Decisão questionada

No Rio de Janeiro, juiz desbloqueou conta de doleiro no PR.

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10 de março de 2002, 12h45

Entre as decisões do juiz Francisco Pizzolante, do Tribunal Regional Federal da Segunda Região (Estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo) para as quais se busca explicação até hoje está a que envolveu o desbloqueio de bens e valores da ordem de R$ 1 bilhão de um doleiro paraguaio, em Foz do Iguaçu, no Paraná.

O dinheiro só não foi remetido para o exterior, em maio de 2001, porque o ministro Nilson Naves suspendeu a decisão judicial que beneficiava o doleiro Juan Carlos Ramirez Villanueva.

Ao todo, Villanueva tentava tirar do Brasil o equivalente a US$ 2,9 milhões (cerca de R$ 6 milhões). O dinheiro tinha origem criminosa e representaria evasão de divisas com poder de afetar a política cambial, conforme o Banco Central, que solicitou ao STJ a manutenção do bloqueio.

A sentença restabelecida pelo vice-presidente do STJ permitia ainda o arresto no valor de até US$ 459,5 milhões (aproximadamente R$ 1 bilhão). Este montante corresponderia ao total já desviado pelo doleiro, segundo estimativa do Ministério Público Federal, e que também constituiria objeto de crime de evasão. A decisão judicial prevê ainda o arresto adicional de R$ 10,6 milhões, visando “acautelamento das multas penais devidas pelos crimes em tese cometidos” pelo doleiro.

O desbloqueio, agora revogado pelo STJ, foi concedido pelo juiz Francisco Pizzolante, do Tribunal Regional Federal da Segunda Região (Estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo), ao qual Villanueva recorreu. A medida permitiria ao doleiro retirar de sua conta no Banco Prosper e remeter para conta no mesmo banco, no Paraguai, US$ 2,9 milhões.

O bloqueio judicial dos depósitos de Villanueva teve origem em pedido de arresto formulado pelo Ministério Público Federal, após investigações realizadas pelo Banco Central e a constatação da prática de ilícitos e evasão de divisas. “Tais valores (cerca de meio bilhão de dólares) devem ser objeto de decretação de perda em sede penal, por serem produto e objeto do crime, além de também estarem sujeitos à perda administrativa, nos termos da Lei 9.069/95”, segundo o MPF. O bloqueio foi aprovado pelo juiz da Primeira Vara Criminal de Foz de Iguaçu (PR), e começou a vigorar dia 17 de abril último.

Em seguida ao bloqueio, Juan Carlos Villanueva ajuizou mandado de segurança com pedido de liminar junto à 22ª Vara Federal do Rio de Janeiro, pleiteando o desbloqueio de suas contas internacionais no Banco Prosper, do Rio de Janeiro. A liminar foi deferida pela juíza Nizete Antônia Lobato Rodrigues (RJ). A juíza, todavia, revogou tal decisão tão logo foi informada da existência de sentença da Primeira Vara Criminal de Foz do Iguaçu, bloqueando as contas do doleiro.

Villanueva, porém, interpôs agravo de instrumento junto ao TRF pedindo a suspensão dessa segunda decisão da juíza Nizete. O agravo foi deferido pelo juiz Francisco Pizzolante (TRF da Segunda Região). Assim, foi restabelecida a liminar que desbloqueia as contas e permitia a remessa do dinheiro ao exterior. Diante da existência de duas ordens judiciais – uma autorizando o bloqueio e outra desbloqueando os depósitos – o Banco Central vinha obedecendo à primeira. Mas o juiz Francisco Pizzolante determinou esta semana o “cumprimento imediato daquela decisão (o desbloqueio), sob as penas da lei”. A Procuradoria do Banco Central recorreu, então, à Presidência do STJ, que cassou a decisão do juiz Francisco Pizzolante e restabeleceu o bloqueio.

Para o Banco Central, a permissão para remessa imediata dos recursos bloqueados ao exterior, enquanto a questão ainda está sendo discutida na Justiça, representaria grande risco. “Fácil constar que liberado o montante em depósito judicial, a possibilidade de recuperação da importância será mínima”, observaram os procuradores do Banco Central no pedido de suspensão da liminar ao STJ.

O doleiro Juan Carlos Villanueva opera em Foz do Iguaçu há muitos anos e começou a ser investigado pelo Banco Central e o Ministério Público Federal em 1996. Numa auditoria nas casas bancárias daquela cidade o Banco Central constatou indícios de diversas práticas de ilícitos penais previstos no artigo 22 da Lei 7.492/86, como lavagem de dinheiro, operações de câmbio não autorizada, e saída de moeda para o exterior. Em razão dessa investigação, foi instaurado o Inquérito Policial nº 263/97 perante a Primeira Vara Criminal de Foz do Iguaçu contra os indiciados naquela oportunidade, entre os quais figurava Villanueva.

Na ocasião, a delegacia regional do Banco Central em Curitiba informou à Procuradoria da República no Estado do Paraná que se deparou com operações de compra de moeda estrangeira no valor de US$ 300 mil, efetuadas por Villanueva. “O valor era incompatível com a renda e a ocupação profissional constante de seu cadastro bancário, além de ser fortemente discrepante da finalidade declarada (viagens internacionais ou turismo no exterior), fato que, em tese, configuraria prática de crime contra a ordem tributária, previsto no artigo 2º, I, da Lei 8.137/90”, segundo relatório da Procuradoria do Banco Central.

Em razão dessa descoberta instaurou-se o Inquérito Policial nº 195/98 e, em seguida um processo, também, na Primeira Vara Criminal de Foz do Iguaçu. Em 26 de fevereiro de 1999, nesse processo, foi decretada a prisão temporária do doleiro, que é paraguaio. Mas somente em abril do ano passado, o Ministério Público Federal requereu o arresto de bens de propriedade de Juan Carlos Villanueva, por meio de bloqueio dos valores identificados pela fiscalização do Banco Central e movimentados por ele, “tendo como escopo resguardar eventual prejuízo para a Fazenda Pública”.

Processo: SS 927

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Revista Consultor Jurídico, 10 de março de 2002.

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