu o princípio do devido processo legal (art. 5º, inc. LIV), a dúvida beneficia o réu, de modo que não havendo plena certeza acerca da efetiva ocorrência ou da prática da conduta típica e antijurídica a ele formalmente atribuída, impõe-se a absolvição como medida acautelatória de bem jurídico vital do homem, sua liberdade.

Destarte, diante da fragilidade do contexto probatório apresentado, conclui-se que é impossível o acolhimento da pretensão condenatória deduzida na denúncia.

Decisão.

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE A PRETENSÃO PUNITIVA DEDUZIDA EM JUÍZO, e o faço para ABSOLVER a querelada NICÉA CAMARGO DO NASCIMENTO, qualificada nos autos, das acusações que lhe foram feitas na denúncia, tudo ante a fragilidade do conjunto probatório contra ela apresentado e, com fulcro no inc. VI do art. 386 do Cód. Proc. Penal.

P.R.I.C e, oportunamente, arquive-se.

São Paulo, em 05 de Setembro de 2001.

ALEX TADEU MONTEIRO ZILENOVSKI

Revista Consultor Jurídico, 16 de março de 2002.

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